As Armadilhas do Simbolismo: O Caso de Jean Hani
Jean Hani |
Etienne Couvert |
30/12/2024
Tradução por: Prof. Gabriel Sapucaia
Autor: Etienne Couvert (C.B nº 15)
As Armadilhas do Simbolismo: O Caso de Jean Hani
O simbolismo é a utilização de elementos materiais para evocar e melhor compreender as realidades espirituais. Trata-se, portanto, de um procedimento comum a todas as épocas, povos e religiões.
O cristianismo, também, recorreu ao simbolismo para expressar suas próprias realidades, utilizando elementos naturais universais.
Facilmente se percebe as ambiguidades que tal recurso pode conter, e, em breve, precisaremos publicar um estudo sobre esta questão importante: o interesse e o perigo do simbolismo. Contudo, hoje nos deparamos com algo além da ambiguidade natural — um uso deliberadamente confuso, destinado a favorecer a transição do simbolismo cristão para um simbolismo gnóstico e panteísta.
O artigo sobre a subversão da ideia de criação na obra de Jean Borella, publicado no Boletim nº 13, já forneceu vários exemplos desse uso fraudulento.
Outro caso dos mais interessantes é o de Jean Hani, helenista acadêmico, especialista em religião grega e membro do Centro de Estudos das Mitologias da Universidade de Paris Nanterre.
O Sr. Jean Hani publicou recentemente duas obras que obtiveram certo sucesso entre os católicos tradicionalistas: "O Simbolismo do Templo Cristão" e "A Divina Liturgia".
Nós as lemos com toda a atenção necessária. Inicialmente, ficamos impressionados com o conteúdo gnóstico desses livros. Posteriormente, uma análise mais detalhada permitiu-nos reconhecer no Sr. Jean Hani um verdadeiro discípulo de René Guénon.
Também soubemos que ele participa de encontros e colóquios esotéricos em companhia de figuras como Jean Borella, Daniel Cologne, Frithjof Schuon e outros conhecidos guénonianos.
Tal situação deveria servir como alerta para os cristãos, especialmente para os sacerdotes, contra uma leitura tão perigosa. Infelizmente, sabemos por experiência que nossos amigos tradicionalistas se lançam, de forma imprudente e irrefletida, em toda uma literatura esotérica que lhes parece a quintessência da mística. Eles não percebem que esses senhores gnósticos lhes armam uma cilada tão antiga quanto o próprio cristianismo: transmitir, por meio de fórmulas simbólicas, toda a doutrina panteísta e fundamentalmente anticristã dos primeiros gnósticos.
O Sr. Jean Hani distingue dois tipos de simbolismo:
Um simbolismo de ordem teológica, aquele que é ensinado por meio da Revelação e da Liturgia cristã desde a origem da Igreja e que todos os cristãos batizados conhecem bem: a água do batismo, o pão eucarístico, o lírio da pureza, o sangue dos mártires, etc. Este simbolismo corresponde, segundo o Sr. Jean Hani, a um primeiro significado da palavra "Tradição", que designa "os cânones eclesiásticos próprios à arte cristã enquanto tal".
Um simbolismo de ordem cosmológica, que corresponde a outro significado da palavra "Tradição", referindo-se aos "cânones universais da Arte Sagrada, deduzidos de conhecimentos metafísicos".
Uma primeira observação se impõe: o simbolismo da Igreja é apresentado como um uso particular e local de um simbolismo mais universal, não ensinado pela Igreja, mas extraído ou "deduzido" de uma Metafísica. Veremos ao longo do livro que essa Metafísica nada mais é do que o eterno panteísmo dos gnósticos, algo que será demonstrado com citações claras e irrefutáveis.
O simbolismo teológico descrito pelo autor é, de fato, o da Igreja Católica, e ele acumula referências bíblicas e dos Padres da Igreja para demonstrar a ortodoxia de suas proposições. Contudo, ao longo do capítulo, o discurso desvia-se para o simbolismo cosmológico, de forma sutil e quase imperceptível.
Neste momento, o autor deixa de fornecer referências explícitas. Sempre que trata deste simbolismo — que, na realidade, é panteísta —, a Tradição da Igreja já não lhe fornece respaldo ortodoxo. No entanto, Jean Hani conhece muito bem as numerosas referências que poderia ter extraído dos gnósticos dos primeiros séculos, amplamente denunciadas por São Irineu no Contra as Heresias. Contudo, ele evita mencioná-las, pois isso tornaria evidente que suas proposições não são totalmente ortodoxas.
O autor limita-se a citar escritores não condenados, mas impregnados de neoplatonismo, como o Pseudo-Dionísio Areopagita (Denys, o Areopagita), um autor eclesiástico por muito tempo confundido com São Dionísio, cujo prestígio era grande na Idade Média, e São Clemente de Alexandria, sobre quem falaremos mais adiante. Estas são as referências habituais de Jean Borella. No restante, o leitor é remetido à bibliografia no final do volume, que é altamente sugestiva: destacam-se principalmente autores ligados à maçonaria.
Concluímos, assim, que o primeiro simbolismo é, de fato, o ensinamento constante da Igreja, enquanto o segundo foi introduzido de forma sub-reptícia pelos modernos gnósticos. Ele não pertence à Tradição da Igreja, que o rejeitou já nos primeiros séculos. Por ser hoje desconhecido, Jean Hani e seus amigos guénonianos conseguem dar a ele um prestígio renovado e uma aparência de ortodoxia.
Jean Hani vai além:
"Os símbolos teológicos", afirma ele, "só são frequentemente compreensíveis por referência aos símbolos cosmológicos que lhes são subjacentes e, por assim dizer, os sustentam. Isso ocorre por uma razão muito simples[1]: o Homem, estando imerso no mundo sensível, deve alcançar o divino através das 'figuras' deste mundo, justamente com o auxílio da Arte."
Os Padres da Igreja não entenderam que cada símbolo possui um duplo significado: um significado ensinado por eles e outro, secreto e esotérico, que eles não transmitiram. Assim, os símbolos se tornam incompreensíveis para aqueles que não estudaram a metafísica de René Guénon.
Os símbolos cosmológicos são considerados os verdadeiros símbolos, pois são universais e necessários. Já os símbolos teológicos são apresentados como formas particulares, pertencentes à Igreja, e, portanto, desprovidos de universalidade. Esses símbolos teológicos têm um significado exotérico, considerado comum, banal e sem relevância, o que leva Jean Hani a afirmar:
"Tentaremos resgatar o simbolismo cosmológico subjacente."
Ou seja, o verdadeiro simbolismo, propósito para o qual seu livro foi escrito. O objetivo é ensinar aos cristãos que a Igreja ignorou, desde sempre, o verdadeiro significado dos símbolos que ela própria nunca compreendeu plenamente e que utilizou de maneira equivocada. Estamos aqui no domínio da Gnose maçônica.
René Guénon escreveu:
"É necessário restituir à doutrina do catolicismo integral, sem alterar a forma religiosa sob a qual se apresenta ao público (exoterismo), o sentido profundo que ela possui em si mesma (esoterismo), mas que seus representantes atuais parecem não mais compreender, assim como sua unidade essencial com outras formas tradicionais..."
Este trecho está citado em De la Gnose à l'Oecuménisme (p. 46).
A Maçonaria também afirma:
"Todas as religiões que existiram até agora possuíam um núcleo de verdade (esoterismo) que foi coberto de erros, corrompido e misturado a ficções (exoterismo)" (De la Gnose à l'Oecuménisme, p. 32).
Estas são as verdadeiras fontes do simbolismo de Jean Hani.
O Caso de São Clemente de Alexandria
Sabemos muito pouco sobre a vida de São Clemente de Alexandria, conhecendo-o apenas por suas obras, especialmente os Stromates. Segundo Clemente, a Gnose pressupõe a fé, mas a supera. Ela acrescenta à fé uma inteligência das verdades, chegando a uma ciência infalível ou a uma compreensão perfeita. O gnóstico crê e sabe. Por meio de sua ascensão espiritual, ele alcança a perfeição. Ele contempla Deus, um estado que Clemente chama de "Teoria" ou "Epopteia".
Contudo, o linguagem de São Clemente é ambígua: com o termo "teoria", ele refere-se, em diferentes momentos, à visão beatífica no além, à contemplação sobrenatural e até mesmo ao conhecimento racional de Deus. Sua obra é impregnada de elementos do neoplatonismo. Encontram-se nele ideias corretas, erros, textos confusos e incertos, assim como uma luz difusa que não permite compreender claramente o alcance de seu pensamento.
O Padre Lebreton, S.J., comenta que:
"São Clemente entregou-se ao entusiasmo de seus mestres por uma vida isenta de paixões, fixada em uma contemplação perpétua, elevada acima da humanidade. Essa ambição altíssima, não isenta de ilusões, trouxe consequências graves para sua concepção do Cristianismo e, em particular, para a relação entre fé e gnose..."
Seu estilo carece de precisão e lógica. Sua mente é permeável a diversas ideias, e sua imaginação vaga sem coerência por entre recordações sagradas e profanas, criando uma dificuldade real para acompanhar o raciocínio.
A Distinção Entre Gnose Verdadeira e Falsa
São Clemente tenta, como os gnósticos modernos, distinguir uma "gnose verdadeira" de uma "gnose falsa". Ele dá grande importância a essa distinção para se afastar dos gnósticos condenados. Contudo, ao longo de sua obra, ele gradualmente reintroduz, de maneira pouco clara, elementos essenciais da gnose herética.
Se o termo "gnose" mantivesse apenas seu sentido grego ordinário de "conhecimento", não haveria razão para tanta insistência. Seria apenas uma questão semântica, facilmente resolvida ao abandonar um termo que gera dificuldades. Entretanto, os gnósticos, ao contrário, empenham-se em impor inicialmente o uso do termo e, ao longo de suas exposições, introduzem um novo e inédito significado para "conhecimento".
Em qualquer inteligência ordinária, o "conhecimento" é uma operação do espírito que recebe a forma dos objetos conhecidos. Há, portanto, uma identificação com o objeto, mas apenas pela forma inteligível, e não pela substância. Isso significa que essa identidade é formal e não real. O objeto conhecido, mesmo presente no espírito, permanece presente fora dele, em sua substância e em si mesmo.
Porém, ao usar o termo "Gnose", os modernos gnósticos referem-se a uma identificação real com o objeto conhecido. Para eles, conhecer uma coisa por meio da Gnose é tornar-se realmente essa coisa, em uma espécie de conhecimento reificante que produz em nós a substância da coisa. Assim, conhecer a Deus pela Gnose significa tornar-se Deus, coincidindo com Ele a tal ponto que não há mais distinção, o que eles chamam de "Retorno à Unidade Primordial".
É evidente que a escolha do termo "Gnose" está fundamentada em uma doutrina totalmente oposta ao ensinamento da Igreja.
Além disso, São Clemente de Alexandria ensina que há uma tradição secreta, um ensino esotérico, relacionado a mistérios e iniciações. BOSSUET, em sua polêmica contra Fénelon[2], condenou energicamente essa pretensão de São Clemente:
"Essas tradições secretas foram, na Igreja, uma fonte de heresias. Era o último refúgio dos maniqueus e de outras seitas semelhantes, dizer que havia segredos de religião que não eram revelados a todos os fiéis. São Irineu e São Epifânio condenaram essas tradições. Santo Agostinho combateu esse erro em dois tratados sobre São João... Se essas tradições fossem cuidadosamente escondidas, como afirma Bossuet, então os Padres teriam se expressado apenas por meias palavras. Sob esse pretexto, seria fácil fazer os Santos Doutores dizerem qualquer coisa."
Se os Apóstolos e os Padres da Igreja tivessem realmente conhecido o simbolismo cosmológico mencionado por Jean Hani, deveriam tê-lo mantido em segredo. Tal duplicidade destruiria toda a credibilidade deles perante os cristãos.
As Fórmulas do Panteísmo
Como todo gnóstico coerente consigo mesmo, Jean Hani demonstra uma predileção pelo termo "Cosmos".
Se o termo "cosmos" fosse simplesmente sinônimo de "universo", não haveria razão para adotar esse vocabulário. No entanto, em seus textos, "Cosmos" carrega uma concepção nova e contrária ao ensinamento da Igreja.
Para a Igreja, o universo é o conjunto dos seres criados. Cada ser possui sua própria realidade, sua substância, constituindo uma individualidade distinta das outras. Quando se trata de seres humanos, essa distinção é chamada de personalidade, que nos coloca, como indivíduos, em uma posição única e intransferível em nossa espécie.
A multiplicidade e a variedade dos seres que compõem o universo formam uma unidade de ordem, mas não de substância. O universo não é um ser ou uma coisa em si; é apenas o nome usado para designar essa coleção de seres. Essa coleção não possui uma existência própria. Não se deve "reificar" um termo meramente conveniente e dar substância ao que ele designa.
O termo "Cosmos" é frequentemente usado em círculos gnósticos para descrever um único ser imenso, infinito, formado de uma única substância, cujos seres que o habitam são meros fragmentos dispersos que deveriam ser reunidos em um conglomerado unificado. Para sustentar essa concepção, os gnósticos afirmam que esse imenso "Cosmos" é permeado por um sopro vital, uma energia interna chamada "energia cósmica", que seria comum a todos os seus elementos. Essa visão mergulha no vitalismo e, consequentemente, no panteísmo, atribuindo os atributos divinos ao "Cosmos".
Essa abordagem é absolutamente contrária ao ensinamento constante da Igreja. É necessário sempre manter grande cautela diante de quem emprega o termo "Cosmos", pois ele frequentemente carrega consigo uma filosofia panteísta subjacente.
Citando Jean Hani:
"O mundo é um organismo harmonioso, hierarquizado, cuja formulação cristã encontramos em Dionísio, o Areopagita. A partir dele, remontamos a Platão (...). A criação é essencialmente o Cosmos sucedendo ao Caos, ou seja, a ordem e a organização surgindo do desordem e do tohu-bohu da Gênese (Ordo ab chao). É o Espírito penetrando a substância informe. Da mesma forma, o arquiteto fabrica um edifício orgânico a partir da matéria bruta e, nessa realização, imita o Criador, chamado, após Platão, de Grande Arquiteto do Universo, porque, como diz o filósofo, 'Deus é Geômetra'. A geometria, base da arquitetura, foi, até o início da era moderna, uma ciência sagrada cuja formulação ocidental provém precisamente do Timeu de Platão e, através dele, remonta aos pitagóricos." (O simbolismo do templo cristão, p. 45).
Essa passagem apresenta um exemplo clássico da linguagem maçônica. Elementos como o "Grande Arquiteto do Universo", "geometria sagrada" e "Ordo ab chao" são marcas registradas das doutrinas maçônicas e gnósticas, carregadas de significados ocultos e contrários ao ensino tradicional da Igreja Católica.
Analisando essa abordagem sob a ótica do senso comum, surgem várias perguntas:
- O que é exatamente esse "Ordo ab chao"? Como a ordem poderia surgir do caos, que é simplesmente a negação da ordem e, portanto, não possui existência própria?
- O que significa "substância informe" ou "matéria bruta"? Isso não é nada; não há como organizar algo que seja literalmente "nada".
- O "arquiteto" citado seria um criador? E se não, quem criou a matéria informe que ele usou para construir o Cosmos?
Essas questões fundamentais permanecem sem resposta nos textos de Jean Hani.
Hani afirma ainda:
"O templo representa, ou melhor, é a Natureza regenerada, como a Igreja (...). Ele é, por sua construção e estrutura, uma manifestação do Espírito descendo à Substância, do Espírito imanente por meio de suas Energias à ordem do mundo. O templo é um Cosmos sacralizado e oferecido." (O simbolismo do templo cristão, p. 49).
Aqui, encontramos conceitos como a imanência vital (característica dos modernistas) e a energia cósmica ou "elan vital", populares no pensamento de Bergson e seus seguidores. A ideia da "descida do Espírito à Substância" revela a influência do panteísmo gnóstico.
Para compreender essas ideias mais profundamente, é recomendável a leitura do primeiro capítulo de De la Gnose à l'Oecuménisme, onde tais conceitos são analisados e refutados sob a perspectiva da fé católica.
O Retorno ao Estado Primordial
Monsieur Jean Hani escreve na página 65:
"Assim como o Templo total, em seu plano, e o Santuário, em sua elevação, representam, ao mesmo tempo, o Homem Arquétipo e o crescimento espiritual do indivíduo humano até sua coincidência com seu Arquétipo, até a 'Estatura de Cristo', como diz São Paulo."
Outras Formulações de Monsieur Hani
"A interrupção da rotação do mundo e sua fixação em um estado final é a Restauração do Estado Primordial" (p. 37).
"A cúpula do transepto é frequentemente encimada por uma cruz ou uma flecha erguida que materializa o eixo da abóbada, o que significa a Saída para fora do Cosmos, à imitação de Cristo que, durante a Ascensão, subiu acima de todos os céus" (p. 38).
Toda a metafísica (?) de René Guénon ressurge nessas formulações: o Homem Arquétipo designa o Cristo, com quem o indivíduo deve coincidir (segundo São Paulo, aparentemente). A Ascensão de Cristo "acima de todos os céus" e não apenas ao céu significaria a "Saída para fora do Cosmos". É impossível desrespeitar mais impudentemente as Escrituras Sagradas do que tentando reduzi-las sistematicamente às elucubrações dos gnósticos.
O Labirinto e o "Retorno ao Centro"
Citemos este texto sobre o labirinto (pp. 108–109). Nele encontramos resumido todo o ensino de René Guénon:
- A viagem ao centro,
- A distinção entre corpo, alma, mente e espírito,
- A expressão "o Eu do Homem", realizar o Eu,
- As camadas do indivíduo,
- O Reino de Deus identificado com o centro do Mundo,
- A concentração no Eu, e assim por diante.
Isso não é francês; é um jargão gnóstico, idêntico ao que se encontra nos textos ocultistas ou esotéricos que abarrotam as livrarias contemporâneas.
"Compreendemos, então, a importância e o novo sentido que adquire, nessa perspectiva, a deambulação do fiel medieval pelo labirinto místico. Não era, como dizia com certo desdém Cisternay, cônego de Chartres, uma 'brincadeira tola em que aqueles que nada têm a fazer perdem seu tempo caminhando em círculos'. A eminente dignidade dessa peregrinação, como de qualquer peregrinação, reside no fato de simbolizar a verdadeira peregrinação, o verdadeiro 'retorno ao centro', que é uma 'viagem interior' em busca do Eu."
O Eu e o Trabalho Espiritual
O Eu do homem não se identifica com:
- Seu corpo, domínio das sensações;
- Sua alma, domínio dos sentimentos;
- Sua mente, domínio das ideias e da razão;
- Nem mesmo com seu espírito... ou, como dizem algumas escolas espirituais, seu coração.
Este espírito ou coração é chamado, dependendo da tradição, de:
- "Fundo",
- "Castelo Interior",
- "Ponta Fina" ou
- "Cume da Alma".
É aqui que reside a essência humana, "a imagem de Deus no Homem"; é o centro de seu ser. Todo o trabalho espiritual, o propósito único da vida — o unum necessarium — é "realizar" esse Eu. Isso significa tomar consciência, pela graça de Deus, não de forma discursiva, mas vital e ontológica, de que isso é o nosso verdadeiro ser. Assim, todas as outras camadas do indivíduo se dissolvem nesse centro vivo e luminoso, que é "o Reino de Deus em nós" e que, por analogia entre o macrocosmo e o microcosmo humano, identifica-se ao Centro do Mundo.
"O homem que, pela graça de Deus, se estabelece nesse centro, vê tudo — o mundo e a si mesmo — com o próprio olho de Deus."
"No esforço longo e difícil de concentração que deve fazer sobre si mesmo para realizar essa incursão ao Centro, o Espírito precisa ser sustentado por suportes externos, que canalizem os fluxos sensíveis e mentais e os façam convergir para a perspectiva do objetivo, ajudando assim o Homem a encontrar seu próprio centro. Esse é o papel das imagens, quaisquer que sejam elas."
Este é um linguajar que já não possui nada de cristão. As referências a fórmulas escriturísticas não têm o propósito de esclarecer o encadeamento das ideias, mas sim de dar uma aparência ortodoxa a textos completamente contrários ao ensino da Igreja.
A Teurgia ou Divinização
No capítulo VII de La Divine Liturgie, Monsieur Jean Hani apresenta as formulações mais claras do panteísmo.
O título "Théosis" já indica que o autor tratará da deificação, descrita como:
"a operação espiritual pela qual o homem é arrancado de sua condição limitada, individual, saindo de seu Eu para ser assumido na personalidade divina, que é propriamente o objetivo da comunhão à Carne e ao Sangue do Salvador." (p. 67).
Como é difícil encontrar tais formulações na Escritura Sagrada, o autor busca referências na liturgia oriental, onde a linguagem mística permite todas as ambiguidades.
Começamos com São Paulo:
"Deus nos trouxe de volta à Vida com Jesus Cristo. Ele nos ressuscitou com Ele e nos fez assentar nos céus em sua Pessoa..."
A repetição da preposição "com" deixa claro que não se trata de uma identificação, mas sim de uma comunhão, uma convivialidade. O homem é chamado a compartilhar a vida divina, a participar do perfeito bem-aventurança.
O rito bizantino afirma:
"Essa natureza de Adão que renovaste, ó Deus, Tu a elevas hoje contigo acima das Principados... O Filho de Deus incorporou-a em Si mesmo e a colocou à Direita do Pai..."
No entanto, algumas fórmulas da liturgia oriental podem tender ao panteísmo:
- São Gregório de Níssa escreve: "O homem foi concebido com a ordem de se tornar Deus."
- São João Crisóstomo: "Deus misturou seu sangue ao nosso para fazer de nós, homens, um só ser com Ele."
- Máximo, o Confessor: "Por meio da santa participação nos mistérios puros e vivificantes (a Missa), o homem alcança a intimidade e a identidade com Deus; por ela, o homem obtém tornar-se Deus, sendo homem."
Entretanto, a Liturgia Romana evita cuidadosamente qualquer fórmula que possa levar a um sentido panteísta. Ela fala sempre de participação, nunca de identificação. Exemplos:
- "Deus, que nos tornas participantes de tua única e soberana Divindade." (Não há mais de um Deus; participamos de sua divindade.)
- "Ó Deus, faze que, pelo mistério desta água e deste vinho, participemos da divindade daquele que se dignou unir-se à nossa humanidade, Jesus Cristo."
Em Jesus Cristo, a natureza humana não foi absorvida por sua natureza divina de forma a deixar de ser humana. Cristo é perfeitamente homem e perfeitamente Deus.
Da mesma forma, nossa natureza humana não será absorvida pela natureza divina de modo que nos tornemos Deus ou coincidamos com Ele, como afirma Monsieur Jean Hani, ou que nos identifiquemos com Ele em uma única Divindade Total, o Pléroma dos gnósticos.
Não! A liturgia fala sempre de participação. Nossa natureza humana, embora distinta da de Deus, será elevada a uma vida divina. Não será destruída, nem consumida, mas assumida — ou seja, elevada e unida a Deus pelo vínculo fortíssimo da visão beatífica face a face.
Entretanto, Monsieur Jean Hani continua:
"Todos esses textos que acabamos de citar dizem claramente que a Missa é o lugar onde se realiza a Deificação por meio de uma verdadeira transmutação do Homem." (p. 155).
Isso significa que a natureza humana será perdida e uma natureza divina tomará seu lugar. Caso contrário, que sentido inteligível poderia ser dado à palavra "transmutação"?
Para concluir, apresenta-se este texto extremamente revelador: "Quando o homem integrou sua personalidade divina, pode-se dizer que a Imagem de Deus nele alcançou seu Arquétipo celeste. Essa é a definição metafísica da Salvação."
(Metafísica no sentido guenoniano do termo: transmutação de uma natureza. O homem é divino por sua própria substância. O retorno ao estado primordial é uma integração de si à divindade.)
"É ao mesmo tempo o ato pelo qual o Sacrifício de Deus, do qual falamos, e que é como a exteriorização de Deus em sua Criação, é anulado, redimido, por assim dizer. Pois, nesse ato, o Homem renunciou a si mesmo em seu estado exteriorizado para refazer, em sentido inverso, o trajeto de Deus em direção à Criatura, de modo que a Criatura retorna ao seu princípio."
"E, com ela, toda a Criação, porque o homem, ao integrar o Si, não faz sozinho o caminho de retorno a Deus. Como espelho e resumo do Mundo, microcosmo, ele conduz todo o Cosmos no caminho, seguindo o Cristo, que primeiro, como Homem-Deus, mas também como Homem, realizou a redenção de todo o Cosmos." (p. 163).
Ao ler uma profissão de fé panteísta como esta, somos levados a refletir sobre as palavras de Cristo que afirmou que não veio para salvar o mundo, mas que Satanás já era o Senhor deste mundo; que, ao sofrer sua paixão, quis redimir os pecados dos homens para salvá-los e retirá-los deste mundo; que haverá uma nova Terra e Novos Céus, entre outras declarações.
Por fim, a Suprema Zombaria: o sacrifício de Deus é anulado pelo retorno do Homem ao seu princípio, ou seja, à sua natureza divina primitiva. Realmente, pergunta-se qual teria sido a utilidade de tal sacrifício de Deus!
Se o homem, por meio da Gnose (o Conhecimento divinizante do Si), é capaz de alcançar seu princípio e integrar sua personalidade divina primitiva, se é o Homem quem renuncia a si mesmo para refazer o trajeto de Deus, então o Sacrifício de Jesus Cristo torna-se perfeitamente inútil.
Assim, é o Homem quem, por seu ato de Integração, redime o Sacrifício de Deus, "por assim dizer", é claro... mas ousaram dizer isso!
- Etienne Couvert (C.B nº 15)
[1] 'Por uma razão muito simples que' é admirável. Não sabíamos até hoje que a imersão no sensível era a razão suficiente para os símbolos cosmológicos.
[2] Por ocasião da leitura de uma obra secreta e inédita de Fénelon, intitulada: "O Gnóstico de São Clemente de Alexandria".