V - Um precursor da “hermenêutica da continuidade”?
Utilizando uma linguagem ambivalente própria dos modernistas e diretamente retirada das lojas, Jean-Luc Maxence deixa entrever a armadilha sofística que será enfatizada e desenvolvida alguns anos depois pelo “serpente” Ratzinger...
Para tentar delegitimar a “rebelião” de Dom Lefebvre frente ao Vaticano II, ele tenta insinuar que as derivações pós-conciliares não seriam resultado de “interpretações abusivas do Concílio” (página 148).
Jean-Luc Maxence
O Concílio Vaticano II, em si, seria bom. Mas seriam as más “interpretações” que dele foram feitas a causa dos “excessos” ou dos “abusos” que os progressistas, eles próprios, estão, aliás, dispostos a reconhecer hoje de bom grado para tentar “salvar” seu Concílio...
“Os abusos de quem interpretou as renovações do Concílio são numerosos e resultaram em um laxismo muito real, cada vez mais evidente” (página 10), finge lamentar Maxence enquanto desenvolve neste mesmo livro um ódio e considerações insultantes em relação à Igreja e seu ensino, que demonstram quão estranho a Fé católica é esse personagem, escolhido por Dom Fellay para editar o programa de sua política maçônica de alinhamento.
Mais adiante, ele fala das “interpretações errôneas das reformas conciliares” (página 107).
Então, para conseguir exonerar o Concílio Vaticano II e seus autores, Jean-Luc Maxence avança a tese de uma “continuidade” da religião conciliar com a religião anterior ao Vaticano II:
“Na verdade, não existe o que os integristas chamam de ‘uma nova religião’. **A religião católica, apostólica e romana antes do concílio Vaticano II e a depois são uma só. Existe uma continuidade lógica e não uma mudança de alma. O que não evolui retrocede. O que está imóvel já cheira a cadáver” (página 65) nos diz ele.
É, precisamente, por esse mesmo sofisma tipicamente maçônico (o falso apresentado como uma extensão lógica e harmoniosa do verdadeiro…) que Bento XVI seduz hoje os meio chamados de “Tradição” ao lhes dar a impressão de realizar um início de contestação do Concílio Vaticano II enquanto, na verdade, apenas o reforça ao defendê-lo!
Ratzinger começou a desenvolver esse conceito enganador e pérfido em 1985 em seu livro Entrevista sobre a fé e depois o retomou na ocasião de seu discurso de 22 de dezembro de 2005 à Cúria:
« Por que a acolhida do Concílio, em grandes partes da Igreja, se desenrolou até agora de maneira tão difícil? Bem, tudo depende da justa interpretação do Concílio ou – como diríamos hoje – da sua justa hermenêutica, da justa chave de leitura e aplicação. Os problemas da recepção nasceram do fato de que duas hermenêuticas contrárias se confrontaram e entraram em conflito. Uma causou confusão, a outra, silenciosamente, mas de forma cada vez mais visível, trouxe e traz frutos. De um lado, existe uma interpretação que eu gostaria de chamar de « hermenêutica da descontinuidade e da ruptura »; esta muitas vezes contou com a simpatia dos meios de comunicação e também de uma parte da teologia moderna. Por outro lado, há a « hermenêutica da reforma », da renovação na continuidade do único sujeito-Igreja que o Senhor nos deu; é um sujeito que cresce no tempo e se desenvolve, mas permanece sempre o mesmo, o único sujeito do Povo de Deus em marcha. »
Encontramos, aliás, essa mesma retórica enganadora em seu « Motu proprio » de 7 de julho de 2007, onde Ratzinger apresenta a missa de São Pio V e a pseudo-missa de Montini como sendo as « duas formas de um único e mesmo rito » (sic!). Afirmando assim uma « unicidade e identidade » do verdadeiro e do falso rito, esse antipapa não poderia ser mais cínico!
O princípio da « reforma da reforma », sustentado pelo padre de la Rocque em sua Carta aos nossos irmãos sacerdotes de setembro de 2005, procede, aliás, dessa mesma método ocultista e maçônico que consiste em amalgamar os contrários, negando toda contradição.
Em seu discurso de 22 de dezembro de 2005, Ratzinger acrescenta o seguinte:
« Quarenta anos após o Concílio, podemos revelar que o aspecto positivo é maior e mais vivo do que parecia na agitação dos anos que se seguiram a 1968. Hoje, vemos que a boa semente, mesmo se se desenvolve lentamente, cresce, e que também cresce a nossa profunda gratidão pela obra realizada pelo Concílio. »
Então, ele termina:
« Assim, hoje, podemos direcionar nosso olhar com gratitude para o Concílio Vaticano II: se o lermos e o acolhermos guiados por uma justa hermenêutica, ele pode e se tornará sempre mais uma grande força para a renovação sempre necessária da Igreja. »
Acostumada, nesses últimos anos, aos silêncios e traições, a FSSPX apresentou então esse discurso como um texto « fundamental » (sic!) que marcaria a « retoma do controle da Igreja » por Ratzinger!
Trecho da Carta aos nossos irmãos sacerdotes (n°41, março de 2009, página 5)