5 - Duo in Carne Una
Chegamos agora à última tentativa dos androginistas e veremos que ela está destinada ao mesmo fracasso. Eles se agarram, uma última vez, ao famoso verso que todo mundo conhece de cor:
"Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá (adha erebit) à sua esposa (uxori) e serão os dois em uma só carne". "E erunt duo in carne una" (Gen., II, 24).
Eles pegam a expressão "duo in carne una" para lhe dar, desta vez, um sentido literal que não lhe convém. "Dois em uma só carne", essa é de fato a definição do andrógino, dizem eles. O casal humano, e mais precisamente o ato de se unir, reconstituem o andrógino adâmico.
Há aqui um erro muito grosseiro de interpretação. Nunca tal exegese foi aceita ou mesmo expressa na Igreja. O sentido literal aqui é completamente ininteligível, como vamos mostrar. É por causa de seu casamento que os cônjuges agora possuirão a mesma carne (erunt duo in carne una)? Diremos que eles têm o mesmo corpo? Claro que não, pois os dois corpos permanecem separados. Diremos então que os dois corpos são feitos da mesma substância carnal? Essa comunidade de substância não é específica dos cônjuges, pois ela se encontra em dois seres humanos escolhidos ao acaso.
Portanto, estamos nos desviando se procuramos aqui o sentido literal. É evidente que o vínculo que une os cônjuges não é o da unidade de substância. Se o texto fala de uma só carne, é por outra razão. A compreensão deste trecho do Gênesis é dada no Evangelho. Vamos reproduzi-lo na íntegra porque é muito importante.
Os fariseus se aproximam de Jesus e lhe fazem esta pergunta
"É permitido a um homem repudiar sua esposa por qualquer motivo? Jesus respondeu-lhes: 'Não lestes que aquele que os criou, desde o princípio, os fez homem e mulher e disse: Por isso deixará o homem pai e mãe e se unirá à sua mulher, e os dois serão uma só carne? Assim, já não são dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus uniu, o homem não separe.'" (Mateus, XIX, 3-6)
Nosso Senhor compara os laços que unem os cônjuges com os laços particularmente indissolúveis que uniam Adão e Eva. Os cônjuges encontram-se espiritualmente na situação recíproca em que Adão e Eva se encontravam fisicamente. Não se pode separar espiritualmente os cônjuges mais do que se poderia dissociar fisicamente nossos primeiros pais, que tinham o privilégio único, nunca reproduzido desde então, de possuir uma carne única.
Se Nosso Senhor evoca o exemplo de Adão e Eva, não é para sugerir que os cônjuges adquiram, em virtude do seu casamento, uma substância carnal única que não teriam possuído anteriormente, é para dar uma imagem da força e da indissolubilidade do laço que os une. É, aliás, a conclusão da resposta que ele dá aos fariseus.
Se insistimos, é porque estamos tocando no ponto sensível que é o mais atacado pelos andróginos. Há, neste texto, uma comparação entre dois estados análogos: o estado físico do primeiro casal humano e o estado espiritual de todos os outros casais. Os dois termos desta comparação são separados na Gênesis pelo advérbio "quamobrem" e no Evangelho por "propter hoc". Estas palavras, que significam "em razão de..., por causa de..." fazem a charnière entre os dois termos da analogia e seu significado desenvolvido é o seguinte:
«Devido ao estado no qual o primeiro homem e a primeira mulher foram criados».
O comentário de L.-Cl. Fillion nos convencerá definitivamente:
«Todas as outras relações, todos os outros vínculos, mesmo os mais íntimos, cederão às relações e aos laços estabelecidos pelo casamento. A coesão criada por essa força é a maior possível... Conclusão final de Jesus: que o homem se abstenha de romper pela divórcio a unidade tão estreita que Deus Ele mesmo estabeleceu entre os dois primeiros cônjuges».
Assim, esta mesma expressão bíblica «duo in carne una» é interpretada pela Igreja como significando a indissoluabilidade espiritual do casamento e pelos andróginos como a reconstrução física do andrógino adâmico. Essa reconstrução é o elemento introdutório de um certo caminho místico que leva às práticas mais sofisticadas do ioga, tântrico ou outro.