Capítulo 1
É necessário saber que, como diz o filósofo no Livro V da Metafísica, o ser é dito per se de duas maneiras: de um modo, que se divide em dez gêneros; de outro modo, que significa a verdade das proposições. A diferença entre esses dois modos é que, no segundo, pode-se chamar de ser tudo aquilo de que uma proposição afirmativa pode ser formada, mesmo que isso não tenha nenhum referente na realidade. Assim, as privacões e negações são ditas entes; pois dizemos que a afirmação é oposta à negação e que a cegueira está no olho. Mas, no primeiro modo, não se pode chamar de ser senão o que realmente tem um referente na realidade. Portanto, no primeiro modo, a cegueira e coisas semelhantes não são entes.
Assim, o nome essência não é tomado do ente no segundo modo mencionado; pois algumas coisas são ditas entes desse modo, que não têm essência, como é evidente nas privacões; mas a essência é tomada do ente no primeiro modo. Daí o Comentador diz no mesmo lugar que o ente dito no primeiro modo é o que significa a essência da coisa.
E como, conforme foi dito, o ente dito desse modo se divide em dez gêneros, é necessário que a essência signifique algo comum a todas as naturezas, pelas quais diferentes entes são classificados em diferentes gêneros e espécies, como a humanidade é a essência do homem, e assim por diante.
E porque aquilo pelo qual uma coisa é constituída em seu próprio gênero ou espécie é o que é significada pela definição que indica o que é a coisa, daí resulta que o nome essência é, por parte dos filósofos, transformado no nome quididade. E isso é o que o filósofo frequentemente denomina "o que era ser", isto é, aquilo pelo qual algo tem ser como "o que".
É também chamado de forma, na medida em que pela forma se significa a certeza de cada coisa, como diz Avicena em sua Metafísica II.
Isso também é chamado, por outro nome, de natureza, considerando a natureza segundo o primeiro modo daqueles quatro que Boécio atribui no livro sobre as duas naturezas, segundo o qual a natureza é dito tudo aquilo que pode ser captado de algum modo pela inteligência. Pois uma coisa não é inteligível senão por sua definição e essência.
E assim também o filósofo diz no Livro V da Metafísica que toda substância é natureza. No entanto, o nome natureza tomado desse modo parece significar a essência da coisa, na medida em que tem relação com a operação própria da coisa, já que nenhuma coisa está desprovida de sua própria operação.
O nome quididade, de fato, é tomado do que é significada pela definição. Mas a essência é dita na medida em que, por ela e nela, o ente tem ser.
Contudo, como o ser absoluto e de modo prioritário é dito das substâncias, e de modo posterior e como que segundo um certo aspecto dos acidentes, daí resulta que a essência é propriamente e verdadeiramente encontrada nas substâncias, mas nos acidentes é de certa forma e segundo um certo aspecto.
Entre as substâncias, algumas são simples e outras compostas, e em ambas existe a essência, mas nas simples de modo mais verdadeiro e nobre, na medida em que também possuem um ser mais nobre. Pois são causa daquelas que são compostas, a saber, a substância primeira simples, que é Deus. Mas como as essências dessas substâncias são mais ocultas para nós, deve-se começar pelas essências das substâncias compostas, para que a disciplina se torne mais adequada, partindo do que é mais fácil.
Portanto, nas substâncias compostas, a forma e a matéria são conhecidas, como no homem, a alma e o corpo.
Entretanto, não se pode dizer que apenas um deles seja chamado de essência. É evidente que a matéria sozinha não é a essência da coisa, pois uma coisa é conhecida por sua essência e é ordenada em espécie ou gênero. Mas a matéria não é nem o princípio do conhecimento, nem é por ela que algo é determinado a um gênero ou espécie, mas segundo aquilo que algo é realmente.
Nem mesmo a forma pode ser dita apenas essência da substância composta, embora alguns tentem afirmar isso. A partir do que foi dito, é claro que a essência é aquilo que é significada pela definição da coisa. A definição, no entanto, das substâncias naturais não contém apenas a forma, mas também a matéria; caso contrário, as definições naturais e matemáticas não difeririam.
Nem se pode dizer que a matéria é posta na definição da substância natural como um adendo à sua essência ou ser fora de sua essência, pois esse modo de definição é próprio dos acidentes, que não têm uma essência perfeita. Portanto, deve-se incluir na sua definição um sujeito que esteja fora de seu gênero. É evidente, então, que a essência compreende a matéria e a forma.
Não se pode dizer que a essência signifique a relação que existe entre a matéria e a forma ou algo que seja superadicionado a elas, pois isso seria necessariamente um acidente e estranho à coisa, e não permitiria que a coisa fosse conhecida, o que se aplica a tudo que convém à essência. Pois pela forma, que é o ato da matéria, a matéria se torna um ente em ato e algo determinado. Assim, aquilo que supervenha não confere ser em ato simplesmente à matéria, mas ser em ato tal, como também os acidentes o fazem, como a brancura torna algo efetivamente branco. Portanto, quando tal forma é adquirida, não se diz que é gerada simplesmente, mas segundo um certo aspecto. Portanto, conclui-se que o nome essência, nas substâncias compostas, significa aquilo que é composto de matéria e forma.
E isso está de acordo com a palavra de Boécio no comentário sobre os categorias, onde diz que usia significa composto. Pois usia, entre os gregos, é o mesmo que essência entre nós, como ele mesmo diz no livro sobre as duas naturezas. Avicena também diz que a quididade das substâncias compostas é a própria composição da forma e da matéria. O Comentador também diz sobre a Metafísica VII: a natureza que as espécies têm nas coisas geráveis é algum meio, isto é, composto de matéria e forma.
A razão também se alinha com isso, pois a existência de uma substância composta não se reduz apenas à forma ou apenas à matéria, mas refere-se ao composto em si. A essência é, portanto, aquilo pelo qual uma coisa é dita existir. Assim, a essência, pela qual uma coisa é chamada de "ser", não é apenas a forma nem apenas a matéria, mas ambos, embora, sob esse aspecto, a forma seja, de seu modo, a única causa do ser.
De fato, vemos em outros casos que, quando algo é constituído por múltiplos princípios, a coisa não é nomeada apenas por um desses princípios, mas por aquele que abrange ambos. Isso é evidente nos sabores, pois a doçura resulta da ação do calor que digere a umidade. Embora, neste sentido, o calor seja a causa da doçura, o corpo doce não é denominado pelo calor, mas pelo sabor que abrange o quente e o úmido.
Entretanto, como o princípio da individuação é a matéria, pode-se inferir que a essência, que inclui tanto a matéria quanto a forma, é apenas particular e não universal. Isso implicaria que os universais não teriam definição, se a essência é aquilo que é significada pela definição.
Portanto, é importante notar que a matéria não é aceita como princípio de individuação de qualquer modo, mas apenas a matéria "designada". Refiro-me à matéria designada que é considerada sob dimensões determinadas. Essa matéria, na definição do homem enquanto homem, não é mencionada, mas seria se Sócrates tivesse uma definição. Na definição do homem, considera-se a matéria não designada; não se menciona este osso ou esta carne, mas osso e carne de forma absoluta, que são a matéria do homem não designada.
Assim, fica claro que a essência do homem e a essência de Sócrates não diferem exceto pela designação. Como diz o Comentador na VII Metafísica: Sócrates não é nada além de animalidade e racionalidade, que são sua quiddidade.
Da mesma forma, as essências do gênero e da espécie diferem segundo a designação, embora o modo de designação seja diferente em cada caso, pois a designação do indivíduo em relação à espécie é através da matéria determinada por dimensões, enquanto a designação da espécie em relação ao gênero é através da diferença constitutiva, que é extraída da forma da coisa.
No entanto, essa determinação ou designação, que está na espécie em relação ao gênero, não provém de algo que exista na essência da espécie e que não esteja de nenhum modo na essência do gênero; na verdade, tudo o que está na espécie também está no gênero, mas não de forma determinada. Se o animal não fosse todo o que é o homem, mas apenas uma parte dele, não poderia ser predicado sobre ele, já que nenhuma parte integral é predicada de seu todo.
Isso pode ser visto ao considerar como o corpo é entendido como parte do animal e como é entendido como gênero. Não pode haver um gênero da mesma maneira que há uma parte integral. Portanto, o nome "corpo" pode ser entendido de várias maneiras.
O corpo, enquanto é do gênero substância, é chamado assim porque possui tal natureza que permite que três dimensões sejam designadas nele; essas três dimensões são o corpo, que está no gênero quantidade. Contudo, em coisas, é possível que o que possui uma perfeição possa alcançar outra perfeição, como é evidente no homem, que possui tanto a natureza sensitiva quanto a intelectual. De maneira semelhante, além dessa perfeição de ter uma forma tal que permite a designação de três dimensões, pode-se adicionar outra perfeição, como a vida ou algo semelhante. Portanto, o nome "corpo" pode significar uma coisa que possui tal forma, da qual se segue que na própria coisa podem ser designadas três dimensões sem que nenhuma perfeição adicional se siga dela; mas se algo mais for adicionado, isso estará além da significação do corpo assim denominado. E dessa maneira, o corpo será a parte material e integral do animal, pois a alma estará além do que é designado pelo nome corpo e será superveniente a ele, de modo que, a partir dessas duas partes, alma e corpo, se constitui o animal.
Esse nome "corpo" pode também ser entendido como significando uma coisa que possui tal forma, da qual podem ser designadas três dimensões, independentemente de que forma seja essa, se dela pode resultar alguma outra perfeição ou não. E dessa maneira, o corpo será o gênero do animal, pois não há nada no animal que não esteja implicitamente contido no corpo. A alma não é uma forma diferente daquela pela qual podem ser designadas três dimensões na coisa; portanto, quando se diz que o corpo é o que possui tal forma, da qual podem ser designadas três dimensões, entende-se que seja qualquer forma, seja a animalidade, a mineralidade ou qualquer outra. Assim, a forma do animal está implicitamente contida na forma do corpo, na medida em que o corpo é seu gênero.
E a relação do animal com o homem é semelhante. Se o termo "animal" designasse apenas uma coisa que possui tal perfeição que pode sentir e mover-se por um princípio existente nela, sem considerar outra perfeição, então qualquer outra perfeição subsequente seria em relação ao animal como uma parte e não como implicitamente contida na noção de animal, e assim o animal não seria gênero; mas é gênero na medida em que significa uma coisa cuja forma pode resultar em sensibilidade e movimento, seja qual for essa forma, seja apenas sensitiva ou tanto sensitiva quanto racional.
Assim, o gênero significa indeterminadamente tudo o que está na espécie, não se referindo apenas à matéria; da mesma forma, a diferença significa tudo e não se refere apenas à forma; e também a definição significa tudo, assim como a espécie. Contudo, cada um o faz de maneira diferente, pois o gênero significa tudo como uma denominação que determina o que é material na coisa sem a determinação da forma própria. Portanto, o gênero é extraído da matéria, embora não seja matéria, como se evidencia que o corpo é chamado assim por ter tal perfeição que permite que três dimensões sejam designadas nele; tal perfeição tem uma relação material com uma perfeição adicional.
A diferença, por outro lado, é como uma denominação tomada da forma de maneira determinada, além do que, do primeiro entendimento dela, seja matéria determinada, como se observa quando se diz "animado", ou seja, aquele que possui alma; não se determina o que é, se é corpo ou outra coisa. Portanto, Avicena diz que o gênero não é compreendido na diferença como parte de sua essência, mas apenas como um ser fora da essência, assim como o sujeito é do entendimento das paixões. E por isso o gênero não é predicado da diferença de maneira absoluta, como diz o filósofo na III Metafísica e na IV dos Tópicos, a menos que, de alguma forma, como um sujeito, se predique sobre a paixão.
Porém, a definição ou espécie abrange ambos, ou seja, a matéria determinada, que o nome do gênero designa, e a forma determinada, que o nome da diferença designa.