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A Besta 666

« Matem e torturem; não poupem; ataquem-nos! »

A OTO sendo uma sociedade secreta ou um culto secreto que age no mundo todo, o leitor provavelmente se questiona sobre os objetivos de uma tal organização. Trata-se de um amontoado de excêntricos apaixonados pelo vício e por Satanás, Eros e Hórus? São pessoas inofensivas que gostam de fazer comentários um tanto ásperos e a se assustar com alguns documentos que falam sobre sangue, que buscam se libertar de qualquer limite violando o tabu relacionado à adoração do Demônio quando lhe convém, mas que, no final, não passam de um grupo adicional de existencialistas modernos, outrora cristãos, cujo descontentamento podemos entender e que se revoltam contra a repressão que sofreram na juventude, mas que são igualmente capazes de ajudar uma velha a atravessar a rua como qualquer escoteiro ou lobo?

Alguns membros da OTO são nostálgicos dos anos sessenta que se deleitam com drogas e devassidão, e que sempre serão fascinados por um pentagrama ou uma planta de cannabis. São principalmente esses "Lodge Hippies" que os verdadeiros iniciados acolhem e vampirizam para fins de magia sexual, para depois se desinteressarem deles.

Pois todos os membros da OTO não têm cabelo verde, um anel no nariz e herpes. Alguns são cientistas e médicos no auge de suas disciplinas, mas a ala esquerda da OTO não deixa de acreditar na necessidade de derrubar a forma de civilização caracterizada por essa famosa "repressão sexual" baseada em princípios cristãos. Peter R. Koenig, ex-iniciado da OTO (onde se tornou apaixonado por letras ocultas), escreve a esse respeito: « À espreita no limiar da História, Thélème busca comunicar suas ideias ao mundo. Sua evangelização tem como objetivo final destruir as normas da sociedade. Luta pela dominação mundial e se compara ao jovem cristianismo que Roma perseguia. Segundo os seus sectários: "Se trocássemos o Exército pela OTO, seria excelente para a Ordem". »

De acordo com a OTO, na verdade, a busca desse objetivo passará necessariamente algum dia por uma efusão de sangue. Em Khabs Am Pekht, que é um de seus documentos oficiais, a OTO dá a seus membros a seguinte orientação: « Mais cedo ou mais tarde, teremos que lutar para destruir o poder dos escravos dos deuses-escravos. No âmbito desta epístola, é impossível expor os vastos problemas em jogo, mas quando o momento chegar, a hierarquia da Ordem deverá resolvê-los de acordo com a Lei da OTO (chamada Thélème). »

Este trecho traduz, portanto, o compromisso de declarar guerra contra os cristãos "quando o momento chegar", e como a OTO está espalhada da Itália à América do Sul, passando pela Croácia, Japão e Nova Zelândia, os cristãos fariam bem em se informar um pouco melhor sobre isso.

Brasão da OTO

Kenneth Grant, dirigente da OTO na Inglaterra, nutre um esquema igualmente assustador. Como observa Robert Anton Wilson, « A versão da OTO criada por Grant baseia-se em grande parte nas variantes anais da magia sexual e em sombrias alusões a objetivos políticos de longo prazo conhecidos apenas pelo círculo interno… »

Grant, por sua vez, declara: « O psiquiatra e psicanalista Wilhelm Reich foi eliminado pelas autoridades americanas porque suas descobertas levavam a uma conclusão lógica: a derrubada total da sociedade tal como a conhecemos hoje. No entanto, é somente sobre as ruínas dessa sociedade que o Reino de Ra-Hoor-Khuit poderá se estabelecer. Alguns indivíduos dedicados praticando Thélème com diligência e perseverança bastarão para derrubar a sociedade de vez… »

As « Instruções secretas do Sétimo Grau » expõem objetivos não menos grandiosos, pois destacam a atenção do iniciado: « E no momento que Lhe parecer favorável, a O.H.O., reunindo suas forças, proclamará essa Verdade em particular aos Reis e Príncipes da Terra, para que, após terem feito a consulta, governem todos os homens na paz e no amor em virtude desse Segredo, à Sombra das Asas do Único inefável Senhor. »

Notemos a grotesca mentira que está no cerne dessa propaganda: a lei sanguinária de Crowley é apresentada como uma Weltenschauung fundada na paz e no amor! Tal é, portanto, a ideologia hegemônica dos « pastores de Hermas »; é ela que elaborou e gerenciou secretamente os movimentos hippie e New Age desde os anos sessenta, e cujo símbolo muito popular entre os jovens não é outro senão a cruz Ânkh ou cruz ansada, também chamada de cruz da vida, que inicialmente servia como uma atadura para os pastores do antigo Egito.

O filósofo Thomas Molnar revelou o cerne da questão ao mostrar o que é, na realidade, a famosa « Abadia de Thélème »: uma contra-igreja clandestina que se apresenta como o caminho a seguir para se alcançar uma utopia libertária, desprovida da disciplina rígida e das severas restrições da Igreja Católica. No entanto, Molnar demonstrou que Thélème era uma contra-igreja que impunha regras ainda mais rígidas do que as da Igreja Católica, e que a primeira manifestação desse diabólico engodo remonta à Revolução Francesa. E ele faz uma observação marcante: « Nossa civilização certamente chegará ao fim no dia em que a Igreja Católica e os Estados Unidos se unirem à revolução. »

Uma conspiração de direita

Na busca por esse objetivo, os thélémites semearam sementes de destruição tanto na ala esquerda do catolicismo (os « ecumenistas » ou « conciliaristas ») quanto na sua ala direita (os « tradicionalistas »), conforme um processo conhecido pelos alquimistas sob o nome de coincidentia oppositorum (« conciliamento dos opostos »).

Muito se escreveu sobre as infiltrações ocultas provenientes da esquerda; no entanto, a maioria dos analistas não procurou estudar nem denunciar a subversão que atua sobre os gostos e afinidades da direita. As sociedades secretas têm, contudo, o talento de manipular esses dois lados da psique e da pessoa humana, guiando tanto aqueles que prezam o igualitarismo e a anarquia quanto os que são favoráveis ao elitismo e à autoridade.

Nicholas de Vere é o líder de um culto que busca superar a crise de autoridade muito real que afeta o homem moderno, que é assaltado por dúvidas. Sua retórica apresenta uma semelhança impressionante com os argumentos dos tradicionalistas católicos. De fato, ele tempesta contra a « estupidez da atitude New Age », que « provém da afirmação do liberalismo econômico, totalmente indefensável e motivado, na verdade, pela cupidez, segundo a qual cada um poderia se tornar o que quisesse, assim como contra a ideia politicamente correta e desprovida de fundamento de que haveria apenas iguais. »

É fácil ver que de Vere não é um esquerdista. Suas declarações, portanto, soam agradáveis a ouvidos tradicionalistas. Ele prossegue nestes termos: « Todo espírito racional deve abominar essa variante patética do liberalismo, nascida de um rejeição da vitimização inoculada ao corpo social, e é por isso que eu não sinto nada além de desprezo por […] um grande nivelador e igualador social. Mas não se ganha muito dinheiro dizendo à grande maioria de seu público que ela não está excluída geneticamente de um processo que lhe é impossível viver ou mesmo compreender; então, se vende bobagens New Age dizendo aos ingênuos que todos podem desempenhar o papel que quiserem e adotar qualquer “estilo de vida” à moda ditada por seu capricho como por uma publicidade enganosa… »

Quem é Nicholas de Vere? O dirigente leigo de um grupo de fiéis ligados à Missa Tridentina? Um filósofo conservador? De modo nenhum. De Vere é um satanista e luciferiano assumido: « Aos doze anos, Nicholas foi magicamente e oficialmente consagrado à tradição do dragão, e aos treze anos, ele realizou pela primeira vez o rito conhecido como Starfire [fogo estelar]. Em seguida, sua mãe conseguiu que ele pudesse trabalhar com Aleister Crowley; ele estudou então muito seriamente os princípios das Artes Obscuras e adquiriu grande competência nos rituais mágicos.

Aos quinze anos, Nicholas foi submetido ao rito arcaico de Realeza [Rito da Realeza], que, de acordo com a antiga tradição gaélica, confere ao impetrante o manto da soberania extraído da própria Terra. »

De Vere conquistou um espaço próprio dentro da hierarquia Crowley/OTO: « A Cour do Dragão contemporânea representa, além disso, uma combinação do que Aleister Crowley chamaria de vários "correntes", sendo a principal que está fora da família propriamente dita consagrada através do Black Country Covenant of the Baphometic Order of the Cubic Stone, cuja origem remonta aos Cavaleiros do Templo. Esse favor foi concedido à minha família em reconhecimento dos laços hereditários que esta mantinha com a Feitiçaria real e a tradição histórica do Dragão. Outras correntes exteriores derivam do Clan Donnachaid (da Cavalaria dos Plantagenêt), que é primo – no Dragão – da Casa de Vere, da qual Edward de Vere, décimo sétimo conde de Oxford, foi um membro proeminente. Edward também realizou os rituais da realeza do Dragão na família, incluindo o rito de realeza dos Calle Daouine. »

Em The Beginning of the New World, Crowley expõe seu autêntico plano diretor visando os adeptos do autoritarismo de direita: « A primeira medida prática a ser tomada para esse fim é a criação de uma forte organização central capaz de dirigir com coerência as atividades dos muitos adeptos já estabelecidos em diversos países. Depois, será necessário convocar conferências de especialistas de todas as ciências para tratar da humanidade sob o ângulo social e sob o ângulo individual, a fim de elaborar um programa internacional abrangente. »

Constata-se, portanto, que, em vez da utopia libertária tanto alardeada, que faz correr tanta saliva em uma típica "rave party" dos thélémites (onde se consome muita droga), a OTO é capaz e deseja funcionar como uma “forte organização central”.

Os próximos de Crowley sabiam que ele era um autoritário de primeira linha, chegando a ser um proto-fascista da pior espécie. Uma das principais razões pelas quais a OTO é tão perigosa – e ao mesmo tempo tão atraente – é que ela herdou de Satanás o conhecimento da psicologia humana. O fato é que os discípulos de Crowley se reúnem na extrema direita, entre pessoas psicologicamente inclinadas ao royalismo, ao autoritarismo bem como ao esplendor e às cerimônias solenes.

Isso foi verificado no século vinte no domínio do ocultismo em geral, embora a OTO tenha aperfeiçoado o processo. Entramos aqui em um dos domínios de estudo mais espinhosos e abstrusos da contra-espionagem, aquele que diz respeito ao estratagema das "black ops", operações secretas (ou "dentro da clandestinidade") que servem à união alquímica dos contrários. Um dos exemplos mais impressionantes desse tipo de ação pode ser encontrado em The Slaves Shall Serve (os escravos devem servir), um livro publicado em 2004 e escrito por James Wasserman, um dos líderes mais brilhantes e eruditos da OTO, cujo trabalho é um manifesto fundamental.

O livro em questão faz um ousado e totalmente novo apelo à direita americana. O autor, de fato, elogia publicamente a John Birch Society, ao mesmo tempo que salienta que « por razões pessoais », não é membro. Ele recomenda a leitura dos textos de William Jasper, de John McManus e da John Birch Society, assim como o Liber Oz, « uma declaração publicada pelo mestre inglês Aleister Crowley durante a Segunda Guerra Mundial, que apresenta o que considero ser a exposição ideal dos direitos políticos de qualquer indivíduo corajoso o suficiente para enfrentar as responsabilidades que a liberdade comporta. »

Wasserman ataca os muçulmanos utilizando a fraseologia da John Birch, ou seja, falando sobre "islamo-fascismo", e pretende se colocar como o campeão da "liberdade", repetindo, assim, os argumentos de Birch contra as Nações Unidas. Ele reproduz uma grande parte da documentação de Birch referente às Nações Unidas, que anota demonstrando que essa organização representa um problema. No entanto, ele não menciona, evidentemente, o papel da ONU na criação do Estado de Israel, nem as sanções mortais impostas pela ONU contra o Iraque em vez de contra Israel, assim como não aborda as relações da ONU com a maçonaria (que remontam ao patrocínio da extinta Liga das Nações pelo Grande Oriente e outras lojas). Por oportunismo, ele entrega apenas uma "verdade parcial", demonstrando sua desonestidade.

Por que isso acontece? Porque, na medida em que a OTO é fundada na Cabala, ele percebe que o holofote da conspiração deve ser desviado do judaísmo e da maçonaria, o que o leva a lançar a culpa principalmente sobre o islã, enquanto promove grupos que atuam de forma semelhante, notavelmente a John Birch Society. Após corromper a cultura por meio de ramificações ligadas à "Esquerda", a OTO agora se posiciona para dirigir a "Direita" conservadora kasher.

Wasserman nega – é importante observar – que a resistência islâmica tenha como motivo o apoio de Israel pelos Estados Unidos. Ele pressiona os americanos a se filiar à NRA (Associação Nacional de Rifles); além disso, multiplica as notas de rodapé citando The New American e mencionando, entre outras coisas, a tese discutível de que árabes estariam envolvidos no atentado de Oklahoma City. O líder da OTO até aprova o juiz Roy Moore, que afirmou que os Dez Mandamentos deveriam estar nas instituições americanas. Vindo de um membro ativo da OTO, essa declaração seria risível se não indicasse que algo profundamente subversivo está em ação.

Wasserman destaca, além disso, que a crença em uma Poder Superior constitui uma garantia de liberdade. Na nota de rodapé que acompanha essa declaração, aconselha os "jovens Irmãos" a se libertarem de sua "indolência" e a lembrarem-se de sua busca pelo "HGA", por meio da qual tudo irá bem para eles. O que é esse "HGA" que a juventude deve buscar? "HGA" não é outro senão o nome de código da OTO para o Santo Anjo Guardião (Holy Guardian Angel), que Crowley prescreve – em seu Livro 4 – invocar como « Satã, Teu Olho, Teu Desejo! »

Essa preocupação quanto à "busca dos muçulmanos pela dominação mundial" reflete, na verdade, o medo de que o islã faça concorrência à OTO (um dos líderes da OTO é chamado de "Califa" e até usa um turbante). Quanto ao apelo para a exibição dos Dez Mandamentos, que revelação! Os thélémites são os inimigos jurados dos Dez Mandamentos. Wasserman chega a tentar explicar que, ao citar o Liber Oz de Crowley, onde este escreve « Não há deus além do homem », isso não o torna um ateu, porque Deus não é outra coisa que a "superconsciência" presente no homem.

A OTO é uma força que determina o Bem. Este ponto é muito importante. A OTO considera a John Birch Society como um dos meios mais úteis para desviar a atenção, transferindo-a do judaísmo para o islã, da maçonaria para as Nações Unidas.

Wasserman, que é um agente da Nova Ordem Mundial, escreve isto: « Encontram-se informações preciosas sobre a história e a natureza da tirania internacionalista sob as plumas de John McManus em Financial Terrorism, de William Jasper em Global Tyranny e The United Nations Exposed e de James Perloff em Shadows of Power. Esses quatro livros descrevem a Nova Ordem Mundial com detalhes assustadores, embora de uma maneira sensata. Eles são fruto de pesquisas aprofundadas, e apresentam referências rigorosas a documentos oficiais. Global Tyranny contém um capítulo humorístico sobre o movimento New Age; este capítulo é caracterizado por uma ignorância considerável, mas o bom grão pode ser separado da palha, não é? De qualquer forma, grande parte das críticas que ele [Jasper] dirige ao movimento New Age são fundamentadas. Ele o descreve como tendo sido capturado por ativistas de esquerda que disfarçam seus verdadeiros objetivos sob aparências ecoespiritualistas. Ele apresenta Gorbatchev e aqueles de sua espécie como os grandes sacerdotes de um culto socialista disfarçado de paganismo, cujo verdadeiro objetivo – puramente marxista – é eliminar a propriedade privada[44]

Wasserman recomenda ao leitor o « comentário autorizado da OTO sobre o Book of the Law » (Livro da Lei) de Crowley, comentário intitulado The Law is For All (a lei é para todos). No entanto, no livro em questão, Crowley declara explicitamente que o governo precisa de uma elite e que a maioria das pessoas precisa ser escrava. De fato, o título da obra de Wasserman The Slaves Shall Serve é uma piada de insider, pois é nada menos que uma citação do Livro da Lei de Crowley.

O entusiasmo que a ataque de Birch contra as Nações Unidas inspira em Wasserman é algo estranho, considerando o papel histórico desempenhado pela OTO na criação da Nova Ordem Mundial, assim como o dossiê existente a esse respeito sobre Aleister Crowley, o herói de Wasserman. A OTO desempenhou seu papel nos círculos chamados a assegurar o lançamento publicitário do que H.G. Wells chamava de “Estado mundial”, e não se deve deixar de citá-la entre os movimentos que geraram a Liga das Nações, predecessor das Nações Unidas. De 1915 a 1917, Crowley foi empregado de George Sylvester Viereck, redator-chefe de dois jornais influentes, The Fatherland e The International. Três anos antes da criação da Liga das Nações, Crowley escrevia na mesma linha, para The International: « É preciso trair os interesses inferiores pelos interesses superiores, os benefícios particulares de determinado país pelo Commonwealth mundial. » Existe no Templo da Compreensão das Nações Unidas uma vitral representando o deus Pã aos pés de bode, o primeiro e maior amor de Crowley além de si mesmo.

Em outubro de 2004, podia-se ler no site da Loja Sekhet-Maat da OTO as seguintes informações sobre Wasserman: « James Wasserman ingressou na Ordo Templi Orientis em 1976. Em 1979, fundou a Loja Tahuti, uma das mais antigas lojas da OTO a ter funcionado continuamente. Ele desempenhou um papel fundamental em várias publicações tão influentes quanto originais do corpus literário de Crowley. Três de suas participações foram as seguintes. Primeiro, supervisionou a edição por Weiser, em 1976, do Livro da Lei, no qual o manuscrito holográfico foi anexado ao texto composto e corrigido da publicação dessa obra pela OTO de 1938 – conforme as instruções do autor, o que era uma novidade para um livro famoso. Segundo, ele conseguiu, após várias anos de negociações, reprocessar profissionalmente as pinturas de Crowley-Harris ilustrando o tarô, visando a uma segunda edição melhorada do jogo de Thoth Tarot publicado em 1977 e da qual ele também realizou o manual. Terceiro, colaborou em 1983, com dois outros membros da OTO, na produção dos Holy Books of Thelema [os santos livros de Thélème], uma coleção dos escritos inspirados (Classe A) de Crowley.

« Em 1986, seu ensaio intitulado “Introdução à História da OTO” foi publicado na edição nº 10 de Equinox III [...] Em 1989, ele descreveu sua adaptação a sessões coletivas do exercício do “Middle Pillar” (pilastro mediano) apresentado na obra de Israel Regardie intitulada Healing Energy, Prayer and Relaxation (energia curativa, oração e relaxamento) (Nova Publicações Falcon). Em 1992, ele escreveu e concebeu Art and Symbols of the Occult (Arte e símbolos do oculto), um belo panorama em cores das disciplinas e imagens primordiais da tradição oculta (Inner Traditions). Em 1993, ele compilou, editou e escreveu uma longa introdução para o livro Aleister Crowley and the Practice of the Magical Diary (Aleister Crowley e a prática do diário mágico) (publicado pela Nova Publicações Falcon e reeditado em 2003 pela Sekmet Books). Em 1994, após quinze anos de elaboração, sua edição inovadora do livro The Egyptian Book of the Dead (o livro egípcio dos mortos) foi publicada pela Chronicle Books. Este livro contém uma magnífica reprodução em cores e uma tradução em inglês do Papiro de Ani. Em 1996, ele concebeu, editou e escreveu um epílogo para o importante poema místico de Aleister Crowley intitulado AHA ! (Nova Publicações Falcon).

« Em 2001, The Templars and the Assassins: The Militia of Heaven (os templários e a seita dos assassinos: a milícia do céu) foi publicado pela Inner Traditions. Já traduzido para quatro idiomas, parece estar em boa via de se tornar um clássico moderno sobre o tema da guerra santa. A obra estranhamente antecipou os atentados de 11 de setembro, ocorrendo exatamente quatro meses após sua publicação. »

O livro The Templars and the Assassins tem como objetivo revisitar a época das Cruzadas e sua iconografia, seguindo a linha da propaganda que tem prevalecido desde 11 de setembro de 2001. Slaves Shall Serve amplifica essa operação ao se apoiar na propaganda conservadora "neocon" para provocar uma brusca mudança à direita na OTO. Assim, a OTO retorna às raízes que lhe foram atribuídas por Theodor Reuss, seu fundador, e outros "senhores", todos muito bem vestidos.

The Templars and the Assassins recebeu o « imprimatur » do chefe da Golden Dawn, do chefe do Temple of Set (templo do deus egípcio Seth) e de um dos líderes de outra ordem oculta. Esse patrocínio triplo é sem precedentes. A capa mostra a luta dos templários (com vestimentas de cores invertidas) contra os árabes. O que é, hoje, o nosso Ocidente supostamente cristão, senão uma cruzada invertida, uma cruzada pseudo-cristã conduzida em nome (…) da hegemonia sionista? Na capa, vemos árabes e cruzados lutando em uma muralha prolongada por duas torres e prestes a desmoronar. À direita, aparecem dois assassinos árabes (o demônio e Osama Bin Laden), enquanto no céu brilham duas estrelas (provavelmente Sirius A e Sirius B, da constelação do Grande Cão).

O Direcionamento dos Católicos Tradicionalistas

Outro fato merece ser destacado: o entusiasmo dos ocultistas de direita pela antiga Missa tradicional ("tridentina") em latim. Entre esses entusiastas, o mais conhecido talvez seja C.W. Leadbeater. Antigo sacerdote anglicano e associado à "teosofista" oculta Helena Blavatsky, "Leadbeater estava, no entanto, ciente de que a humanidade contemporânea ainda precisava da magia dos sacramentos cristãos..."

"Em obras como The Science and the Sacraments, The Inner Side of Christian Festivals e em seu livro póstumo recentemente publicado sob o título The Christian Gnosis, ele deixou um legado impressionante pelo qual demonstrou – para satisfação de muitos – que a Missa e os outros sacramentos do cristianismo apostólico eram capazes, em nossa época, de favorecer o bem-estar espiritual e o crescimento transformador dos indivíduos..."

A OTO explorou o fato de que alguns ocultistas "valorizavam as tradições espirituais ocidentais, por exemplo, a magia cerimonial, a maçonaria esotérica, assim como o mistério e a magia sagrada dos sacramentos cristãos [...] Muitos teósofos também foram atraídos pela majestosa beleza e o misticismo da Missa e dos outros sacramentos [...] Evocar a possível existência de um catolicismo oculto não é tão absurdo quanto alguns podem pensar. A história está repleta de prelados, padres e freiras da Igreja Católica que eram fervorosos e competentes ocultistas. A Cabala, o hermetismo, a astrologia e a magia tinham todos seus protetores [...] Hoje em dia, pode-se perceber que pessoas interessadas em gnose e hermetismo têm mais em comum com os católicos tradicionalistas do que com os católicos modernistas do Concílio Vaticano II ou com os protestantes."

Isso não significa que o rito católico tridentino seja oculto. Muito pelo contrário, ele serviu durante séculos como um bastião contra a tentativa diabólica de travestir Jesus Cristo em um arquétipo gnóstico-pagão. Os conspiradores ocultistas do Vaticano – pessoas de esquerda – aboliram a Missa tridentina em 1969 com o zelo de um Thomas Cranmer, enquanto os conspiradores ocultistas de direita buscam assumir o controle das últimas tropas que permanecem ligadas a esta Missa desde sua abolição.

Confuso? Não se a gnose lhe oferecer uma chave, aquilo que o Zohar chama de "conhecimento do equilíbrio". Da mesma forma que os adeptos do vodu utilizam ornamentos, estátuas e outros objetos católicos para perverter o catolicismo, transformando-o em uma superstição mágica, a ala direita da conspiração explora a superstição que alguns católicos nutrem em relação a uma espécie de "sacramentalismo mágico" tácito, ou seja, a ideia de que o simples fato de estar presente na Missa, com sua imponente solenidade, seus sinos, seu incenso e suas velas – e não o estado de graça, a fidelidade aos mandamentos de Deus ou a relação com Jesus Cristo – constitui uma garantia de santidade para o interessado.

Se é verdade que a Missa é uma espécie de magia, como declarou em seminários um palestrante e renomado autor do maior grupo católico "tradicional" dos Estados Unidos, então o sacerdote deve ser um mago.

Esse "sacramentalismo mágico" falsifica a realidade da Eucaristia, zombando dela de maneira diabólica ao transformá-la em um totem do eterno psicodrama pagão, em vez de defender a verdade, que é a de que, sendo uma reedição do drama do Calvário, a Eucaristia representa a única exceção ontológica a esse psicodrama.

Apresso-me em acrescentar que essa crença mágica e perversa não é de forma alguma intrínseca ao catolicismo. Pois trata-se de uma perversão, e de uma perversão satânica. O Papa São Pio V convocou o Concílio de Trento em parte para destruir essa teologia herética e falsificada, que é a obra de Satanás agindo como o "símio de Deus". A crise atual se deve ao fato de que os católicos ortodoxos e verdadeiramente tradicionais não estão dispostos a enfrentar essa ameaça que cresce em seus próprios meios e preferem varrê-la para baixo do tapete, o que precisamente desejam que se faça os ocultistas infiltrados entre eles.

A heresia oculta do sacramentalismo mágico e a mentalidade de casta aristocrática que ela favorece refletem bem a ordem hierárquica que Crowley buscava impor. A hierarquia ideal segundo Crowley não tinha contas a prestar a ninguém. Um megalomaníaco não tolera interferências. Nenhum freio ou contrapeso poderia existir aos seus olhos. Seu objetivo é nada menos que o poder absoluto sem a menor restrição.

Onde melhor lançar tal projeto totalitário do que nas fileiras dos católicos tradicionais "em ruptura", que clamam por restauração da ordem e da obediência, mas que, no entanto, não reconhecem na terra nenhuma autoridade superior àquela dos prelados que lideram seu grupo?

Um Royalismo Blasfematório: O Priorado de Sion e o Código Da Vinci

O sacramentalismo mágico não é o único meio de metamorfosear católicos piedosos em escravos do ocultismo. Se se estuda o cruzamento onde o royalismo e o monarquismo encontram a heresia outrora secreta segundo a qual algumas cabeças coroadas da Europa seriam geneticamente descendentes de Jesus Cristo, começa-se a vislumbrar a ascensão de uma organização dotada de uma autoridade tão divina que nenhum cristão crente poderia resistir. Esse engano empunhado pelos ocultistas que procuram impor sua lei totalitária possui um poder alucinatório quase irresistível. A esse respeito, seu agente moderno foi Pierre Plantard (1920-2000), supostamente o distante descendente do rei merovíngio Dagoberto II.

Plantard foi o padrinho – para o século XX – do mito do "Priorado de Sion", segundo o qual algumas famílias reais da Europa descendem de uma suposta união sexual entre Jesus e Maria Madalena.

Em 1942, Plantard fundou os Alpha Galates. "Os Alpha Galates eram um movimento católico romano de direita, esotérico e antissemita, manifestamente representativo da tradição francesa conhecida como Grande Ocidente, em oposição ao Grande Oriente, que era pro-republicano por natureza. A tradição do Grande Ocidente se desenvolveu, à direita, dentro de diferentes ordens de cavalaria durante o período da ocupação alemã."

No entanto, nem todos foram enganados por essa fachada. O jornal francês Au Pilori, que circulava durante a Segunda Guerra Mundial, acusou assim a ordem de Plantard de ser fundamentalmente maçônica, revelando seus graus de iniciação e dando a Plantard o apelido de "Sua Majestade druídica": "Expressamos nossa admiração, com total imparcialidade, por esta nova Ordem de Cavalaria, e desejamos a Sua Majestade druídica todo o sucesso possível na realização de sua Obra."

Contudo, o redator deste jornal havia levantado uma lebre. O principal movimento católico romano tradicional existente atualmente foi fundado em parte pela nobreza europeia e pode ser descrito superficialmente de maneira quase idêntica aos Alpha Galates: é de direita, esotérico e antissemita. Em suas declarações públicas, mostra-se firmemente anti-judaico, mas, se analisado mais de perto, percebe-se que, como no caso do evasivo Plantard, sua mentalidade apresenta uma parentela sutil com a Cabala e outras seitas de origem muito obscura. É rico em contradições vertiginosas e forma inúmeras alianças não menos desconcertantes com organizações e indivíduos que estão aparentemente em oposição frontal a ele.

O golpista Plantard operava atrás desse tipo de fachada há décadas. Mas ele não era um golpista comum. Sua rede operava entre católicos conservadores e em meios antissemitas, organizando e inspirando afiliados cabalistas ou mesmo devotados a uma "deusa".

O sucesso mais espetacular de Plantard foi a influência do Priorado de Sion sobre Dan Brown, autor de O Código Da Vinci, fenômeno editorial extremamente eficaz que vendeu dez milhões de cópias. Com este livro, a intriga em questão alcançou proporções globais.

Uma sinistra ironia faz com que o Priorado de Sion, "ordem de cavalaria" que teria sido criada em 1099 pelo "Cruzado Godofredo de Bulhão", tenha se tornado, por meio do católico Pierre Plantard e do autor New Age Dan Brown, uma verdadeira correia de transmissão para a revivência do culto bruxo de Ísis, da magia negra da Cabala e da infame difamação talmúdica sobre as supostas relações sexuais de Jesus Cristo.

Talvez o leitor comece agora a vislumbrar a utilidade do que constitui a especialidade da OTO e que o doutor Carl Gustav Jung chamou de Mysterium Coniunctionis (a síntese dos opostos psíquicos na alquimia). A OTO não deseja, de modo algum, adotar uma tática que consista em se ocupar apenas do movimento "progressista" (isto é, de esquerda) favorável à "modernização" e à "reforma", em outras palavras, a abandonar a oposição à direita contra seus inimigos.

Em vez disso, ela está sempre e em toda parte determinada a impor o paradigma cabalístico assegurando-se o controle da oposição. Apela para as normas elitistas de cultura e gosto ao defender as liturgias clássicas, ao mesmo tempo em que agentes do Vaticano inspirados pelo zeitgeist (espírito do tempo) da OTO tornam esses ritos mais ou menos ilegais, excluindo-os do culto ordinário.

Nesse aspecto, a conspiração foi coroada de pleno sucesso. A assistência à Missa tridentina é hoje restrita a pequenas bolsas de resistência católica que, alvo de uma infiltração oculta, se tornam mais suscetíveis à penetração do que seria um movimento de massas reunindo milhões de crentes.

É necessário lembrar aqui o antigo lema alquímico Solve et coagula (dissolver e recompor). A Missa tridentina de outrora santificou inúmeros clérigos e leigos, entre os quais estão os santos mais populares da Igreja.

Mas ela foi despojada de seus centenas de milhões de fiéis com uma rapidez notável, quase num piscar de olhos, o objetivo a longo prazo sendo suscitar em seu favor um novo movimento muito mais circunscrito sobre o qual os círculos ocultos possam exercer um controle estreito.

A Fraude Libertária: “Faz o que tu queres”

Enquanto proclama em alto e bom som a “Lei da Liberdade”, a OTO persegue abertamente objetivos políticos e sociais opostos à própria essência da liberdade. A esquizofrenia que preside tais contradições e a mentalidade que as alimenta resultam em raciocínios aterradores. De acordo com um texto oficial da OTO, “... uma organização é necessária ao desenvolvimento da Liberdade em si, e a direção de cada organização deve ser altamente centralizada. Isso é especialmente necessário em tempos de guerra, assim como as nações 'democráticas' aprenderam por experiência, porque não queriam aprender com a Alemanha. Agora, esta era é eminentemente um 'tempo de guerra', especialmente atualmente, quando nos cabe derrubar os deuses-escravos.”

O delírio pelo poder organizacional como o concebido por Crowley e pela OTO choca-se de maneira singular com a propaganda libertária que eles mesmos promovem. Que se julgue. Aquele que se autodenominava “a Grande Besta 666” escreveu o seguinte: “O Livro da Lei foi dado à humanidade com o principal propósito de comunicar-lhe um princípio impecável de política prática... Não devemos ter escrúpulos em explorar as qualidades naturais de toda a humanidade. Não julgamos indispensável tentar formar ovelhas para caçar raposas ou dar aulas de história; buscamos seu bem-estar físico e nos aproveitamos de sua lã e de sua carne. Assim, dispor-nos-emos de uma classe de escravos felizes que aceitarão suas condições de existência tal como são e que desfrutarão da vida com a tranquila sabedoria do gado.”

Essa doutrina de “A Força faz a Lei” da OTO aparece em destaque ao se analisar a relação particularmente ambígua de Crowley com o nazismo. Crowley escreveu em 1915: “O chefe mundial da OTO é um alemão, e cabe à OTO reconstruir as civilizações da Europa, o que só pode ser feito à maneira alemã. A era dos jogadores de críquete acabou.” Embora Crowley fosse um agente de inteligência britânico, ele apreciava o carisma hipnótico de Hitler, que considerava o aglutinador das forças que estavam esmagando a Ordem cristã, o “Éon de Osíris”.

A OTO foi então proibida na Alemanha nazista, principalmente devido à ligação de seu chefe, Karl Germer, com o agente britânico Crowley, visto como um rival. Em qualquer caso, os alemães da época de Hitler tinham suas próprias ordens ocultas teutônicas, incluindo a Ordo Novi Templi ou Ordem dos Novos Templários (ONT), que contribuiram, por sua vez, para a ascensão do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (Nationalsozialistische Deutsche Arbeiter Partei, ou NSDAP: o partido "Nazista"). A Germanen Order, originária da ONT, pode ter sido o protótipo da Sociedade Thulé (Thule Gesellschaft), organização pagã e oculta que também apoiava o NSDAP.

Após o naufrágio da Alemanha após a Primeira Guerra Mundial, era quase inevitável que o paganismo oculto se reerguesse e se ligasse a qualquer movimento importante, incluindo o nacional-socialismo; é, porém, correto dizer que não se poderia ser ao mesmo tempo maçom e membro do partido nazista, pois Hitler temia a dominação judaica das lojas.

(…)

As declarações contraditórias de Crowley sobre os alemães e os adeptos do judaísmo parecem conciliáveis entre si quando se analisam as próprias contradições de Hitler e a perseguição que – de maneira previsível – resultou, de sua parte, contra os "judeus". Crowley escreveu, em um comentário à margem de seu exemplar pessoal doda coletânea de seus poemas (prefácio, p. xxi): “Minha vida pela Inglaterra...” E em seu ensaio revelador intitulado “Carta Aberta ao Rabino Joel Blau”, Crowley escreve: “Que o judeu mostre o caminho!” Ele acrescenta que o “Messias [judaico] deve se erguer, e será chamado de Anticristo...

Assim como hoje, a OTO já jogava em dois tabuleiros: de um lado, entusiasmava-se com as guerras e os banhos de sangue provocados por Hitler; do outro, apoiava o sionismo atuando como agente dos serviços secretos britânicos (o MI6) e da maçonaria britânica.

Crowley, que pregava um fascismo oculto, venerava ao mesmo tempo Adolf Hitler e o rabino Blau; além disso, permaneceu toda a sua vida um agente britânico e um cripto-sionista. Em sua autobiografia, Crowley elogia muitos judeus, de forma semelhante ao que faria um proprietário esnobe de um clube exclusivo. Harry Truman também era conhecido por lançar farpas contra certos adeptos do judaísmo em conversas privadas, e, no entanto, poucas pessoas serviram à criptocracia com mais entusiasmo do que o maçom de 33º grau Harry Truman, o que também pode ser dito sobre Crowley.

Crowley chegou à liderança da OTO por cooptação dentro da maçonaria. Segundo suas próprias palavras: “Embora eu tenha sido admitido desde 1900 no trigésimo terceiro e último grau da maçonaria [de rito escocês antigo e aceito], foi apenas no verão de 1912 que se confirmaram minhas suspeitas. Estou me referindo à minha convicção de que por trás das frivolidades e da convivialidade de nossa maior instituição (a maçonaria) se esconde, na verdade, um segredo. Na época de que falo, um homem veio até mim. Era um dos misteriosos mestres da maçonaria esotérica, essas pessoas que são os olhos e o cérebro dela, mas que permanecem desconhecidos, muitas vezes até mesmo para os líderes oficiais da obediência [...] Esse homem, que observava minha carreira oculta há vários anos, então me julgou digno de participar dos Mistérios Superiores.

O homem que contatou Crowley era o "irmão Merlin" (o conhecido Theodor Reuss), que posteriormente confiou a ele a direção da OTO; Crowley alcançou o grau Baphomet XI, o “Rei Santo e Supremo da Irlanda, de Iona e de todas as Bretanhas que estão no Santuário da Gnose, a OTO”. Quando Crowley se tornou OHO (Outer Head of the Order, ou seja, chefe exterior da Ordem), membros alemães da OTO relativamente sensatos se recusaram a segui-lo. Pois Crowley já havia começado a divulgar segredos de seu antigo Ordem mágica rosacruciana (Rosicrucian Magical Order), a Ordem Hermética da Aurora Dourada (Hermetic Order of the Golden Dawn), fundada por maçons de alto escalão.

Mas aos olhos dos discípulos de Crowley, ele não se restringiu a promover futilidades esotéricas. Segundo eles, ele foi o Logos do Novo Éon de Hórus, inaugurado em 1904 com a "recepção" pelo próprio Crowley do Livro da Lei, que lhe havia sido ditado durante três dias no Cairo, no Egito. Embora até então, cada loja maçônica sempre tivesse exibido sobre seu altar um "livro da lei", um dos "marcos" da maçonaria, a obra em questão não tinha - no fundo - muito a ver com esta última, pois mudava com a religião de cada iniciado; em outras palavras, um iniciado cristão prestava um juramento sobre uma Bíblia, um maçom muçulmano sobre um Corão, etc., pois tais eram, na realidade, os "livros da lei" presentes dentro de uma loja comum. Mas com a revelação que foi ditada a Crowley por um certo "Aiwass", identificado por ele como sendo Satanás e por Kenneth Grant como sendo uma inteligência estrangeira desencarnada, a maçonaria finalmente dispunha de um Livro da Lei vinculante que se impunha a todos os maçons, independentemente de sua obediência.

Crowley obteve por "canalização" uma Lei codificada em um livro que ele afirmava ter sido revelado por seu "Anjo da Guarda", o demônio Aiwass; trata-se da Lei de Thelema, interpretação da máxima de Rabelais "Faz o que tu queres será o todo da Lei".

Em 1904, o cenário descrito pelo Livro da Lei ainda era impensável. Era o de uma sociedade fundada não na reconhecida cínica e pura forma dos princípios cristãos, mas na adoção entusiástica e deliberada de seus opostos: o sucesso pessoal em vez do sacrifício de si, a adulteração e todas as formas imagináveis de expressão e licenciosidade sexual, o uso de drogas, o ocultismo, a exaltação da guerra e doda carnificina, bem como o apelo darwiniano para a eliminação dos fracos. Ora, de acordo com as profecias "ditadas" a Crowley, o século passado foi de fato testemunha da realização desses princípios em uma escala... gargantuesca.gigantesca. Será que a OTO estava, portanto, certa? Alguma inteligência desencarnada escolheu "mostrar sua mão" ao anunciar o projeto que havia concebido para o século XX a seus fiéis do primeiro círculo maçônico, a OTO? O Livro da Lei é, como afirmam alguns, o plano diretor de Satanás para um mundo sem Deus?

Em 1907, o capitão J.F.C. Fuller, da infantaria leve de Oxfordshire (que se tornaria depois o principal arquiteto da estratégia militar britânica durante a Segunda Guerra Mundial), foi apresentado a Crowley e depois fez dele um panegírico intitulado The Star in the West (a estrela do Ocidente), no qual figurava um termo de sua invenção: a "crowleyanidade" (Crowleyanity).

Crowley apresentou-se inicialmente como poeta, cujas obras, de fato, receberam críticas favoráveis de G. K. Chesterton no início (sobre o qual Crowley um dia escreveria: "É com você que eu escolho me medir [...] você é uma força com a qual é preciso contar [...] pode ser difícil dizer se somos de fato amigos ou inimigos"). Crowley começou sua carreira (que mais tarde se mostraria prolífica) com prosa, produzindo escritos em grande quantidade e suas influências começaram a crescer. James Branch Cabell assim utilizou a Missa gnóstica de Crowley para o capítulo 22 de sua obra intitulada Jurgen, a Comedy of Justice. Quanto ao famoso romancista W. Somerset Maugham, ele tomou Crowley como modelo para o personagem sulfuroso Oliver Haddo, que aparece em seu livro sensation da 1908 intitulado O Mágico, no qual se fala de alquimia, de um homúnculo e do poder encantador de Haddo sobre a virginal Margaret. Assim como Crowley, Maugham era um agente dos serviços de inteligência britânicos, e Alfred Hitchcock se baseou em sua novela intitulada Ashenden para realizar em 1936 o filme "Agente Secreto".

Como modelo para Haddo, Crowley seduziu uma miríade de mulheres para seus rituais de bruxaria sexual, incluindo Keila Waddell, Leah Hearsing e muitas outras, assim como homens inclinados à homossexualidade. Em 1910, no Caxton Hall, em Londres, Crowley organizou uma das primeiras drug parties dos tempos modernos, servindo aos seus convidados cogumelos alucinatórios misturados a maçãs com cheiro de podre. Crowley foi o verdadeiro pioneiro de quase cada manifestação das “culturas” hippies e New Age que surgiriam de sua sombra um meio século depois.

Em 1920, foi construída em Cefalù, na Sicília, uma “Abadia de Thélème” onde Crowley realizava suas cerimônias da OTO. Mas em 1923, Benito Mussolini fechou o local e ordenou que Crowley deixasse o território italiano. No meio da década de 1930, Crowley fez amizade com outro intelectual influente do século XX, Aldous Huxley, autor do livro "Admirável Mundo Novo" e um dos primeiros pioneiros dos alucinógenos psicodélicos na Califórnia nos anos cinquenta. Huxley era neto de Thomas Huxley, um dos primeiros defensores da teoria darwiniana da evolução, que se descrevia como "agnóstico" para designar sua ausência de fé. Após a morte de Crowley, em 1947, a OTO fez progressos rápidos nos corredores da cultura de massa.

Mas a hora de Crowley realmente chegou com os anos sessenta. Como mencionado acima, os Beatles fizeram adicionar seu retrato fotográfico na capa de um de seus álbuns, e Jimmy Page, guitarrista do grupo de rock Led Zeppelin, comprou na Escócia a casa de Crowley localizada em Boleskine, acima do Loch Ness, habitat do famoso “monstro”. Além disso, Page aceitou colaborar com um discípulo hollywoodiano de Crowley, o bem nomeado Kenneth Anger,[56] na composição da trilha sonora do “filme cult” de Anger Lucifer Rising (a ascensão de Lúcifer), no qual atua Bobby Beausoleil – associado de Charles Manson,[57] que seria posteriormente condenado pelo assassinato do músico Gary Hinman.

Nas lojas Virgin Megastore dos Estados Unidos, a versão de bolso do livro de Crowley intitulado Confissões está praticamente no topo das vendas. Um CD onde se ouve Crowley recitar seu lamento dos “Chamados Enoquianos” e ler sua própria poesia (onde ele fala de si: “Enterrem-me em uma sepultura sem nome; vim de Deus para salvar o mundo”) vende-se como água... ou melhor, como bolos de Halloween. As grandes lojas oferecem uma dezena de suas obras. Harry Potter nunca teria alcançado um sucesso planetário tão grande se a “Besta” não lhe tivesse aberto o caminho. Como me disse um adolescente (me presenteando, em um momento de sincero entusiasmo, com um exemplar do livro de Crowley Diário de um Viciado como um evangelista me teria confiado a Bíblia de Gideon), “Crowley tem muito a nos ensinar”.

Mas, mais importante que o triunfo de Aleister Crowley e da OTO na "cultura" pop, estão os progressos da "crowleyanidade" no mainstream da cultura. O famoso autor cristão C. S. Lewis chamava nossa época de a era "pós-cristã". Crowley, aliás, havia previsto isso: o "Éon de Hórus", a era da Criança Coroada e Conquistadora, dizia ele, deve vir e derrubar o "Éon de Osíris", a era do Deus Moribundo. NoNa NovoNova AgeEra anunciado por Crowley, Deus Pai é desterrado por Hórus Filho, ou seja, uma cultura juvenil chamada a se desenvolver na rebeldia, imprudência e perigo. Do ponto de vista de Crowley, no entanto, essa cultura é essencial tanto para a manutenção da autoridade quanto para a evolução, pois a rebeldia de esquerda liderada pela OTO desencadeará uma reação de direita também conduzida pela OTO.

O doublespeak[58] ou duplo discurso de Crowley e seus sucessores é surpreendente. Esses diabolistas estão à frente de movimentos tipo bumerangue que escravizam pessoas hipnotizadas e em busca de sentido, aprisionando-as na aceitação orwelliana de condições opostas àquelas que eles defendem e preveem. Assim, a massa se imagina avançando, enquanto na verdade abraça o esqueleto como um maçom de 33º grau em processo de iniciação. O paralelo entre o iniciado da OTO e o povo americano é notável: ambos foram ou estão atualmente sob condicionamento, e, no momento oportuno, acolherão um líder que lhes trará a "sabedoria tranquila do gado", que eles terão se tornado entretanto. Já não estamos nós no Éon de Hórus?