Capítulo 5
Agora resta ver como a essência se encontra nos acidentes.
Pois, como já foi dito, a essência é aquilo que é significado pela definição, deve ser que as coisas tenham essência da forma como têm definição. No entanto, têm uma definição incompleta, pois não podem ser definidas sem que um sujeito seja colocado em sua definição. E isso se dá porque não possuem ser por si mesmas, absolutamente separado do sujeito,
mas assim como do composto de forma e matéria resulta o ser substancial, assim também do acidente e do sujeito resulta o ser acidental, quando o acidente se acrescenta ao sujeito. Portanto, nem a forma substancial tem uma essência completa, nem a matéria, porque, mesmo na definição da forma substancial, é necessário que se coloque aquilo do qual é a forma; assim, sua definição é por adição de algo que está fora de seu gênero, como também a definição da forma acidental. Daí que, na definição da alma, o corpo é colocado por um natural, que considera a alma apenas na medida em que é a forma do corpo físico.
No entanto, entre formas substanciais e acidentais há uma simples diferença, pois assim como a forma substancial não possui ser absoluto por si mesma sem aquilo a que se acrescenta, assim também não tem o que lhe acresce, a saber, a matéria. E assim, da junção de ambos resulta aquilo no qual a coisa subsiste por si mesma, e deles surge um único ser por si; por isso, da confluência deles resulta uma certa essência. Portanto, a forma, embora considerada em si mesma não tenha a razão completa da essência, é, no entanto, parte da essência completa. Mas aquilo a que o acidente se acrescenta é um ente completo em si, subsistente em seu ser. Este ser, de fato, precede naturalmente o acidente que sobrevem. Portanto, o acidente que sobreveio, da conexão deste com aquilo a que se acrescenta, não causa aquele ser no qual a coisa subsiste, por meio do qual a coisa é um ente por si, mas causa um certo ser secundário, sem o qual a coisa subsistente pode ser entendida como sendo, assim como o primeiro pode ser entendido sem o segundo. Daí que, do acidente e do sujeito, não se faz um único ser por si, mas sim um por acidente. E, portanto, da junção deles não resulta uma certa essência, como da junção da forma com a matéria. Por isso, o acidente não possui a razão de essência completa nem é parte da essência completa, mas, assim como é um ente em certo sentido, assim também possui a essência em certo sentido.
Mas porque aquilo que é dito de forma máxima e verdadeira em qualquer gênero é a causa daquilo que está posteriormente naquele gênero, assim como o fogo que está no extremo da caloridade é causa do calor nas coisas quentes, como é dito na II Metafísica, é necessário que a substância que é primeira no gênero do ente, possuindo verdadeira e máxima essência, seja a causa dos acidentes, que participam secundariamente e de forma quase secundária da razão do ente.
Entretanto, isso ocorre de maneira diversificada. Uma vez que as partes da substância são matéria e forma, alguns acidentes, portanto, decorrem principalmente da forma e outros da matéria. Contudo, há formas encontradas, cujo ser não depende da matéria, como a alma intelectual; a matéria, por sua vez, não tem ser senão pela forma. Assim, nos acidentes que decorrem da forma, há algo que não tem comunicação com a matéria, como é o entender, que não está relacionado ao órgão corporal, como o filósofo prova na III De Anima. Por outro lado, alguns dos acidentes que decorrem da forma têm comunicação com a matéria, como sentir. Mas nenhum acidente decorre da matéria sem comunicação da forma.
No entanto, nesses acidentes que decorrem da matéria, encontra-se certa diversidade. Alguns acidentes decorrem da matéria segundo a ordem que esta possui em relação à forma especial, como masculino e feminino nos animais, cuja diversidade se reduz à matéria, como é dito na X Metafísica. Portanto, removida a forma do animal, os ditos acidentes não permanecem senão de forma equívoca. Outros decorrem da matéria segundo a ordem que ela possui em relação à forma geral, e por isso, removida a forma especial, ainda permanecem nela, assim como a negritude da pele é no etíope por causa da mistura de elementos e não pela razão da alma, e por isso permanece neles após a morte. E porque cada coisa se individualiza pela matéria e se coloca em gênero ou espécie por sua forma, os acidentes que decorrem da matéria são os acidentes do indivíduo, segundo os quais também os indivíduos da mesma espécie diferem entre si,
os acidentes, por sua vez, que decorrem da forma são as paixões próprias, seja do gênero, seja da espécie; portanto, encontram-se em todos que participam da natureza do gênero ou da espécie, como o risível segue na forma do homem, porque o riso resulta de certa apreensão da alma humana.
É necessário também observar que os acidentes, por vezes, são causados a partir dos princípios essenciais segundo o ato perfeito, como o calor no fogo, que é sempre, de fato, quente; outras vezes, porém, são causados apenas segundo a aptidão, mas o complemento ocorre a partir de um agente exterior, como a diacência do ar, que se completa por um corpo luminoso externo. E, em tais casos, a aptidão é um acidente inseparável, mas o complemento, que advém de algum princípio que está fora da essência da coisa ou que não entra na constituição da coisa, é separável, como mover-se e outros semelhantes.
Deve-se também notar que em acidentes o gênero, a diferença e a espécie são tomados de modo diferente do que nas substâncias.
Pois, nas substâncias, resulta por si um único ser de uma certa natureza da junção da forma substancial e da matéria, que propriamente se enquadra no predicamento da substância; por isso, na substância, os nomes concretos, que significam o composto, são propriamente ditos no gênero do ser, como espécies ou gêneros, por exemplo, homem ou animal. Não obstante, forma ou matéria não se encontra dessa forma no predicamento, exceto por redução, como os princípios são ditos no gênero do ser. Mas do acidente e do sujeito não se forma um único ser por si. Portanto, não resulta da junção deles nenhuma natureza à qual se possa atribuir a intenção de gênero ou espécie. Assim, os nomes acidentais ditos concretamente não são colocados no predicamento como espécies ou gêneros, como, por exemplo, branco ou musical, exceto por redução, mas apenas na medida em que se significam de modo abstrato, como albedo e música.
E, porque os acidentes não são compostos de matéria e forma, não se pode, portanto, tomar o gênero deles a partir da matéria e a diferença a partir da forma, como ocorre nas substâncias compostas. Mas é necessário que o gênero primeiro seja tomado a partir do próprio modo de ser, segundo o qual o ente é predicado de diversas maneiras a partir do que é anterior e posterior entre os dez gêneros, como se diz que a quantidade é aquilo que mede a substância, e a qualidade segundo o que é a disposição da substância, e assim por diante, segundo o filósofo na IX Metafísica. As diferenças, por sua vez, são tomadas da diversidade dos princípios dos quais são causadas. E porque as paixões próprias decorrem dos próprios princípios do sujeito, é por isso que o sujeito é colocado na definição deles no lugar da diferença, quando são definidos abstratamente, na medida em que são propriamente do gênero, como se diz que a simetria é a curvatura do nariz. Mas seria o contrário, se a definição deles fosse tomada segundo o que se diz concretamente. Assim, o sujeito seria colocado em sua definição como gênero, uma vez que seriam definidos conforme as substâncias compostas, nas quais a razão do gênero é tomada da matéria, como dizemos que o simo é um nariz curvo.
De modo semelhante, isso também se aplica caso um acidente seja o princípio de outro acidente, como o princípio da relação é a ação e a paixão e a quantidade; e por isso, de acordo com isso, o filósofo divide a relação na V Metafísica.
Mas, como os próprios princípios dos acidentes nem sempre são manifestos, então, às vezes, tomamos as diferenças dos acidentes a partir de seus efeitos, como as diferenças de cor são ditas ser a congregativa e a disgregativa, que são causadas pela abundância ou escassez de luz, a partir da qual se causam as diversas espécies de cores.