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NUANCES NECESSÁRIAS

Uma descrição rápida é fatalmente levada a negligenciar as nuances, um pouco como nos interessamos apenas pela resultante das forças num problema de mecânica; mas o estudo detalhado, por sua vez, deverá restabelecer as nuances, sob pena de injustiça e, mais ainda, de incompreensão.

Quando se diz que tal organização teve como papel fazer penetrar a Revolução na Igreja, estima-se o resultado e a função num movimento de conjunto.

Mas é preciso ter muito cuidado em não julgar uniformemente as pessoas e até mesmo as ações; isso nem sempre é fácil, pois nas pessoas e em suas ações encontra-se uma infinidade de graus, mas é indispensável, pois é precisamente pelo conhecimento dessa diversidade que se pode alcançar o real.

A habitual noção de boa-fé que introduz essa diferença não é simples no caso que nos interessa e não corresponde unicamente aos critérios ordinários; tentemos, pois, identificar aqueles que se adequam à nossa matéria.

Quando, num domínio dado – a questão social, o apostolado, a liturgia, a catequese, etc. –, certos homens quiseram modificar a linha da Igreja e se empenharam concretamente nisso, a formação de cada um deles e também a sua motivação podiam ser muito diferentes.

Tentemos alguns graus.

Há, claro, o modernismo inveterado: isso é certo, pois conhecemos casos – mas o caso talvez não seja tão frequente quanto se seria tentado a crer (especialmente nos anos anteriores a 1940) e, de qualquer forma, é geralmente difícil de estabelecer: é preciso, portanto, evitar explicar tudo por aí, primeiro porque não se terão provas, depois porque se fecharão os olhos para a verdadeira realidade: pois os responsáveis existem, mas são frequentemente outros, em grande parte.

Há, em seguida, o progressista: ou seja, aquele que, sem negar a objetividade da fé cristã, adere também à religião do progresso e pensa que a Igreja deve fazer o mesmo. Em matéria política, adotar 1789, que, aliás, só é reconhecido sob um certo aspecto (veremos um dia que drama imenso e misterioso se esconde por trás dessa miopia). Em matéria social, adotar a doutrina do dia, o liberalismo e depois o socialismo. Em matéria propriamente religiosa, diminuir mais ou menos fortemente o transcendente para exaltar o homem individual e, sobretudo, o coletivo, o que se encontra tanto no interior da Igreja quanto nas relações com os outros grupos religiosos.

Há, em seguida, o liberal: que lamenta mais ou menos a evolução da sociedade, mas que pensa ser preciso adaptar-se a ela e moldar-se a ela: a Igreja, entre outros; esse homem se assemelha muito ao progressista exteriormente, mas interiormente não é o mesmo, o coração não está lá, ele segue o Progresso como os lagostins, de ré.

Há, enfim, o homem zeloso, perdido, mas zeloso; talvez não haja nada mais grave do que o zelo – La Fontaine já tornou célebre a história da laje do urso. No seio do cristianismo, é muito triste, até pungente, contemplar a multidão de homens de boa vontade, de boa-fé, zelosos, dedicados por vezes até ao último sacrifício, mas cuja inteligência mal iluminada e guiada por mestres eles próprios "tortos" os conduziu a buscar o bem da Igreja em caminhos arriscados e muitas vezes criminosos.

Há também, num plano um pouco diferente, o funcionário: ou seja, aquele que não quer confusão e que, por isso, está pronto a aceitar tanta coisa, mesmo o que choca o sentido cristão. Esse é uma legião, ele constitui a infantaria dos medíocres e dos mornos, e na situação presente, em matéria litúrgica, por exemplo, é o caso dessa maioria de padres que praticam sem entusiasmo a missa de Paulo VI, enquanto a cada dia constatam a sua crescente maleficência.


É da convergência, da ação conjunta de todas essas categorias de homens, e de muitas outras categorias intermediárias, que se dá o avanço da Revolução na Igreja, e se quisermos compreendê-la bem, é preciso ver a parte de cada um no esforço comum.

Assim, quando se fala de complô modernista, é verdade que houve conjurados, mas não é certo que o seu número tenha sido muito importante; e, aliás, por natureza, uma conspiração não pode reunir grandes efetivos, sob pena de se transformar em segredo de Polichinelo.

Por outro lado, uma conspiração pode muito bem fazer colaborar na sua obra uma multidão de homens que acreditam seguir cada um o seu próprio objetivo, e dos quais um grande número são pessoas de peso: são mesmo os mais preciosos para a causa subversiva oculta.

No caso do complô modernista na Igreja, é evidente que todo um ensinamento progressivamente adulterado foi veiculado por estruturas, seminários e universidades, ainda católicas, e que, no fim do processo, nos encontramos diante de um ensinamento abertamente herético, assegurado por quadros cuidadosamente reciclados: na partida, um núcleo de modernistas; na chegada, uma fé quase universalmente desviada; entre os dois, um corpo eclesiástico dedicado, inconsciente do processo ao qual estava submetido e o sofrendo gradualmente.

É a esse nível que se situa a verdadeira dificuldade para o estudo, pois não se passa sem transição do branco para o preto: são necessárias todas as sutis nuances do cinza.

P.R.