A CRISE DA IGREJA E SUAS ORIGENS
A Igreja sofre hoje um obscurecimento que não tem equivalente na história. Talvez se possa ver uma prefiguração disso na crise do arianismo no século V, quando a Verdade da Fé repousava sobre dois bispos, um dos quais estava excomungado, deposto de sua sede e reduzido a permanecer no exílio. Isso seria uma analogia bastante impressionante com a situação atual.
No entanto, uma crise como esta não pode encontrar sua explicação adequada em uma simples evolução que comporta, como se diz frequentemente hoje, seus erros, seus passos em falso, inevitáveis mal-entendidos, que desaparecerão diante de uma renovação anunciada como sensacional. A crise das vocações religiosas, o fechamento de seminários, a perda da prática religiosa generalizada, as igrejas fechadas não são sinais de renovação, mas anúncios de agonia.
É preciso encontrar para tal catástrofe uma causa proporcionada: constata-se que, há dois séculos, homens se organizaram, anunciaram a crise atual, e a prepararam com uma paciência e uma tenacidade incomuns. Eles nem sempre encontraram na Igreja, diante deles, homens decididos a resistir. Encontraram, ao contrário, estranhas cumplicidades dentro da cidadela que queriam ocupar para destruí-la.
Já no século XVIII, aprendemos pela correspondência de Voltaire com Frederico II essa intenção de "minar surdamente o edifício" da Igreja.
Já também, o chefe dos Illuminati da Baviera, Weishaupt, havia revelado:
"Deveis incessantemente formar novos planos a fim de ver como se pode, em vossas províncias, apoderar-se da educação pública, do governo eclesiástico, das cátedras de ensino e de pregação."
Mas foi sobretudo após o fracasso da Grande Revolução, dita Francesa, que o esforço de penetração na Igreja se tornaria terrivelmente eficaz.
No tempo em que o Papa era chefe de Estado e dispunha de uma polícia pessoal, ele podia perseguir essas manobras e denunciá-las. Foi o caso de Pio IX. É apenas uma grande pena que, por preocupação com a discrição e o respeito às pessoas, este santíssimo Papa tenha recusado ao historiador Crétineau-Joly a possibilidade de revelar os verdadeiros nomes desses personagens. Mas vejamos suas declarações:
"A Itália está coberta de confrarias religiosas, diz Piccolo Tigre... Não temamos em infiltrar alguns dos nossos no meio desses rebanhos guiados por uma devoção estúpida... Colocai-os sob a batuta de um padre virtuoso, bem-conceituado, mas crédulo e fácil de enganar; infiltrai o veneno nos corações escolhidos, em pequenas doses e como por acaso; depois, ao refletirdes, ficareis vós mesmos espantados com o vosso sucesso..."
"Não pretendemos ganhar os papas para a nossa causa, fazer deles neófitos dos nossos princípios, propagadores das nossas ideias. Isso seria um sonho ridículo. O que devemos pedir, o que devemos procurar alcançar... é um papa segundo as nossas necessidades; Alexandre VI, com todos os seus crimes, não nos serviria, pois nunca errou em matérias religiosas. Um Clemente XIV, ao contrário, seria feito para nós da cabeça aos pés..."
"Ora, para nos assegurarmos de um papa nas disposições exigidas, trata-se primeiro de lhe moldar, a esse papa, uma geração digna do sonho que sonhamos. Deixai de lado a velhice, ide à juventude e, se possível, até a infância. Deveis apresentar-vos com todas as aparências de um homem grave e moral. Uma vez estabelecida a vossa reputação nos colégios... fazei com que aqueles que principalmente se engajam na milícia clerical gostem de buscar as vossas conversas. Em alguns anos, este jovem clero terá, pela força das coisas, invadido todas as funções: governará, administrará, julgará, formará o conselho do soberano... Lançai as vossas redes como Simão Barjonas... Tereis pescado uma revolução em tiara e capa, marchando com a cruz e o estandarte, que só precisará de um pequeno estímulo para atear fogo aos quatro cantos do mundo."
Ora, vivemos hoje este "sonho" de Piccolo Tigre. A tática revolucionária está aí, bem-sucedida. Temos o Papa sonhado pela Alta Venda Italiana, a Revolução marxista pregada e armada pelo clero e o fogo ateado aos quatro cantos do mundo. Entre o projeto afirmado e a realidade presente, há a aplicação, a criação dos meios para alcançar um resultado tão belo. Foi preciso um pouco mais de um século para a manobra ser bem-sucedida. Homens se agruparam, declararam "Queremos quebrar a barraca" e a Barraca da Igreja está desmoronando sob seus golpes e sob nossos olhos. Há ainda uma multidão de bons cristãos que assistem a este espetáculo, sem ver nem compreender, infelizmente!
Foi Lamennais quem, primeiro, trabalhou com afinco nessa penetração do Pensamento Revolucionário na Igreja. Ele suscitou o movimento de pensamento animado por "L'Avenir". Ele reuniu em seu salão toda a juventude católica que, posteriormente, dirigiria o Liberalismo católico ao longo do século; foi o iniciador da jovem escola Romântica, tanto na literatura quanto na Religião, foi até mesmo o promotor do Satanismo nas letras no século XIX. Ele foi realmente o promotor da laicização da sociedade e da apostasia das nações, a ponto de, em 1845, o Cardeal Bernetti poder escrever: "Nosso jovem clero está imbuído de doutrina liberal... os estudos sérios são abandonados... Eles são padres, mas aspiram a se tornar "homens"... A parte do clero que, depois de nós, naturalmente chega aos negócios é mil vezes mais maculada pelo vício liberal." Dir-se-ia já o "novo padre" de hoje.
Foi sob o Pontificado de Pio IX que os Católicos Liberais viram seu número crescer de forma preocupante. "Em vez de escolher entre os princípios de 89 e os dogmas da religião católica, purifiquemos os princípios pelos dogmas e façamo-los caminhar em concerto", dirá de Broglie em 1856.
Lacordaire, muito rapidamente, abandonou a equipe de Lamennais e de seu jornal "L'Avenir". Mas toda uma plêiade de escritores católicos liberais se reuniu em torno de "L'Ère Nouvelle" sob a direção do padre Maret. Louis Veuillot liderou uma campanha enérgica contra aqueles que ele chamava de "liberastas" (adoradores da liberdade). Após a Revolução de 1848, o Papa Pio IX lutou com energia contra os liberais e publicou o "Syllabus". Mas os católicos liberais se uniram contra ele. No Concílio Vaticano I, Dom Dupanloup foi o chefe da oposição ao Papa:
"Havia todo domingo na Villa Grazioli (sua residência) um almoço onde se encontravam, entre vários prelados, os jovens que Dom Dupanloup empregava para corresponder tanto com os jornais quanto com os homens políticos da França." (Visconde de Mesura)
Em 1871, Pio IX, recebendo católicos franceses, disse-lhes:
"Há um mal mais temível que a Revolução... É o liberalismo católico que é o verdadeiro flagelo."
Foram ainda os Católicos liberais que desviariam e fariam fracassar o "Movimento social cristão" animado após a guerra de 1870 por Albert de Mun e La Tour du Pin, em torno da Restauração do Regime Corporativo. Foi a política do "Ralliement" à República, preconizada por Leão XIII, que destruiu definitivamente a esperança de uma restauração social ligada à restauração política.
Arthur Loth, em "La Vérité", revela um novo estado de espírito "nas fileiras do Clero... que sonham com um cristianismo novo sem dogma e sem culto, acomodado à apatia intelectual e moral de gerações que já não têm nem a força, nem a vontade de crer... Propõe-se à sociedade em colapso uma religião sem fé, à medida de seu ceticismo e de sua indiferença... uma religião enfraquecida, diminuída e mais humana que divina..." (5 de junho de 1896)
Zola, ao apresentar a crise do Americanismo na Igreja dos Estados Unidos, anuncia o cisma no interior da Igreja: "Leão XIII, diz ele, tem consciência do cisma ameaçador, do cisma iminente que fatalmente um dia deverá ocorrer. Este medo do cisma explica apenas sua adesão aos democratas, sua indulgência para com os bispos democratas que se fazem adorar pelas multidões... Ele ocorrerá no dia em que, de concessão em concessão, o papa reinante se vir encurralado no próprio dogma. Nesse dia, ele não poderá ir mais longe: será Roma, a eterna, com sua enorme massa de tradições, seus séculos, suas ruínas que se tornará o obstáculo intransponível..."
Com a criação do "Sillon" de Marc Sangnier, vemos delinear-se uma vasta tentativa de penetração das ideias revolucionárias nos seminários. Foi uma explosão de romantismo protestante. No Sillon, afirma-se que o Catolicismo é antes de tudo uma vida, que Cristo se experimenta mais do que se prova: reconhecem-se aí as teses mais perigosas do Modernismo. Um padre testemunha: "Quando cheguei em outubro de 1906 ao seminário, os 'sillonistas' tinham na casa um grupo constituído, um grupo que chamarei de embargo e uma influência bastante grande, apesar da proibição expressa e reiterada de Monsenhor e do conselho dos diretores." O padre Plogranges explicou mais tarde que havia deixado o Sillon porque era organizado internamente "como a mais absoluta das monarquias". "São numerosos esses jovens padres relegados à sombra das discretas casas paroquiais ou ao recolhimento de vastos seminários que se sentem filhos desses pequenos párocos de 89 que punham sua mão sacerdotal na dos plebeus corajosos." (Le Sillon).
Após o Sillon, e sobretudo após sua condenação por São Pio X, a penetração modernista no clero se intensifica. Fogazzaro, em seu romance "Il Santo", relata os métodos dessa penetração: "Precisamos criar uma opinião que levará a autoridade legítima a agir segundo nossas visões!..." O Papa, designado pelo nome de Grande Pescador, não poderá mais resistir a tal penetração. "Digo-vos para assumir publicamente o lugar dos Pastores? Não... mas preparai o terreno onde crescem os Pastores..." O romance foi colocado no Index; mas o Cardeal Mathieu escreveu ao autor: "Um cardeal não pode desmentir um tribunal romano. Vingue-se, meu caro Senhor, à maneira do sol... Farei todo o possível para saudá-lo... Será preciso que esta visita seja feita incognito e in nigris para que, eu também, não seja colocado no Index." Quando Fogazzaro veio a Paris, uma multidão de católicos, seminaristas e um bispo vieram aplaudi-lo: "Meu personagem, Selvai, veste a batina; ele se mostra nas universidades, ele se esconde nos seminários!", disse ele então.
Os modernistas, reunidos em uma Sociedade Secreta, haviam se encontrado em Moluono, sob a direção do Barão Von Hügel. Quando saiu a Encíclica "Pascendi" condenando os modernistas, Fogazzaro escreveu: "Aconselhei que se fizesse silêncio sobre a Encíclica... Tyrell se engana ao responder... e em que tom!"
O padre Fontaine escrevia então: "O mal está em nossas casas de formação. Lembremo-nos das 'correntes' e de outras pequenas publicações clandestinas, circulando nos seminários sem o conhecimento dos diretores!!" Segue-se uma longa lista dessas pequenas revistas secretas.
É possível seguir essa ação subterrânea da seita liberal e modernista através de um século de história. Ela aflora por vezes durante crises graves, e então os membros da Sociedade Secreta retornam ao silêncio e trabalham com perseverança para demolir a Igreja por dentro. Hoje, eles detêm todos os postos de comando na Igreja. Seria extremamente útil poder detectar alguns textos que permitam seguir essa ação entre o fim da crise modernista e o estado atual da Igreja. Isso será objeto de próximas publicações.
E. C.