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C. A falsificação dos atos do VI Concílio Ecumênico (680-681)

No entanto, ao ler certos trabalhos históricos, encontra-se a informação de que Honório teria sido anatematizado pelo VI Concílio Ecumênico. Como explicar essa contradição entre os elogios do Papa Agatão e os registros do concílio? A explicação está na falsificação dos registros desse concílio pelos gregos.

Os gregos frequentemente falsificavam os registros dos concílios. "Adicionar ou retirar partes dos registros dos concílios eram práticas comuns entre os gregos", afirmava Anastácio, o bibliotecário (em: Ségur, p. 271). Anastácio, o bibliotecário (800-879), viveu em Roma. Ele foi arquivista dos papas e um tradutor famoso pela sua proficiência no grego.

São Roberto Belarmino escreve: "Se os gregos corromperam os concílios IV, V e VII, não é surpreendente que também tenham corrompido o VI?" (De romano pontifice, livro IV, cap. II).

Os gregos eram mal vistos por Roma devido às suas múltiplas fraudes. Os papas frequentemente se queixavam disso. O Papa São Nicolau I concedeu uma autorização baseada em um documento que ele havia recebido da Grécia, mas especificou: "desde que este documento não seja falsificado conforme o costume dos gregos" (carta ao Imperador Miguel). O Papa São Leão I, o Grande (Carta Puritatem fidei, 10 de março de 454), lamentou-se porque alguns haviam falsificado sua carta a Flaviano. Após alterarem algumas palavras e sílabas, os falsificadores afirmaram que o Papa Leão havia caído na heresia de Nestório. Uma situação semelhante aconteceria com o Papa Honório. Desde as primeiras sessões do VI Concílio, descobriu-se a presença de falsificadores entre os participantes!

Logo no início da primeira sessão, os legados pontifícios declararam que, nos últimos 46 anos, o monotelismo havia sido ensinado pelos bispos de Constantinopla Sérgio, Paulo, Pirro e Pedro, assim como por Cirilo, patriarca de Alexandria, e Teodoro, bispo de Farã (sem menção a Honório!). Apesar dos esforços do Siège apostólico, eles persistiram no erro com obstinação.

O Patriarca de Antioquia, Macários, respondeu que os monotelitas baseavam sua doutrina nos concílios, nos Padres da Igreja "e também em Honório, outrora Papa da antiga Roma" (em: Mansi, t. XI, col. 213). O concílio então examinou os documentos apresentados por Macários. Foi lido um trecho do concílio de Éfeso, que continha uma citação de São Cirilo de Alexandria. Esta citação não era monotelita (como afirmava Macários), mas diofisita. Durante a terceira sessão, foram lidos os atos do V Concílio Ecumênico: uma carta do bispo de Constantinopla, Mênas, contendo a fórmula "una voluntas", pareceu suspeita aos legados. O texto apresentado por Macários foi comparado com os originais dos arquivos imperiais, e ficou claro que Macários tinha adicionado a carta de Mênas nos atos do V Concílio! Na sétima sessão, descobriu-se que Macários também havia fabricado outro falso, uma carta do Papa Vigílio que definia (supostamente) uma "operação" de Cristo. Na nona sessão, as citações patrísticas apresentadas por Macários foram comparadas com os exemplares autênticos mantidos pelo patriarcado, e ficou provado que Macários havia falsificado os escritos dos Padres. O bispo de Antioquia persistiu e se apegou às suas (supostas) autoridades (concílios, Padres, Honório). Ele foi então anatematizado e deposto por crime de falsificação.

Na décima primeira sessão, foi lido um documento anterior de Macários, segundo o qual Honório já teria sido condenado por seu monotelismo. Isso era um mentira tão óbvia que ninguém levou a sério.

Há todas as razões para acreditar que os registros posteriores do VI Concílio tenham sido alterados por um falsário. Aqui estão algumas evidências.

A CARTA DE AGATÃO. Em sua carta ao imperador, lida na 4ª sessão, o Papa São Agatão havia condenado especificamente sete hereges monotelitas (em: Mansi, t. XI, col. 274-275). Na 13ª sessão, os Padres do concílio escreveram (supostamente!) ao Papa Agatão: "Nós excluímos do rebanho do Senhor aqueles que erraram na fé, ou, para falar como Davi, nós os matamos com anátemas, conforme a sentença pronunciada anteriormente em suas sagradas cartas contra Teodoro de Farã, Sérgio, Honório, Cirilo, Paulo, Pirro e Pedro" (em: Mansi, t. XI, col. 683). Os Padres do concílio (ou melhor: o copista que falsificou a declaração dos Padres) são aqui pegos em flagrante mentira: eles substituíram o nome de um dos condenados pelo de Honório! Vamos comparar as duas listas:

LISTA AUTÊNTICA, lida na 4ª sessão (autor: o Papa São Agatão): "1. Teodoro, o herege de Alexandria, 2. Cirilo de Alexandria, 3. Teodoro bispo de Farã, 4. Sérgio de Constantinopla, 5. Pirro (partarca de Constantinopla), 6. Paulo também, seu sucessor, 7. Pedro seu sucessor".

LISTA FALSA da SUPOSTA 13ª sessão (autor: copista falsificador): "1. Honório, 2. Cirilo, Teodoro bispo de Farã, 4. Sérgio, 5. Pirro, 6. Paulo, 7. Pedro".

O nome do herege Teodoro de Alexandria foi apagado e substituído pelo de Honório! Isso constitui uma prova incontestável de que os registros do concílio foram falsificados!

A ATITUDE DO IMPERADOR. Na carta imperial que confirmava o concílio, o imperador repetiu o anátema que supostamente atingia os seguintes hereges monotelitas: "Designamos como tais Teodoro, antigo bispo de Farã, Sérgio, antigo bispo desta cidade imperial protegida por Deus [Constantinopla]. Com eles, da mesma opinião e impiedade, estava Honorius, outrora papa da antiga Roma, que era herege como eles, concordava com eles e fortalecia a heresia; e também Cirilo, bispo de Alexandria, assim como Pirro, Pedro e Paulo..." (em: Mansi, t. XI, col. 710-711).

No entanto, de maneira bastante curiosa, esse mesmo imperador, em duas cartas endereçadas ao Papa Leão II para informá-lo dos resultados do concílio, não fez NENHUMA menção à condenação de Honorius, como destacou um historiador perspicaz. "Outra prova de que os atos foram falsificados e que o texto original não continha a condenação nem o nome de Honorius é que o imperador não estava ciente disso. Teriam sido cuidadosos em mantê-lo no escuro; portanto, ele escreveu ao Santo Leão II, sucessor de Santo Agatão, e ao concílio romano de acordo com os verdadeiros registros das sessões, nas quais ele sempre participou. Portanto, não há uma única palavra sobre Honorius nessas duas cartas" (Édouard Dumont: "Provas da falsificação dos atos do VI concílio contra Honorius", em: Annales de philosophie chrétienne, Paris 1853, p. 417). Se o concílio realmente tivesse anatematizado um papa, o imperador não teria deixado de mencionar um evento tão sensacional para Leão II. No entanto, ele não o fez. Seu silêncio prova que não houve condenação de Honorius.

Há algo de suspeito. Intrigados pela reflexão de Édouard Dumont, procuramos por essas duas cartas do imperador para Leão II. Surpresa!

Trecho da primeira carta: "A lei antiga saiu da montanha de Sião; o ápice da perfeição doutrinal está na montanha apostólica em Roma" (em: Mansi, t. XI, col. 715). De maneira muito poética, o imperador aqui faz um magnífico elogio ao papado!

"Glória a Deus, que fez coisas gloriosas e preservou a fé íntegra entre nós. De forma alguma poderá acontecer - e Deus predisse que isso nunca será - que as portas do inferno (isto é, as armadilhas da heresia) possam prevalecer contra esta pedra sobre a qual Ele fundou a Igreja" (em: Mansi, t. XI, col. 718). O imperador manifesta assim de forma extremamente explícita que nenhuma heresia jamais prevalecerá contra um papa.

Trecho da segunda carta, dirigida ao sínodo romano: "Estamos admirados com a relação de Agatão, que é a própria voz de Pedro" (em: Mansi, t. XI, col. 722). É importante lembrar que Agatão afirmou não menos que quatro vezes em sua carta ao imperador que nenhum papa falhou.

Que contraste gritante! Por um lado, o imperador enaltece o papado ("ápice da perfeição doutrinal"; "pedra" inacessível à heresia); por outro lado, ele teria anatematizado um papa "herege" da mesma forma que os monotelitas, "em acordo com eles" e que teria "fortalecido a heresia"?! Não é esta uma boa prova adicional de que os registros do concílio foram alterados?

A biografia de Agatão é uma fonte de informações independente dos atos (falsificados) do concílio. De acordo com essa biografia, os Padres, os legados e o imperador removeram dos dipticos da igreja de Santa Sofia em Constantinopla os nomes de "Cirilo, Sérgio, Pirro, Paulo e Pedro", devido à sua heresia (Liber Pontificalis, vida de Agatão, t. 1, p. 354). É notável: nenhuma menção a Honório!

UMA CARTA FICTÍCIA DE HONÓRIO. Na 13ª sessão, foram lidas duas cartas de Honório a Sérgio, o que é uma fraude! Pois Honório havia escrito apenas uma carta, não duas. Isso é atestado pelo secretário do falecido papa, que menciona uma resposta a Sérgio. A segunda carta é atribuída a "Sericus", enquanto o secretário de Honório se chamava "João". Resumo de uma tese de doutorado especializada: "O testemunho dos escritores contemporâneos nos permite considerar a segunda carta como totalmente falsa e a primeira como falsificada" (Abbé Benjamin Marcellin Constant: Étude historique sur les lettres d‘Honorius (tese de doutorado defendida em Lyon), Paris 1877, p. 57). A primeira carta (Scripta fraternitatis, 634) foi mal traduzida para o grego (cf. acima nosso exemplo latim-grego-francês); a segunda carta (Scripta dilectissimi, 634) é inautêntica (cf. também o artigo de C. Silva Tarouca em Gregorianum, nO 12, 1931, p. 44-46).

O ESTRANHO SILÊNCIO DOS LEGADOS E DO PAPA AGATÃO. Honório foi (supostamente) acusado na 12ª sessão e então anatematizado a partir da 13ª sessão. "Até a 12ª sessão do VI Concílio Ecumênico, os legados pontificais frequentemente tomavam a palavra. [...] Seu comportamento parece ainda mais estranho após a 12ª sessão. Quando as duas cartas de Honório foram lidas, não se ouviu uma palavra dos legados em sua defesa. [...] Eles aceitaram em silêncio a condenação de Honório I e confirmaram sem contestação o anátema pronunciado contra ele" (Kreuzer, p. 97-100).

No Liber Pontificalis estão as biografias oficiais dos papas. No entanto, na biografia de Agatão, não há menção da condenação de Honório. Erich Caspar (Geschichte des Papsttums, Tübingen 1930-1933,1. l, p. 609) tentou explicar a ausência da condenação de Honório I na Vita Agathonis, sugerindo que os legados pontificais teriam parado de enviar relatórios a Roma a partir de março/abril de 681 devido ao "desenvolvimento desfavorável" do concílio. No entanto, esta hipótese é desmentida pelo conteúdo da Vita em si, que ainda menciona eventos que podem ter ocorrido apenas após 26 de abril (momento da 15ª sessão) (ver Duchesne: Liber Pontificalis, 1. 1, p. 356, nota explicativa 13).

Refletindo um pouco: se Agatão realmente tivesse recebido uma notícia tão sensacional - sem precedentes na história da Igreja e em flagrante contradição com a carta que acabara de escrever para certificar a ortodoxia dos papas - ele certamente teria reagido. No entanto, na Vita Agathonis, não há menção alguma da condenação de Honório, o que sugere que é puramente fictícia. Da mesma forma, os legados, se realmente tivessem tentado anatematizar Honório, certamente teriam feito comentários a respeito. Seu silêncio repentino e anormal indica que um copista inseriu o anátema contra Honório, mas esqueceu de inventar também alguns discursos dos legados, o que teria tornado a situação plausível. "Mas suponha-se que o nome de Honório não estivesse envolvido em tudo isso, o silêncio dos legados se explicaria muito bem. Eles obviamente não teriam nada a dizer nesse caso" (Dumont: "O VI Concílio e o Papa Honório", in: Annales de philosophie chrétienne, Paris 1853, p. 58).

CARTAS FICTÍCIAS DE LEÃO II. Agatão morreu em 10 de janeiro de 681. Ele foi substituído apenas no final do ano por Leão II (681-683). O bispo de Constantinopla, Teodoro, então fabricou cartas fictícias do Papa Leão II, que teria (supostamente) confirmado o anátema contra Honório (muitas evidências de falsificação em Dumont, p. 418-419 e em Caesar Baronius: Annales Ecclesiastici, Antuérpia 1600 (várias reedições), ano 683). Dessa forma, Teodoro propagou entre os gregos a fábula do anátema contra Honório. Essa fábula chegou aos ouvidos de Roma. Dois séculos depois, Roma vingou solenemente a memória ultrajada de Honório.