6 - Avançar mais além não é permitido
Acreditamos ter mostrado que os argumentos a favor da androginia de Adão não têm valor algum. Agora é necessário examinar aqueles que a mesma escola esotérica ainda avança em relação a uma pretendida androginia arquetípica, sediada no próprio seio da Divindade. Os doutrinários desta escola estimam que, de duas coisas uma, ou bem Cristo seria ele mesmo andrógino como sendo o modelo de Adão, ou bem existiria um demiurgo andrógino, mais primitivo e mais essencial na mente divina, do qual Cristo e Sua Mãe não seriam mais do que os produtos da bipartição.
Reduzamos, portanto, nossas ambições e vejamos apenas de que maneira os esoteristas estabelecem seu raciocínio. Eles o baseiam em uma constatação inicial que é correta, ou seja, que no casal humano, o homem provém de um pensamento divino de justiça e a mulher de um pensamento divino de misericórdia. E de fato, não há nada a dizer sobre isso. Mas eles vão tirar desta constatação correta consequências que já não o serão.
O arquétipo universal, dizem eles, deve reunir, associar e harmonizar a justiça e a misericórdia que são os dois grandes atributos divinos. Portanto, para eles, o arquétipo universal não pode ser senão andrógino, reunindo assim a justiça e a misericórdia, o princípio masculino e o princípio feminino.
Existem duas contradições ali, cuja refutação completa nos levaria a longas considerações teológicas, porque elas introduzem perturbações nas relações entre o Criador e a criatura. Digamos apenas, para nos resumir, que o andrógino arquetípico substitui a hierarquia normal do Criador e da criatura por uma relação de igualdade. O elemento masculino, de fato, representa o Criador, e o elemento feminino, a criatura. Mas no seio de um andrógino, não existe qualquer precedência, qualquer prioridade cronológica, do primeiro sobre o segundo, e portanto nenhuma hierarquia entre o representante do Criador e o da criatura. Assim se pode resumir a principal perturbação teológica introduzida pela androginia arquetípica. Mas ela ainda provoca outras e tudo isso nos levaria muito longe.
A escola esotérica, que também podemos chamar de escola gnóstica, está, mais uma vez, em contradição com a doutrina da Igreja, a qual ensina que o arquétipo universal é o Cristo, a Palavra Encarnada, e que o Cristo não é andrógino: «Um filho nos nasceu; um Filho nos foi dado». Não há outro nome que Jesus pelo qual possamos ser salvos.
Aqui toca-se no dedo a diferença essencial entre o pensamento cristão e o pensamento gnóstico. O pensamento cristão medita a Revelação que lhe foi dada, mas não vai além; quando se depara com um mistério, contempla-o sem tentar penetrá-lo. Tal é a postura realista.
O pensamento gnóstico é guiado por uma intenção de conhecimento a todo custo, não admite ser limitado pelo mistério, quer entender até mesmo o que está acima das forças da razão humana; então, quando a Revelação não fornece explicações, ele as inventa conforme o "próprio espírito", quando não se deixa inspirar pelo "mau espírito", o que acontece frequentemente.
E aqui é o que ela faz. A escola gnóstica atual vê muito exatamente que o homem é resultado de um pensamento divino de justiça e a mulher de um pensamento divino de misericórdia, mas então ela prolonga essa constatação exata com uma invenção explicativa: associa esses dois pensamentos divinos para criar um andrógino arquetípico, apesar das idiotices e sacrilégios aos quais conduz tal mito. Porque, afinal, aqui está uma entidade, um fantasma que vem se interpôr entre o Cristo e Deus e ocupar precisamente o lugar que Lúcifer ambiciona.
Vamos agora raciocinar como cristãos. A coexistência da justiça e da misericórdia é obviamente muito misteriosa, pois, de certa forma, elas se opõem. Na Santíssima Trindade, há a distinção das pessoas e a unidade da substância: o Pai é distinto do Filho e do Espírito Santo, mas o Pai não é "algo diferente" do Filho e do Espírito Santo, como afirma vigorosamente São Atanásio em seu símbolo. Em Deus, tudo é simples. Há o atributo da justiça e o atributo da misericórdia. Mas a justiça não é algo diferente da misericórdia. Estes são mistérios que devemos apenas contemplar, sem inventar um andrógino sob o pretexto de torná-los inteligíveis.
Pio IX, em sua allocução "Singulari quidem" de 9 de dezembro de 1854, trata justamente desta questão dos relacionamentos entre a justiça e a misericórdia:
«Longe de mim, veneráveis irmãos, que nos atrevamos a colocar limites à misericórdia de Deus, que é infinita; longe de nós que queiramos sondar os conselhos e julgamentos ocultos de Deus, abismos imensos onde a mente do homem não pode penetrar... Quando, livres das restrições físicas, vermos Deus como Ele é, compreenderemos qual elo estreito e belo une em Deus a misericórdia e a justiça. Agora que estamos nesta moradia terrena, acreditem firmemente, segundo a doutrina católica, que há um Deus, uma Fé, um batismo; ir além em nossas pesquisas não é mais permitido».
Estas palavras de Pio IX contêm mais verdadeira sabedoria, mais cultura religiosa, mais experiência sobrenatural do que todas as grotescas e blasfemas invenções da gnose, antiga e moderna.
Terminamos nossa série de cinco capítulos sobre o tema do simbolismo da Cruz. O primeiro estava reservado para o significado sobrenatural da Cruz do Calvário.
O segundo apresentava o simbolismo metafísico que R. Guénon dá à Cruz, após sofrer transformações que a desfiguram completamente.
Depois, fomos levados a dedicar dois capítulos ao mito do andrógino porque R. Guénon, tendo excluído Cristo da cruz metafísica, nele faz figurar o homem universal que descreve como andrógino; o estudo deste mito nos pareceu necessário para explicar o verdadeiro sentido do simbolismo metafísico da cruz. O último capítulo está reservado, para encerrar, à refutação de um mito que é absolutamente estranho à Tradição apostólica.
Não há outro arquétipo além de nosso Senhor Jesus Cristo.
«Ele é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação; porque nele todas as coisas foram criadas, as que estão nos céus e as que estão na terra... Ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem nele. Ele é a cabeça do corpo, que é a Igreja, ele que é o início... Pois agradou ao Pai que toda a plenitude habitasse nele... Digo isto para que ninguém vos seduza com argumentos persuasivos» (Col. I, 15-19 e II, 4).