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11 - Adam-Kadmon

Se, sob o império da antiga lei, os Doutores da Sinagoga conseguiram afastar da religião judaica essa noção turva e prejudicial do andrógino, o mesmo não aconteceu, após a ruína de Jerusalém, com os Rabinos que organizaram as novas comunidades. Os mitos pagãos, antes mantidos de maneira mais ou menos precária à margem, tornaram-se, entre os contemplativos da Diáspora, verdadeiros temas de meditações místicas. Dois desses temas são inspirados, de perto e de longe, no antigo Hermafrodita. São eles: Adam-Kadmon e a árvore sefirótica.

Adam-Kadmon é o equivalente judaico do "Homem Universal" do Islã. É considerado o arquétipo da humanidade no pensamento divino; muitas vezes é representado como andrógino ou, melhor dizendo, assexuado. Adam-Kadmon é uma entidade teológica; não deve ser confundido com o Adão terrestre descrito no Gênesis por Moisés. Adam-Kadmon é um homem teórico e arquetípico.

Mas o primeiro homem terrestre, também ele, o Adão do Gênesis, é declarado andrógino nos comentários bastante livres que formam a literatura cabalística. Às vezes, Adão e Eva são representados como formando originalmente um único ser, análogo ao andrógino de Aristófanes; às vezes, é apenas Adão que é homem à direita e mulher à esquerda, antes de ser dividido por Deus em duas metades. Em todos esses comentários androgínicos, o texto hebraico do Gênesis é amplamente transgredido e serve apenas para justificar elucubrações sem regra.

O segundo tema cabalístico no qual o andrógino aparece é a árvore sefirótica. Mais do que uma árvore, é um esquema que reúne as famosas Dez Sefirot. No singular, cada Sephira pode ser definida de duas maneiras. Uma Sephira é um número divino criador: Deus teria feito suas obras ao pronunciar certos números cuja mera evocação possuía um poder criativo. Mas uma Sephira também é um atributo divino, mais ou menos personificado.

O gráfico que reúne as dez sefirot apresenta, grosso modo, a forma de uma árvore; daí o nome "árvore sefirótica". Diz-se que as entidades das quais são compostas podem ser divididas em dois grupos: o grupo masculino à direita e o grupo feminino à esquerda.

Assim, a árvore sefirótica é andrógina, tendo um lado masculino e um lado feminino. Em suma, entre os judeus da Diáspora, encontramos a androginia não apenas no ancestral comum dos homens, mas também em Deus, como vimos nos mitos do paganismo.

Seria isso a conservação de um vestígio da antiguidade gentílica, ou seria uma nova elaboração dos contemplativos da cabala? É essa segunda hipótese que é sugerida no livro de Scholem "Os Grandes Correntes da Mística Judaica".

Veremos, em nossa refutação, que o texto do Gênesis de forma alguma obriga a concluir a androginia de Adão. Pelo contrário. Pois, em um próximo capítulo, após completarmos a linha que conduziu o andrógino até os nossos dias, faremos a crítica deste ponto de vista da ortodoxia cristã e tentaremos determinar de que inspiração esse estranho mito pode ser fruto.

Notas

  1. Essa alegação de Guénon é uma mentira; na verdade, o Gênesis (I, 27) diz: "macho e fêmea os criou" (Nota do Editor).
  2. Edição Saint-Rémi.
  3. Heresiarcas gnóstico do século II d.C.; Nasceu no Egito e ensinou em Roma (Nota do Editor).