2 - Uma forma humana no Meio Invariável
Aqui estão, primeiramente, os termos em que R. Guénon define o homem universal:
"O homem universal, na medida em que é representado pelo conjunto 'Adão-Eva', tem o número de Allah. Esse número, que é 66, é dado pela soma dos valores numéricos das letras que formam os nomes Adam wa Eawa. Segundo o Gênesis hebraico [1], o homem, criado macho e fêmea, ou seja, em um estado andrógino, é 'à imagem de Deus'. O estado andrógino original é o estado humano completo no qual os complementares, em vez de se oporem, se equilibram perfeitamente" (O Simbolismo da Cruz, cap. III).
O homem universal assim definido será simbolicamente colocado no Meio Invariável. É aí, de fato, que o andrógino se coloca logicamente, ou seja, no centro do vórtice esférico universal, que nada mais é do que o antigo centro metamorfoseado da Cruz cristã.
Guénon agora vai elevar suas considerações metafísicas a um novo patamar. Ele vai considerar esse "Meio Invariável" não mais como o centro da humanidade apenas, mas como o centro do universo inteiro, com todos os seres materiais e espirituais que o compõem. Ele constata então que o andrógino, embora represente validamente toda a humanidade por ser bissexuado, não pode representar o universo inteiro.
Para representar adequadamente a totalidade universal, é necessário um símbolo que não seja mais bissexuado, mas completamente assexuado, totalmente neutro. Em toda lógica, seria necessário até mesmo um símbolo absolutamente desprovido de antropomorfismo e geocentrismo. Ouçamos Guénon nos explicar o porquê.
"Devemos agora insistir em um ponto que, para nós, é de importância capital: é que a concepção tradicional do ser, tal como a expomos aqui, difere essencialmente de todas as concepções antropomórficas e geocêntricas das quais a mentalidade ocidental se liberta com tanta dificuldade... A metafísica pura não pode, de maneira alguma, admitir o antropomorfismo" (O Simbolismo da Cruz, Cap. XXVI).
Ele frequentemente retorna a essa ideia, que é realmente importante em termos de simbolismo:
"A humanidade, do ponto de vista cósmico, desempenha realmente um papel central em relação ao grau de existência ao qual pertence, mas apenas em relação a esse e, evidentemente, não em relação ao conjunto da Existência universal, na qual esse grau é apenas um entre uma multidão indefinida, sem nada que lhe confira uma situação especial em relação aos outros" (O Simbolismo da Cruz, Cap. XXVIII).
Um símbolo antropomórfico, portanto, não é suficiente, ele pensa, para significar a existência universal em sua totalidade. Nesse ponto do raciocínio, poderíamos esperar ver erigir, como símbolo de totalidade, um ser ou pelo menos uma entidade teórica, que não seria nem antropomórfica, nem geocêntrica e que seria desprovida de qualquer distinção sexual. Ora, os cristãos conhecem precisamente um ser que preenche essas condições e que, portanto, seria notavelmente adequado para preencher esse papel: é Lúcifer.
Não é exatamente esse ser que Guénon vai escolher, ele que é sempre tão lógico na condução de seus raciocínios. Desta vez, ele vai hesitar diante de uma dedução tão extrema e retornará, para desempenhar o papel de símbolo central, a uma entidade antropomórfica, mais especificamente ao andrógino. Ele explica suas razões, mas é surpreendente constatar que elas residem essencialmente em uma conveniência de linguagem.
"Se todo antropomorfismo é nitidamente antimetafísico e deve ser rigorosamente descartado como tal, um certo antropocentrismo pode, por outro lado, ser considerado legítimo" (O Simbolismo da Cruz, cap. XXVIII).
E esse antropocentrismo, acrescenta Guénon, pode ser considerado legítimo porque, na linguagem corrente, a noção de homem é suscetível de "transposições analógicas". Assim, diz ele, é possível distinguir quatro graus muito diferentes: o homem ordinário ou comum, o homem verdadeiro ou perfeito, o homem transcendente que adquiriu a imortalidade virtual e, finalmente, o Homem Universal que adquiriu a imortalidade real por ter se identificado com o arquétipo.
"Não pode haver questão de antropocentrismo senão em um sentido restrito e relativo, mas ainda assim suficiente para justificar a transposição analógica que dá lugar à noção de homem e, portanto, à denominação mesmo de Homem Universal" (O Simbolismo da Cruz, cap. XXVIII).
É, portanto, em virtude de uma transposição analógica que Guénon fará com que uma figura de homem, o andrógino, desempenhe o papel simbólico central, embora esse papel esteja, na metafísica pura, acima da condição humana ordinária e comum. Assim, retornamos ao andrógino, como uma aproximação necessária, para representar, no centro da cruz absoluta que se tornou vórtice esférico, não apenas a humanidade, mas toda a existência universal.
Esse é o Homem Universal, andrógino desencarnado, descrito por R. Guénon. Sua natureza, o cristão compreende bem, é mais angélica do que humana. Seu papel simbólico, no sistema que expomos, situa-se entre o Céu e a Terra, na interseção do plano horizontal da expansão e do eixo vertical da extensão:
"O Céu e a Terra sendo dois princípios complementares, um ativo e o outro passivo, sua união pode ser representada pela figura do andrógino" (O Simbolismo da Cruz, cap. XXVIII).