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8 - O Verdadeiro e o Falso Simbolismo da Cruz

O simbolismo religioso é uma forma particular de raciocínio que nos permite compreender o mundo espiritual ao observar o mundo material. Isso se deve ao fato de o Criador ter estabelecido uma harmonia entre as coisas visíveis e as invisíveis, conforme expresso na profissão de fé cristã: "Criador do céu e da terra, de todas as coisas visíveis e invisíveis". O mundo físico é a imagem do mundo espiritual. Esse é o cerne da "dissertação simbólica".

Dentro dessas "coisas invisíveis", devemos incluir não apenas o mundo espiritual (ou seja, dos anjos e das almas), mas também toda a ordem sobrenatural, pois ela também é invisível aos olhos físicos.

A ordem sobrenatural também é conhecida como a ordem da Graça. Mas o que é Graça? É uma ajuda espiritual concedida aos seres humanos para que possam alcançar as finalidades gloriosas para as quais foram destinados, mas que, por diversas razões, não podem alcançar apenas com suas próprias forças naturais.

De onde vem essa ajuda espiritual, misericordiosa e gratuita? Ela é derivada dos Tesouros da Graça, que são os méritos acumulados pela Paixão de Cristo, ou seja, pela Cruz.

Há uma graduação entre os três ordenamentos. O mais inferior é a ordem da natureza, cujo conhecimento deriva do decreto da Criação do nada. Em seguida, vem a ordem sobrenatural, cujo status é resumido pela Cruz. Por fim, no topo das Obras Divinas, está a ordem da Glória, que será definitiva e resultará de outro decreto já anunciado no Apocalipse:

"E Aquele que estava assentado no trono disse: 'Eis que faço novas todas as coisas'". (Apocalipse XXI - 51).

A Cruz, que governa a ordem da Graça, está, portanto, intermediária entre a natureza e a Glória. É ela que permite que o universo saia do estado natural e alcance seus fins: "O mundo geme e sofre as dores do parto". Assim, a Cruz não é apenas um símbolo que permite aos homens entender o mundo dos espíritos e da Graça, mas também é o instrumento eficaz pelo qual Jesus torna possível o decreto divino de renovação final. A Cruz contém em si o Reino eterno. A Cruz é o instrumento da salvação.

Toda a inteligência da Cruz resulta de sua posição intermediária entre a natureza e a Glória. Portanto, para fornecer uma interpretação correta de seu simbolismo, é necessário primeiro admitir os grandes mistérios e dogmas da Fé cristã, dos quais vimos que ela é um resumo. Não se compreende a Cruz se não se conhecem os mistérios que ela resume.

O SIMBOLISMO METAFÍSICO DA CRUZ, que R. Guénon nos propõe agora, é totalmente diferente. A "cruz metafísica" não é mais o instrumento de dor que opera a transição da natureza para a Glória. Ela se torna um sistema de coordenadas retangulares que fornece a situação recíproca das grandes forças cósmicas e que permite observar a harmonia universal, o que é, de fato, exato, mas é apenas uma pequena parte do verdadeiro simbolismo da Cruz. R. Guénon aceita os dogmas cristãos apenas verbalmente (e mesmo assim) mas não lhes reconhece valor absoluto. Para ele, são apenas formas aproximadas e populares de uma metafísica muito mais vasta e abrangente, metafísica que, segundo ele, é revelada pela iniciação.

Seu deus não é, como o nosso, o Deus Vivo de Abraão, Isaque e Jacó. É um princípio abstrato, uma construção da mente, chamado PRINCÍPIO SUPREMO e definido como o locus geométrico de todas as possibilidades, sejam elas manifestadas ou virtuais. É a esse deus que a "cruz metafísica" conduz, seguindo uma ascensão iniciática.

O universo de Guénon, portanto, está privado da Cruz operativa de Jesus Cristo, e, consequentemente, também privado do último fim que ela proporciona: o Reino dos Céus. Esse universo agora só pode evoluir em eternos recomeços, dos quais o homem só pode escapar pela fusão com um "Princípio Supremo" tanto mais imutável quanto estiver fora da existência.

Veremos em breve por meio de quais mecanismos, aliás muito inteligentes como sempre, e muito habilidosos, Guénon passa da Cruz de Cristo para a cruz metafísica.