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A Gnose Simoniana

O primeiro dos gnósticos, o fundador da Escola, é sem contestação possível Simão, o Mago. Foi ele quem traçou as grandes linhas do pensamento gnóstico, especialmente no que diz respeito à essência da divindade e à natureza do mundo dos espíritos. Cada novo líder subsequente apenas trouxe variações e complementos a esse quadro primitivo, principalmente no que se refere às origens do homem e às modalidades de sua salvação.

Simão, o Mago, nos é apresentado nos Atos dos Apóstolos com características que se tornaram proverbiais:

"Na cidade de Samaria, havia um homem chamado Simão, que praticava a magia e maravilhava o povo da Samaria, apresentando-se como alguém de grande importância... Vendo Simão que o Espírito Santo era concedido pela imposição das mãos dos Apóstolos, ofereceu-lhes dinheiro, dizendo: Dai-me também esse poder, para que aquele a quem eu impuser as mãos receba o Espírito Santo. Mas Pedro lhe disse: Que teu dinheiro pereça contigo, pois pensaste que o dom de Deus se obtém por dinheiro! Não tens parte nem sorte neste ministério, porque o teu coração não é reto diante de Deus." (Atos VIII, 9-21)

No auge de sua teologia, que é, como veremos, uma verdadeira mitologia onde a invenção é soberana, Simão, o Mago, coloca um Princípio universal. Este princípio é uma espécie de fogo espiritual que se manifesta externamente, dando nascimento, por emanação, a espíritos chamados éons. Esta noção de éon não é rara no pensamento antigo. Pertencia, naquela época, ao patrimônio filosófico corrente.

Esses éons procedem aos pares: um éon masculino agindo em cooperação com um éon feminino. Cada casal de éons forma uma sizígia. A sizígia é uma espécie de andrógino angélico. Vemos reaparecer na gnose, e por muito tempo, a velha lenda hermafrodita que circula no paganismo há tantos séculos.

O Princípio universal produz primeiro por emanação três sizígias, cada uma com dois éons, que constituem com ele o "mundo superior" ou "mundo divino".

Abaixo deste mundo divino, Simão, o Mago, coloca o "mundo do meio", que é formado principalmente por novos éons que surgem, sempre por emanação, dos éons superiores ou divinos. Mas encontramos também, no mundo do meio, outros personagens: Epinoia, os anjos, as potências e o Demiurgo.

Epinoia é o nome dado ao pensamento divino. Inexplicavelmente, essa Epinoia abandona o princípio universal do qual ela saiu e, voltando sua predileção para os seres inferiores, chama à existência os anjos e as potências, que são mantidos, não se sabe por quê, na ignorância do Princípio imutável, ignorância inicial e fatal que leva os anjos a uma série de erros. O pecado original é, portanto, um pecado de ignorância. A essa ignorância primordial, a gnose vai agora opor o "conhecimento" que deve restabelecer tudo em ordem.

O Demiurgo é o artífice do universo físico. Ele molda uma "materia prima" eternamente pré-existente. Ele não faz surgir o cosmos do nada; ele apenas precisa organizá-lo; é por isso que é chamado de _""artífice"fice", demiurgo em grego. Reconhece-se aí a origem do "Grande Arquiteto do Universo" que a maçonaria aceita e _"tolera" como divindade.

O papel respectivo de Epinoia, dos anjos, das potências e do Demiurgo não é claramente definido nos textos simonianos, que nos chegaram apenas por meio das citações dos Padres e dos _"Philosophoumena""Philosophoumena". De qualquer forma, da colaboração, das rivalidades e da revolta deles, vai nascer o mundo inferior, assim como a humanidade que o habita. Em resumo, o homem (e isso é o essencial a ser retido) é o produto da ignorância, da inépcia e até da malícia dos criadores angélicos do "mundo do meio".

Por ser obra dos anjos prevaricadores, o homem é viciado em sua natureza e em sua origem. Ele está submetido ao poder tirânico dos anjos que o formaram e manifesta uma tendência incoercível de se emancipar.