Capítulo IV - Os Gurus de Laboratórios
- A Gnose de Princeton
- O Politeísmo Moderno
- Mais uma vez os Grandes Iniciados
- Os Participantes Profetas
- A Gnose Anexa a Ciência
A Gnose de Princeton
Raymond Ruyer, professor da Universidade de Nancy, sinalizou em 1974 a existência de um grupo gnóstico americano que ele considerava muito influente. Ele declarava compartilhar as ideias deste grupo e até mesmo as fazer inteiramente suas. Essas ideias, ele as expõe em dois livros que marcaram época, ambos publicados pela Éditions Fayard: "A Gnose de Princeton" (1974) e "Os cem próximos séculos" (1977) com o subtítulo: "O destino histórico do homem segundo a nova gnose americana".
Ele apresenta esta doutrina, explicitamente e com insistência, como sendo uma gnose e, portanto, como aparentada à gnose dita histórica, isto é, aquela dos séculos II e III de nossa era, da qual se afasta apenas em certos pontos que não são essenciais.
Esta gnose modernizada consiste principalmente, sob a pena de Raymond Ruyer, em uma futurologia de ampla amplitude que se estende por uma duração de cem séculos, ou seja, dez milênios. E é uma futurologia unicamente científica, já que não recorre a nenhum dado profético proveniente da Escritura ou da Tradição. Aliás, o lugar da religião cristã neste sistema é praticamente nulo. Ela é considerada como ultrapassada e como tendo feito seu tempo. E é precisamente para substituí-la, já que está moribunda e até mesmo morta, que é necessária uma gnose científica. Reconhece-se aí as disposições de espírito de Auguste Comte em sua religião positivista.
«Este sistema cristão, abandonado de fato pelo clero, escreve R. Ruyer, não ressuscitará tal qual. Mas será necessário algo análogo que unifique, como o sistema cristão, a preocupação com a imortalidade pessoal, familiar, e a preocupação com a longa duração do povo». ("Os cem próximos séculos", p. 292).
O Politeísmo Moderno
O Professor Ruyer esclarece que se trata realmente de uma gnose e não de uma simples futurologia. E, de fato, encontramos nela traços de parentesco com a gnose histórica. Existe primeiro, no sistema de Princeton, um "Princípio Supremo" muito semelhante ao "Princípio Universal" de Simão, o Mago, e ao de R. Guénon. É a consciência cósmica à qual R. Ruyer dá diferentes nomes, muito esclarecedores sobre a concepção que ele faz dela: "a grande consciência", "o gênio misterioso da vida", "a lei sobre-humana", "a norma invisível", "a norma todo-poderosa", "a consciência total do espaço-tempo".
A grande consciência de Princeton possui todos os atributos do Princípio Supremo do hinduísmo? Talvez não. Mas ainda assim ela exerce a função de divindade, pois é objeto de contemplação por parte de alguns contemplativos mais ou menos especializados.
A produção de "consciências coletivas" é dada como um fenômeno absolutamente geral. Ela ocorre em todos os agregados e em todas as massas feitas de unidades reunidas, sejam essas unidades elementares materiais ou espirituais. Inobserváveis nos agregados de pouca importância, as consciências coletivas adquirem um valor enorme quando se trata de povos inteiros ou de constelações siderais. Haveria assim, no universo, não apenas uma grande consciência total, mas consciências coletivas subdivididas, espécies de pulsões gregárias parciais se impondo aos indivíduos. Elas desempenhariam o papel de divindades subalternas. Inevitavelmente, pensamos não apenas nos deuses do politeísmo antigo, mas também nos Eones e Arcontes das teogonias gnósticas e platônicas. Compreende-se que R. Ruyer tenha dado ao sistema de Princeton o nome de gnose, não obstante sua aparência "científica" ultramoderna.
Mais uma vez os Grandes Iniciados
Esse sistema também é gnóstico pelo sincretismo que forma sua estrutura. Ele apresenta todas as religiões como equivalentes e miscíveis. Portanto, não é surpreendente ver reaparecer a teoria dos Grandes Iniciados, tornada célebre em nossos dias por Édouard Schuré, mas que é muito mais antiga que ele.
Na verdade, encontramo-la formulada já no século III d.C. por Mani, primo dos gnósticos, nos primeiros parágrafos de seu Shapourakan:
"A sabedoria e as obras sempre foram reveladas ao mundo pelos enviados de Deus. Assim, em determinada época, elas foram trazidas à Índia pelo enviado chamado Buda, em outra, por Zoroastro à Pérsia, em outra ainda por Jesus ao Ocidente. Finalmente, esta revelação presente desceu, esta profecia se manifestou nesta idade suprema para mim, Mani, o mensageiro do deus da verdade no país da Babilônia". (Mani, século III d.C.).
Em "Os cem próximos séculos", R. Ruyer mostra por sua vez sua inclinação por esta doutrina:
"...os fundadores religiosos não batizam simplesmente um século, eles abrem uma nova era, como Moisés, Buda, Jesus Cristo, Maomé. Assim, vemos neles deuses, enviados de deus e pelo menos "grandes iniciados" aos segredos dos deuses, e não simples mortais ou simples super-homens". (página 110)
Os Participantes Profetas
Outro traço de parentesco da gnose de Princeton com a gnose antiga é o modo de aquisição do conhecimento religioso pela via do misticismo. Reconhecendo o peso psicológico da "grande consciência", constatando a atração, quase mágica, exercida por ela sobre todo espírito, os sábios da sociedade futura se colocarão à sua escuta para transmitir aos homens os grandes impulsos que ela gera.
Entre os gnósticos de Princeton, alguns, por sua aptidão à contemplação, se tornarão os mediadores da "norma invisível":
"Pode-se prever", escreve R. Ruyer, "novas religiões" gnósticas-científicas "cujos cleros não serão constituídos por sábios enquanto tais, mas por todos os participantes dos grandes seres do cosmos". (página 289)
Esses participantes serão místicos que transmitirão à humanidade as inspirações extraídas da contemplação dos grandes seres. E se nos perguntarmos que forma tomará esse neo-misticismo científico, R. Ruyer nos responderá:
"Essa participação poderá tomar todas as formas, desde a eventual comunicação por rádio com outras humanidades ou espécies inteligentes, até a participação psíquica por consciência transcendente, por transe ou outros processos psíquicos ou orgânicos com a consciência da espécie ou com a consciência total do espaço-tempo". (página 289)
R. Ruyer especifica mesmo os poderes que se poderá conceder a esses novos videntes gnósticos, esses homens ao mesmo tempo sábios e místicos. Ele os chama de "participantes-profetas" e eis o que ele diz a respeito:
"Os participantes-profetas estarão em condições, ou se julgarão em condições, de dar à humanidade e aos poderes temporais, cuja docilidade será intermitente, missões e direções. Seus discípulos, constituídos em um clero mais institucional, comentarão e explicarão aos fiéis as instruções sobre-humanas e as comunicações sagradas". (página 289)
Assim, a futura religião gnóstica será alimentada pelo misticismo. Mais ainda, as almas dos falecidos participarão dessa alimentação permanente:
"O novo sistema poderá ser uma crença na reencarnação, uma crença na transformação da alma dos falecidos em espíritos protetores, capazes de se comunicar pessoalmente com os vivos, ao mesmo tempo que participam das comunicações sagradas com os grandes seres sobre-humanos" (Os cem próximos séculos).
Vemos que o espiritismo de Allan Kardec também faz parte desse amálgama.
A Gnose Anexa a Ciência
Já se percebe, em R. Ruyer, uma metamorfose que deve chegar a seu pleno florescimento com R. Abellio: a saber, a espiritualização gnóstica da ciência quantitativa. Uma vez que apreende o espírito cósmico, a ciência atinge a divindade e se torna religião:
"A fé possível para o futuro é mais a fé em uma ciência além da ciência positiva, em uma ciência reencontrando os grandes seres vivos por si mesmos em uma natureza animada, misteriosa, mágica e participável, natureza ou antes cosmos vivo, onde o homem, como indivíduo e como espécie, desempenha um papel obscuro, mas que ele pode pressentir e aprender a conhecer cada vez melhor, comunicando-se com os grandes seres do cosmos". (Os Cem Próximos Séculos, página 288).
Não se encontra explicitamente nos escritos de R. Ruyer o emanatismo que forma o fundamento da teologia gnóstica. Nele, ao contrário, os "grandes seres" parecem não ser produtores do universo, mas antes produzidos pelo universo, do qual eles personificam o automatismo, já que são chamados de "normas invisíveis". Mas como entender que o universo tenha produzido seus próprios legisladores? Tudo isso é de uma teologia bastante simplista.
Quanto à escatologia, ou seja, a ciência das "últimas coisas", ela não é claramente definida como cíclica, como é geralmente a escatologia gnóstica. A gnose de Princeton é uma futurologia indefinidamente prolongada, em um tempo sem limite, onde se distingue apenas uma vaga alternância de civilizações e barbáries. Obviamente, não há nesta construção toda, nem juízo final, nem inferno, nem reino eterno.
O professor Ruyer não engana seus leitores quando dá o nome de gnose ao sistema que ele expõe. Encontra-se ali, de fato, em um sincretismo muito amplo, o princípio supremo: os eões, os arcontes, e na terra, os "participantes" contemplativos dedicados à escuta dos grandes seres e aos quais o cristão pode dar de antemão e sem risco de se enganar, os nomes de falsos místicos e de falsos profetas.