Capítulo 4
Assim, é evidente a partir das visões dele que a essência se encontra de maneiras diversas. Pois há um modo triplo de possuir essência nas substâncias.
Alguma coisa é, como Deus, cuja essência é o próprio seu ser; e, portanto, alguns filósofos afirmam que Deus não tem quididade ou essência, porque sua essência não é outra coisa senão seu ser. E disso segue que Ele não está em gênero, porque tudo que está em gênero deve ter quididade além de seu ser, uma vez que a quididade ou natureza do gênero ou da espécie não se distingue segundo a razão da natureza naquelas coisas, cujo é o gênero ou a espécie, mas o ser é diverso nas diversas.
E não deve ser, se dizemos que Deus é apenas ser, que incorramos no erro daqueles que afirmam que Deus é aquele ser universal, pelo qual qualquer coisa é formalmente. Pois esse ser que Deus é, possui tal condição, que nada pode ser adicionado a ele; assim, por sua própria pureza, é um ser distinto de todo ser. Por isso, se diz no comentário da nona proposição do livro das causas que a individuação da primeira causa, que é apenas ser, é pela pura bondade dEle. O ser, portanto, comum como em seu intelecto, não inclui alguma adição, assim como não inclui em seu intelecto a predição da adição; porque se assim fosse, nada poderia ser entendido como sendo, no qual algo fosse adicionado ao ser.
De maneira semelhante, embora seja apenas ser, não se deve pensar que faltem a ele as demais perfeições e nobreza, antes, ele possui todas as perfeições que estão em todos os gêneros. Por isso, é dito perfeito simpliciter, como o filósofo e o Comentador dizem na V Metafísica. Mas ele possui-as de maneira mais excelente que todas as coisas, pois, nele, são uma, enquanto nas outras têm diversidade. E isso acontece, porque todas aquelas perfeições lhe convêm segundo seu ser simples; assim como se alguém pudesse, por uma qualidade, realizar operações de todas as qualidades, nessa única qualidade teria todas as qualidades, da mesma forma, Deus possui em seu ser todas as perfeições.
O segundo modo em que a essência é encontrada é nas substâncias criadas intelectuais, nas quais existe um ser diferente da essência delas, embora a essência seja sem matéria. Assim, seu ser não é absoluto, mas recebido e, portanto, limitado e finito à capacidade da natureza que as recebe, mas a natureza ou quididade delas é absoluta, não recebida em alguma matéria. E por isso diz-se no livro das causas que as inteligências são infinitas por baixo e finitas por cima. Pois são finitas quanto ao seu ser, que recebem do superior, não obstante, não são limitadas por baixo, porque suas formas não se limitam à capacidade de alguma matéria que as recebe.
Portanto, em tais substâncias não se encontra a multidão de indivíduos em uma única espécie, como foi dito, exceto na alma humana devido ao corpo, ao qual se une. E, embora a individuação dela dependa do corpo ocasionalmente quanto ao seu início, porque não se adquire ser individuado a menos que seja em um corpo, do qual é ato, não é necessário que, com a remoção do corpo, a individuação cesse, porque, tendo um ser absoluto, do qual foi adquirido o ser individuado pelo fato de se tornar a forma deste corpo, esse ser sempre permanece individuado. E por isso Avicena diz que a individuação das almas ou multiplicação depende do corpo quanto ao seu princípio, mas não quanto ao seu fim.
E porque nessas substâncias a quididade não é a mesma que o ser, por isso são ordenáveis no predicamento, e devido a isso existe nelas gênero, espécie e diferença, embora suas diferenças próprias sejam ocultas para nós. Nas coisas sensíveis, até mesmo as diferenças essenciais são desconhecidas, assim são significadas por diferenças acidentais, que surgem das essenciais, assim como a causa é significada por seu efeito, como bípedes é colocada como a diferença do homem. No entanto, os acidentes próprios das substâncias imateriais são desconhecidos para nós; portanto, suas diferenças não podem ser significadas nem por si mesmas nem por diferenças acidentais.