VII - As confissões
Mas a penitência, dizeis vós, não pode ela reparar com vantagem a perda da inocência? É verdade, concordo: mas sei também que a penitência é tão difícil, na prática, que ou ele perdeu extremamente o uso ou os pecadores abusam extremamente dele, que isso só basta para vos convencer que são poucos os que se salvam por esta via. Oh! Que esse caminho é de difícil acesso, estreito, semeado de espinhos, horrível de ver, duro para subir! Temos nele visto em toda parte traços de derramamento de sangue, e de coisas que lembram tristes lembranças. Quantos fracos nada chegaram a ver! Quantos desistem no começo! Quantos caem fatigados no meio, quantos se abandonam miseravelmente no fim! E, quão poucos são os que nele perseveram até a morte! Santo Ambrósio declara que é mais fácil achar homens que guardaram a inocência que entre eles achar quem tenha feito uma penitência conveniente: "Facilius inveni qui innocentiam servaverint, quam qui congruam poenitentiam egerint".
Se vós considereis a penitência enquanto Sacramento, quantas confissões censuradas, quanto apologias estudadas, quantos arrependimentos enganosos, quantas promessas falsas, quantos propósitos ineficazes, quantas absolvições inválidas! Por acaso olhai como válida a confissão daquele que se acusa de seus pecados desonestos do qual ele se guarda da ocasião próxima de levá-lo ao pecado, ou daquele que se acusa das injustiças manifestas sem ter intenção de os reparar o tanto que ele pode; ou daquele que, apenas tendo confessado, recai nas mesmas iniquidades? Oh! Abusos horríveis de um tão grande Sacramento!
Um se confessa para evitar a excomunhão, o outro para dar-se a si mesmo a reputação de um penitente. Aquele se livra de seus pecados para acalmar seu remorsos, esse aqui os esconde por vergonha; Certos pecados ele acusa imperfeitamente por malícia, outros descobre por hábito. Aquele não se propõe pois ao verdadeiro fim do sacramento; A aquele falta-lhe a dor necessária; ao outro falta um firme propósito. Pobres confessores, quanto esforço não vos é preciso para convencer a maior grande parte dos penitentes à essas resoluções, a esses atos, sem os quais a confissão é um sacrilégio, a absolvição uma condenação e a penitência uma ilusão!
Onde estão agora aqueles que acreditam que o número dos eleitos entre os cristão é maior que aquele de reprovados e que, para autorizar a opinião deles, convencem assim a maior parte dos católicos adultos que morrem em seus leitos, munidos de Sacramentos da Igreja, então, pois, a maior parte dos católicos adultos são salvos? Oh! Que belo raciocínio! É preciso dizer totalmente o contrário. A maior parte dos católicos adultos se confessam mal durante toda a vida, então, ainda com mais forte razão eles se confessam mal no momento da morte; concluímos, pois, que a maior parte é condenada. Digo: com mais razão, porque quando algum moribundo que não se confessou bem enquanto estava com boa saúde, terá ele ainda mais dificuldade em bem se confessar quando ele estiver no leito de morte, com o coração oprimido, com a cabeça vacilando, e com a razão sonolenta; (nesse momento) quando será combatido de várias formas pelos objetos ainda vivos, pelas ocasiões que ainda se produzirão, pelos hábitos contraídos, e sobretudo pelos demônios que buscam todos os meios de precipitá-lo no inferno? No entanto se a todos esses falsos penitentes vós acrescentardes tantos outros pecadores que morrem de improviso no pecado, ou pela ignorância dos médicos, ou pela falta dos pais, que morrem envenenados ou enterrados em um terremoto, ou atacados de um acidente vascular cerebral, ou em uma queda, ou em um campo de batalha, ou em uma rixa, ou pegos em uma armadilha, ou atacados por um relâmpago, ou queimados, ou afogados, não é forçoso concluir que a maior parte dos cristãos adultos são condenados? É o raciocínio de São João Crisóstomo. A maior parte dos cristãos, disse esse santo_, não caminham eles toda suas vidas no caminho do inferno? Por_ que, pois, vos surpreendeis de que a grande partes deles vá para o inferno? Para chegar à porte é preciso pegar o caminho que a ela nos leva. Que tendes vós para responder assim a um tão forte argumento?