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A « Conexão Bloomsbury »

Não se pode explicar o funcionamento interno dos « Apóstolos » e as relações de sua sociedade com a organização de espionagem de Cambridge sem ao menos mencionar brevemente o Grupo Bloomsbury, ao qual muitos de seus membros mais influentes estavam intimamente ligados. Essa seita cultural, tão seletiva quanto influente, nasceu de uma série de amizades entre os ricos filhos apaixonados por arte e literatura de Sir Leslie Stephen – Vanessa, Virginia, Julian, Thoby e Adrian – e seus conhecidos de Cambridge, entre os quais estavam « Apóstolos » tão proeminentes quanto John Maynard Keynes, Lytton Strachey, Duncan Grant e E.M. Forster[95]. A descrição do romancista D.H. Lawrence dos « Bloomsberries » como « pequenos egos incansáveis » retratava bem o caráter excêntrico e narcisista do grupo que se reunia toda quinta-feira à noite na residência de Stephen, no 46, Gordon Square, no bairro boêmio londrino de Bloomsbury[96].

Os Bloomsbury eram agnósticos, politicamente à esquerda, pacifistas e sexualmente liberados. Os parcerias sexuais tinham uma importância primordial dentro desse coletivo fechado. Todos os relacionamentos – homossexuais, bissexuais ou heterossexuais – estavam em um estado permanente de flutuação e reconfiguração.

Por exemplo, Vanessa Stephen era casada com o rico herdeiro do carvão Clive Bell, mas teve um filho com o belo pintor escocês Duncan Grant, que se sentia atraído pelo irmão de Vanessa, Adrian, mas que também teve uma série de aventuras homossexuais com os « Apóstolos » Keynes e Strachey, os quais travaram uma feroz competição por conquistar as graças de Arthur Lee Hobhouse, uma nova aquisição do grupo, que se apaixonou perdidamente por Grant e que depois formaria um ménage à trois [NdT: em francês no texto] com David Garnett, seu novo amante, e Vanessa.

Quando a Primeira Guerra Mundial estourou e os jovens disponíveis se tornaram escassos, alguns dos « bichas » do movimento « Apóstolos » e Bloomsbury – como Virginia Stephen Woolf os chamava – começaram a se consolar com companheiras, e alguns até descobriram « as alegrias da vida doméstica »[97]. Assim, para grande espanto de seus amigos « Apóstolos » e Bloomsbury, Keynes, que era notoriamente propenso à promiscuidade masculina e que o muito ciumento Strachey certa vez chamou de « bicicleta de segurança equipada com genitais », acabou se apaixonando por Lydia Lopkova, uma das maiores estrelas do balé russo Diaghilev, com a qual chegou a contrair um casamento que se revelou feliz[98].

Dada a importância geral dos « Apóstolos » e dos seus íntimos do grupo Bloomsbury, assim como sua grande influência sobre a vida da Universidade de Cambridge no final dos anos 1920 e no início dos anos 1930, era lógico que os esforços do NKVD para recrutar jovens ricos da alta classe visando expandir seu círculo de espiões em Cambridge fossem baseados, em parte, no projeto de explorar ambos os grupos.

Como relata Andrew Sinclair em The Red and the Blue – Cambridge, Treason and Intelligence, a recuperação dos « Apóstolos » pelos soviéticos revelou-se uma operação relativamente simples. No final dos anos 1920, « as afinidades com o marxismo » tornaram-se uma condição de pertencimento à sociedade secreta que era tão importante quanto « uma boa aparência e uma viva inteligência »[99]. Sinclair observa que, entre os vinte e seis « Apóstolos » eleitos entre 1927 e 1937, vinte – ou seja, três quartos – eram socialistas, simpatizantes marxistas, marxistas autênticos ou comunistas engajados. « Isso representava menos de um por cento do total de estudantes », ressalta ele[100].

A conjunção de três fatores – a hostilidade ativa dos « Apóstolos » e dos Bloomsbury em relação ao cristianismo e à moral tradicional, sua rede clandestina de relações sexuais criminosas e ilícitas, bem como a agenda igualmente proibida e subversiva da Revolução marxista mundial – revelou-se mortal para a nação britânica.