Skip to main content

Um Cristianismo de Fantasia

Se acreditarmos nos neognósticos de hoje e na sua literatura exuberante, a gnose histórica teria preservado o depósito da suprema inteligência e da "suprema conhecimento" contra o autoritarismo limitado do clero romano. Fazem tanto alarde que seríamos tentados a nos deixar meio convencidos.

A realidade é bem menos brilhante. Dois testemunhos nos mostrarão isso. O primeiro é o de Ernest Renan, no entanto cético e inimigo de posições firmes; é surpreendente o julgamento severo que ele faz da gnose. Eis o que ele diz em "A Igreja Cristã":

«Tudo isso era inconciliável com o cristianismo. Essa metafísica de sonhadores, essa moral de solitários, esse orgulho bramânico que teria trazido de volta, se deixado agir, o regime de castas, teriam matado a Igreja, se a Igreja não tivesse tomado a dianteira...

«O que havia de realmente grave era a destruição do cristianismo que era o fundo de todas essas especulações. Suprimia-se na realidade o Jesus vivo; deixava-se apenas um Jesus fantasma sem eficácia para a conversão dos corações: substituía-se o esforço moral por uma pretensa ciência; colocava-se o sonho no lugar das realidades cristãs, cada um se dando o direito de moldar um cristianismo de fantasia, nos dogmas e nos livros anteriores. Isso não era mais cristianismo, era um parasita estrangeiro que buscava se passar por um ramo da árvore da vida».

O segundo testemunho que invocamos é o de Jean Doresse, estudioso totalmente atual ao qual devemos precisamente livros sobre os papiros gnósticos de Nag-Hammadi, descobertos durante os anos 50 no alto Egito, um pouco ao norte de Luxor. Eis como ele se expressa em "O Livro Secreto dos Gnósticos do Egito":

«O cristianismo não teria sido ele mesmo, em seus primórdios, próximo da gnose? Mas logo, diante da luminosa simplicidade dos grandes Evangelhos, diante do claro e profundo pensamento de São Paulo, diante até mesmo das visões do apocalipse joanino, é surpreendente a diferença entre os dois ensinamentos. Ler primeiro os escritos gnósticos, depois retomar o Novo Testamento é uma experiência a se fazer: sente-se a incomparável superioridade desses textos acessíveis a todos em suas imagens e em seu sentido. Surpreende-se que as gnoses tenham podido por tanto tempo competir com eles; e compreende-se que os sectários tenham preferido, frente a uma tal Religião, guardar o segredo de seu próprio dogma e se esconder nas trevas».