ÚLFILAS E O ARIANISMO VISIGODO
As decisões do Concílio Ecumênico de Nicéia, exploradas com diligência pelo Imperador Teodósio, o Grande, puseram fim ao arianismo que assolava o interior do Império. Mas em quais condições essa heresia se manteve entre os povos bárbaros que ocupam a periferia?
Um século antes, os godos se estabeleceram no vale do Danúbio: os ostrogodos na margem oriental e os visigodos na margem ocidental. Ora, esses dois povos praticam o arianismo devido às seguintes circunstâncias.
Eles foram evangelizados pelo bispo Úlfilas, que acabou por desfrutar de um imenso prestígio entre eles. Ele havia traduzido as Escrituras Sagradas para a língua gótica e, por causa disso, era considerado como um novo Moisés. Ora, ele aderiu ao arianismo sem medir bem, dizem, as consequências futuras dessa adesão. Os povos godos, tanto os do Oeste quanto os do Leste do Danúbio, seguiram cegamente seu novo Moisés. E assim se tornaram todos arianos. E permaneceram arianos enquanto as populações do interior do Império já não o eram.
Quando os godos deixaram suas residências danubianas e iniciaram suas migrações para o Sul e Oeste, para se aproximarem do Mediterrâneo e do Oceano, reintroduziram no Império um arianismo que havia sido extirpado cinquenta anos antes, principalmente pelo zelo católico de Teodósio.
Em 410, Alarico I, rei dos visigodos, aproveita a ausência de Honório, que está em Ravena, para tomar Roma. Ele se prepara para passar para a Sicília quando morre antes de realizar esse projeto. Seu sucessor, Ataulfo, faz a paz com Honório, que havia retornado a Roma. O Imperador cede-lhe a Gália Narbonense e a parte da Espanha situada ao norte do Ebro, o rio de Saragoça. A partir dessa primeira base, o reino visigótico se expande rapidamente para todo o vale do Garona. Essa é a origem do reino visigótico da Aquitânia, cuja capital é Toulouse.
Os primeiros reis visigodos da Aquitânia, embora permanecessem arianos, mantiveram boas relações com a população e o episcopado católicos. Essa política flexível se impôs aos visigodos durante todo o reinado de Honório, último imperador romano do Ocidente.
Mas quando Odoacro toma Roma e depõe Honório, a autoridade federativa do Império desmorona e Eurico, que se tornou rei dos visigodos após a morte de Ataulfo, aproveita para romper todos os laços de lealdade com Roma e expande os limites da monarquia visigótica, primeiro na Espanha, ao sul do Ebro, e depois na Gália, até o Loire e o Ródano. Ele sonha, aliás, em conquistar todo o resto da Gália, que a queda do Império Romano deixou sem defesa.
Ao mesmo tempo, Eurico retoma uma política de arianização. Ele impõe, sobre os territórios que ocupa na Gália, um jugo cada vez mais pesado. Exila os bispos que resistem a ele e proíbe que se substituam aqueles que morrem. Algumas sedes episcopais permanecem assim muitos anos sem titulares. As populações e o clero católicos suportam cada vez mais mal o autoritarismo ariano dos visigodos.
Eurico morre em 485 e Alarico II lhe sucede no trono visigótico de Toulouse. Ele está decidido a praticar uma política menos restritiva em relação aos católicos da Gália, mas não consegue desarmar a desconfiança deles. Pois os olhares dos galo-romanos agora se voltam para Clóvis e para os francos, cujos sucessos militares acabaram de mostrar a eficácia na defesa das fronteiras setentrionais. Lembra-se, pois foi apenas há quarenta anos, da ação decisiva de Meroveu nos Campos Cataláunicos na batalha que repeliu os hunos e que durou três dias, 20, 21 e 22 de setembro de 451.
O próprio Clóvis acaba de pôr fim ao reino anacrônico que havia sido constituído pelo general romano Siágrio, entre Troyes e as costas da Mancha, ele o expulsou de Soissons, sua capital, em 486.
Se deixarem os visigodos conquistar a Gália, eles a mergulharão novamente nos erros e desordens do arianismo, e isso ainda mais certamente porque os burgúndios são arianos e também ariano é Teodorico, rei dos ostrogodos (a não ser confundido com Teodósio, imperador de Roma e de Constantinopla). Teodorico acaba de expulsar Odoacro de Roma; ele próprio se instalou lá e exerce uma autoridade quase imperial. É realmente necessário conter a dominação dos príncipes arianos sobre a Gália. E quem pode fazer isso melhor do que Clóvis? É o que pensa São Remígio, que é arcebispo de Reims desde 461.