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XVII. O DISCERNIMENTO DOS ESPÍRITOS

Uma vez que o demônio pode se "pintar de branco" e se passar por um anjo, como vamos distinguir os bons dos maus espíritos, as boas das más influências? Fazer essa distinção é realizar o que se chama o discernimento dos espíritos.

A capacidade de discernimento dos espíritos não é natural para nós. No entanto, o homem pode possuí-la excepcionalmente como um dom da graça. Então, ela constitui o discernimento infuso, que é um carisma. Essa capacidade é comparável, em seu mecanismo, ao instinto dos pássaros migratórios que se orientam sem referências. A alma agraciada com o discernimento infuso pode, na ausência de qualquer sintoma visível, farejar as trevas mesmo quando estão cobertas por um disfarce de luz.

Mas então, qual será o recurso da grande maioria dos homens que não são agraciados com esse carisma? Os Mestres da vida espiritual reuniram o que se chama as "regras do discernimento dos espíritos".

As regras de discernimento dos espíritos foram refinadas desde a época do Antigo Testamento até os nossos dias. Esse refinamento prova que os demônios estão cada vez mais intimamente misturados aos homens, seja pelo aumento do número daqueles que assombram a terra, seja porque eles acentuam sua sutileza e aperfeiçoam sua arte de penetrar em nossos espíritos. O Cardeal Pierre d'Ailly, já no início do século XV, em seu extenso tratado das Falsas Profecias, observava que "o mundo está em declínio, o Anticristo se aproxima e as imaginações doentias, as ilusões perigosas proliferam".

Sob o domínio da Antiga Lei, a regra de discernimento dos espíritos era simples e rústica porque era suficiente: os bons espíritos levam a obedecer a Deus e os maus a desobedecê-lo. E referia-se à regra do Gênesis:

"Porque comeste da árvore da qual Eu te ordenei que não comesses" (Gên. III, 17).

A serpente, espírito maligno, havia instigado a desobediência à Lei. Tal era o critério simples e saudável.

Após a Vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo, os demônios vão aperfeiçoar sua arte; também será necessário aperfeiçoar a análise. São Paulo enumera os diversos elementos do diagnóstico das boas e más influências espirituais. Os maus espíritos utilizam os caminhos da carne:

"Ora, as obras da carne são manifestas: imoralidade, impureza, libertinagem, idolatria, feitiçaria, inimizades, brigas, ciúme, iras, rivalidades, dissensões, facções, invejas, bebedeiras, orgias e coisas semelhantes a estas" (Gál. V, 19-21).

Estas são as obras da carne às quais os demônios se esforçam para empurrar o homem. Eis agora como se reconhecem as influências divinas, que São Paulo também chama de "obras do Espírito":

"Mas o fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio... E os que são de Cristo Jesus crucificaram a carne, com as suas paixões e concupiscências" (Gál. V, 22-24).

Como se vê, São Paulo enuncia regras de discernimento baseadas em critérios morais. São João fornece critérios doutrinais:

"Nisto conhecereis o Espírito de Deus: todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus; e todo espírito que não confessa a Jesus não é de Deus; este é o espírito do anticristo, a respeito do qual tendes ouvido que havia de vir" (I João IV, 2-3).

A partir de então, os dois critérios apostólicos, de São Paulo e de São João, só precisarão ser desenvolvidos pelos mestres da vida espiritual.

Este desenvolvimento começa no período patrístico. Orígenes faz o seguinte raciocínio: Satanás aproveita-se dos primeiros movimentos suscitados em nós por nossa natureza pecaminosa. Ele primeiro deixa esses movimentos operarem em nós e por nós, e assim encontra neles uma desculpa e um direito de nos tentar e nos empurrar mais adiante no caminho que nós mesmos escolhemos; ele encontra ao mesmo tempo um meio de dissimular sua influência; acreditamos assim continuar por nós mesmos o que começamos sozinhos.

Os Padres também constatam os efeitos psicológicos do bom e do mau espírito: o bom espírito gera paz e humildade; o mau espírito gera tristeza, perturbação, indecisão e preguiça.

São Tomás de Aquino trata metodicamente da questão do discernimento dos espíritos. Ele se dedica a distinguir o que, em nossa vida interior, diz respeito à nossa liberdade e o que diz respeito à influência de Satanás, que age principalmente utilizando nossos sentidos e nossa imaginação. Ele também enumera algumas regras para diferenciar os verdadeiros e os falsos profetas. Os verdadeiros, acima de tudo, não se atribuem sua missão; eles a recebem de Deus. Os falsos profetas se atribuem seu próprio mandato, eles têm horror ao santo Nome de Jesus, eles incitam primeiro ao bem e depois rapidamente desviam para o mal.

O autor anônimo de "A Imitação" faz recair o discernimento dos espíritos sobre a distinção entre a natureza e a graça. A natureza busca a si mesma, ela quer perdurar, ela hipertrofia o ego, ela não traz senão consolações exteriores. A graça age para Deus, que é seu fim, ela modifica o ego, ela traz consolações espirituais e interiores. Mas "A Imitação" não esquece o demônio: ele vem conosco com as coisas da natureza, ele as acompanha.

São Inácio de Loyola é um dos últimos a vir como doutor do discernimento. Ele expressou suas regras em seu livro de Exercícios. A grande difusão desses "Exercícios" tornou suas regras clássicas. São Inácio distingue primeiro a "vida purgativa" e a "vida iluminativa". Ele dedica a primeira semana dos exercícios ao estudo da vida purgativa e enumera catorze regras "para discernir os movimentos que os diferentes espíritos excitam na alma, a fim de agradar os bons e repelir os maus". A segunda semana trata da vida iluminativa e é concluída por oito outras regras "para melhor discernir os espíritos".

Qual é essencialmente o critério ignaciano do discernimento dos espíritos? Os maus espíritos produzem na alma estados de desolação: eles criam tristeza, desespero, perda de confiança em Deus; não se deve tomar decisões quando se está nesses períodos de desolação, pois nada de bom se faz sob a influência dos demônios. Ao contrário, os bons espíritos produzem na alma estados de consolação, que incluem alegria espiritual e calma interior, misturados com lágrimas de arrependimento.

No entanto, São Inácio conhece as falsas desolações que não são outras que esses estados de secura tão bem descritos por São João da Cruz e Santa Teresa de Ávila. Essas "falsas desolações" vêm de Deus para a purificação da alma. Ele também conhece os estados de falsas consolações que vêm do demônio e que consistem em um contentamento consigo mesmo e um sentimento de complacência.

É fácil constatar que as regras ignacianas de discernimento dos espíritos têm principalmente como campo de aplicação o trabalho de introspecção pessoal. Elas são eminentemente subjetivas.

Pode-se aplicá-las quando se trata de discernir de que espírito pertencem obras doutrinais? Podem elas ajudar a reconhecer se tal produção intelectual vem do Céu ou, ao contrário, sai do poço do abismo? Nesse caso, elas são insuficientes, e é apenas a análise objetiva das doutrinas expostas que pode revelar o espírito.

No entanto, pode-se aplicar as regras ignacianas à impressão interior, de ansiedade ou de calma, que as obras de doutrina produzem no espírito dos leitores. Elas servem então para confirmar os resultados da análise objetiva. Mas com a condição de que a experiência seja continuada por um período suficientemente longo, isso para eliminar os fenômenos de euforia passageira. As obras de falsa mística, em particular, podem gerar uma piedade intensa mas efêmera.