CAPÍTULO 20: Como deve ser entendida a afirmação de que um homem foi assumido
Da mesma forma, é intrigante no mesmo discurso de Atanásio a afirmação de que o homem é assumido. Falando na pessoa do Filho, ele diz: “Tendo assumido o homem em sua totalidade, eu dei o Espírito Santo plena e perfeitamente aos homens.” E em sua carta a Serapião, ele afirma: “A unidade da Igreja é do Pai através do Filho no Espírito Santo, por meio do homem deificado e deificante, assumido pelo mesmo Filho.”
Deve-se notar, porém, que, como ninguém assume a si mesmo, aquele que assume deve ser distinto do que é assumido, o receptor do que é recebido. Se, portanto, o homem é dito ser assumido pelo Filho de Deus, o que é conotado pelo termo homem deve ser diverso do que é conotado no termo Filho de Deus. Pelo termo homem, entretanto, pode-se conotar ou uma pessoa humana completa, ou menos: um supósito humano que não goza de personalidade humana. Se, portanto, for dito que um homem é assumido, onde homem conota uma pessoa humana, seguirá que uma pessoa divina assumiu uma pessoa humana, e assim haverá duas pessoas em Cristo, o que é a heresia nestoriana. Agostinho, portanto, diz em seu livro De fide ad Petrum que “Deus, o Verbo, não tomou para si a pessoa de um homem, mas a natureza.”
Alguns, querendo evitar esse erro, disseram que, quando se diz que um homem é assumido pelo Verbo, pelo termo homem entende-se um supósito da natureza humana, a saber, este homem, mas não uma pessoa humana, porque ele não existe separadamente por si mesmo, mas está unido a alguém de maior dignidade, a saber, o Filho de Deus. E porque esse supósito humano, que é designado como assumido quando a frase: homem assumido, é usada, é distinto do supósito que é o Filho de Deus, eles afirmam que há dois supósitos em Cristo, mas não duas pessoas.
Mas, nessa visão, segue-se que essa proposição: o Filho de Deus é homem, não seria verdadeira. Pois é impossível que de duas coisas diferentes uma da outra como dois supósitos uma pudesse ser verdadeiramente predicada da outra. E, portanto, é comumente sustentado que há apenas um supósito conotado pelo termo homem e pelo termo Filho de Deus. Disso segue-se que a afirmação: o homem é assumido, é falsa ou imprecisa. Deve-se interpretar no sentido de: o Filho de Deus assumiu o homem, isto é, a natureza humana.