MISTÉRIO DA INIQUIDADE: Investigação Teológica, Histórica e Canônica
- MISTÉRIO DA INIQUIDADE: investigação teológica, histórica e canônica
- Prefácio de Mons. Dolan
- Prefácio
- Introdução
- A. Algumas citações surpreendentes
- B. O plano maçônico de infiltração na Igreja romana
- C. Investigação Teológica, Histórica e Canônica
- Investigação Teológica: A Infalibilidade Papal
- 1. PODE UM PAPA DESVIAR-SE DA FÉ?
- A. A prefiguração da infalibilidade pontifical pela cátedra de Moisés
- B. Os Evangelhos
- C. Os Pais da Igreja
- São Tomás de Aquino
- E. Os Papas
- 2. É possível que um papa ensine um erro na fé?
- 3. UM PAPA PODE CAIR EM HERESIA COMO 'DOCTOR PRIVADO'?
- A. A rejeição da noção de "doutor privado" pelos Padres do Vaticano
- B. São Bellarmino refuta os partidários da tese do "doutor privado herege"
- C. Os Padres do Vaticano comentam o "Formulaire d'Hormisdas": os pontífices romanos são "IMUNIZADOS contra o erro"
- D. Um papa "JAMAIS" falhará na fé: esse é o dogma definido por Pio IX e pelos Padres do Vaticano!
- 4. A HISTÓRIA ECLESIÁSTICA CONHECE CASOS EM QUE UM PONTÍFICE APOIOU UMA HERESIA?
- A. Das fábulas caluniosas, cem vezes refutadas
- B. São Pedro
- C. São Libério
- D. Honório I
- E. João XXII
- 5. DOS MOVIMENTOS HERÉTICOS QUE ESTÃO NA ORIGEM DA NEGAÇÃO DA INFALIBILIDADE PAPAL
- A. Os cortesãos de Luís da Baviera
- B. O atentado contra o papa Bonifácio VIII
- C. Os carrascos de Santa Joana d'Arc
- D. O grande cisma do Ocidente
- E. Os galicanos
- F. Os Hussitas
- G. A Heresia de Pedro de Osma
- H. Os protestantes
- I. Os jansenistas
- J. Os febronianos
- K. Os maçons
- L. Os velhos católicos
- M. Os modernistas
- Inquérito Histórico: Infiltrações Antigas e Recentes
- UMA CINQUENTA DE ANTIPAPAS
- A. Algumas informações estatísticas
- B. Usurpadores heréticos ou flertando com os hereges
- C. "Anacleto II"
- D. Rampolla
- Conclusão
- Uma Centena de Conciliábulos
- VATICANO II: CONCÍLIO INFALÍVEL OU CONCILIÁBULO FALÍVEL
- A. Vaticano II: pastoral ou dogmático?
- B. Magistério infalível extraordinário ou ordinário?
- C. Valor de Obligação do Vaticano II
- D. Contradição entre o Vaticano II e a doutrina católica
- E. É permitido contestar este concílio?
- Conclusão
- 9. WOJTYLA É CATÓLICO?
- A. Uma doutrina heterogênea
- B. Wojtyla aprovou ex cathedra heresias?
- C. "Eu creio em Deus, Pai Todo-Poderoso" [ERROS SOBRE O PODER POLÍTICO]
- D. Eu creio em Deus, "Criador de todas as coisas" [EVOLUCIONISMO]
- E. Eu creio "em um só Senhor, Jesus Cristo" [O CRISTO-REI DESTRONADO PELO HOMEM-REI]
- F. Eu creio no "Filho único de Deus" [JESUS NÃO É O MESSIAS]
- G. Eu creio que o Filho é "consubstancial ao Pai" ["DA MESMA NATUREZA" SEGUNDO ÁRIO E A IGREJA CONCILIAR]
- H. Eu creio que "Ele se encarnou da Virgem Maria" [ATAQUE CONTRA O DOGMA DA IMACULADA CONCEIÇÃO]
- I. Eu creio que "Ele desceu aos infernos" [HERESIA DE ABELARDO E DE CALVINO]
- J. Eu creio que "Ele subiu aos céus" [FICÇÃO METAFÓRICA]
- K. Eu acredito que Ele 'voltará para julgar os vivos e os mortos' [HERESIA DE ZANINUS DE SOLCIA AMPLIFICADA POR WOJTYLA]
- L. Eu creio no Espírito Santo" [TRÊS PECADOS WOJTYLIANOS CONTRA O ESPÍRITO SANTO]
- M. Eu creio "na Igreja una, santa, católica e apostólica" [A RELIGIÃO À LA CARTE]
- INQUÉRITO CANÔNICO: A VISIBILIDADE DA IGREJA
- UM NÃO CATÓLICO PODE SER ELEITO PAPA?
- A. Uma lei de direito divino
- B. Um princípio constante da legislação apostólica bimilenar
- C. A constituição apostólica Cum ex apostolicum (1559) do papa Paulo IV
- D. Paulo IV emitiu um julgamento ex cathedra
- E. O Papa São Pio V ordena que as prescrições de Paulo IV sejam "observadas inviolavelmente"
- F. O Papa São Pio X faz inserir a bula de Paulo IV no código de direito canônico
- G. O Papa Pio XII confirma a inelegibilidade dos não-católicos para o pontificado supremo
- Conclusão
- RONCALLI, MONTINI, LUCIANI E WOJTYLA DESVIARAM-SE DA FÉ ANTES DE SUA ELEIÇÃO?
- A. O juramento antimodernista de São Pio X traído
- B. Aplicação prática da lei a Angelo Roncalli
- C. Aplicação prática da lei a Giovanni Battista Montini
- D. Aplicação prática da lei a Albino Luciani
- E. Aplicação prática da lei a Karol Wojtyla
- Conclusão
- O TRONO PAPAL PODE SUBSISTIR TEMPORARIAMENTE SEM PAPA?
- Ausência de Papa
- Conclusão
- AS QUATRO MARCAS DA IGREJA VISÍVEL
- A. A marca da unidade
- B. A marca da santidade
- C. A marca da catolicidade
- D. A marca da apostolicidade
- A Igreja conciliar não possui as quatro notas da Igreja visível!
- Conclusão
- CONCLUSÃO
- A. A invalidade dos Conclaves
- B. A "ABOMINAÇÃO DA DESOLAÇÃO NOS LUGARES SANTOS"
- C. APOLOGIA DA IGREJA ROMANA
- D. A VIRTUDE DA ESPERANÇA
- Posfácio
- ANEXOS
- ANEXO A: Honório I, um papa "brilhante pela sua doutrina", que "instruiu eruditamente o clero"
- A. A ortodoxia de Honório comprovada pelos testemunhos de seus contemporâneos e por seus próprios escritos
- B. Primeiras Falsificações (640-649) Contra Honorius, Desmascaradas pelos Contemporâneos do Papa Falecido
- C. A falsificação dos atos do VI Concílio Ecumênico (680-681)
- D. Fraudes dos Gregos contra Honório definitivamente condenadas pela Igreja
- E. Os trabalhos históricos que tratam Honorius como herege são proibidos pela Igreja.
- ANEXO B: A bula de Paulo IV inserida no direito canônico
- ANEXO C: O que é um "herege"?
- A. A Pertinácia
- B. Ninguém está isento de ignorar o magistério
- C. Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla são pertinazes?
- D. Os hereges não fazem parte da Igreja
- BIBLIOGRAFIA
MISTÉRIO DA INIQUIDADE: investigação teológica, histórica e canônica
"O mistério da iniquidade está em formação desde agora, aguardando apenas que o obstáculo que o retém desapareça" (São Paulo).
INIQUIDADE (adj.): Que falta gravemente à equidade, muito injusto. Ação iníqua, usurpatória.
INIQUIDADE (s.f.): Corrupção dos costumes; depravação, estado de pecado. Ver ilegalidade. Ver crime, usurpação. (Paul Robert: Dicionário Alfabético e Analógico da Língua Francesa, Paris 1981).
A Nossa Senhora de La Salette, que como mãe previdente nos anunciou tudo e nos quer em seu exército.
A Nossa Senhora do Sagrado Coração, que sempre nos tem ajudado.
A São José, protetor da Santa Igreja.
Ao papado, que nos guiou ao longo de nossa investigação sobre o "mistério da iniquidade". Pois, como disse São Tomás de Aquino (Quaestiones quodlibetales, q. 9, a. 16):
"É preciso seguir a sentença do papa, a quem compete pronunciar em matéria de fé, mais do que a opinião de todos os sábios".
Prefácio de Mons. Dolan
Queridos amigos,
Agradeço-lhes pelo envio de "O Mistério da Iniquidade", o qual li com grande interesse. Sua apresentação gráfica atraente e clara destaca um estilo lúcido e lógico.
Estou convencido de que este livro contribuirá significativamente para o estudo e o debate sobre os elementos cruciais que permitem entender como a Igreja tem sido atacada em nosso tempo.
Acho particularmente impressionante sua apresentação dos abundantes juízos do magistério da Igreja, bem como dos escritos de muitos teólogos e santos. Alguns desses textos são quase desconhecidos, e vocês prestaram um grande serviço aos católicos ao trazê-los à luz.
Isso esclarecerá muitos debates que, infelizmente, com frequência descem ao nível de opiniões pessoais, de argumentos destinados a servir interesses próprios, e de teorias complicadas.
A argumentação de um homem vale apenas tanto quanto valem as autoridades que ele cita -- e seus argumentos, queridos amigos, são realmente fortes!
Que Deus os abençoe, a vocês e ao seu trabalho.
Em Jesus e Maria,
Mgr Daniel L. Dolan
Prefácio
"Se conseguirmos demonstrar que todas as 'novidades' que hoje perturbam a Igreja são apenas antigas heresias constantemente condenadas por Roma, poderemos concluir que a Igreja, neste fim do século XX, está sendo ocupada por uma seita estrangeira, exatamente como um país pode ser ocupado por um exército estrangeiro" (Jacques Ploncard d'Assac: L'Église occupée, Chiré-en-Montreuil 1975, segunda edição 1983, p. 7).
Nesta guerra das ideias, os escritores católicos têm o dever de soar o alarme.
"Soai, soai sempre, clarins do pensamento" (Victor Hugo: Les châtiments, 1853, livro VII, cap. 1).
"Ninguém imagine que seja proibido aos particulares cooperar de certa maneira neste apostolado, especialmente aqueles a quem Deus concedeu dons de inteligência com o desejo de se tornarem úteis. Sempre que a necessidade o exige, eles podem facilmente, não assumindo o papel de doutores, mas comunicando aos outros o que eles mesmos receberam, e ser, por assim dizer, o eco do ensinamento dos mestres. Além disso, a cooperação privada foi considerada tão oportuna e fecunda pelos Padres do Concílio Vaticano que eles acharam necessário exigir formalmente: 'Todos os fiéis cristãos', dizem eles, 'especialmente aqueles que presidem ou têm a responsabilidade do ensino, nós os suplicamos pelas entranhas de Jesus Cristo, e lhes ordenamos, pela autoridade deste mesmo Deus Salvador, que dediquem seu zelo e sua ação para afastar e eliminar esses erros da Santa Igreja, e para espalhar a luz da fé mais pura' (constituição Dei Filius, passagem final). Portanto, que cada um se lembre que pode e deve espalhar a fé católica pela autoridade do exemplo, e pregá-la pela firmeza da profissão que faz dela. Assim, nos deveres que nos ligam a Deus e à Igreja, uma grande importância é dada ao zelo com o qual cada um deve trabalhar, na medida do possível, para propagar a fé cristã e repelir os erros" (Leão XIII: encíclica Sapientiae christianae, 10 de janeiro de 1890).
O presente estudo pretende ser simplesmente o 'eco' do magistério, uma coleção de documentos e textos da Igreja una, santa, católica, apostólica e romana.
"O mistério da iniquidade", escreve o apóstolo São Paulo, "já está em ação, aguardando apenas que o que o detém agora desapareça" (2 Tessalonicenses II, 7). Quando a fé tiver desaparecido praticamente por toda parte e a apostasia geral tiver chegado, então o Anticristo se manifestará.
Segundo São Paulo, o Anticristo "se assentará no Templo de Deus" (2 Tessalonicenses II, 4). Comentando este texto paulino, Santo Agostinho ensina que o Anticristo será um indivíduo, mas que também podemos aplicar o termo "Anticristo", de forma figurada, a toda uma sociedade anticristã. Esse Anticristo coletivo, que deve preparar o caminho para o Anticristo individual, se assentará "in templo Dei". Em latim, observa Santo Agostinho, a preposição "in" pode ser traduzida como "dentro" ou "no lugar de". A expressão "in templo Dei" pode, portanto, ser interpretada tanto literalmente quanto de forma figurada.
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No sentido literal, será um homem que entrará no Templo para ser honrado pessoalmente como um ser divino.
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No sentido figurado, será uma sociedade apóstata, uma falsa Igreja que usurpará o lugar da verdadeira Igreja. Será uma sociedade de apóstatas que se erguerá como "Templo de Deus", um grupo de infiltrados que pretenderá representar a Igreja de Cristo. "Este trecho, que se refere ao Anticristo, aplica-se não apenas ao príncipe dos ímpios, mas de certa forma a todos aqueles que estão com ele, isto é, à multidão de homens que lhe pertencem". Deve-se interpretar não "dentro do Templo de Deus", mas sim "como Templo de Deus", como se o próprio Anticristo fosse o Templo de Deus, que nada mais é do que a Igreja" (Santo Agostinho: Cidade de Deus, livro XX, capítulo 19). Assim, o Anticristo será (ou já é!) uma seita herética que pretende representar a Igreja católica.
Santo Agostinho relata como se desenrolará o triunfo no grande dia do mistério da iniquidade. "Outros pensam que as palavras 'vós sabeis o que o detém' (2 Tessalonicenses II, 6) e 'já está em ação o mistério da iniquidade' (2 Tessalonicenses II, 7) se referem apenas aos maus e aos simuladores que estão dentro da Igreja. Até o momento em que, multiplicando-se, alcançarão um número suficiente para formar o grande povo do Anticristo. É o mistério da iniquidade, porque se esconde. As palavras do Apóstolo seriam então um exortação aos fiéis para permanecerem firmes na fé [...] 'até que isso se manifeste saindo do meio', ou seja, até que o mistério da iniquidade, que está momentaneamente escondido, surja do meio da Igreja" (Cidade de Deus, livro XX, cap. 19).
Outra interpretação da Segunda Epístola aos Tessalonicenses merece ser mencionada aqui, mesmo que provenha de um exegeta pouco conhecido. Este exegeta é um monge francês, que viveu de 1092 a 1156. Seu nome é Pedro, o Venerável. Ele é um santo canonizado (celebração em 25 de dezembro), antigamente famoso por sua erudição, mas hoje em dia esquecido. E é uma pena, porque este autor parece ter tido uma iluminação especial para expor as Sagradas Escrituras. Aqui está, de fato, seu comentário na epístola aos Tessalonicenses, um comentário que lança uma luz singular sobre nosso tempo:
"O Cristo permitiu que o Anticristo - cabeça de todos os cismáticos - se assentasse no Templo de Deus, que os seus [os cristãos] seriam exilados, e que aqueles que não são os seus ocupariam um dia o Trono de Pedro" (São Pedro, o Venerável: De miraculis libri duo, livro II, cap. 16).
Introdução
A. Algumas citações surpreendentes
Aqui estão algumas afirmações que certamente causam perplexidade:
"Os elementos do marxismo são de natureza a levar muitos homens ao cristianismo vivido de uma maneira nova. [...] Vemos no islã, no humanismo, no marxismo, um desejo inconsciente e uma busca titubeante pelo verdadeiro rosto de Jesus Cristo, que nós, cristãos, frequentemente obscurecemos." (O Catecismo Holandês. Uma introdução à fé católica. O novo catecismo para adultos realizado sob a responsabilidade dos bispos dos Países Baixos, Paris 1968, p. 58).
"No budismo, em suas várias formas, reconhece-se a insuficiência radical deste mundo mutável e ensina-se um caminho pelo qual os homens, com um coração devoto e confiante, podem alcançar o estado de libertação perfeita, atingir a iluminação suprema por seus próprios esforços ou com ajuda vinda do alto." (declaração conciliar Nostra aetate, 28 de outubro de 1965, § 2).
"Nós oferecemos o cachimbo ao Grande Espírito, à mãe Terra e aos quatro ventos." (oração recitada a pedido de Wojtyla, em 26 de outubro de 1986 em Assis).
"Que São João Batista proteja o Islã." (oração recitada pelo próprio Wojtyla, em 21 de março de 2000).
"Eu venho a vocês, ao legado espiritual de Martinho Lutero, venho como peregrino." (encontro de Wojtyla com o Conselho da Igreja Evangélica, em 17 de novembro de 1980).
"O ateísmo proporciona um 'livre desenvolvimento espiritual'." (Wojtyla, 1º de setembro de 1980).
"Colocar o homem no altar" é próprio dos maçons (Jacques Mitterrand, 33º grau, ex-Grande Mestre do Grande Oriente).
"Nós temos o culto ao homem" (Montini: discurso de encerramento do Vaticano II, 7 de dezembro de 1965).
"Não pensamos que um maçom digno desse nome, comprometido com a prática da tolerância, não possa se regozijar irrestritamente com os resultados irreversíveis do Concílio". Os católicos devem "manter-se nessa corajosa noção de liberdade de pensamento, que, iniciada em nossas lojas maçônicas, se estendeu magnificamente sobre o domo de São Pedro" (Yves Marsaudon: O ecumenismo visto por um maçom de tradição, 1964, p. 119-121).
"Se o mundo muda, a religião não deveria também mudar? [...] Esta é exatamente a razão pela qual a Igreja, especialmente após o concílio, empreendeu tantas reformas" (Montini: audiência geral, 2 de julho de 1969).
Ao ler essas frases curiosas, não podemos deixar de fazer perguntas. Mas o que está acontecendo em Roma?
B. O plano maçônico de infiltração na Igreja romana
Aqui estão alguns trechos do plano de infiltração da Igreja romana, elaborado pela maçonaria italiana e descoberto pela polícia do Papa Pio IX: "O que devemos buscar e esperar, como os judeus esperam o messias, é um papa segundo as nossas necessidades [...] Para garantir um papa nas proporções exigidas, é primeiro necessário moldar para este papa uma geração digna do reinado que sonhamos. Deixem de lado a velhice e a idade madura; foquem na juventude [...] Em poucos anos, este jovem clero terá, por força das circunstâncias, invadido todas as funções; ele governará, administrará, julgará, formará o conselho do soberano, será chamado a escolher o pontífice que deverá reinar, e este pontífice, como a maioria de seus contemporâneos, será necessariamente mais ou menos imbuido dos princípios [...] que começaremos a disseminar [...] Que o clero marche sob sua bandeira, sempre acreditando estar marchando sob o estandarte das chaves apostólicas [...] Vocês terão pregado uma revolução em tiara e capa, marchando com a cruz e a bandeira, uma revolução que precisará apenas [...] de ser um pouco incentivada para incendiar os quatro cantos do mundo" (in: Crétineau-Joly: A Igreja romana diante da revolução, 1859, reedição Paris 1976, Livro II, p. 82-90).
Durante o Concílio Vaticano I, um alto dignitário da maçonaria se regozijou "com o apoio valioso que encontramos há vários anos em um partido poderoso, que nos serve como intermediário entre nós e a Igreja, o partido católico liberal. É um partido que devemos cuidar, e que serve aos nossos propósitos mais do que pensam os homens mais ou menos eminentes que o compõem na França, na Bélgica, em toda a Alemanha, na Itália e até mesmo em Roma, ao redor do próprio papa" (in: Monsenhor Delassus: Verdades sociais e erros democráticos, 1909, reedição Villegenon 1986, p. 399).
Léon XIII (encíclica Inimica vis, 8 de dezembro de 1892) advertiu o episcopado da Itália. "Os sectários maçons buscam seduzir o clero inferior por meio de promessas. Com que objetivo? [...] O que eles querem é gradualmente ganhar para sua causa os ministros das coisas sagradas, e então, uma vez envolvidos nas novas ideias, torná-los revoltados contra a autoridade legítima".
Léon XIII faleceu em 1903. A maçonaria desejava a eleição de um sucessor imbuido do espírito maçônico. Aqui está o retrato do candidato ideal, esboçado em 1903 pela revista maçônica Acacia: "Um papa que afrouxasse os laços do dogmatismo estendidos ao extremo, que não desse ouvidos aos teólogos fanáticos e denunciantes de heresias, que permitisse que os exegetas trabalhassem à sua maneira, limitando-se a manter uma unidade que seria mais uma solidariedade entre os diversos ramos da Igreja, que não entrasse em conflito com os governos, que praticasse e recomendasse a tolerância entre as outras religiões, inclusive em relação ao livre pensamento, que não renovasse a excomunhão da maçonaria" (Acacia, setembro de 1903, in: Leitura e Tradição, nº 94, março/abril de 1982).
Em 1903, os católicos quase tiveram como papa, em vez de Giuseppe Sarto (São Pio X), o cardeal maçom Rampolla, Secretário de Estado de Leão XIII. Ele recebeu a maioria dos votos, mas foi afastado devido à intervenção do Império Austro-Húngaro.
Apesar deste fracasso pontual, o plano maçônico funcionou muito bem. O Papa São Pio X (encíclica Notre Charge Apostolique, 25 de agosto de 1910) denunciou as infiltrações maçônicas no movimento "Le Sillon" (movimento da juventude cristã francesa). "Conhecemos muito bem os sombrios gabinetes onde se elaboram essas doutrinas deletérias, que não deveriam seduzir mentes esclarecidas. Os líderes do Sillon não puderam se defender disso: a exaltação de seus sentimentos, a cega bondade de seus corações, seu misticismo filosófico misturado com um certo iluminismo, os levaram a um novo evangelho, no qual eles acreditaram ver o verdadeiro Evangelho do Salvador, ao ponto de ousarem tratar Nosso Senhor Jesus Cristo com uma familiaridade supremamente irreverente, e, seu ideal sendo aparentado ao da revolução, eles não hesitam em fazer comparações blasfemadoras entre o Evangelho e a Revolução".
O clero também estava infiltrado. Sentindo os "modernistas" (clérigos que adotaram os princípios maçônicos do racionalismo, do subjetivismo, da indiferença em matéria de religião e da reforma da Igreja) rondando ao seu redor, este santo papa exclamou angustiado: "Inimigos da Igreja, eles certamente são, e ao dizer que não há piores, não estamos longe da verdade. Na verdade, não é de fora, como já foi observado, [é de dentro que tramam sua ruína; o perigo está hoje quase nas próprias entranhas e veias da Igreja]" (encíclica Pascendi, 8 de setembro de 1907).
Nas décadas de vinte, a conspiração havia tomado proporções alarmantes, pois não apenas o clero inferior e a juventude, mas também uma parte significativa do alto clero estavam agora militando sob a bandeira da revolução. Durante o consistório secreto de 23 de maio de 1923, Pio XI interrogou cerca de trinta cardeais da Cúria sobre a oportunidade de convocar um concílio ecumênico. O cardeal Boggiani considerou que uma parte considerável do clero e dos bispos estava impregnada de ideias modernistas. "Essa mentalidade pode levar alguns Padres a apresentar moções, a introduzir métodos incompatíveis com as tradições católicas". O cardeal Billot foi ainda mais direto. Ele expressou o temor de ver o concílio "manipulado" pelos "piores inimigos da Igreja; os modernistas, que já se preparam, como indicam certos sinais claros, para fazer a revolução na Igreja, um novo 1789" (citado em: Mgr Marcel Lefebvre: Eles a decronaram. Do liberalismo à apostasia. A tragédia conciliar, Escurolles 1987, p. 158 - 159).
Com a morte de Pio XII, o sonho da maçonaria se realizou: uma "revolução em tiara e capa". Angelo Roncalli (que havia sido iniciado em uma sociedade secreta na Turquia em 1935, e depois se afiliou a uma loja maçônica em Paris) assumiu o nome de "João XXIII". Ele convocou o Concílio Vaticano II, que revolucionou completamente a religião, por exemplo, proclamando a "liberdade de pensamento, que, partindo de nossas lojas maçônicas, se estendeu magnificamente sobre o domo de São Pedro" (Yves Marsaudon: O ecumenismo visto por um maçom tradicional, 1964, p. 121).
Os defensores da mudança são chamados de "conciliares" (nome derivado do "concílio" Vaticano II). Os oponentes se chamam "católicos" (devido ao seu apego ao catolicismo).
Desde 1958, Roma adotou uma posição contrária ao que o papado sempre ensinou. Algumas pessoas então elaboram o seguinte silogismo: toda vez que um papa não define solenemente ex cathedra um dogma, ele pode estar errado. Portanto, não somos obrigados a obedecê-lo sempre que ele ensina ou ordena algo contrário à fé. Os homens no poder em Roma desde 1958 têm proferido heresias, mas não ex cathedra. Portanto, esses homens são papas.
Outras pessoas estabelecem um silogismo diferente: o ensinamento ex cathedra é transmitido não apenas pelo modo "extraordinário" (definições solenes), mas também pelo modo "ordinário" (escritos do dia a dia). Um papa não erra em nenhum momento no campo da fé, porque ele é constantemente assistido pelo Espírito Santo, conforme a promessa formal de Cristo (João XIV, 15-17). "Como um verdadeiro papa sucessor de Pedro, assegurado da assistência do Espírito Santo, pode presidir à destruição da Igreja?" (Mgr Lefebvre, in: Bonum certamen, nº 132, Nancy). Essa falha não seria um sinal de que os homens que governam o Vaticano desde 1958 não são verdadeiros papas, mas usurpadores, ocupantes ilegítimos da Sé de Pedro?
Para abordar o problema, essas duas formas de consideração são ambas lógicas. No entanto, um silogismo pode ser lógico e ainda assim ser falso. Isso ocorre porque tudo depende das premissas das quais se chega a uma conclusão. Se uma premissa é falsa, um raciocínio logicamente correto pode levar a uma conclusão falsa. Antes de começar a raciocinar como um bom lógico, é essencial garantir que as bases sobre as quais o raciocínio se apoia correspondam à realidade. "A maioria dos erros dos homens vem menos do fato de raciocinarem mal a partir de princípios verdadeiros, do que de raciocinarem corretamente a partir de julgamentos inexatos ou princípios falsos" (Charles Augustin Sainte-Beuve: Causeries du lundi, Paris 1851-1862, t. X, p. 36).
Para evitar raciocínios vazios, empreendemos uma ampla investigação teológica, histórica e canônica. Coletamos muitas informações e documentos para estabelecer uma base muito sólida para este estudo, cujo plano será apresentado no próximo ponto.
C. Investigação Teológica, Histórica e Canônica
I. INVESTIGAÇÃO TEOLÓGICA: A INFALIBILIDADE PONTIFICAL
A premissa que precisa ser esclarecida é a seguinte: um papa pode naufragar na fé? A infalibilidade papal se manifesta apenas a cada cem anos, em uma definição solene (1854: Imaculada Conceição; 1950: Assunção)? Ou Nosso Senhor assiste o papa continuamente para impedi-lo de cair em heresia? Esta questão será abordada na primeira parte, dedicada à infalibilidade pontifical. Inclui também um capítulo sobre casos históricos de papas que supostamente falharam, como São Libério, Honório I ou João XXII.
II. INVESTIGAÇÃO HISTÓRICA: INFILTRAÇÕES ANTIGAS E RECENTES
Na segunda parte, o leitor descobrirá um fato pouco conhecido: a história da Igreja registra cerca de cinquenta antipapas e cerca de cem "conciliábulos" (= assembleias heréticas, falsos concílios). Poderia haver precedentes para a situação atual? Vamos examinar se o Vaticano II foi um concílio infalível ou um conciliábulo falível.
III. INVESTIGAÇÃO CANÔNICA: A VISIBILIDADE DA IGREJA
A terceira parte, dedicada à visibilidade da Igreja, responderá a algumas questões vitais: Um não católico pode ser eleito papa validamente? A Igreja pode subsistir sem um papa? Quais são os traços que identificam a Igreja visível?
Investigação Teológica: A Infalibilidade Papal
1. PODE UM PAPA DESVIAR-SE DA FÉ?
"A Igreja é infalível em seu magistério ordinário, que é exercido diariamente principalmente pelo papa, e pelos bispos unidos a ele, que por essa razão são como ele, infalíveis com a infalibilidade da Igreja, pelo Espírito Santo todos os dias, [...]"
Questão: A quem, então, pertence cada dia que Deus faz:
- declarar as verdades implicitamente contidas na Revelação?
- definir as verdades explícitas?
- defender as verdades atacadas?
Resposta: Ao papa, seja em concílio, seja fora do concílio. O papa é, de fato, o Pastor dos pastores e o Doutor dos doutores" (Mgr d'Avanzo, relator da Deputação para a fé do Primeiro Concílio do Vaticano, 1870).
Desde a definição do dogma da infalibilidade pontifícia em 1870, os católicos acreditam que um papa não pode se enganar quando ensina solene e oficialmente uma verdade de fé. No entanto, há opiniões divergentes quanto ao seu ensinamento ordinário. Um papa, infalível em definições solenes, pode ele cair em heresia em seu ensinamento diário, ou a assistência do Espírito Santo impede que sua fé falhe em nenhum momento de seu pontificado?
No caso de dúvida, deve-se aderir ao que foi crido em todos os lugares e por todos nos tempos antigos, pois a antiguidade não pode ser seduzida pela novidade (Commonitorium de São Vicente de Lérins, 434). A ideia de que o papa pode errar na fé surgiu na época moderna sob a influência de correntes heréticas (ver capítulo 5). Teólogos católicos foram influenciados por novas ideias e afirmaram que um papa poderia errar. No entanto, essa novidade, por ser nova, não está de acordo com a doutrina católica tradicional. Esta doutrina tradicional é encontrada no Antigo e no Novo Testamento, nos Padres da Igreja, em Santo Tomás de Aquino e nos escritos dos próprios papas.
A. A prefiguração da infalibilidade pontifical pela cátedra de Moisés
Para começar, é importante distinguir entre "infaillibilidade" e "impecabilidade"[1].
Os doutores da antiga Sinagoga eram, certamente, corrompidos, mas ainda assim infaillíveis. Assim como houve prefigurações de Cristo no Antigo Testamento, também houve uma prefiguração da infalibilidade pontifical. A cátedra de Pedro é, de fato, prefigurada pela "cátedra de Moisés".
A "cátedra de Moisés" na antiga Sinagoga era infalível. Quando uma questão religiosa ou moral era disputada ou não claramente entendida, os judeus tinham que submeter suas controvérsias ou dúvidas ao veredicto da cátedra de Moisés. A cátedra de Moisés era um tribunal que decidia com autoridade soberana e infalível as questões religiosas ou morais. Os escribas e fariseus sentados na cátedra de Moisés interpretavam a Lei sem a possibilidade de erro.
"Então Jesus disse à multidão e aos seus discípulos: 'Os escribas e os fariseus estão sentados na cátedra de Moisés. Observai, pois, tudo o que vos disserem, mas não imiteis suas obras, porque dizem e não fazem'" (Mateus XXIII, 2-3).
Comentário de São João Crisóstomo (Homilia 71, citada por São Tomás de Aquino em sua Cadeia de Ouro): "Para que ninguém pudesse desculpar sua negligência nas boas obras pelos vícios daquele que ensina, o Salvador destrói esse pretexto acrescentando: 'Fazei tudo o que eles vos disserem' etc.. Pois eles não ensinam sua própria doutrina, mas as verdades divinas com as quais Deus compôs a lei que deu por Moisés."
Comentário de Santo Agostinho (Contra Faustum XVI, 29): "Nestas palavras do Senhor, há duas coisas a observar. Primeiramente, a honra que Ele dá à doutrina de Moisés, na cátedra da qual até os malvados não podem sentar-se sem serem OBRIGADOS a ensinar o bem, pois os prosélitos se tornavam filhos do inferno não por ouvirem as palavras da lei da boca dos fariseus, mas por imitarem sua conduta."
Comentário de Santo Agostinho (De doctrina christiana IV, 27): "O verdadeiro e o justo podem ser pregados com um coração perverso e hipócrita. Esta cátedra, portanto, que não era deles, mas de Moisés, os FORÇAVA a ensinar o bem, mesmo quando eles não o faziam. Assim, eles seguiam suas próprias máximas em sua conduta; mas uma cátedra que lhes era estranha não lhes permitia ensiná-las [...]. São muitos aqueles que buscam a justificação de seus desvios na conduta daqueles que são encarregados de instruí-los, dizendo interiormente e às vezes até mesmo exclamando em público: 'Por que me mandas fazer o que tu não fazes?'. Assim, eles [...] desprezam tanto A PALAVRA DE DEUS quanto o pregador que a prega."
São Francisco de Sales (1576 - 1622) raciocinava da seguinte maneira: se a cátedra de Moisés já era infalível quando ensinava sobre a fé ou os costumes, com muito mais razão a cátedra de Pedro não pode errar. Este doutor da Igreja compôs um livro notável sobre a infalibilidade, onde se pode ler o seguinte: "A Igreja sempre necessita de um confirmador infalível [2] a quem possa recorrer, de um fundamento que as portas do inferno, e principalmente o erro, não possam derrubar, e que seu pastor não possa levar seus filhos ao erro: os sucessores de São Pedro têm, portanto, todos esses mesmos privilégios, que não seguem a pessoa, mas a dignidade e o cargo público."
São Bernardo (De consideratione, Livro II, cap. 8) chama o papa de outro "Moisés em autoridade": ora, quão grande foi a autoridade de Moisés, não há ninguém que desconheça, pois ele sentava-se e julgava todas as disputas que havia entre o povo e todas as dificuldades que surgiam no serviço de Deus. Assim, o supremo pastor da Igreja é para nós um juiz competente e suficiente em todas as nossas maiores dificuldades, caso contrário estaríamos em pior condição do que aquele antigo povo que tinha um tribunal ao qual podia recorrer para a resolução de suas dúvidas, especialmente em questões de religião" (São Francisco de Sales: As Controvérsias, parte III, cap. 6, art. 14, in: Obras de São Francisco de Sales, Annecy 1892, vol. 1, p. 305, ortografia modernizada por nós).
"O sumo sacerdote dos judeus usava sobre o peito um pedaço de pano quadrado chamado 'racional'. Sobre este racional estava escrito 'doutrina e verdade' (Êxodo XXVIII, 30). A razão pela qual o sumo sacerdote tinha um racional sobre o peito 'a doutrina e a verdade', era sem dúvida [...] 'a verdade do seu julgamento' (Deuteronômio XVII, 9) [...]. Rogo-vos, se na sombra havia iluminações da doutrina e perfeições da verdade no peito do sacerdote, para alimentar e fortalecer o povo, o que não terá o nosso sumo sacerdote? De nós, digo, que estamos no dia e sob o sol nascente? O sumo sacerdote antigo [...] presidia à noite, por suas iluminações, e o nosso preside ao dia, por suas instruções" (São Francisco de Sales, p. 307).
[1] Isso dito, todos os papas levaram uma vida correta, até mesmo santa. Alexandre VI Bórgia, apresentado como o papa supostamente mais depravado da história da Igreja, na realidade é inocente dos crimes que lhe são imputados. Existe um estudo magistral que reabilita completamente este grande papa, redigido por Monsenhor Peter De Roo (Material for a History of Pope Alexander VI. His Relatives and His Time, The Universal Knowledge Foundation, Nova York 1924, 5 volumes). Este estudo é definitivo, pois nunca foi refutado por ninguém desde sua publicação. Monsenhor De Roo dedica o primeiro volume à genealogia dos Bórgia para dissipar as confusões mantidas - intencionalmente ou não - pelos historiadores. Ele trabalha com documentos contemporâneos: crônicas, biografias e arquivos. Conclui-se que este papa foi vítima de sua própria generosidade. Seus inimigos políticos - as famílias rivais romanas: Orsini, Colonna, Savelli, Estouteville etc. - difamaram-no porque ele tentou conter suas ambições. Quando o cardeal Rodrigo Bórgia (futuro Alexandre VI) acolheu seus sobrinhos órfãos, espalhou-se o boato de que eram seus bastardos.
[2] O manuscrito original de São Francisco de Sales foi "corrigido" por editores galicanos hostis à papado, desejosos de anular a infalibilidade pontifical: "A Igreja sempre necessita de um confirmador infalível" tornou-se assim "...confirmador permanente"!
B. Os Evangelhos
Sob o Antigo Testamento, aquele que se recusasse a obedecer ao sumo sacerdote deveria ser morto. "Dirige-te aos sacerdotes, filhos de Levi, e ao juiz que houver naqueles dias; consultar-te-ás, e te anunciarão a sentença [...] e procederás conforme ao que te anunciarem, de acordo com a lei que te ensinarem e segundo o juízo que te disserem; não te desviarás nem para a direita nem para a esquerda. E aquele que, com soberba, não der ouvidos ao sacerdote, que ali está para servir ao Senhor teu Deus, ou ao juiz, esse morrerá" (Deuteronômio XVII, 12).
Sob o Novo Testamento, Jesus Cristo ordenou:
"Se recusar ouvir a Igreja, seja para ti como o pagão e o publicano" (Mateus XVIII, 17).
Essa obrigação estrita de obedecer à Igreja implica que ela não pode errar nem nos enganar. Se Deus nos obriga a ouvir o magistério com confiança e submissão, é porque a Igreja Romana está protegida do erro.
"Jesus Cristo instituiu na Igreja um magistério vivo, autêntico e perpétuo [...], e quis e ordenou severamente que os ensinamentos doutrinais deste magistério fossem recebidos como os seus próprios. [... se o ensinamento da Igreja] de alguma maneira pudesse ser falso, seguiria-se, o que é evidentemente absurdo, que Deus mesmo seria o autor do erro dos homens" (Leão XIII: encíclica Satis cognitum, 29 de junho de 1896).
Nosso Senhor fez uma promessa solene a São Pedro: "Simão, Simão, eis que Satanás pediu para vos joeirar como trigo; mas eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça; e tu, quando te converteres, confirma os teus irmãos" (Lucas XXII, 32). São Pedro recebeu assim a promessa formal de que nunca poderia perder a fé. Essa firmeza inabalável era vital para a sobrevivência da Igreja, pois Pedro seria estabelecido como doutor de toda a Igreja, encarregado de fortalecer a fé de seus irmãos e dissipar quaisquer erros que pudessem surgir no futuro.
Em outra ocasião, o Salvador disse a São Pedro:
"Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela" (Mateus XVI, 18).
Novamente, o Filho de Deus assegurou a Pedro que sua fé seria à prova de tudo, pois a comparou à estabilidade imutável de uma pedra.
Com base nesses dois textos, um Papa é sempre infalível. Pois se um pontífice desviasse da fé por um momento sequer em particular, Cristo teria mentido. Além disso, é distorcer o texto dizer que essa promessa se aplica apenas a definições solenes, e não à vida cotidiana. Se fosse assim, Jesus teria especificado, Ele que não fala nenhuma palavra ao acaso e pesa cada palavra. Nenhum teólogo ou exegeta tem o direito de acrescentar, por conta própria, uma restrição mental à palavra do Filho de Deus!
Que o Papa (assim como o episcopado) seja assistido diariamente pelo Espírito Santo ressalta-se ainda mais por outra promessa de Nosso Senhor:
"Ide, pois, ensinai a todas as nações [...] Estarei convosco todos os dias, até a consumação dos séculos" (Mateus XXVIII, 19-20).
A Igreja ensinante (papa e bispos) desfruta de uma assistência permanente do Espírito Santo.
"Se me amais, guardareis os meus mandamentos. E eu rogarei ao Pai, e Ele vos dará outro Defensor, para que fique eternamente convosco. É o Espírito da Verdade" (João XIV, 15-17).
C. Os Pais da Igreja
São Irineu de Lyon (ca. 130 - ca. 208) elogia "a Igreja muito grande, muito antiga e universalmente conhecida, que os dois muito gloriosos apóstolos Pedro e Paulo fundaram e estabeleceram em Roma [...]. A tradição que ela recebe dos Apóstolos e a fé que ela anuncia aos homens chegaram até nós através das sucessões dos bispos [...]. Com esta Igreja, devido à sua origem mais excelente, deve necessariamente concordar toda a Igreja, ou seja, os fiéis de toda parte" (Contra as Heresias III, 3, 2). São Irineu exortava os fiéis a alinharem sua fé com a do pontífice romano, pois este transmitia intacta a tradição vinda dos apóstolos.
São Cipriano (ca. 200 - 258) defendeu a autoridade e a infalibilidade pontifical em seu famoso tratado Da Unidade da Igreja. "Aquele que não guarda a unidade da Igreja, acredita que guarda a fé? Aquele que se opõe à Igreja, que abandona a cátedra de Pedro sobre a qual a Igreja é fundada, pode se vangloriar de ainda estar na Igreja?" (De unitate Ecclesiae, cap. 4). "A cátedra de Pedro é esta principal Igreja de onde emanou a unidade sacerdotal, junto à qual o erro não pode ter acesso" (Carta 40 e 55).
Santo Atanásio (ca. 295 - 373) usou uma carta de um papa para lutar contra os hereges arianos. O papa São Dionísio havia escrito, por volta do ano 260, uma carta doutrinal a Dionísio, bispo de Alexandria, condenando a heresia sabeliana, que mais tarde seria retomada pelos arianos. Por isso, Santo Atanásio repreendeu os arianos por já terem sido condenados há muito tempo por um julgamento definitivo, o que prova que ele acreditava na infalibilidade pontifical (De sententia Dionysii). Em uma carta a Félix, ele escreveu esta frase memorável: "A Igreja romana sempre mantém a verdadeira doutrina sobre Deus".
Santo Efrém (ca. 300 - 373), o grande doutor da Igreja síria, celebrou a grandeza do ensinamento pontifical, continuamente assistido pelo Espírito Santo: "Salve, ó sal da terra, sal que nunca pode tornar-se insípido! Salve, ó luz do mundo, que aparece ao Oriente e resplandece por toda parte, iluminando aqueles que estavam sob as trevas e queima sempre sem ser renovada. Esta luz é Cristo; seu castiçal é Pedro; a fonte de seu óleo é o Espírito Santo" (Encomium in Petrum et Paulum et Andream, etc.).
Santo Epifânio (ca. 315 - 403) interpretou Mateus XVI,18. Ele afirmou que era impossível que a Igreja Romana fosse vencida pelas portas do inferno, isto é, pelas heresias, porque ela estava apoiada na sólida fé de Pedro, junto ao qual se encontrava a resposta correta para todas as questões doutrinais. "A Pedro, o Pai revela seu próprio Filho, e é por isso que ele é chamado de bem-aventurado. Pedro, por sua vez, manifesta o Espírito Santo [em seu discurso aos judeus no dia de Pentecostes], como convinha àquele que era o primeiro entre os apóstolos, àquele que era a pedra inabalável sobre a qual a Igreja de Deus é fundada, e contra a qual as portas do inferno não prevalecerão. Por essas portas do inferno, devem-se entender as heresias e os autores das heresias. Em todos os aspectos, a fé é solidamente fundamentada nele: ele recebeu as chaves do céu, ele desata e ata tanto na terra quanto no céu. Nele são resolvidas as questões mais difíceis da fé" (Anchoratus. Capítulo 9).
São Basílio (329 - 379) informa seu amigo São Atanásio que tinha a intenção de pedir ao soberano pontífice que exercitasse sua autoridade para exterminar a heresia de Marcelo de Ancira (Carta 69). "A carta de São Basílio, mencionando este pedido de intervenção do bispo de Roma como algo comum e ordinário, leva a concluir que naquela época não era apenas a convicção pessoal de Basílio, mas também a convicção de todos, mesmo no Oriente, que o bispo de Roma possuía o poder de julgar soberanamente, por si mesmo, questões doutrinais" (Vacant e Mangenot: Dicionário de Teologia Católica, artigo "infallibilité du pape"). Por que consultar Roma e não outra autoridade? "Pedro", diz São Basílio, "foi encarregado de formar e governar a Igreja, porque ele se destacava na fé" (Contra Eunômio, livro 2). Graças à promessa de Cristo, o papa perseverava absolutamente sem qualquer falha, pois sua fé tinha a mesma estabilidade que a do próprio Filho de Deus! "Pedro foi colocado para ser o fundamento. Ele disse a Jesus Cristo: 'Tu és o Cristo, Filho do Deus vivo', e por sua vez foi dito a ele que ele era Pedro, embora não fosse pedra imóvel, mas apenas pela vontade de Jesus Cristo. Deus comunica aos homens suas próprias dignidades. Ele é sacerdote, e faz sacerdotes; Ele é pedra, e dá a qualidade de pedra, tornando assim seus servos participantes do que lhe é próprio" (Homilia 29). Este último trecho de São Basílio desfruta de autoridade particular na Igreja Católica, pois foi inserido no Catecismo do Concílio de Trento (explicação do símbolo, seção Credo in Ecclesiam).
São Gregório de Nazianzo (ca. 330-390) elogiou a indefectibilidade da fé romana em um poema. "Quanto à fé, a antiga Roma, desde o início até hoje, segue felizmente seu curso, e ela mantém todo o Ocidente nos laços da doutrina que salva" (Carmen de Vita sua, versos 268 - 270).
São Gregório de Nissa (falecido em 394), irmão mais novo de São Basílio, afirmou: "A Igreja de Deus tem sua solidez em Pedro, pois é ele que, de acordo com a prerrogativa que lhe foi concedida pelo Senhor, é a pedra firme e muito sólida sobre a qual o Salvador construiu a Igreja" (Laudat. 2 in St. Stephan para o fim).
Santo Ambrósio (340 - 397) interpretou o versículo de Lucas XXII, 32 no sentido de que o Senhor havia fortalecido a fé de Pedro, para que, "imóvel como uma rocha", pudesse sustentar eficazmente o edifício da Igreja (Sermão 5). Em seu comentário sobre o Salmo 40, Ambrósio estabeleceu uma equação que se tornaria famosa: "Onde está Pedro, ali está a Igreja. Onde está a Igreja não é a morte, mas a vida eterna" (Ennarratio in Psalmum XL, cap. 19). Em outras palavras: fora do papa, não há salvação.
São João Crisóstomo (340 - 407) é o mais famoso dos Padres gregos. Devido aos seus ensinamentos admiráveis, ele mereceu o apelido de "boca de ouro". São João Crisóstomo sugeriu a admirável solidez da fé de Pedro por meio de uma imagem: "Existem muitas ondas impetuosas e tempestades cruéis, mas não tenho medo de ser submerso, porque estou sobre a rocha. Que o mar se agite furiosamente, pouco me importa: ele não pode derrubar esta pedra inabalável" (Carta 9 a Ciríaco). Ele enfatizou a etimologia simbólica do nome do primeiro papa: "São Pedro foi assim chamado por causa de sua virtude. Deus como que depositou neste nome uma prova da firmeza do apóstolo na fé" (Quarta Homilia sobre as mudanças de nomes).
São Jerônimo (347-420), em sua carta ao Papa Dâmaso, defendeu rigorosamente a necessidade de estar unido ao pontífice romano. "Eu acreditei que devia consultar a cátedra de Pedro e esta fé romana louvada por São Paulo (...). Você é a luz do mundo, você é o sal da terra. Eu sei que a Igreja é construída sobre esta pedra; quem quer que tenha comido o Cordeiro fora desta casa, é um profano" (Carta 15). Segundo São Jerônimo, os fiéis podiam seguir com toda segurança os ensinamentos pontificais, pois a cátedra de Pedro guardava incorruptivelmente a herança da fé: "A santa Igreja romana, que sempre permaneceu sem mancha, permanecerá ainda em todos os tempos futuros firme e imutável no meio dos ataques dos hereges, e isso pela proteção providencial do Senhor e pela assistência do bem-aventurado Pedro" (citado em: Mgr de Ségur: Le Souverain Pontife, in Œuvres complètes Paris 1874, t. III, p. 80).
Santo Agostinho (354 - 430) fez uma interpretação muito relevante de Lucas XXII, 32. Antes de reproduzi-la aqui, é importante destacar que o Papa Leão XIII, após destacar os talentos de cada um dos Padres da Igreja, concluiu afirmando que "entre todos, a palma parece voltar a Santo Agostinho" (encíclica Aeterni Patris, 4 de agosto de 1879). O bispo de Hipona foi assim o maior dos Padres da Igreja. Ele se pronunciou categoricamente a favor da infalibilidade permanente do pontífice romano! Aqui está seu texto magistral:
"Se, defendendo o livre arbítrio não segundo a graça de Deus, mas contra ela, você diz que pertence ao livre arbítrio perseverar ou não no bem, e que se perseverar, não é por um dom de Deus, mas por um esforço da vontade humana, o que você inventará para responder a estas palavras do Mestre: 'Eu roguei por ti, Pedro, para que tua fé não desfaleça'? Ousará dizer que, apesar da oração de Cristo para que a fé de Pedro não falhasse, essa fé teria falhado, no entanto, se Pedro quisesse que falhasse, isto é, se ele não quisesse perseverar até o fim? Como se Pedro pudesse querer outra coisa além do que Cristo pedia para ele querer! Quem ignora que a fé de Pedro deveria perecer, se sua própria vontade, a vontade pela qual ele era fiel, falhasse, e que deveria permanecer até o fim, se sua vontade permanecesse firme? Mas como a vontade é preparada pelo Senhor, a oração de Cristo por ele não poderia ser vã. Quando ele orou para que sua fé não desfalecesse, o que ele pediu afinal, senão que ele tivesse uma vontade de crer ao mesmo tempo perfeitamente livre, firme, invencível e perseverante? Assim se defende a liberdade da vontade, segundo a graça, e não contra ela. Pois não é por sua liberdade que a vontade humana adquire a graça, mas sim pela graça que ela adquire sua liberdade, e para perseverar, ela recebe ainda da graça o dom de uma deliciosa estabilidade e de uma força invencível" (De la correction et de la grâce, livro VIII, cap. 17).
São Cirilo de Alexandria (380 - 444), em seu Comentário sobre Lucas (XXII, 32), explicou que a expressão "confirma teus irmãos" significava que Pedro era o mestre e o apoio daqueles que vinham a Cristo pela fé. Ele também comentou sobre o evangelho segundo São Mateus: "De acordo com esta promessa (Tu es Petrus), a Igreja apostólica de Pedro não contrai nenhuma mancha de todas as seduções da heresia" (São Cirilo, citado em: São Tomás de Aquino: Cadeia de ouro sobre Mateus XVI, 18).
São Fulgêncio de Ruspe (467 - 533) observa: "O que a Igreja romana mantém e ensina, todo o universo cristão acredita sem hesitação com ela" (De incarnatione et gratia Christi, cap. 11).
São Bernardo (1090 - 1153) foi o último dos Padres da Igreja. Citemos algumas palavras que servirão como conclusão: "Os ataques feitos à fé devem ser reparados precisamente por aquele cuja fé não pode falhar. Esta é a prerrogativa deste Trono" (De error Abaelardi, prefácio).
Nenhum Pai fala da possibilidade (mesmo teórica) de que um papa possa errar em um único instante. "É principalmente para a explicação da palavra sagrada que eles [os Padres da Igreja] permanecerão sempre nossos mestres. Nenhuma pesquisa, por mais profunda que seja a ciência, nos dará o que eles tinham então: o mundo como Jesus o conheceu, o mesmo aspecto dos lugares e das coisas, e especialmente o ensinamento dos fiéis. Eles, tendo vivido perto dos apóstolos, podiam transmitir suas instruções. Essas circunstâncias reunidas dão à autoridade dos Padres um brilho tão grande que até os teólogos protestantes foram impressionados por isso. Eles admitem: 'Desviar-se de um consenso entre eles é uma loucura e um absurdo'" (Abbé C. Fouard: La vie de Notre-Seigneur Jésus Christ vigésima sexta edição, Paris 1920, p. XVI).
Em 13 de novembro de 1564, o Papa Pio IV estabeleceu a obrigação para todo o clero de prestar juramento de obediência a uma profissão de fé, que dizia, entre outras coisas: "Eu interpretarei sempre a Escritura de acordo com o consentimento unânime dos Padres".
São Tomás de Aquino
São Tomás de Aquino (1225 - 1274) é o maior de todos os doutores da Igreja. É chamado de "doutor comum", "doutor angélico" ou "anjo da escola" devido à excelência de sua doutrina. Foi frequentemente exaltado pelos papas.
"Tomás, sozinho, iluminou mais a Igreja do que todos os outros doutores. Sua doutrina só poderia ter vindo de uma ação miraculosa de Deus" (João XXII: bula de canonização).
O que ensina, então, esse doutor quase tão infalível quanto o papa?
O doutor angélico é um defensor da infallibilité absoluta e permanente do sumo pontífice: "A Igreja apostólica [de Pedro], situada acima de todos os bispos, pastores, chefes de igrejas e fiéis, permanece pura de todas as seduções e artifícios dos hereges em seus pontífices, em sua fé sempre íntegra e na autoridade de Pedro. Enquanto outras igrejas são desonradas pelos erros de alguns hereges, apenas ela reina, apoiada em fundamentos inabaláveis, silenciando e fechando a boca de todos os hereges; e nós [...], confessamos e pregamos em união com ela a regra da verdade e da santa tradição apostólica" (citação de São Cirilo de Alexandria retomada por São Tomás em sua Cadeia de Ouro, onde ele comenta Mateus XVI, 18).
Baseado em Lucas XXII, 32, o doutor comum ensina que a Igreja não pode errar, porque o papa não pode errar.
"A Igreja universal não pode errar, pois Aquele que é ouvido em tudo por sua dignidade disse a Pedro, sobre a profissão de fé na qual a Igreja é fundamentada: 'Eu roguei por ti para que tua fé não desfaleça'" (Summa Theologica, suplemento da III parte, q. 25, a. 1).
"A unidade da fé poderia ser mantida na Igreja, como exige o Apóstolo (1 Coríntios I, 10), se as questões levantadas a respeito da lei não fossem definidas pelo chefe da Igreja, o sumo pontífice" (Summa Theologica, II-II, q. 1, a. 10).
« Uma vez que as coisas tenham sido decididas pela autoridade da Igreja universal, aquele que persistentemente se recusar a se submeter a essa decisão será considerado herege. Esta autoridade da Igreja reside principalmente no Sumo Pontífice. Pois é dito (Decreto XXIV, q. I, cap. 1.2): 'Sempre que uma questão de fé é debatida, eu penso que todos os nossos irmãos e colegas no episcopado devem se submeter apenas a Pedro, isto é, à autoridade de seu nome e de sua glória'. Nem Agostinho, nem Jerônimo, nem qualquer outro doutor contradisse seu parecer contra sua autoridade. Portanto, São Jerônimo dizia ao Papa Dâmaso (in expo. symbol.): 'Esta é a fé, Santíssimo Padre, que aprendemos na Igreja Católica: se em nossa exposição há algo pouco exato ou pouco seguro, pedimos que o corrija, vós que possuís a fé e a cátedra de Pedro. Mas se nossa confissão receber a aprovação de vosso julgamento apostólico, quem quer que me acuse provará ser ignorante, mal-intencionado ou não católico. Mas ele não provará que eu sou herege' (Summa Theologica II-II, q. 11, a. 2).
"Deve-se aderir ao julgamento do Papa, a quem pertence pronunciar em matéria de fé, em vez da opinião de todos os sábios" (Quaetiones quodlibetales q. 9, a. 16).
No Salmo 39, versículo 10, está escrito: 'Anunciei a tua justiça na grande assembleia'. Eis o comentário de São Tomás:
O salmista falou 'na grande assembleia', ou seja, na Igreja Católica, que é grande por seu poder e firmeza: 'As portas do inferno não prevalecerão contra ela' (Mateus 16, 18) (São Tomás: Comentário sobre os Salmos).
Esta 'firmeza', a Igreja a deve, em primeiro lugar, à fé inabalável dos pontífices romanos, como é explicado em um dos Opúsculos do santo doutor.
A Igreja é uma, santa, católica e "firme". "Quarta, ela é firme. Uma casa é firme 1. quando suas fundações são sólidas". A verdadeira fundação da Igreja é Cristo (1 Coríntios 3, 2) e os doze apóstolos (Apocalipse 21, 14). Para sugerir firmeza, Pedro é chamado de rocha. "2. A firmeza de uma casa também aparece quando ela não pode ser derrubada por um abalo". A Igreja não pôde ser derrubada nem pelos perseguidores, nem pelas seduções do mundo, nem pelos hereges. Segundo Mateus 16, 18, as "portas do inferno" (= os hereges) podem prevalecer sobre tal ou tal igreja local, mas não contra a Igreja de Roma onde reside o papa. "É por isso que somente a Igreja de Pedro (a quem foi atribuída a Itália durante o envio dos discípulos) permanecerá sempre firme na fé. E enquanto em outros lugares a fé não existe de todo, ou é misturada com muitos erros, a Igreja de Pedro é forte na fé e pura de todos os erros, o que não é surpreendente, visto que o Senhor disse a Pedro: 'Eu roguei por ti, para que tua fé não desfaleça'" (São Tomás: Opuscula, opúsculo intitulado Expositio symboli apostolorum, trecho relativo ao artigo "creio na Igreja católica" do símbolo dos apóstolos).
O ensinamento do doutor angélico pode, portanto, ser resumido assim: a fé do papa é de uma firmeza absoluta e permanente.
A doutrina do doutor angélico deve ser "religiosamente mantida" (sancte) por todos os professores de seminários (cânone 1366, § 2)! A Igreja dá a entender com isso o quanto considera necessário que os jovens seminaristas (que mais tarde formarão o clero baixo e alto) sigam completamente o doutor comum. São Pio X dizia:
"Afastar-se de São Tomás nunca ocorre sem grave perigo" (motu proprio Sacrorum antistitum 1º de setembro de 1910).
E ainda:
"Aqueles que se afastam de São Tomás são assim levados à extremidade de se separarem da Igreja" (Carta Delata Nobis, 17 de novembro de 1907, dirigida ao Padre Tomás Pègues).
E. Os Papas
St. Lucius, papa e mártir (253 - 254), ensina: "A Igreja romana, santa e apostólica, é mãe de todas as Igrejas, e é constatado que ela nunca se desviou do caminho da tradição apostólica, conforme a promessa que o Senhor mesmo fez a ela, dizendo: 'Eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça'." (Carta aos bispos da Gália e da Espanha, nº 6)
St. Inocêncio I (401 - 417) comparou a Igreja da cidade de Roma a uma fonte pura de toda impureza herética, que vivificava as igrejas locais, "como as águas que jorram de sua fonte original e fluem para todas as regiões do mundo por rios puros provenientes da fonte não poluída" (carta In requirendis, 7 de janeiro de 417, aos bispos do Concílio de Cartago).
St. Sisto III (432 - 440) disse que São Pedro "recebeu uma fé pura e intacta, uma fé que não está sujeita a qualquer controvérsia".
St. Leão Magno (440 - 461) indicava que São Pedro vivia e ensinava através de seus sucessores: "O bem-aventurado Pedro, conservando sempre essa solidez de pedra que recebeu, não abandonou o leme da Igreja [...] Se, portanto, fazemos algo bom, se discernimos corretamente nas questões [...] é obra, é mérito daquele cujo poder vive e cuja autoridade governa em seu Trono" (Sermon 3 do aniversário da sua Assunção).
Este papa ainda disse: "Ao longo de tantos séculos, nenhuma heresia pôde manchar aqueles que estavam sentados na cátedra de Pedro, pois é o Espírito Santo que os ensina" (Sermon 98). Os Padres do Concílio de Calcedônia declararam formalmente sobre São Leão: "Deus, em sua providência, escolheu para si, na pessoa do pontífice romano, um atleta invencível, impenetrável a qualquer erro, que acabou de expor a verdade com a maior clareza".
St. Gelásio I (492 - 496) dirigiu uma decreto aos gregos: "Pedro brilhou nesta capital [Roma] pela sublime potência de sua doutrina, e teve a honra de derramar gloriosamente seu sangue aqui. É aqui que ele repousa para sempre, e assegura a este Trono, abençoado por ele, que nunca será vencido pelas portas do inferno" (Decreto 14, intitulado De responsione ad Graecos).
St. Hormisdas (514 - 523) redigiu uma profissão de fé em 11 de agosto de 515, que foi aceita por toda a Igreja e repetida nos concílios de Constantinopla IV e Vaticano I. Após lembrar que Cristo "edificou a Igreja sobre a pedra" contra a qual o inferno não prevalecerá (Mateus XVI, 18), o papa comentou com confiança: "Esta afirmação é verificada pelos fatos, pois a religião católica sempre foi guardada imaculada no Trono Apostólico".
St. Agatão (678 - 681) redigiu um texto crucial [1], que foi lido e aprovado pelo Sexto Concílio Ecumênico.
St. Leão IX (1049 - 1054), depois de afirmar que a Igreja construída sobre Pedro não poderia "ser dominada pelas portas do inferno, isto é, pelas disputas dos hereges" (cf. Mateus XVI, 18) e citar a promessa de Cristo a Pedro (Lucas XXII, 32), repreendeu os cismáticos gregos Miguel Cerulário e Leão de Ácrida em sua carta In terra pax de 2 de setembro de 1053: "Então, alguém será suficientemente louco para ousar pensar que a oração daquele para quem querer é poder pode ser sem efeito em algum ponto? O Trono do príncipe dos apóstolos, a Igreja romana, não tem, seja por Pedro próprio, seja por seus sucessores, condenado, refutado e vencido todos os erros dos hereges? Não confirmou os corações dos irmãos na fé de Pedro, que até agora não falhou e que, até o fim, não falhará?"
Pio IX (1846 - 1878) afirmou desde sua elevação ao pontificado (no Discurso de sua exaltação) que um papa nunca poderia "JAMAIS" desviar da fé! Ele também escreveu o mesmo em sua encíclica Qui pluribus de 9 de novembro de 1846. Para interpretar a Escritura, os homens precisam de uma autoridade infalível: Pedro, cujo Cristo "prometeu que a fé nunca falhará". A Igreja romana "sempre manteve íntegra e inviolada a fé recebida do Senhor Cristo, e a ensinou fielmente". O mesmo é afirmado na carta In suprema Petri de 6 de janeiro de 1848 e na encíclica Nostis et nobiscum de 8 de dezembro de 1849: "jamais".
Leão XIII (1878 - 1903) reafirmou a antiga crença em sua encíclica Satis cognitum de 29 de junho de 1896: nunca um pontífice romano desviou na fé. Sua encíclica sobre o Espírito Santo contém um comentário memorável sobre o Evangelho segundo São João. No dia de Pentecostes, "o Espírito Santo começou a produzir seus benefícios no corpo místico de Cristo. Assim se cumpria a última promessa de Cristo aos seus apóstolos, relativa ao envio do Espírito Santo [...]: 'Quando vier aquele Espírito de Verdade, ele vos guiará em toda a verdade' (João XVI, 12). Esta verdade Ele concede e dá à Igreja, e, por sua presença CONTÍNUA, ele vigia para que nunca ela sucumba ao erro" (encíclica Divinum illud, 9 de maio de 1897).
São Pio X (1903-1914) ensina: "O primeiro e o maior critério da fé, a regra suprema e inabalável da ortodoxia é a obediência ao magistério SEMPRE vivo e infalível da Igreja, estabelecida por Cristo 'a coluna e o sustentáculo da verdade'" (1 Timóteo III, 15).
São Paulo diz: 'Fides ex auditu' - A fé vem não pelos olhos, mas pelos ouvidos, pelo magistério vivo da Igreja, sociedade visível composta de mestres e discípulos [...]. Jesus Cristo mesmo ordenou a seus discípulos que ouvissem as lições dos mestres [...], e disse aos mestres: 'Ide ensinar todas as nações. O Espírito da Verdade vos ensinará toda a verdade. Eis que estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos'" (São Pio X: discurso Con vera soddisfazione aos estudantes católicos, 10 de maio de 1909).
"Os filhos devotos do papa são aqueles que obedecem à sua PALAVRA e o seguem em TUDO, não aqueles que estudam meios de evadir seus mandamentos" (discurso aos novos cardeais, 27 de maio de 1914).
O Dicionário de Teologia Católica (artigo "infallibilité du pape") argumenta que o papa Inocêncio III (1198-1216) teria se pronunciado contra a infalibilidade perpétua do papado. Como prova, o dicionário cita a seguinte frase: "Tenho especialmente necessidade da fé, porque para todas as outras faltas eu sou julgado apenas pelo tribunal de Deus; para as faltas contra a fé, pelo contrário, posso ser julgado pela Igreja."
Pode-se interpretar este trecho no sentido de que um papa pode errar na fé e, consequentemente, poderia ser julgado pela Igreja (por exemplo, por um concílio geral). No entanto, é importante notar que o Dicionário de Teologia Católica se envolveu em uma falsificação do texto. Este método é tão antigo quanto o mundo: cita-se um trecho fora de contexto e se lhe dá um sentido oposto ao que o autor original pretendia. Que leitor terá o trabalho de ir às fontes para verificar! Aqui está o texto não amputado:
"Se eu mesmo não tivesse uma fé sólida, como poderia fortalecer os outros na fé? E esta é uma das partes principais das minhas funções, porque o Senhor não disse a São Pedro: 'Eu roguei por ti, para que tua fé não desfaleça', e 'Quando te converteres, fortalece teus irmãos'. Ele orou, e foi ouvido em tudo por causa de sua obediência. Assim, a fé da Santa Sé nunca vacilou nos tempos de tribulação, mas permaneceu sempre firme e inabalável, para que o privilégio de São Pedro permanecesse inviolável. Mas precisamente por esta razão, tenho especialmente necessidade da fé, porque para todas as outras faltas eu sou julgado apenas pelo tribunal de Deus; para as faltas contra a fé, pelo contrário, posso ser julgado pela Igreja. Tenho a fé e uma fé constante, porque ela é apostólica" (Inocêncio III: discurso principal ao povo após sua consagração; tradução francesa em: J.B.J. Champagnac: Philippe Auguste et son siècle, Paris 1847, p. 264).
O Dictionnaire de théologie catholique (artigo "infallibilité pontificale") portanto mentiu ao cortar parte do sermão de Inocêncio III. Em outro artigo ("déposition"), o mesmo dicionário peca novamente por omissão ao citar uma frase de outro texto de Inocêncio III sem indicar que, no mesmo texto, Inocêncio defende a ortodoxia do papado ("Pedro negou com a boca, mas não com o coração"). Assim é como este dicionário deturpa o pensamento de Inocêncio III!
Para não deixar dúvidas sobre o pensamento autêntico deste papa, citaremos agora outro texto dele. Inocêncio III, depois de lembrar a promessa a São Pedro ("Eu roguei por ti, para que tua fé não desfaleça"), fez o seguinte comentário: "Nosso Senhor evidentemente insinua por estas palavras que os sucessores de Pedro nunca se afastariam EM NENHUM TEMPO da fé católica, mas antes a restaurariam nos outros; assim, Ele lhe concede o poder de fortalecer os outros, para impor-lhes a obrigação de obedecer" (carta Apostolicae Sedis primatus ao bispo de Constantinopla, 12 de novembro de 1199). Este trecho é crucial, pois a expressão "em nenhum tempo" (nullounquam tempore) torna absolutamente irrefutável a tese da infalibilidade perpétua do sumo pontífice!
Conclusão do primeiro capítulo: Os evangelistas e os representantes da Tradição (Padres, São Tomás, papas e concílios) clamam unanimemente que o pontífice romano nunca pode falhar na fé em NENHUM momento.
RESUMO: UM PAPA NUNCA FARÁ NAUFRÁGIO NA FÉ, PORQUE TODOS OS PAPAS, CONCÍLIOS E PAIS DA IGREJA O DISSERAM.
O sumo sacerdote judeu vestido com o pedaço de tecido quadrado, chamado "racional", que Deus ordenou a Moisés e aos outros israelitas: "Gravareis no racional do julgamento: 'doutrina e verdade', que estarão sobre o peito de Arão quando ele entrar [no tabernáculo para se apresentar] diante do Senhor, e ele sempre levará sobre o seu peito o racional do julgamento, [onde estarão escritos os nomes] dos filhos de Israel, quando ele se apresentar diante do Senhor, [para que ele se lembre de que está encarregado de instruí-los na doutrina e ensinar-lhes a verdade]" (Êxodo XXVIII, 30). "Se na sombra havia iluminações de doutrina e perfeições de verdade no peito do sacerdote, para alimentar e fortalecer o povo, o que não terá o nosso sumo sacerdote? De nós, digo eu, que estamos no dia e sob o sol levantado? O antigo sumo sacerdote [...] presidia à noite, com suas iluminações, e o nosso preside ao dia, com suas instruções" (São Francisco de Sales).
[1] Este texto está reproduzido no Apêndice A do livro.
2. É possível que um papa ensine um erro na fé?
A CÁTEDRA DE SÃO PEDRO
Na Basílica de São Pedro, no fundo da abside, é preservada, inserida em um relicário de bronze dourado, a preciosa cátedra que foi utilizada por São Pedro. Esta cátedra (termo em latim: cathedra) deu origem às definições "ex cathedra", proclamadas "do alto da cátedra" pelo Vigário de Cristo.
"Este assento estava decorado com ornamentos de marfim [...]. A cátedra de São Pedro era feita de carvalho, como pode ser facilmente deduzido hoje pelas peças principais da estrutura original, como os quatro grandes pés, que ainda estão preservados em seu lugar e mostram vestígios dos numerosos furtos cometidos pelos fiéis ao longo dos tempos, retirando lascas para conservá-las como relíquias. A cátedra possui dois anéis laterais nos quais eram inseridos bastões para seu transporte; isso corresponde perfeitamente ao testemunho de São Enódio, que a chamou de sedes gestatoria (cadeira de portadores)" (Dom Prosper Guéranger: Santa Cecília e a sociedade romana nos dois primeiros séculos, Paris 1874, p. 69-70).
Se o papa tem uma fé sempre pura, não se vê como ele poderia ensinar um erro na fé. A este argumento de razão, pode-se acrescentar a voz do magistério.
O Concílio Ecumênico Vaticano I publicou dois textos sobre a infalibilidade: Dei Filius e Pastor Aeternus.
Os Padres do Vaticano afirmam categoricamente a infalibilidade DIÁRIA de São Pedro e de sua Igreja. Pela bula Aeterni Patris de 3 de julho de 1868, Pio IX convocou um concílio ecumênico e exortou o mundo católico a confiar na Igreja. "Para que ela (a Igreja) procedesse sempre com uma ordem e uma retidão infalíveis, o divino Salvador prometeu estar com ela até a consumação dos séculos". O ensinamento de Pio IX foi retomado e desenvolvido pelos Padres do Concílio em sua constituição dogmática Dei Filius de 26 de abril de 1870. O prólogo é muito belo: "Jesus Cristo, prestes a retornar ao seu Pai celestial, prometeu estar com sua Igreja militante na terra todos os dias [!] até a consumação dos séculos [cf. Mateus XXVIII, 19]". Um pouco mais adiante, os Padres conciliares se alegraram que a Igreja fosse perpetuamente governada pelo Espírito Santo. "Portanto, em nenhum momento, ela pode, cessar de testemunhar e pregar a verdade de Deus, que cura tudo; ela não ignora que lhe foi dito: 'Meu Espírito, que está em ti, e minhas palavras que pus em tua boca, não se afastarão de tua boca desde este dia até a eternidade' (Isaías LIX, 21)".
"Devem ser cridas, de fé divina e católica, todas as coisas que estão contidas na palavra de Deus, seja escrita ou transmitida por tradição, e que a Igreja, seja por um julgamento solene, seja pelo magistério ordinário e universal, propõe como sendo divinamente revelado" (Vaticano I: constituição dogmática Dei Filius, 26 de abril de 1870, capítulo 3, intitulado "de fide"). Portanto, o ensinamento infalível da Igreja pode assumir duas formas: uma definição solene em grande pompa (bula, concílio) ou um documento de aparência modesta (discurso, encíclica...).
Ao apresentar o esquema deste texto aos Padres do Vaticano, Monsenhor Simor, relator da Deputação da Fé, disse-lhes: "Este parágrafo é dirigido contra aqueles que afirmam que só se deve acreditar no que foi definido por um concílio, e que não se está obrigado a crer igualmente no que a Igreja ensinante dispersa prega e ensina de acordo unânime como divinamente revelado" (em: Jean Michel Alfred Vacant: Estudo sobre as constituições do Concílio do Vaticano de acordo com os atos do concílio, Paris e Lyon 1895, 1. II. p. 89).
Segundo outro relator da Deputação da Fé, Monsenhor Martin, este parágrafo ensina que o magistério ordinário é tão infalível quanto o magistério extraordinário. "É necessário crer em todas as coisas que Deus revelou e nos propõe crer, por meio da Igreja, e QUALQUER QUE SEJA O MODO DE EXPRESSÃO que ela escolha (quomodocumque). Por esta doutrina é excluído o erro daqueles que querem que se deva apenas crer de fé divina nos artigos de fé formalmente definidos, e que, portanto, se esforçam para reduzir quase ao mínimo a quantidade de verdades a serem cridas" (ibidem, p. 372).
"Jesus Cristo, prestes a retornar ao seu Pai Celestial, prometeu estar com sua Igreja militante na terra TODOS OS DIAS, até a consumação dos séculos. Portanto, ele não deixou EM NENHUM TEMPO (nullo unquam tempore) de sustentar sua amada esposa, DE ASSISTI-LA EM SEU ENSINAMENTO, de abençoar suas obras e socorrê-la nos perigos" (Vaticano I: Dei Filius, Prólogo).
Esta infalibilidade diária, atribuída a toda a Igreja em Dei Filius, deriva da infalibilidade diária do papa sozinho. Os bispos de todo o mundo não se enganam em seu magistério ordinário diário, porque se apoiam na fé indefectível do pontífice romano. A Igreja é infalível porque repousa sobre o rochedo indestrutível da fé de Pedro. Isso é claramente destacado na constituição dogmática Pastor Aeternus, publicada em 18 de julho de 1870 por Pio IX com a aprovação dos Padres do Vaticano.
"Para que o episcopado fosse uno e não dividido", como está escrito no prólogo de Pastor Aeternus, "para que a multidão de todos os fiéis fosse conservada na unidade da fé. [... Cristo colocou] o bem-aventurado Pedro acima dos outros apóstolos [… para que] sobre a firmeza de sua lei se erguesse o sublime edifício da Igreja que deve ser levado até o céu".
O capítulo 4 de Pastor Aeternus é mais explícito: "[Os cristãos das províncias] comunicaram ao Sé Apostólico os perigos particulares que surgiam em matéria de fé, para que os danos causados à fé fossem reparados onde ela não pode sofrer falha (cf. São Bernardo: Carta 190)._ [... Todos os Padres da Igreja e todos os doutores ortodoxos] sabiam perfeitamente que este Sé de Pedro permanecia puro de qualquer erro, conforme a promessa divina de nosso Senhor e Salvador ao chefe de seus discípulos. 'Eu roguei por ti, para que tua fé não desfaleça; e quando te converteres, fortalece teus irmãos' (cf. a carta do Papa São Agatão ao imperador, aprovada pelo Sexto Concílio Ecumênico)[1]. Este carisma de verdade e fé sempre indefectível foi concedido por Deus a Pedro e a seus sucessores nesta cátedra".
O que é notável é que o capítulo 4 de Pastor Aeternus, onde se trata da fé inabalável do papa, culmina precisamente com a definição da infalibilidade pontifical.
Esta definição começa com as palavras "Por isso..." Pela expressão "por isso", os Padres estabelecem uma ligação com o que foi mencionado anteriormente, ou seja, a fé inabalável. A infalibilidade do ensinamento - notemos bem a conexão! - decorre da fé sempre pura. Portanto, uma vez que a fé é sempre pura, o ensinamento será consequentemente sempre puro de qualquer erro!
"Este carisma de verdade e fé sempre indefectível foi concedido por Deus a Pedro e aos seus sucessores nesta cátedra (...) POR ISSO, ligando-nos fielmente à tradição recebida desde o início da fé cristã, definimos como um dogma revelado por Deus:
O pontífice romano, quando fala ex cathedra, isto é, quando, cumprindo seu dever de pastor e doutor de todos os cristãos, define, com base em sua suprema autoridade apostólica, que uma doutrina sobre a fé ou os costumes deve ser mantida por toda a Igreja, desfruta, pela assistência divina prometida a ele na pessoa de São Pedro, desta infalibilidade que o divino Redentor quis que sua Igreja possuísse ao definir a doutrina sobre a fé e os costumes. Portanto, tais definições do pontífice romano são irrevogáveis por si mesmas e não pelo consentimento da Igreja. Se alguém, o que Deus não permita, tiver a presunção de contradizer esta definição, seja anátema" (Pastor Aeternus, Cap. 4).
Destacamos imediatamente que esta definição não prescreve nenhum modo específico de ensino. O Vaticano I afirma: o pontífice romano é infalível "quando ele define", e não "somente quando ele define solenemente". Também não é especificado que o pontífice romano deva obrigatoriamente escrever: "Nós definimos". Basta que ele declare que determinado ponto faz parte da doutrina ou moral cristã.
Examinemos mais de perto a definição: o papa ensinando sozinho "desfruta [...] desta infalibilidade da Igreja". Ora, esta infalibilidade da Igreja, como vimos no prólogo e no capítulo 3 de Dei Filius, abrange ambos os modos de ensino (magistério extraordinário e magistério ordinário). Portanto, o papa ensinando sozinho é infalível ao impor uma doutrina aos fiéis, seja por uma definição solene (modo extraordinário) ou por seu ensinamento cotidiano (modo ordinário).
Vamos lembrar bem disso: o Vaticano I não diz de forma alguma que o papa seria "APENAS" infalível em suas definições solenes. Por quê? Bem simplesmente porque o papa também é infalível em seu ensinamento cotidiano! Isso fica claramente evidenciado em uma explicação de Monsenhor d'Avanzo, relator da Deputação da Fé do Vaticano I:
"A Igreja é infalível em seu magistério ordinário, que é exercido diariamente principalmente pelo papa, e pelos bispos unidos a ele, que por essa razão são, como ele, infalíveis pela infalibilidade da Igreja, que é assistida pelo Espírito Santo todos os dias. [...]
Pergunta: A quem então pertence todos os dias que Deus faz:
- declarar as verdades implicitamente contidas na revelação
- definir as verdades explícitas?
- defender as verdades atacadas?
Resposta: Ao papa, seja em concílio, seja fora do concílio. De fato, o papa é o Pastor dos pastores e o Doutor dos doutores" (Monsenhor d'Avanzo), relator da Deputação para a fé do primeiro Concílio do Vaticano: "Status questionis" ("estado da questão da infalibilidade"), início de julho de 1870; documento histórico nº 565 do apêndice B dos atos do concílio, in: Gerardus Schneemann (ed.): Acta et decreta sacrosancti oecumenici concilii Vaticani cum permultis aliis documentis ejusque historiam spectantibus, Freiburg 1892, col.1714)
Aqui está outra intervenção, também do mesmo relator da Deputação da Fé. "Há, na Igreja, um duplo modo de infalibilidade: o primeiro é exercido pelo magistério ordinário. (...) Portanto, assim como o Espírito Santo, o Espírito da Verdade permanece TODOS OS DIAS na Igreja, a Igreja também ensina todos os dias as verdades da fé, com a assistência do Espírito Santo. Ela ensina todas as verdades já definidas, ou explicitamente contidas no depósito da revelação, mas ainda não definidas, ou ainda aquelas que são objeto de fé implícita. Estas verdades, a Igreja as ensina DIARIAMENTE, PRINCIPALMENTE PELO PAPA, assim como por cada um dos bispos em comunhão com ele. Todos, tanto o papa quanto os bispos, neste ensinamento ordinário, são infalíveis pela própria infalibilidade da Igreja. Eles diferem apenas nisso: os bispos não são infalíveis por si mesmos, mas precisam da comunhão com o papa que os confirma, MAS O PAPA, ELE NÃO PRECISA DE NADA ALÉM DA ASSISTÊNCIA DO ESPÍRITO SANTO, QUE LHE FOI PROMETIDA. Assim, ele ensina e não é ensinado, ele confirma e não é confirmado" (intervenção oficial de Monsenhor d'Avanzo, relator da Deputação da Fé, diante dos Padres do Vaticano, in: Dom Paul Nau "O magistério pontifício ordinário, lugar teológico. Ensaio sobre a autoridade dos ensinamentos do sumo pontífice", in: Revue thomiste, 1956, p. 389 - 412, separata Neubourg 1962, p. 15)._
Algumas anos após o concílio, o Papa Pio IX criticou os católicos liberais (carta Per tristissima, 6 de março de 1873). Nela encontramos uma frase-chave: "Eles se consideram mais sábios do que esta cátedra à qual foi prometido um auxílio divino, especial e PERMANENTE". Visto que a Cátedra de Pedro desfruta de uma assistência permanente do Espírito Santo, a infalibilidade "ordinária" é atribuída não apenas à Igreja universal, mas também ao papa ensinando sozinho. O magistério pontifício ordinário também é infalível.
O conhecimento de todos esses trechos constitui uma ajuda preciosa para entender bem o sentido da famosa definição da infalibilidade pontifícia feita no Vaticano I. Pois o perigo é grande de interpretar mal o Pastor aeternus. Um especialista na questão, Dom Nau, advertiu os teólogos que dissertavam sobre o crédito a ser dado ao magistério pontifício: "O perigo mais grave" é "abalando a confiança e a adesão dos fiéis. Seria particularmente perigoso opor magistério solene e ordinário com base em categorias demasiadamente simplistas de falível e infalível" (Nau: op. cit.). O domínio da infalibilidade do papa abrange não apenas o magistério extraordinário, mas também o magistério ordinário. A grande maioria dos católicos, sem mencionar os teólogos, sabe que o Vaticano I proclamou a infalibilidade do pontífice romano.
Mas o que é frequentemente esquecido é que o Vaticano I define uma infalibilidade para os dois modos de ensino: 1. o ensino pontifício extraordinário (solene); 2. o ensino ordinário.
O magistério pontifício ordinário também é infalível, seja em um discurso, em uma encíclica ou em uma bula de canonização. Para que o texto seja infalível, basta que o papa queira impor uma doutrina a todos os fiéis usando sua autoridade pontifícia. Algumas formulações usadas em documentos relacionados ao magistério ordinário provam que o papa deseja usar sua infalibilidade. Um exemplo disso é:
A proibição da contracepção artificial é "a expressão de uma lei natural e divina, contrária à ordem estabelecida por Deus" (Pio XII: Discurso às parteiras, 29-30 de outubro de 1951).
"Como supremo mestre da Igreja, nós, sentado na cátedra de São Pedro (ex cathedra Divi Petri), pronunciamos solenemente: 'Em honra da Santíssima Trindade e indivisível, para a exaltação da lei católica e a expansão da religião cristã, pela autoridade de NSJC, dos bem-aventurados apóstolos Pedro e Paulo e pela nossa (...), definimos e declaramos que a bem-aventurada Joana Antida Thouret é santa'" (Pio XI: carta decretal Sub salutiferae, 14 de janeiro de 1934).
"Cheios do dever do nosso cargo apostólico, e cheios de solicitude pela nossa santa religião, pela sã doutrina, pela salvação das almas que nos é confiada do alto e pelo bem mesmo da sociedade humana, julgamos necessário elevar novamente a voz" (Pio IX: encíclica Quanta cura, 8 de dezembro de 1864).
"Como doutor da Igreja universal", Pio XII ensina os "mistérios revelados por Deus" válidos para "todo o povo de Deus" (encíclica Mystici corporis, 29 de junho de 1943). Os termos utilizados por Pio XII não indicam claramente que ele está falando ex cathedra? E esse ensinamento infalível não está presente em um escrito ordinário? Portanto, como podemos limitar o campo da infalibilidade pontifícia apenas às definições solenes, como a definição da Imaculada Conceição em 1854 e da Assunção em 1950? Não seria isso mutilar a doutrina católica?
Visto que alguns teólogos (pseudo-católicos) negavam a infalibilidade do magistério ordinário pontifício, Pio XII reafirmou claramente a infalibilidade permanente dos pontífices: "Não se deve pensar que o que é proposto nas cartas encíclicas não exige por si só o assentimento, sob o pretexto de que os papas não exercem nelas o poder supremo do seu magistério. Com efeito, este ensinamento pertence ao magistério ordinário e para este magistério vale também a palavra de Cristo aos Apóstolos: 'Quem vos ouve, a mim ouve' (Lucas X, 16), e frequentemente o que é proposto e imposto nas encíclicas pertence há muito tempo à doutrina católica. Se, nos seus atos, os Sumos Pontífices deliberadamente emitem um julgamento sobre uma questão até então disputada, torna-se evidente a todos que, conforme o espírito e a vontade desses mesmos pontífices, essa questão não pode mais ser considerada uma questão livre entre teólogos" (encíclica Humani generis, 12 de agosto de 1950).
Aqui, Pio XII se opõe àqueles que, sob o pretexto de o papa não ensinar solenemente, acreditam que outros escritos podem conter opiniões contestáveis. Mas as encíclicas e outros atos do "magistério ordinário", diz Pio XII, são a voz de Cristo. E como Cristo nunca mente, esses textos são, por natureza, sempre infalíveis. Portanto, a infalibilidade é permanente, não limitada apenas a definições solenes pontuais.
E o mesmo papa disse em outra ocasião: "Assim que se faz ouvir a voz do magistério da Igreja, tanto ordinário quanto extraordinário, receba esta voz com ouvido atento e espírito dócil" (Pio XII aos membros do Angelicum, 14 de janeiro de 1958).
O Papa Leão XIII ordena aos católicos que creiam em tudo o que o papa ensina (uma nova prova da infalibilidade permanente do sumo pontífice): "É necessário aderir com adesão inabalável a TUDO o que os pontífices romanos ensinaram ou ensinarão, e, sempre que as circunstâncias o exigirem, fazer disso profissão pública" (Leão XIII: encíclica Immortale Dei, novembro de 1885). O papa não faz nenhuma distinção entre magistério extraordinário ou ordinário: "Portanto, sempre que a palavra deste magistério declare que tal ou tal verdade faz parte do conjunto da doutrina divinamente revelada, cada um deve crer com certeza que isso é verdadeiro; pois se isso de alguma maneira pudesse ser falso, seguir-se-ia, o que é evidentemente absurdo, que Deus mesmo seria o autor do erro dos homens" (Leão XIII: encíclica Satis Cognitum, 29 de junho de 1896).
Todas as encíclicas que condenam os erros modernos desde 1789 pertencem ao magistério ordinário. E Leão XIII afirma que a esse respeito, "cada um deve se ater ao julgamento da Sé Apostólica e pensar como ele próprio pensa. Portanto, se, nessas conjunturas tão difíceis [crise da Igreja e da sociedade], os católicos nos ouvirem como devem, eles saberão exatamente quais são os deveres de cada um tanto em teoria quanto em prática" (Immortale Dei, 1º de novembro de 1885). Portanto, o magistério pontifício ordinário é infalível. O papa é infalível diariamente.
A expressão "infaillibilité quotidienne du pape" pode surpreender o leitor, pois é raro ler tal afirmação em revistas ou livros atuais. No entanto, essa interpretação do Vaticano I é de fato o reflexo do que o papado ensinou sobre a infalibilidade do magistério pontifício ordinário. Já citamos Humani Generis; vamos citar mais uma interpretação autêntica da definição do Vaticano I, que deve ganhar a adesão do leitor, pois vem de um papa:
"O magistério da Igreja - o qual, segundo o plano divino, foi estabelecido neste mundo para que as verdades reveladas subsistam PERPETUAMENTE e sejam transmitidas facilmente e com segurança ao conhecimento dos homens - se exerce TODOS OS DIAS pelo pontífice romano e pelos bispos" (Pio XI: encíclica Mortalium Animos, 6 de janeiro de 1928).
CONCLUSÃO DO SEGUNDO CAPÍTULO:
RESUMO: de acordo com o Concílio Vaticano I, um papa nunca ensinará um erro na fé.
O ensinamento do papa será sempre irrepreensível. Isso é simples de provar, bastando comparar os prólogos de dois textos do Vaticano I:
1.1 A Igreja ensina a verdade todos os dias (prólogo de Dei Filius).
1.2 Esta infalibilidade diária da Igreja ensinante repousa na fé indestrutível do papa (prólogo de Pastor aeternus).
1.3 Portanto, o papa prega a verdade todos os dias, assim como os bispos em comunhão com ele.
Esta conclusão é corroborada por outros documentos do Vaticano I apresentados no capítulo seguinte.
[1] Esta carta está reproduzida no Apêndice A de nosso trabalho.
3. UM PAPA PODE CAIR EM HERESIA COMO 'DOCTOR PRIVADO'?
3. UM PAPA PODE CAIR EM HERESIA COMO 'DOCTOR PRIVADO'?
A. A rejeição da noção de "doutor privado" pelos Padres do Vaticano
B. São Belarmino refuta os partidários da tese do "doutor privado herege"
C. Os Padres do Vaticano comentam o "formulário de Hormisdas": os pontífices romanos estão "IMUNES contra o erro"!
D. Um papa nunca falhará "JAMAIS" na fé: este é o dogma definido por Pio IX e pelos Padres do Vaticano
No dia 18 de julho de 1870, Pio IX, o papa da infalibilidade, anatematizou qualquer pessoa que ousasse afirmar a tese do "papa podendo errar como doutor privado". Segundo Pio IX, o papa é "aquele cuja fé não pode falhar" (carta Ad apostolicae, 22 de agosto de 1851).
A. A rejeição da noção de "doutor privado" pelos Padres do Vaticano
Durante os preparativos do primeiro Concílio do Vaticano, um postulado dos bispos italianos continha uma frase onde se admitia que o papa poderia errar como um simples particular, mas que seria infalível como doutor público. Os bispos italianos propuseram que essa frase servisse de base para a definição da infalibilidade pontifical.
No entanto, este postulado NÃO FOI ACEITO pelos Padres, especialmente devido à passagem sobre o doutor privado falível! O Vaticano I define claramente que o pontífice romano possui uma fé "para sempre infalível" e que ela não pode sofrer falhas (Pastor Aeternus, capítulo 4).
Durante as deliberações do concílio, o relator da Deputação da Fé, Monsenhor Zinelli, fez esta intervenção contra a tese do "doutor privado herege":
"E não têm peso válido os casos hipotéticos do pontífice caindo em heresia como pessoa privada ou sendo incorrigível, que podem ser comparados com outros casos, como o do pontífice caindo em demência etc... Confiando na providência sobrenatural, consideramos, com uma probabilidade amplamente suficiente, que isso (um papa herege) nunca acontecerá" (relatório de Monsenhor Zinelli, relator da Deputação da Fé, no primeiro Concílio do Vaticano, in: Gerardus Schneemann (ed.): Acta et decreta sacrosancti oecumenici concilii Vaticani cum permultis aliis documentis concilium ejusque historiam spectantibus, Freiburg 1892, col. 357).
B. São Bellarmino refuta os partidários da tese do "doutor privado herege"
Quanto ao papa como doutor privado, Monsenhor Zinelli confia na Providência; ele se refere, sem dúvida, a um trecho bem conhecido do cardeal Bellarmino sobre as relações entre a providência e a inerrância do papa como pessoa particular. São Roberto Bellarmino (1542 - 1621), doutor da Igreja, sustenta que um papa não pode errar, mesmo como simples particular. Aqui estão suas palavras de um capítulo intitulado "do papa como simples pessoa particular":
"É provável e pode ser piedosamente acreditado que o sumo pontífice, não apenas não pode errar como papa, mas também não pode ser herético ou crer com pertinácia em qualquer erro na fé como simples particular (particularem personam). Isto é provado, primeiramente, porque é requerido pela suave disposição da providência de Deus. Pois o pontífice não apenas não deve e não pode pregar a heresia, mas também deve sempre ensinar a verdade, e sem dúvida o fará, dado que Nosso Senhor lhe ordenou que fortalecesse seus irmãos [...]. No entanto, eu pergunto, como um papa herético poderia fortalecer seus irmãos na fé e sempre lhes pregar a verdadeira fé? Deus poderia, sem dúvida, arrancar de um coração herético uma confissão de verdadeira fé, como em outro tempo fez falar a jumenta de Balaão. Mas isso seria mais por violência e de forma alguma conforme com o modo de agir da divina providência, que dispõe todas as coisas com suavidade. Isso é provado, em segundo lugar, pelo evento, pois até hoje, ninguém foi herético [...]; portanto, é um sinal de que isso não pode acontecer. Para mais informações, consulte o manual de teologia elaborado por Pighius" (São Roberto Bellarmino: De Romano Pontifice, IV, cap. 6).
São Bellarmino remete para mais informações a Pighius. Quem é Pighius? O neerlandês Albert Pighius (1490 - 1542) foi um teólogo muito estimado pelos papas de sua época. Ele compôs um Tratado sobre a Hierarquia Eclesiástica (Hierarchiae Ecclesiasticae Assertio, Colônia 1538). Neste tratado (especialmente no livro IV, cap. 8), Pighius demonstrou que um papa é incapaz de desviar da fé, mesmo como simples particular [1].
Saint Robert Bellarmino (De Romano Pontifice, livro II, capítulo 30) faz este julgamento sobre a tese de Pighius: "É fácil de defender!"
Ao contrário do que muitos comentadores de São Bellarmino afirmam, o santo cardeal não acredita de forma alguma na possibilidade de um papa ser herético. Ele adere, de fato, à tese de Pighius. Apenas como uma especulação intelectual puramente hipotética, ele estuda a possibilidade de um "papa herético". Citemos o trecho onde ele adere à tese de Pighius, enquanto anuncia que estudará as opiniões contrárias: "Há cinco opiniões sobre esta questão. A primeira é a de Albert Pighius (Hierarchiae Ecclesiasticae Assertio, livro IV, capítulo 8), para quem o papa não pode ser herético e, portanto, não pode ser deposto em nenhum caso. Esta opinião é provável e fácil de defender, como veremos mais adiante, em tempo oportuno. No entanto, dado que isso não é certo e que a opinião comum é o oposto, é útil examinar a solução a ser dada a esta questão, na hipótese de o papa poder ser herético" (De Romano Pontifice, livro II, capítulo 30).
Depois de anunciar que adere à primeira opinião, o santo cardeal apresenta as outras quatro opiniões. Em seguida, uma vez feita essa apresentação das cinco hipóteses, São Bellarmino demonstra que a tese de Pighius é a única verdadeira: 1. pela suave disposição da providência de Deus; 2. pelo evento (livro IV, capítulo 6; ver texto citado anteriormente).
O livro do cardeal Bellarmino está incluído na bibliografia especial sobre a infalibilidade estabelecida pelos Padres do Vaticano I (ver nosso capítulo 4). Na verdade, a obra especializada do cardeal Bellarmino sobre o pontífice romano é o ponto de referência constante dos Padres do Concílio do Vaticano. Eles se referem a ele continuamente em seus trabalhos, citando-o para provar seus postulados e intervenções. Pode-se dizer que o livro De Romano Pontifice é, de certa forma, a "Bíblia" dos Padres do Vaticano, assim como a Summa Theologiae de Santo Tomás foi a "Bíblia" dos Padres de Trento.
Na declaração conjunta sobre o esquema preparatório de Pastor Aeternus, os Padres reconhecem a autoridade doutrinária do santo cardeal ("a autoridade de Bellarmino"), dando-lhe ampla voz, excluindo todos os outros autores (!), para a interpretação autêntica de Lucas 22, 32, o que prova que o consideram como o melhor dos "autores testados" ("probatos auctores"). Este doutor da Igreja refuta de maneira vitoriosa os galicanos negadores da infalibilidade pontifícia e demonstra que "o Senhor rezou para obter dois privilégios para Pedro. Um deles consiste em que Pedro nunca poderá perder a fé (...). O outro consiste em que, como papa, Pedro nunca poderá ensinar algo contra a fé, ou seja, nunca se encontrará que ele ensina contra a verdadeira fé do alto de sua cátedra". O privilégio de nunca ensinar o erro "certamente permanecerá em seus descendentes ou sucessores" (De Romano Pontifice, livro IV, capítulo 4, citado pelos Padres: Relatio de Observationibus Reverendissimorum Concilii Patrum in Schema de Romani Pontificis Primatu, in: Schneemann: Acta... col. 288).
[1] Para provar suas afirmações, ele apresentava sete argumentos teológicos, além de uma demonstração histórica:
a. O papa é a regra de fé de todos os fiéis católicos: se ele errasse, um cego guiará outro cego (o que seria contrário à providência divina);
b. Que Pedro não possa errar é uma crença da Igreja universal (todos os católicos de todos os tempos e lugares o têm acreditado: portanto, é verdade);
c. A promessa de Cristo em Mateus XVI, 18;
d. A promessa de Cristo em Lucas XXII, 32;
e. A necessidade de manter a coesão: é necessário um centro estável e sólido (Roma), para contrariar as forças centrípetas (tantos povos diversos, às vezes vivendo em terras heréticas, precisam de um polo que os mantenha na fé).
f. É preciso evitar os hereges (Tito III; 2 Tessalonicenses III). "E não nos é permitido de modo algum separar-nos da cabeça do corpo da Igreja: separar-se é ser cismático". Pedro é o fundamento unido indissoluvelmente à Igreja, contra a qual as portas do inferno (... os hereges) não prevalecerão: "o que não seria possível se o papa fosse herege".
g. O herege ou o cismático não têm o poder de ligar ou desligar (Santos Atanásio, Agostinho, Cipriano, Hilário). O pleno exercício do poder é necessário à cabeça da Igreja visível. Portanto, Deus não permitirá que o papa caia na heresia.
O autor então empreende uma refutação dos supostos casos históricos de papas que teriam desviado da fé.
C. Os Padres do Vaticano comentam o "Formulaire d'Hormisdas": os pontífices romanos são "IMUNIZADOS contra o erro"
Que um papa não possa, de modo algum, desviar-se da fé fica claro na profissão de fé do papa São Hormisdas, que foi incorporada (em abreviado) no próprio texto de Pastor aeternus. Em 11 de agosto de 515, o papa São Hormisdas publicou seu Libellus fidei (literalmente traduzido como "programa ou panfleto da fé"; mas este texto é mais conhecido como Formulaire d'Hormisdas). O papa Adriano II impôs o Formulaire d'Hormisdas no VIII Concílio Ecumênico ("Constantinopla IV") a todos os bispos do Oriente e do Ocidente. O Concílio Ecumênico do Vaticano I incorporou uma citação abreviada do Formulaire no capítulo 4 de Pastor aeternus: "Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja" (Mateus 16,18); o que foi dito e comprovado pelos fatos; pois a religião católica sempre foi guardada sem mancha na Sé Apostólica e a doutrina católica sempre foi professada em sua santidade (...) Esperamos merecer permanecer na comunhão com vocês que é pregada pela Sé Apostólica, comunhão na qual reside, completa e verdadeira, a solidez da religião cristã. Este formulário não é claro como água cristalina?
De acordo com o Formulaire d'Hormisdas, o dogma da infalibilidade papal "se verificou nos fatos". Os Padres do Vaticano comentam: "Isso deve ser entendido não apenas como um simples fato (facto), mas também como um direito (jure) constante e imutável, em virtude das palavras de Cristo ['Tu és Pedro etc.'], que permanecem imutáveis. Enquanto durar a pedra sobre a qual Cristo fundou a Igreja, assim a religião católica e a doutrina santa serão guardadas imaculadas na Sé Apostólica, e isso por direito divino.
[...A infalibilidade papal] está perfeitamente contida no Formulaire d'Hormisdas (com a adição de Adriano II), que afirma: em virtude das palavras de Cristo 'Tu és Pedro etc.', na Sé Apostólica, ou seja, por Pedro e por aqueles que o sucedem nesta cátedra, a religião e a doutrina sempre foram guardadas imaculadas, e como foi mostrado acima, por direito divino, sempre serão guardadas [no futuro]. Isso equivale certamente à proposição que diz: os bispos romanos que ocupam a Sé de Pedro são, em relação à religião e à doutrina, IMUNIZADOS contra o erro" (Relatio de observationibus Reverendissimorum concilii Patrum in schema de romani pontificis primatu, in: Schneemann: Acta..., col. 281 - 284).
D. Um papa "JAMAIS" falhará na fé: esse é o dogma definido por Pio IX e pelos Padres do Vaticano!
É preciso acabar de uma vez por todas com essa maldita opinião de que "o papa pode se tornar herético como doutor privado", uma calúnia extremamente injuriosa para a honra do papado! Duas simples citações do capítulo 4 de Pastor aeternus, que define o dogma da infalibilidade papal, são suficientes para encerrar o debate de uma vez por todas.
Primeira citação: "A Sé de Pedro está SEMPRE isenta de todo ERRO." Segunda citação: "O carisma da fé NUNCA falhante."
Portanto, segundo Pio IX e os Padres do Vaticano, o papa está "SEMPRE" livre de qualquer erro doutrinal, e sua fé é "para SEMPRE" indefectível. Se as palavras ainda têm algum significado, isso significa que a tese do "papa doutor privado herético" é um erro na fé.
Além disso, a definição da infalibilidade papal deve ser entendida no sentido como a Igreja a definiu. A Santa Igreja Católica, Apostólica e Romana, Mãe e Mestra de todos os fiéis, definiu a infalibilidade papal no sentido de uma imunidade DIÁRIA do Sumo Pontífice contra o vírus do erro. O parágrafo final do capítulo 4 (Pastor aeternus) declara: "Se alguém, o que Deus não permita, tiver a presunção de contradizer esta definição, que seja anátema".
Um concílio ecumênico tem autoridade infinitamente superior à de qualquer teólogo, que não é, ele próprio, infalível em tudo o que escreve. A Igreja decidiu em 1870: a opinião daqueles que consideram que um papa pode cair em heresia como doutor privado já não é uma opinião livre, mas uma opinião contrária à fé solenemente definida por um concílio ecumênico.
Que alguns teólogos tenham uma opinião oposta ao magistério não nos impressiona de modo algum, pois em caso de desacordo, é a Igreja que tem a última palavra. "Poderíamos ter nos perguntado se é a palavra dos teólogos ou a do magistério da Igreja que tem mais peso e oferece uma melhor garantia de verdade. A este respeito, lemos na encíclica Humani generis: 'Este depósito (da fé) não foi confiado pela nosso Divino Redentor à interpretação autêntica de cada um dos fiéis, nem mesmo dos próprios teólogos, mas apenas ao magistério da Igreja (...). Além disso, Pio IX, nosso predecessor de imortal memória, quando ensinou que o papel muito nobre da teologia é mostrar como a doutrina definida pela Igreja está contida nessas fontes, acrescentou, não sem grave razão, estas palavras: 'no sentido em que a Igreja a definiu' (Inter gravissimas, 28 de outubro de 1870)'". Portanto, para o conhecimento da verdade, o que é decisivo não é a "opinião dos teólogos", mas o "sentido da Igreja". Caso contrário, seria quase tornar os teólogos "mestres do magistério", o que é um erro evidente" (Pio XII: discurso na sexta semana italiana de adaptação pastoral, 14 de setembro de 1956).
CONCLUSÃO DO TERCEIRO CAPÍTULO: Que um papa possa desviar-se da fé como "doutor privado" é uma heresia absurda condenada solenemente pelo Concílio Vaticano.
4. A HISTÓRIA ECLESIÁSTICA CONHECE CASOS EM QUE UM PONTÍFICE APOIOU UMA HERESIA?
A. Fábulas caluniosas, repetidas cem vezes
B. São Pedro
C. São Libério
D. Honório I
E. João XXII
A. Das fábulas caluniosas, cem vezes refutadas
A tese da infalibilidade permanente do papa é solidamente estabelecida por argumentos de razão e autoridade. Além disso, essa tese é confirmada pelos fatos: nunca nenhum papa se desviou da fé.
Que alguns papas tenham errado na fé é uma fábula caluniosa, inventada no século XVI por um grupo de historiadores protestantes chamados "centuriadores de Magdeburgo". Seus mentirosos foram retomados pelos galicanos e depois pelos anti-infaibilistas do século XIX. "Este é o tipo de ataque adotado há três séculos pelos centuriadores de Magdeburgo. Como, de fato, os autores e promotores das novas opiniões não conseguiram derrubar as muralhas da doutrina católica, eles adotaram uma nova estratégia, empurrando a Igreja para discussões históricas. O exemplo dos centuriadores foi seguido pela maioria das escolas que se revoltaram contra a antiga doutrina e também, o que é ainda mais lamentável, por vários católicos [...]. Começou-se a examinar os menores vestígios de antiguidades; a vasculhar todos os cantos dos arquivos; a trazer à luz fábulas fúteis, a repetir cem vezes imposturas já refutadas. [...] Entre os maiores pontífices, mesmo aqueles de virtude eminente foram acusados e manchados [...]. Os mesmos fios ainda estão em uso hoje; e certamente, mais do que nunca, pode-se dizer que neste tempo o artifício do historiador parece ser uma conspiração contra a verdade" (Leão XIII: breve Saepenumero considerantes, 18 de agosto de 1883).
De 1868 a 1870, houve uma verdadeira batalha jornalística em torno dos "casos históricos" de papas que teriam falhado na fé. Os anti-infaibilistas ingleses, franceses e alemães atacaram diretamente o papa Honório I. "Hoje testemunhamos esses debates infelizes que tendem a acusar sua memória e a manchar indiretamente a Sé de Pedro", lamentava o Padre Chéry, diretor da Revue œcuménique du Vatican (in: Guérin: Concile œcuménique du Vatican. Son histoire, ses décisions en latin et en français, Bar-le-duc et Paris 1877, p. 116).
O Padre Gratry, considerando que Honório tinha sido herege, tentou impedir a pronunciação do dogma da infalibilidade pontifical. Ele condenou ao inferno aqueles que ignorassem sua proibição: "Todos aqueles que, apesar destas razões e fatos, ousarem passar por cima e pronunciar na escuridão, prestarão contas no tribunal de Deus" (L'Univers, 19 de janeiro de 1870).
O beneditino Dom Prosper Guéranger (um erudito célebre por seus trabalhos sobre a liturgia: Instituições Litúrgicas + O Ano Litúrgico) refutou completamente as acusações de Gratry em Defesa da Igreja Romana contra as Acusações do Pe. Gratry, Paris 1870. Um ano antes, Dom Guéranger havia publicado um estudo sólido sobre os "casos históricos" dos papas caluniados em A Monarquia Pontifical, Paris e Le Mans 1869. O Papa Pio IX o felicitou calorosamente, lamentando ao mesmo tempo a campanha de imprensa desencadeada pelos anti-infaibilistas: "Esta loucura chega a tal extremo que eles se propõem a refazer até a constituição divina da Igreja e a adaptá-la às formas modernas de governos civis, a fim de rebaixar mais facilmente a autoridade do supremo Chefe que Cristo lhe designou e cujas prerrogativas eles temem [= infalibilidade e autoridade]. Assim, vemos-os ousadamente apresentar como indubitáveis ou pelo menos completamente livres certas doutrinas repetidamente reprovadas, ressuscitar CHICANAS HISTÓRICAS, CITAÇÕES MUTILADAS, CALÚNIAS lançadas contra os pontífices romanos, sofismas de todos os tipos conforme os antigos defensores dessas mesmas doutrinas. Com impudência, eles trazem tudo isso à tona, ignorando completamente os argumentos com os quais foram CENTENAS DE VEZES REFUTADOS.
Seu objetivo é agitar as mentes e incitar aqueles de sua facção e o público ignorante contra o sentimento comummente professado. Além do mal que causam ao semear tal perturbação entre os fiéis e ao entregar às discussões de rua as questões mais sérias, nos fazem lamentar em sua conduta uma irracionalidade igual a sua audácia" (Pio IX: breve Dolendum profecto, 12 de março de 1870, endereçado a Dom Guéranger para felicitá-lo por seu livro A Monarquia Pontifical, no qual o célebre beneditino defende a infalibilidade permanente do papa).
O papa lamentou essa campanha de imprensa mentirosa em outro breve: "É extremamente apropriado que tenhamos de maneira global e bem coordenada aquilo que a razão teológica nos demonstra, aquilo que as Sagradas Escrituras nos ensinam, aquilo que sempre foram mantidos e nos foram transmitidos da forma mais constante por este Trono Apostólico, pelos concílios, pelos doutores e pelos Padres, em relação à primazia, ao poder, às prerrogativas do pontífice romano, e ao mesmo tempo as razões muito sérias pelas quais há muito tempo foram REFUTADOS OS SOFISMAS que, se disfarçando sob as aparências enganosas da novidade, são jogados ao público através de panfletos e jornais, e isso com tanta confiança que se diria serem descobertas feitas pela sabedoria moderna e até então desconhecidas" (Pio IX: breve Cum ad sacrae, 5 de janeiro de 1870, endereçado ao Padre Jules Jacques, que havia publicado uma tradução dos escritos de Santo Afonso de Ligório sob o título Do Papa e do Concílio).
Os Padres do Primeiro Concílio do Vaticano, conhecendo melhor a história eclesiástica do que os pseudo-historiadores anti-infaibilistas, não se deixaram de modo algum impressionar pela agitação midiática. O concílio, ignorando essas calúnias, definiu a infalibilidade e afirmou claramente que a teoria da infalibilidade era confirmada pelos fatos: "O que foi dito é comprovado pelos FATOS; pois a religião católica sempre foi mantida imaculada junto ao Trono Apostólico [...]. Nossos predecessores trabalharam incansavelmente para a propagação da doutrina salvadora de Cristo entre todos os povos da terra e cuidaram com igual zelo de sua conservação autêntica e pura onde ela foi recebida" (constituição dogmática Pastor aeternus, 18 de julho de 1870, cap. 4).
Além disso, durante os trabalhos preparatórios do Pastor aeternus, os Padres fizeram uma declaração especial sobre o esquema preparatório do Pastor aeternus, acompanhada de uma bibliografia científica destinada a refutar as objeções dos "casos históricos" de papas que teriam falhado!!! Aqui estão trechos de sua declaração crucial, infelizmente totalmente desconhecida nos dias de hoje:
Os Padres observaram que alguns se opunham à proclamação do dogma da infalibilidade, devido a supostas "exceções retiradas da história eclesiástica". No entanto, segundo os Padres, "a infalibilidade do pontífice romano é uma verdade divinamente revelada; portanto, nunca será possível demonstrar, através de fatos históricos, que isso seja falso; pelo contrário, se tais fatos históricos forem opostos a esta verdade, esses fatos devem ser considerados falsos, visto que estão em oposição a uma verdade absolutamente certa". Os Padres então citaram um trecho do capítulo 4 da constituição conciliar Dei Filius, que acabara de ser votada (esse trecho de Dei Filius era na verdade uma retomada de uma definição feita pelo V Concílio de Latrão): "Portanto, definimos como completamente falsa qualquer afirmação contrária à verdade da fé iluminada". Os Padres do Vaticano tiraram a seguinte conclusão (em sua declaração sobre o esquema preparatório do Pastor aeternus): "Portanto, conclui-se que todas as conclusões da ciência, ou da história eclesiástica, que se opõem à infalibilidade do pontífice romano (que manifestamente deriva das fontes da Revelação) devem ser consideradas certamente como erros".
Um pouco mais adiante, os Padres escreveram: "A refutação dessas dificuldades [históricas], levantadas para se opor a esta verdade, não é tanto o negócio dos Padres do concílio, mas sim da escola dos teólogos, que, no que diz respeito a esta causa, já fizeram seu trabalho há muito tempo. De fato, essas exceções históricas - questão discutida no momento presente - não são novas, mas são há muito tempo muito difundidas e comuns. As mencionadas dificuldades históricas foram frequentemente e completamente, e até elegantemente, resolvidas por aqueles que trataram das coisas da teologia (em suas dissertações sobre a primazia da Santa Sé, a infalibilidade da Igreja Católica e outras verdades católicas), durante suas diversas controvérsias contra os protestantes, jansenistas, febronianos e outros [hereges].
Parece menos adequado e menos apropriado para os Padres voltar à questão e reexaminar novamente uma por uma essas dificuldades, como se as objeções feitas contra as verdades católicas tivessem um fundamento de realidade e como se tivessem conservado até hoje um verdadeiro valor e força; ou ainda - o que seria o mesmo - como se esta verdade revelada e a doutrina da Igreja Católica não fossem suficientemente protegidas e defendidas" (Relatio de observationibus Reverendissimorum concilii Patrum in schema de romani pontificis primatu, in: Schneemann (ed.): Acta..., col. 287 - 288).
Por isso, os Padres recusaram-se a examinar a história eclesiástica e simplesmente se contentaram em referir-se a uma bibliografia científica, onde as supostas quedas dos papas eram refutadas: "Que se consultem então autores sérios e comprovados, que escreveram sobre as principais exceções que são opostas [ao dogma]" [1].
A princípio, se o magistério afirma que um papa nunca pode falhar na fé, o crente julgará desnecessário verificar essa afirmação examinando a história de todos os pontificados desde São Pedro. No entanto, dado que arianos, galicanos, protestantes e jansenistas se esforçaram para provar que tal ou tal papa caiu em heresia, e que seus argumentos são constantemente retomados e repetidos pelos meios católicos hoje em dia, parece ainda inevitável estudar esses casos controversos.
[1] Aqui está a bibliografia deles:
a) na causa do papa Virgílio: Giuseppe Agostino Orsi: De irreformabili Romani Pontificis in definiendis fidei controversiis iudicio, Roma 1739,1. 1, parte 1, cap. 19 - 20; Ieremias a Benettis: Privileg. S. Petri vindic, Roma 1759, parte II, t. V, App. § 5; Ballerini: De vi et ratione Primatus, cap. 15; Louis de Thomassin d'Eynac: Dissertationes, commentarii, notae in concilia generalia et particularia (J.T. de Rocaberti: Bibliotheca Maxima Pontificia, t. XV), Roma 1698,1. 1, Disp. XIX; Pierre de Marca (autor do século XVII): Diss. de Vigilio; e recentemente Al. Vincenzi in S. Gregorii Nyss. et Origenis scripta cum App. de actis Synodi V., 1. IV et V;
b) na causa do papa Honório: entre os autores mais antigos: Joseph Biner: Apparatus eruditionis ad jurisprudentiam praesertim Ecclesiasticam, Augsburgo e Freiburg 1754, partes III, IV e XL; Orsi: op. cit. cap. 21 28; St. Robert Bellarmin: De romano pontifice, livro IV, cap. II; Thomassin: op cit., Diss. XX; Alexandre Natalis: Historia Ecclesiastica veteris novique testamenti Constantini Roncaglia et Joannis Dominici Mansi notis et animadversionibus castigate et illustrata, Veneza 1776,1. V, século VII, Diss. II; François Antoine Zaccaria: Anti-Febronio, 1767 [tradução alemã: Augsburgo 1768; tradução francesa: L 'Antifebronius ou la primauté du pape justifiée par le raisonnement et par l'histoire, Paris 1859-1860, 4 vols.], parte II, livro IV [refutação do livro de Justinus Febronius: De statu Ecclesiae et legitima potestate romani pontificis..., colocado no Índice em 27 de fevereiro de 1764, 3 de fevereiro de 1766, 24 de maio de 1771 e 29 de março de 1773]; entre os autores mais recentes: Civiltà cattolica, ano 1864, série V, volume XI e XII; Gerhard Schneemann: Studien über die Honorius-Frage, Freiburg 1864 [a Civiltà cattolica e Schneemann refutam o livro de Döllinger (principal teólogo da seita dos "velhos-católicos") publicado no ano anterior, intitulado Die Papstfabeln des Miltelalters]; Joseph Pennacchi: De Honorii I. Romani Pontificis causa in Concilio VI. dissertatio. Ad Patres Concilii Vaticani, Roma 1870;
c) na causa da queda [suposta] do pontífice romano no que diz respeito ao ministro do sacramento da ordem: Orsi: op. cit. livro III, cap. 31; Tournely, que em seu tratado De Sacramento Ordinis refuta as objeções de Morini, etc.;
d) na causa da bula de Bonifácio VIII: Aguirre: Defens. Cathedrae S. Petri_,_ disp. 32 - 33; Joseph Hergenröther: Anti-Ianus. Eine historisch-theologische Kritik der Schrift "Der Papst und das Concil" von Janus, Freiburg 1870, p. 133 sqq. [refutação de um livro colocado no Índice em 26 de novembro de 1869, publicado sob o pseudônimo "Janus" por Johann Joseph Ignaz von Döllinger, o mentor da seita dos "velhos-católicos"].
B. São Pedro
Vamos começar com uma acusação dirigida ao primeiro papa, São Pedro. São Pedro não foi repreendido por São Paulo por colocar em risco a sã doutrina? (Gálatas II, 11)?
Desde os primórdios do cristianismo, alguns falsos irmãos tentaram judaizar a Igreja. "Falsos irmãos se infiltraram secretamente entre nós, para espiar a liberdade que temos em Cristo Jesus e nos escravizar de novo", nos sujeitando novamente ao jugo das prescrições legais judaicas (Gálatas II, 4)_. Esses falsos irmãos exigiram que os pagãos convertidos ao cristianismo também observassem as prescrições da lei do Antigo Testamento. No Concílio de Jerusalém, São Pedro disse que não era necessário impor essa observância aos pagãos. Os participantes do concílio concordaram com a opinião do primeiro papa (Atos dos Apóstolos XV, 1-29; Gálatas II, 1-6).
São Pedro deixou Jerusalém e foi para Antioquia. Ele já não observava as prescrições legais do judaísmo. No entanto, algum tempo depois, cristãos de origem judaica de Jerusalém chegaram a Antioquia, que ainda praticavam a antiga lei. Como resultado, São Pedro passou a comer com eles à maneira judaica, para não ofendê-los. Isso lhe rendeu uma repreensão por parte de São Paulo.
São Paulo mesmo relata, em sua epístola aos Gálatas, como ocorreu o incidente em Antioquia. Citamos essa epístola, acrescentando algumas explicações entre colchetes.
"Quando Cefas [São Pedro] veio a Antioquia", conta São Paulo, "eu me opus a ele em face, porque ele estava repreensível. Pois, antes que alguns homens [= cristãos de origem judaica que ainda seguiam as prescrições judaicas] do grupo de Tiago [bispo de Jerusalém] chegassem, ele comia [indiferentemente todo tipo de carne] com os gentios [convertidos]; mas, após a chegada deles, ele se retirou e se separou [desses gentios], temendo [escandalizar] os circuncisos, [para quem esse costume de comer carnes proibidas pela lei parecia um grande pecado]. E os outros judeus também dissimularam com ele, a ponto de levar até Barnabé a se deixar levar por essa dissimulação.
Mas, quando vi que não estavam agindo corretamente conforme a verdade do Evangelho, [que era ofendida por essa falsa observância das cerimônias da lei], eu disse a Cefas na frente de todos: 'Se você, sendo judeu, vive como os gentios e não conforme a lei judaica, como você pode [por seu exemplo] obrigar os gentios a judaizar? [..,] O homem não é justificado pelas obras da lei [antiga], mas somente pela fé em Jesus Cristo'" (Gálatas II, 11-16).
Vamos destacar primeiro que São Pedro não ensinou que se deveria judaizar, mas teve simplesmente um comportamento nessa direção ("não andava" segundo o Evangelho, mas não "não ensinava" segundo o Evangelho). Isso foi destacado já no século III pelo escritor eclesiástico Tertuliano (Da prescrição contra os hereges, capítulo 23): São Pedro cometeu ali "um erro de procedimento, não de doutrina".
Além disso, ele agiu assim por medo de escandalizar os cristãos de origem judaica, como prova a expressão "por medo". A palavra "dissimulação" também indica que ele não estava expressando sua verdadeira convicção, que era ortodoxa. Por fim, ao ouvir sem responder os severos reproches de São Paulo e depois mudar sua atitude, ele deu a todos uma grande lição de humildade.
Para entender bem o incidente de Antioquia, é necessário conhecer o contexto histórico e geográfico da época. Havia, de fato, uma diferença significativa entre a comunidade cristã em Jerusalém e a de Antioquia.
As prescrições da lei judaica sobre alimentos, circuncisão, ritos de purificação, etc., não eram obrigatórias para os gentios (decisão de São Pedro no Concílio de Jerusalém), e tampouco o eram para os judeus convertidos ao cristianismo.
Em Jerusalém, os cristãos de origem judaica ainda observavam as prescrições legais, enquanto em Antioquia, os cristãos de origem judaica já as haviam abandonado. Por quê? Porque em Jerusalém, todos os habitantes eram judeus, enquanto em Antioquia, a população era mista: ao ver que os cristãos gentios de Antioquia não praticavam a lei judaica, os cristãos judeus de Antioquia também acabaram por abandonar suas antigas práticas judaicas.
Para preservar a sensibilidade da comunidade cristã de Jerusalém, como observou São João Crisóstomo, "Pedro não ousava dizer claramente e abertamente aos seus discípulos que era necessário abolir completamente essas práticas. Ele temia que, se tentasse eliminar prematuramente esses hábitos, poderia ao mesmo tempo destruir neles a fé em Cristo, pois o espírito dos judeus, há muito tempo imbuído de preconceitos da sua lei, não estava preparado para ouvir tais conselhos. Portanto, São Pedro permitia que eles seguissem as tradições judaicas" (São João Crisóstomo: Comentário sobre a Epístola aos Gálatas).
Por isso, São Pedro, por consideração aos cristãos judeus da Palestina, observava as prescrições judaicas enquanto estava em Jerusalém. No entanto, ao chegar a Antioquia, ele podia viver como os gentios sem temer chocar os cristãos judeus locais, que há muito haviam abandonado a observância das leis judaicas.
Mas quando alguns cristãos judaizantes de Jerusalém chegaram a Antioquia, São Pedro mudou novamente seu comportamento e passou a observar a lei judaica para não escandalizar os recém-chegados, como explica São João Crisóstomo:
"Enquanto Pedro vivia assim [em Antioquia], alguns judeus enviados por Tiago chegaram lá, ou seja, de Jerusalém, que sempre viveram naquela cidade e nunca conheceram outro modo de vida, mantendo os preconceitos judaicos e seguindo muitas dessas práticas. Então Pedro, vendo esses discípulos que vieram de Tiago e de Jerusalém e que ainda não estavam fortalecidos na fé, temeu que, se escandalizados, rejeitassem a fé. Assim, ele mudou novamente sua conduta, cessando de viver como os gentios e retornando à sua primeira atitude de condescendência, observando as regras alimentares" (São João Crisóstomo: Homilia sobre o texto: "Eu resisti a ele em face").
No entanto, quando percebeu (graças à repreensão de São Paulo) que sua atitude condescendente em relação aos judaizantes de Jerusalém poderia prejudicar a fé dos cristãos em Antioquia, São Pedro mudou imediata e definitivamente sua postura.
Em resumo, a crítica de São Paulo foi justificada porque a atitude excessivamente condescendente de São Pedro em relação aos judaizantes de Jerusalém estava prejudicando os fiéis de Antioquia.
No entanto, é preciso mencionar em defesa de São Pedro que sua conduta foi inspirada por um motivo nobre, pois ele começou a judaizar apenas para evitar escandalizar os cristãos que chegaram de Jerusalém: "Ele temeu que, se escandalizados, rejeitassem a fé", disse São Crisóstomo. São Pedro agiu assim por caridade, e não porque ele próprio tivesse se desviado da fé!
O príncipe dos teólogos, São Tomás de Aquino, não diz outra coisa em seu comentário sobre a atitude de São Pedro em Antioquia. "Ele agia assim, 'porque temia aqueles que vinham dos circuncisos' (Gálatas II, 12), isto é, dos judeus, não por um medo humano ou mundano, MAS POR UM MEDO INSPIRADO PELA CARIDADE, ou seja, para que não fossem escandalizados, diz a Glosa. Pedro se tornou, assim, como um judeu entre os judeus, fingindo pensar como os fracos. No entanto, esse medo dele era contrário à ordem, porque nunca se deve abandonar a verdade por medo do escândalo" (São Tomás: Comentário sobre todas as epístolas de São Paulo; lição 3 sobre o capítulo II da epístola aos Gálatas).
Como conclusão, citaremos ainda São Jerônimo: "Ele se retirava e se separava, temendo os reproches dos circuncisos. Ele temia que os judeus, dos quais ele era apóstolo, se afastassem da fé de Cristo por causa dos gentios; IMITADOR DO BOM PASTOR, ele tremia em perder o rebanho confiado aos seus cuidados" (São Jerônimo: Carta endereçada a São Agostinho em 404).
C. São Libério
C. São Libério
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Abbé J.-E. Darras | Da suposta queda do Papa Libério | Comprar na Editions Saint Remi |
Abbé Louis Nazaire Béguin | A primazia e infalibilidade dos SOBERANOS PONTÍFICES [O arianismo e o Papa Libério pp 147-185] | Baixar em PDF [Atenção! 22.5MB] |
Bibliothèque Saint Libério [http://www.liberius.net] | O Papa São Libério | Baixar em PDF |
Para outros papas, por exemplo Honório Clique aqui e leia o estudo do abbé Béguin |
Certos escritores afirmam que o Papa São Libério (352 - 366) teria apoiado os hereges arianos e excomungado o bispo católico São Atanásio.
Essa acusação é completamente injusta, pois São Libério se destacou exatamente pelo seu combate ao arianismo, o que inclusive resultou no seu exílio de Roma pelo imperador ariano. Longe de excomungar Atanásio, ele o defendeu contra seus adversários!
A crítica a São Libério é tão infundada que até um oponente destacado da infalibilidade papal como o Monsenhor Bossuet não pôde usá-la. "Em 1684, Bossuet foi encarregado por Luís XIV de compor a Defesa da declaração da Igreja da França [defendendo o galicanismo]. Ele imediatamente iniciou este trabalho, que lhe custaria tanto esforço e lhe daria tão pouca satisfação. Em busca de tudo que pudesse enfraquecer a infalibilidade dos papas, ele logo se deparou com a queda de Libério. Qual foi o resultado do longo exame que ele fez deste fato? Seu secretário, o abade Ledieu, nos informa: depois de escrever e reescrever vinte vezes o capítulo sobre Libério, ele acabou por removê-lo completamente, pois não provava o que ele queria" (abade Benjamin Marcellin Constant: A história da infalibilidade dos papas ou pesquisas críticas e históricas sobre os atos e decisões pontificais que alguns escritores consideraram contrários à fé, segunda edição, Lyon e Paris 1869, vol. I, p. 357, baseado em História de Bossuet, Peças justificativas, V, 1, vol. II).
"Libério subiu ao trono pontifício em 22 de maio de 352. Poucos meses depois, duas delegações chegaram a Roma: uma, enviada pelos bispos do Oriente, trouxe uma acusação contra o bispo de Alexandria [...]; a outra veio fazer, em nome de todos os bispos do Egito, a defesa completa do mesmo personagem. O que Libério fez? Ele convocou um concílio em Roma, fez a leitura das cartas dos bispos do Oriente e dos bispos do Egito, ouviu os argumentos de ambas as partes e, suficientemente convencido sobre a questão, encerrou os debates e declarou que a acusação contra Atanásio era sem fundamento.
"No concílio realizado em Arles em 353, o legado Vicente de Capua acredita que o bem da Igreja exige que se faça o sacrifício de um homem para a paz geral. A fé de Niceia é respeitada, mas Atanásio é condenado. Libério, ao receber a notícia, fica profundamente entristecido; ele chama seu legado de prevaricador, jura morrer antes de abandonar o inocente. [...]
"Um ano depois, o imperador ariano Constâncio reprova novamente Libério por seu apoio ao bispo de Alexandria [... mas o papa permanece firme]."
Em 355, o oficial Eusébio e, depois, o próprio imperador, pressionaram Libério para que condenasse aquele que consideravam seu inimigo pessoal. "Como, eu lhes pergunto", respondeu Libério, "agir assim com Atanásio? Como podemos condenar aquele que dois concílios de toda a terra declararam puro e inocente, aquele que um concílio em Roma enviou em paz? Quem nos persuadirá a separar de nós, na sua ausência, aquele que, em sua presença, admitimos à comunhão e recebemos com ternura? [...]". Não havia espaço para excomunhão; pelo contrário, tudo estava repleto de provas do mais sincero apego" (Constant, vol. 1, p. 329-331).
O imperador tentou fazer São Libério ceder através de presentes e ameaças, mas em vão. Então, o imperador ordenou que ele fosse exilado para Beroé, na Trácia, e instalou um antipapa em Roma chamado "Félix II".
Após uma petição das mulheres romanas, o imperador chamou São Libério de volta. São Libério teria feito concessões doutrinárias ao arianismo para poder retornar do seu exílio em Roma?
O antipapa "Félix II", embora fosse fiel à fé de Niceia, mantinha relações com os arianos. Por essa razão, era odiado pelos fiéis em Roma e sua igreja estava vazia. Quando São Libério retornou, foi recebido pelo povo de forma triunfal. Se São Libério tivesse feito qualquer concessão aos arianos, os paroquianos teriam demonstrado a mesma hostilidade que mostraram a "Félix II".
O bispo Ósio manteve a fé até os 90 anos, quando assinou uma fórmula ariana sob coação. Sua queda causou grande repercussão. Se São Libério tivesse caído de maneira semelhante, o escândalo teria sido ainda maior e sua memória teria sido manchada para sempre. Pelo contrário, este pontífice desfruta de uma renomada excepcional, incompatível com uma suposta queda. "Deve-se admirar que Sirício o considere um de seus predecessores mais ilustres; que São Basílio o chame de 'bem-aventurado, muito bem-aventurado'; São Epifânio, de 'pontífice de memória feliz'; Cassiodoro, de 'o grande Libério, o santíssimo bispo que supera todos os outros em mérito e é um dos mais célebres em tudo'; Teodoreto, de 'o ilustre e vitorioso atleta da verdade'; Sozomeno, de 'um homem raro em todos os aspectos'; Lúcio Dexter, de 'São Libério'; Santo Ambrósio, de 'santo, muito santo bispo'" [1].
"Argumentar-se-á que que Santo Atanásio fala da queda de Libério, tanto em sua 'Apologia contra os arianos', quanto em sua 'História dos arianos dirigida aos solitários'; mas todos concordam que a 'Apologia' foi escrita no máximo até 350, ou seja, dois anos antes de Libério se tornar papa. O trecho onde se fala de sua queda é claramente uma adição posterior, feita por uma mão estranha e inexperiente; pois longe de fortalecer a 'Apologia', ela a torna incoerente e ridícula. A 'História dos arianos' também foi escrita antes do período em que se supõe a queda de Libério, ou pelo menos antes do momento em que Santo Atanásio poderia ter conhecimento disso, assim como Osius; pois várias vezes fala-se de Leôncio de Antioquia como ainda vivo. E vimos que sua morte foi informada em Roma, na época em que as mulheres romanas suplicaram a Constâncio que permitisse o retorno do papa, que certamente então não tinha ainda transgredido. Portanto, o trecho onde se fala de sua queda é ainda outra adição posterior, que não se harmoniza tanto com o que a precede quanto com o que a segue. Mas quem poderia ter feito essas interpolações? Vimos que ainda em vida os arianos supuseram uma carta de Santo Atanásio a Constâncio. O que puderam fazer durante sua vida, puderam fazê-lo ainda mais facilmente após sua morte" (Abbé René François Rohrbacher: 'Histoire universelle de l'Église catholique', 1842-1849, vol. III, p. 167).
"Objetarão ainda que Santo Hilário, em vários lugares de seus escritos, teria anatematizado São Libério como herege. Mas aqui novamente são interpolações de copistas arianos. O historiador Ruffin escreveu, de fato, cinquenta anos após a morte de São Libério: 'Os livros tão instrutivos compostos por Santo Hilário para contribuir para a conversão dos signatários de Rimini [concílio ariano], foram tão falsificados pelos hereges que até Hilário não os reconheceria' (in: Constant, vol. 1, p. 328).
Os arianos falsificaram os escritos de Santo Atanásio, de São Jerônimo, de Santo Hilário e de São Libério também (análise detalhada em Constant, vol. 1, p. 294-349).
Que São Libério tenha caído no arianismo e excomungado Atanásio é uma invenção forjada por falsificadores arianos. 'A história dos arianos apresenta uma coleção de falsificações em todos os níveis: inserem sub-repticiamente uma carta em uma palavra para alterar seu sentido. [...] Apagam assinaturas [...]. Acrescentam secretamente artigos às decisões tomadas em público. [...] Supõem cartas: acabamos de ver aquelas atribuídas a Libério. Atanásio também foi alvo desse tipo de provação: 'Quando soube que os arianos afirmavam que eu havia escrito uma carta ao tirano Magêncio, e que diziam mesmo ter uma cópia dessa carta, fiquei fora de mim; passei noites sem dormir; ataquei meus acusadores presentes; gritei alto de indignação e implorei a Deus com lágrimas e soluços que vocês ouvissem favoravelmente minha justificação' (Santo Atanásio: 'Apologia ad Const.'). Às vezes forjam petições e simulam assinaturas. [...] Por fim, dão o nome de um concílio católico a suas reuniões e, sob essa roupagem, publicam seus próprios atos como se tivessem sido canonicamente redigidos e aprovados; e esse ardil foi tão bem-sucedido que até mesmo São Agostinho confundiu por muito tempo o concílio ariano de Filipópolis com o respeitável concílio de Sárdica. Parece-nos, depois disso, que não será surpreendente que alguns de seus escritores tenham acusado Libério de compartilhar seus sentimentos, que alguns católicos tenham dado crédito a calúnias tão habilmente fabricadas e audaciosamente sustentadas" (Constant, vol. 1, p. 359-361).
São Libério condenou os concílios heréticos de Tiro, Arles, Milão e Rimini. Isso é uma nova prova de sua ortodoxia.
Outra prova: ele não foi convidado para o concílio de Rimini organizado pelos arianos. Em 359, o imperador ariano Constâncio convocou o concílio de Rimini, mas cuidou para não convidar São Libério, Atanásio e os cinquenta bispos exilados do Egito!
São Jerônimo comentou os efeitos do concílio de Rimini com uma frase que se tornou famosa: "O universo gemeu e se espantou por ser ariano". São Libério SOZINHO teve o mérito de corrigir a situação: ele anulou o concílio de Rimini e persuadiu os bispos signatários a rejeitarem a interpretação herética. "Os termos 'hipóstase' e 'consubstancial' são como uma fortaleza inexpugnável, que sempre desafiará os esforços dos arianos. Em vão em Rimini eles tiveram a habilidade de reunir os bispos para forçá-los por artimanhas ou ameaças a condenar palavras prudencialmente inseridas no símbolo, este artifício não serviu para nada [...]. Recebemos em nossa comunhão os bispos enganados em Rimini, contanto que renunciem publicamente a seus erros e condenem Ário" (in: Constant, vol. 1, p. 401-403).
A situação se tornou ainda mais dramática no ano seguinte. No concílio de Constantinopla (359 ou 360), os acacianos e os arianos retomaram a fórmula de Rimini e a heresia do concílio ariano de Niceia na Trácia (359), que rejeitava a palavra "substância" (sempre com o objetivo de minar a fé definida no concílio católico de Niceia em 325). "O concílio fez todos os bispos assinarem esta fórmula e a enviou para todas as províncias do império, com uma ordem do imperador de exilar todos os que se recusassem a assinar. A grande maioria dos bispos assinou" (Paul Guérin: 'Les conciles généraux et particuliers', Bar-le-duc 1872, vol. 1, p. 141). Entre os raros defensores da fé que se recusaram a assinar estava o papa São Libério.
É triste ler, sob algumas penas, que São Libério teria sido ariano. Ele teve o imenso mérito de salvar, sozinho, todo o universo católico, que havia caído no arianismo, quando centenas de bispos reunidos no conciliábulo de Rimini assinaram documentos suscetíveis de interpretação ariana. Ele levou os bispos de Rimini a retratarem suas posições. Quando esses bispos se retrataram, São Libério informou os bispos da Macedônia. Sua carta merece ser citada, pois, ao lê-la, é impossível ver como este papa canonizado poderia ser rotulado como ariano! Pelo contrário, ele demonstra uma santa intransigência, o que é todo o seu crédito e o crédito da papalidade.
"Queremos informá-los, para que não ignorem, que todos os blasfêmias de Rimini foram anatematizados por aqueles que foram enganados pela fraude", ou seja, os bispos persuadidos por alguns arianos durante a realização do conciliábulo, mas que depois reconsideraram graças ao papa. "Mas vocês devem avisar a todos, para que aqueles que, pela força ou fraude, sofreram danos em sua fé, possam agora sair do engano herético para alcançar a luz divina da liberdade católica. Se alguém se recusar (...) a expulsar o vírus da doutrina perversa, a rejeitar todas as blasfêmias de Ário e a condená-las com anátema: saiba que - assim como Ário, seus discípulos e outros serpentes, como sabelianos, patripassianos ou qualquer outro herege - ele é estrangeiro e está fora da comunhão da Igreja, que não tolera filhos adulterinos" (São Libério: carta 'Optatissimum nobis, 366).
Para concluir, aqui está uma citação do antigo historiador Teodoro (História Eclesiástica, livro II, capítulo 37): São Libério foi verdadeiramente "o ilustre e vitorioso atleta da VERDADE"!
[1] Constant, vol. I, p. 381-382, referindo-se a: São Siricus: Epist. ad Himer.; São Basílio, Epist. 263, al. 74; São Epifânio: Haer. 75, 2; Cassiodoro: Hist. tripart., livro V, cap. 18; Teodoret: Hist. ecles., livro II, cap. 37; Lucius Dexter: Chron., 353.
D. Honório I
Alguns escritores afirmam que o Papa Honório I (625 - 638) teria sido anatematizado pelo Sexto Concílio Ecumênico (680 - 681) por ter apoiado os monotelitas hereges.
A ideia de que este papa tenha sido monotelita é desinformação inventada pelos próprios monotelitas, com o objetivo de usar a autoridade papal para dar mais credibilidade à sua heresia. Os monotelitas foram desmentidos por calúnia pelo Santo Máximo, o Confessor (contemporâneo de Honório), pelo antigo secretário do papa falecido e pelo Papa João IV (segundo sucessor de Honório). Algumas décadas depois, gregos falsificaram os atos do Sexto Concílio Ecumênico, adicionando secretamente Honório à lista de monotelitas anatematizados. No entanto, dois séculos depois, o Oitavo Concílio Ecumênico, realizado em Constantinopla (!), condenou aqueles que "espalhavam boatos injuriosos contra a Santa Sé" e ordenou: "Que ninguém redija ou componha escritos e discursos contra o santíssimo papa da antiga Roma, sob o pretexto de supostos erros que ele teria cometido". Além disso, todos os clérigos do Oriente e do Ocidente assinaram uma profissão de fé, segundo a qual nenhum papa jamais deixou de servir a doutrina santa.
O caso de Honório parecia estar encerrado; no entanto, seis séculos depois, ressurgiu! Os centuriões de Magdeburgo (historiadores protestantes) desenterraram a antiga fábula sobre Honório. Logo foram apoiados pelos galicanos, claramente interessados em tudo o que pudesse minar a infalibilidade de Roma, com a qual estavam em guerra devido à sua subserviência ao rei da França.
Naturalmente, os apologistas católicos não permaneceram em silêncio, muito pelo contrário! O brilhante teólogo e historiador Pighius defendeu os papas contra seus detratores em sua obra Hierarchiae ecclesiasticae assertio (Colônia 1538). Durante um colóquio entre eruditos alemães em Ratisbona, em 1541, Pighius foi violentamente atacado por um de seus colegas, que triunfantemente levantou o caso de Honório e intimou Pighius a se retratar, sob ameaça de não conseguir sua salvação! Pighius não se deixou intimidar: ele estabeleceu um prazo de três dias. Durante este prazo, ambos os adversários deveriam reunir documentos para provar sua tese. Ao fim do prazo, Pighius apresentou aos seus colegas um volumoso dossier repleto de documentos inocentando Honório. O adversário de Pighius, por outro lado, chegou de mãos vazias[1]!
Depois, o erudito cardeal Baronius (cuja "incrível erudição" foi admirada por Leão XIII em sua breve Saepenumero considerantes), sem mencionar o doutor da Igreja São Roberto Belarmino (cuja obra De romano pontifice está na bibliografia científica dos Padres do Vaticano mencionada acima), demonstraram a impostura dos pseudocientistas protestantes.
A controvérsia se transformou em uma verdadeira batalha jornalística quando o Concílio Vaticano foi convocado para definir a infalibilidade. A Igreja decidiu a favor da inocência, recomendando a leitura de certos historiadores favoráveis a Honório e colocando na lista de proibições alguns livros escritos por pseudohistoriadores contrários a Honório.
Caso encerrado? De jeito nenhum, infelizmente! Escritores contemporâneos, desejosos de defender a qualquer custo a legitimidade dos papados de Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla, constantemente utilizam o caso de Honório para afirmar que um papa pode cair em heresia e ainda assim permanecer papa. Eles perpetuam uma calúnia atroz, forjada pelos antigos hereges e depois propagada pelos hereges modernos, contra aquele que São Máximo chamou de "o divino Honório"!
O caso de Honório provocou mais discussões do que todos os pontificados dos outros papas juntos. Por isso, dedicamos a ele um estudo científico particularmente minucioso, baseado em:
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Fontes primárias: textos de concílios, de papas e de contemporâneos;
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Literatura científica: três teses universitárias especializadas sobre Honório, além de numerosos trabalhos históricos sobre esse assunto (consulte nosso resumo no Apêndice A).
Nota importante: ao ler os documentos compilados no Apêndice A, o leitor terá apenas um resumo da defesa. Como disse Anastácio, o bibliotecário: "Se quisermos reunir tudo o que podemos para a defesa de Honório, faltará papel antes que falte discurso!" Anastácio, o bibliotecário (800 - 879), viveu em Roma, onde trabalhava para os papas. Era arquivista e tradutor deles. Famoso por seu conhecimento do grego, ele traduziu os atos dos concílios. Comparou os atos originais dos concílios preservados em Roma com as cópias feitas pelos gregos em Constantinopla e descobriu que os gregos eram falsificadores. Nossa conclusão será a mesma de Anastácio, o bibliotecário: Honório foi "caluniosamente acusado" por falsificadores!
[1] Albert Pighius: Controversiarum praecipuarum in comitiis Ratisponensibus tractatarum et quibus nunc potissimum exagitatur Christi fides et religio. diligens et luculenta explicatio, Colônia 1542, fólio 2 verso. O dossier de Pighius é, de fato, muito detalhado; por falta de espaço, não incluímos no Apêndice A todas as provas que inocentam Honório.
E. João XXII
O Papa João XXII (1316 - 1334) teria ensinado uma heresia sobre a visão beatífica durante anos e só se teria retratado em seu leito de morte. Acusa-se João XXII de ter pregado que as almas dos justos, separadas de seus corpos, só veriam a essência e as pessoas divinas após a ressurreição geral; e, enquanto isso, desfrutariam apenas da visão da humanidade santa do Salvador.
Na verdade, este papa acreditava exatamente no oposto da opinião que lhe foi atribuída! Eis a sua profissão de fé: "Declaramos da seguinte maneira o pensamento que É e que ERA nosso. [...] Acreditamos que as almas purificadas, separadas dos corpos, são reunidas no céu [...] e que, segundo a lei comum, veem a Deus e a essência divina face a face" (João XXII: bula Ne super his, de 3 de dezembro de 1334, redigida pouco antes de sua morte). A expressão "que é e que era" prova que ele acreditava nisso durante toda a sua vida.
Este papa foi um defensor intrépido da fé, pois refutou incansavelmente hereges de diversos países, sem temer se tornar o pior inimigo deles. Entre eles estava o monarca bávaro Luís IV, que até instalou um antipapa em Roma. Luís IV foi excomungado por João XXII. Os cismáticos da Baviera se vingaram de maneira ignóbil: atribuíram ao papa palavras que ele nunca disse e espalharam por toda parte que ele teria se desviado da fé. Isso levou o rei da França, Filipe VI de Valois, a ordenar uma investigação. Os teólogos da Sorbonne, comissionados pelo rei, examinaram este assunto com o maior cuidado e concluíram pela inocência de João XXII.
Para compreender adequadamente a origem das calúnias proferidas contra João XXII, é importante conhecer melhor seus inimigos: os "fraticelli" e seu protetor, Luís da Baviera.
Os fraticelli eram monges franciscanos heréticos e cismáticos. Em 1294, os franciscanos se dividiram em dois grupos: os "conventuais", que aceitavam a propriedade comum dos rendimentos e bens imobiliários; e os "fraticelli" (ou "eremitas pobres" ou "espirituais"), que rejeitavam essa ideia.
Os fraticelli se entusiasmaram com as visões apocalípticas de Olieu e de Casale, derivadas das heresias de Joaquim de Fiore. Segundo Joaquim de Fiore, retomado pelos fraticelli, a era da Igreja havia terminado. Com o fim da Igreja começava (finalmente) a era do Espírito Santo. A Igreja era a grande prostituta, entregue aos prazeres da carne, ao orgulho, à avareza; os fraticelli, por outro lado, representavam a nova Igreja, casta, humilde e, sobretudo, absolutamente pobre. João XXII os repreendeu severamente: "O primeiro erro, portanto, que sai de sua oficina repleta de trevas, inventa duas Igrejas, uma carnal, esmagada pelas riquezas, transbordando de riquezas e manchada de males, sobre a qual dizem que reinam o pontífice romano e os outros prelados inferiores; a outra espiritual, pura pela sua frugalidade, adornada de virtudes, cercada pela pobreza, na qual se encontram apenas eles e seus semelhantes, e à qual igualmente presidem eles mesmos pelo mérito de uma vida espiritual, se é que se pode acreditar em suas mentiras" (constituição Gloriosam Ecclesiam, 23 de janeiro de 1318).
Identificando sua regra e interpretação com o Evangelho em si, os fraticelli recusaram a reunificação de sua ordem com os conventuais (exigida por Clemente V e João XXII). Quando João XXII solicitou algumas mudanças em sua regra monástica, eles o declararam inimigo do Evangelho e desprovido de toda autoridade. O papa condenou várias proposições absurdas dos fraticelli (constituição Gloriosam Ecclesiam, 23 de janeiro de 1318), o que lhe rendeu um ódio persistente deles. Com sua bula Cum inter nonnul/os de 12 de novembro de 1323, o papa condenou especialmente como herética a opinião de que Cristo e os apóstolos não possuíam nada em comum ou em particular. Muitos franciscanos se revoltaram abertamente. Refugiaram-se na corte de Luís da Baviera, que estava em conflito com a Santa Sé. De lá, inundaram a Europa com panfletos contra aquele que eles desdenhosamente chamavam de "João de Cahors", porque o consideravam deposto do pontificado devido à sua (suposta!) "heresia".
O monarca Luís IV da Baviera (1287 - 1347) queria se colocar acima da papado, de certa forma ser superior ao papa. Sua pretensão insensata correspondia bastante a uma tese proferida por um filósofo da época, mas taxada de herética por João XXII. O mestre parisiense Marsílio de Pádua foi, de fato, condenado pelo papa (constituição Licet iuxta doctrinam, 23 de outubro de 1327) por apoiar várias heresias, incluindo esta: "Cabe ao imperador corrigir o papa, puni-lo, instituí-lo e destituí-lo".
Na eleição do imperador do Sacro Império Romano-Germânico em 1314, os príncipes eleitores não conseguiram chegar a um consenso. Alguns escolheram o austríaco Frederico, o Belo, outros Luís da Baviera. Luís ganhou a batalha de Mühldorf (28 de setembro de 1322) e aprisionou Frederico, o Belo. Mas o papa recusou a coroa imperial a Luís da Baviera, pois queria manter a neutralidade entre os dois rivais. O papa reservou para si a administração dos territórios italianos do Império, conforme a decretação Pastoralis cura de Clemente V, que dizia: "Uma vez que o recurso ao poder secular não é mais possível, o governo, administração e jurisdição supremos do Império pertencem ao Sumo Pontífice, a quem Deus, na pessoa de São Pedro, entregou o direito de governar tanto nos céus quanto na terra".
Apesar disso, Luís não hesitou em exercer sua (pretensa) soberania imperial na Itália e, além disso, acolheu os fraticelli heréticos em sua corte. Ele foi excomungado em 23 de março de 1324. Em resposta, fez redigir pelos fraticelli o apelo de Sachsenhausen (22 de maio de 1324), que declarava João XXII como herege e deposto do pontificado. O papa, por sua vez, decretou em 11 de julho de 1324 que Luís havia perdido todo direito à coroa.
Luís então empreendeu uma expedição militar na Itália (1327 - 1330). Ele encontrou apoio entre os hereges italianos e conseguiu tomar Roma. Foi coroado na Cidade Eterna em 17 de janeiro de 1328 por quatro romanos (em clara violação do direito, pois somente o papa podia coroar um imperador!). Em 18 de abril de 1328, declarou a deposição de João XXII e em 12 de maio impôs o antipapa Pietro Rainallucci, que adotou o pseudônimo artístico de "Nicolas V" (1328 - 1330). O antipapa era natural de Corvara, um vilarejo na região de Aquila, terra natal do líder dos fraticelli, Pedro de Morrone.
O papa legítimo, João XXII, residia em Avignon. O "conclave" dos cismáticos ocorreu em Roma. O candidato designado por Luís da Baviera era um de seus cortesãos. "Este antipapa adicionava a heresia ao seu cisma, ao afirmar que Jesus Cristo e seus discípulos não possuíam nada em comum, nem em particular" (Mgr Paul Guérin: Les conciles généraux et particuliers, Bar-le-duc 1872, t. III, p. 5). Da mesma forma, ele tinha uma concepção exagerada da pobreza monástica.
O "conclave" viola todas as regras mais elementares do direito: "O povo de Roma se reuniu diante de São Pedro, homens e mulheres, todos os que quiseram. Era o sagrado colégio que entrava em conclave. O assim chamado imperador Luís apareceu no tablado, que estava no alto dos degraus da igreja. [...] Ele chamou um certo monge, e, levantando-se de seu assento, o fez sentar-se sob o dossel. Era um franciscano cismático, Pedro, natural de Corbière nos Abruzos, que sustentava que os religiosos mendicantes não podiam sequer ter propriedade sobre a sopa que comiam, e que afirmar o contrário era uma heresia. E foi por isso que" Luís da Baviera o fez sentar-se ao seu lado", para criá-lo antipapa (abade René François Rohrbacher: Histoire universelle de l'Église catholique, 1842 - 1849, t. VIII, p. 483). Pois Pedro de Corvara e Luís da Baviera tinham ambos a mesma concepção falsa da pobreza evangélica.
Ao suposto sagrado colégio, composto de homens, mulheres e crianças (!), foi feita a questão ritual: "Quereis como papa o irmão Pedro de Corvara?". Os pobres ficaram tão temerosos do imperador e de seus soldados que concordaram.
João XXII renovou a excomunhão do imperador. Este último esperava sua vingança. Enquanto isso, acolheu em sua corte filósofos tristemente célebres por suas heresias: Marsile de Padua, Ockham, Cesena e Bonagratia.
Marsile de Padua (1290 - 1343(?)) tornou-se reitor da universidade de Paris em 1312. Em 1324, publicou seu livro Defensor pacis, o que lhe valeu, em 1326, uma citação para comparecer perante o inquisidor da arquidiocese de Paris. Marsile preferiu fugir para a Baviera. Várias proposições tiradas do Defensor pacis foram qualificadas como heréticas por João XXII. Marsile havia sustentado que o imperador estava acima do papa; a separação da Igreja e do Estado estava contida em germe em seu livro. Luís da Baviera o nomeou seu diretor espiritual ("vicarius in spiritualibus"). Acredita-se que tenha sido Marsile quem incentivou Luís a se coroar em Roma sem o consentimento do papa.
Guilherme de Ockham (1285 - 1347) é considerado um dos mais importantes filósofos (heréticos!) da Idade Média. Este franciscano inglês abalou a filosofia medieval e influenciou a doutrina de Lutero. Seu ensinamento naturalista o levou a questionar a transubstanciação. Ele então foi convocado para Avignon, onde o papa residia. De 1324 a 1328, Ockham viveu em um convento avignonês, enquanto a Inquisição examinava seus escritos. Lá ele conheceu os fraticelli Cesena e Bonagratia, e adotou suas ideias.
Michel de Cesena (morto em 1342) era o ex-superior geral dos fraticelles. Ele foi convocado a Avignon devido à sua heresia.
Bonagratia de Bergamo (1265 - 1340) também foi citado perante o tribunal de Avignon.
Na noite de 26 para 27 de maio de 1328, os três comparsas fugiram e se juntaram a Luís da Baviera em Pisa. Eles o acompanharam depois para a Baviera e lá permaneceram até suas mortes. Todos os três excomungados, cismáticos e hereges, lideraram uma guerra de palavras maliciosa contra a Santa Sé, criticando a autoridade do papa, as riquezas da Igreja oficial, etc.
No tempo de João XXII, a questão da "natureza" da "visão beatífica" ainda não havia sido resolvida pela Igreja. Portanto, os teólogos estavam livres para discutir sobre isso. Uma corrente majoritária sustentava que as almas dos falecidos no céu viam a essência de Deus, enquanto uma minoria de teólogos pensava que elas veriam a essência de Deus apenas após o Juízo Final, e que deveriam se contentar, enquanto isso, com a visão apenas da humanidade de Nosso Senhor.
Nesse debate entre teólogos, João XXII acreditava firmemente que a opinião majoritária estava correta (como atestam sua bula citada anteriormente e o testemunho de seu sucessor, Bento XII citado abaixo), mas ele também quis examinar os argumentos contrários. Para isso, ele reuniu diversos testemunhos dos Padres da Igreja e convidou os doutores a discutirem os prós e os contras.
No entanto, seus inimigos aproveitaram a oportunidade para distorcer suas intenções. "Naquele momento, em 1331, por malícia, os bávaros que certamente haviam seguido o cisma de Luís IV da Baviera e os pseudo-frades menores condenados por heresia [= os fraticelles], cujos líderes eram Michel de Cesena, Guilherme de Ockham e Bonagratia [...], mancharam por meio de calúnias a reputação pontifícia, afirmando que João teria pronunciado uma definição ex cathedra segundo a qual as almas não veriam a essência divina antes do Juízo Final. Por isso, pouco depois, impelidos por um zelo perverso, começaram a formular pedidos para a convocação de um concílio ecumênico contra ele como herege" (Odorico Raynald: Annales ecclesiastici ab anno MCXVIII ubi desinit cardinalis Baronius, anotado e editado por Jean Dominique Mansi, Lucae 1750, ano 1331, nº 44).
"Os inimigos caluniaram o pontífice. Um ilustre doutor alemão, Ulrico, os refutou. [...] Ele demonstrou, ao final de seu trabalho (livro IV, último capítulo, manuscrito No 4005 da Biblioteca do Vaticano, p. 136), contra os caluniadores do pontífice, que os ditos criticados pelos inimigos, o papa os havia proferido como moderador de um debate escolástico" (Raynald, ano 1331, nº 44).
O que se entende por um "debate escolástico"? Deve-se entendê-lo como uma "disputatio", ou seja, um debate contraditório onde os adversários apresentam argumentos a favor e contra determinado ponto da doutrina. São Tomás de Aquino, na "Summa Theologiae", procede da mesma forma: ele enumera sistematicamente uma série de argumentos a favor da tese errônea e em seguida a refuta com argumentos opostos. Seria desonesto afirmar que São Tomás é herege só porque ele cita também argumentos falsos. E no entanto, é exatamente isso que fizeram os bávaros cismáticos em relação ao papa: acusaram-no de heresia, quando na verdade João XXII simplesmente "citou", sem aderir de modo algum, alguns textos dos Padres que iam contra a opinião predominante. O próprio papa disse ter mencionado essas palavras patrísticas "ao citar e ao relatar, mas não ao determinar ou aderir" (João XXII: bula "Ne super his" de 3 de dezembro de 1334).
O "ilustre doutor" em teologia Ulrico explica: "Se verdadeiramente se compreende piedosamente e saudavelmente o estilo pontifício, descobrir-se-á, ao pesar cuidadosamente as coisas, que não se trata propriamente de um sermão, nem de uma definição, nem de uma determinação, nem de uma pregação, mas sim de um debate contraditório (scholastica disputatio) ou confrontação de opiniões disputadas" (Ulrico, in: Raynald, ano 1333, nº 44).
O papa, continua Ulrico, "evita a forma e o modo e o costume da 'pregação de um sermão'; ele assume a forma e o modo e o costume das 'disputas escolásticas': citações de autoridades, raciocínios, analogias, argumentos, glosas, silogismos e muitas outras sutilezas verbais, mostrando assim que ele fala não como 'pregador', mas como 'disputante'" (ibidem).
A intervenção de Ulrico acalmou os ânimos por um tempo. Mas a questão da visão beatífica ainda não estava resolvida.
A controvérsia recomeçou com força total dois anos depois, em 1333. "Desejando ardentemente encerrar este debate, João XXII apresentou diante dos cardeais suas coleções de oráculos da Sagrada Escritura e das sentenças dos Padres da Igreja, que poderiam ser invocadas por ambos os lados. Foi ordenado aos cardeais, superiores e outros doutores [...] examinar com cuidado e diligência a controvérsia, e trazer de todos os lados as palavras pronunciadas pelos Santos Padres que ainda pudessem ser encontradas. O pontífice reuniu esses dados em um livro, que ele transmitiu a Pedro, arcebispo de Rouen [futuro Clemente VI]. Neste livro, nada era de sua própria autoria, mas todas as palavras eram retiradas da Sagrada Escritura e dos Padres" (Raynald, ano 1333, No 45).
Os doutores de Paris estavam divididos entre si. Uma minoria pensava que as almas dos falecidos salvos veriam a essência divina somente após o Juízo Final. "Espalhou-se a calúnia de que o pontífice era o autor e o porta-estandarte de sua opinião. [...] Mas o pontífice, para contrariar essa calúnia, escreveu várias cartas ao rei e à rainha da França; ele se queixou que essa coisa lhe fosse atribuída por mal-intencionados, que ele nunca havia estabelecido qualquer coisa nesta questão, mas que tinha colecionado apenas as palavras dos Padres para que se empenhassem no estudo para buscar a verdade. [...] Ele pediu ao rei que não silenciasse nenhum dos lados, para que da discussão pudesse brotar a verdade" (Raynald, ano 1333, nº 45).
"Não proferimos nenhuma palavra de nossa própria cabeça", escreveu João XXII ao rei, "mas apenas as palavras da Sagrada Escritura e dos santos (aqueles cujos escritos são aceitos pela Igreja). Muitas pessoas - cardeais assim como outros prelados, próximos ou distantes de nós - falaram a favor e contra neste assunto em seus discursos. Nos discursos, até públicos, os prelados e mestres em teologia discutem sobre esta questão de várias maneiras, para que a verdade possa ser encontrada mais completamente" (João XXII: carta "Regalem notitiam", 14 de dezembro de 1333, endereçada ao rei da França, Filipe VI de Valois, in: Raynald, ano 1333, No 46).
As notícias que inundaram a França vinham dos schismáticos bávaros. Na Baviera, os fraticelles afiaram suas penas contra o soberano pontífice. Bonagratia publicou um comentário mentiroso: como verdadeiro falsificador, ele fazia crer que João XXII pretendia impor a opinião minoritária. Ockham e Nicolas le Minorite publicaram sermões totalmente fictícios de João XXII. Michel de Cesena percorreu reinos e províncias para organizar um conciliábulo na Alemanha contra "João de Cahors", o então papa. O maestro da conspiração era, é claro, o autoproclamado imperador Luís IV da Baviera.
Em 28 de dezembro de 1333, João XXII convocou um consistório e informou a rainha da França: "Ordenamos aos cardeais, prelados, doutores em teologia e canonistas presentes na cúria que fizessem um estudo diligente e nos apresentassem sua opinião; e para que pudessem fazê-lo mais rapidamente, fizemos uma cópia das coleções dos santos, das autoridades e dos cânones que poderiam ser invocados por um lado ou pelo outro" (João XXII: carta Quid circa, 1334, in: Raynald, ano 1334, No 27). O papa ordenou a leitura das autoridades que havia coletado. Essa leitura durou cinco dias (admirável erudição do papa, diga-se de passagem!).
Um ano depois, em sua bula, ele declarou que sempre acreditara na opinião majoritária e que apenas expor, como uma hipótese contestável, a opinião minoritária: "Acreditamos que as almas purificadas separadas dos corpos [...] veem a Deus e a essência divina face a face [...]. Mas se de alguma forma sobre este assunto algo diferente tivesse sido dito por nós, [...] afirmamos tê-lo dito assim citando, relatando, mas de modo algum determinando ou mesmo aderindo a ele" (João XXII: bula Ne super his, 3 de dezembro de 1334). Os termos "recitando et conferendo", usados pelo papa, significam:
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recitare significa "ler em voz alta (uma lei, um ato, uma carta), produzir, citar" (Plauto: Persa 500 e 528; Cícero: ln Verrem actio II, 23): o papa apenas cita opiniões de outros;
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Conferre significa "trazer junto, trazer de todos os lados, reunir" (Cícero: ln Verrem actio IV, 121; César: De bello gallico VII, 18,4 etc.): o papa apenas reúne documentos sobre este assunto. Conferre também pode ter o sentido de "colocar juntos para comparar" (Cícero: De Oratore I, 197: "comparar nossas leis com as de Licurgo e Sólon"): o papa realiza uma disputatio, que consiste em comparar argumentos antes de se pronunciar.
Os termos utilizados pelo papa coincidem perfeitamente com os termos de um julgamento feito pelos doutores de Paris, encarregados de examinar a ortodoxia do papa. O rei Filipe VI de Valois ordenou uma investigação, que começou em 19 de dezembro de 1333. Os teólogos da Sorbonne, após uma investigação minuciosa, emitiram seu veredito, que continha esta frase chave: "Nós, observando também o que ouvimos e aprendemos pela relação de vários testemunhos dignos de fé, que tudo o que Sua Santidade disse sobre este assunto, ela disse não afirmando ou mesmo opinando, mas apenas citando" (in: Constant, t. II, p. 423; Constant traduz por "recitando").
O Papa Bento XII, que sucedeu a João XXII, procedeu com a mesma prudência que seu predecessor. Embora estivesse convencido da correção da opinião majoritária, o novo papa continuou examinando a questão iniciada por seu predecessor. Em 7 de fevereiro de 1335, ele realizou um consistório onde convocou aqueles que pregaram a opinião minoritária e os solicitou a expor seus argumentos. Em 17 de março, ele designou uma comissão de cerca de vinte especialistas encarregados de preparar uma definição ex cathedra. Entre os especialistas estava Gérard Eudes, partidário da opinião minoritária! O papa retirou-se por quatro meses para o castelo de Pont-de-Sorgues, perto de Avinhão, estudando extensivamente o caso. Finalmente, em 29 de janeiro de 1336, ele definiu ex cathedra que a opinião majoritária deveria doravante ser mantida como um dogma (constituição Benedictus Deus).
No preâmbulo desta constituição Benedictus Deus, Bento XII cuidou para defender seu predecessor atacado injustamente pelos caluniadores bávaros. Sobre a questão da visão beatífica, muitas coisas foram escritas e ditas, especialmente "por nosso predecessor de FELIZ MEMÓRIA (felicis recordationis) o papa João XXII e por vários outros em sua presença. [...] Querendo repelir as palavras e línguas dos MALVADOS (malignantium), e desejando esclarecer 'suas intenções', João XXII havia preparado sua profissão de fé, a bula Ne super his, que Bento XII citou na íntegra. Então o novo papa prosseguiu, definindo solenemente a verdade ex cathedra.
Essa verdade solenemente definida por Bento XII, João XXII sempre acreditou. Temos como prova não apenas sua bula de 1334, mas também certos textos escritos anteriormente pelo santo papa João XXII: as bulas de canonização de São Luís de Toulouse (1317), de São Tomás de Hereford (1320) e de São Tomás de Aquino (1323). Especificamente para São Luís de Toulouse, o papa João XXII mostrou este jovem santo entrando no céu em sua inocência, para contemplar a essência divina com alegria e abertamente: "ad Deum suum contemplandum in gaudio, facie revelata" (bula de canonização, § 18).
Infelizmente, as falsificações de Ockham, Bonagratia e Cesena foram posteriormente revividas pelos hereges nos séculos seguintes, que embelezaram suas fábulas. Um desses "historiadores" posteriores foi o herege de Genebra João Calvino (Instituição da Religião Cristã, 1536, livro IV, capítulo 7, § 28). São Roberto Belarmino, após citar as palavras de Calvino contra João XXII, exclamou: "Digo a Calvino: você proferiu, em poucas palavras, cinco mentiras descaradas" (De Romano Pontifice, livro IV, capítulo 14). Em seguida, ele refutou com grande facilidade o pseudo-historiador genebrino.
Os hereges de todas as épocas acusaram muitos outros papas, mas para que mencionar todas as suas fraudes? Muito antes de nós, o erudito e santo cardeal Belarmino sozinho reabilitou cerca de quarenta acusados, sendo o trigésimo sexto deles o Papa João XXII.
CONCLUSÃO DO QUARTO CAPÍTULO:
A história eclesiástica não registra NENHUM caso em que um papa tenha se enganado na fé ou ensinado um erro. Escritores falsificadores arianos, monotelitas, cismáticos gregos, protestantes, galicanos, fébronianos, anti-infaibilistas acusaram papas, porque odiavam o papado que os anatematizava. Sobre eles, o Papa Leão XIII disse: "A arte do historiador parece ser uma conspiração contra a verdade".
Martinho Lutero recusou-se a obedecer à papado (Apelo contra o papa ao concílio, 28 de novembro de 1518). Sob o pretexto de que São Pedro teria (supostamente!) errado na fé durante sua estadia em Antioquia, Lutero afirmou que o Papa Leão X estava completamente errado e, portanto, todo cristão poderia seguir suas próprias luzes em vez da voz do papado.
O maçom Voltaire, inimigo ardente do cristianismo, teve o prazer malicioso de destacar as (supostas!) falhas de Honório e João XXII em seu Ensaio sobre os costumes (1756). Que valor atribuir a essa obra? Nenhum! Pois o próprio Voltaire escreveu a seu confidente Thiriot, em 21 de outubro de 1736: "É preciso mentir como um diabo, não timidamente, não por um tempo, mas audaciosamente e sempre".
As supostas quedas de alguns papas pertencem à pseudociência histórica. Esta falsa ciência é diretamente contrária à fé católica. "Reprovo igualmente o erro daqueles que afirmam que a fé proposta pela Igreja pode estar em contradição com a história [...]. Condeno e rejeito também a opinião daqueles que dizem que o cristão erudito assume uma dupla personalidade, a do crente e a do historiador, como se fosse permitido ao historiador manter o que contradiz a fé do crente, ou estabelecer premissas de onde se seguirá que os dogmas são falsos ou duvidosos, desde que esses dogmas não sejam diretamente negados" (São Pio X: juramento antimodernista).
"Canon 2: Se alguém disser que as disciplinas humanas devem ser tratadas com tal liberdade que, mesmo que suas afirmações se oponham à doutrina revelada, possam ser reconhecidas como verdadeiras e não possam ser proibidas pela Igreja, que ele seja anátema.
Canon 3: Se alguém disser que é possível que os dogmas propostos pela Igreja recebam, por vezes, devido ao progresso da ciência, um sentido diferente daquele que a Igreja compreendeu e ainda compreende, que ele seja anátema" (Vaticano I: Dei Filius, capítulo 4, intitulado "Defide et ratione").
"Toda teoria ou doutrina filosófica, moral, teológica ou científica que contradiz a fé cristã é necessariamente falsa e mentirosa. Um católico que a professa e se apega a ela [...], é um não-católico, um apóstata e um seguidor do Anticristo" (Clemente XII: carta secreta contra os maçons, anexada à sua bula "In eminenti" de 4 de maio de 1738).
Resumo: a história eclesiástica não conhece nenhum caso em que um papa tenha se desviado da fé ou ensinado uma heresia.
5. DOS MOVIMENTOS HERÉTICOS QUE ESTÃO NA ORIGEM DA NEGAÇÃO DA INFALIBILIDADE PAPAL
- A. Os cortesãos de Luís de Baviera
- B. O atentado contra o Papa Bonifácio VIII
- C. Os algozes de Santa Joana d'Arc
- D. O Grande Cisma do Ocidente
- E. Os Galicanos
- F. Os Hussitas
- G. A heresia de Pedro de Osma
- H. Os protestantes
- I. Os jansenistas
- J. Os febronianos
- K. Os maçons
- L. Os Velhos-Católicos
- M. Os modernistas
Portanto, de onde vem essa ideia de que um papa possa desviar-se da fé? A ideia de que um papa possa errar na fé surgiu na época moderna, impulsionada por movimentos heréticos, especialmente o galicanismo e o protestantismo.
Todos os santos canonizados eram favoráveis à infalibilidade pontifical. "Diante desses homens que veneramos nos altares, podemos primeiro notar, no campo dos adversários da infalibilidade papal, todos os inimigos da Igreja que a traíram internamente [...]. Eu pergunto, o senso católico, por si só, não nos levaria para o lado onde estão os santos, mesmo que apenas para evitar a triste companhia daqueles que são, é verdade, inimigos da infalibilidade do papa, mas que comprometem de forma tão estranha aqueles que se aventuram com eles?" (Dom Prosper Guéranger: La monarchie pontificale, Paris et Le Mans 1869, p. 220 - 221).
A. Os cortesãos de Luís da Baviera
Por razões políticas, Luís IV da Baviera (1287 - 1347) quis usurpar a autoridade do papado. O ambicioso monarca apoiou-se em teólogos servis de seu círculo, que, por meio de seus escritos, procuraram minar a autoridade do papa (rever nosso capítulo 4).
Um desses filósofos-cortesãos, Marsílio de Pádua, afirmava que o papa era falível. No entanto, sua tese foi condenada como herética pela faculdade de teologia de Paris, em 1330!
B. O atentado contra o papa Bonifácio VIII
O "galicanismo" transfere o poder doutrinário e administrativo do papa para o rei. Esta heresia nasceu sob o reinado de Filipe IV, o Belo (1268 - 1314), rei da França.
Filipe, o Belo, com falta de dinheiro, decidiu confiscar injustamente certas rendas do clero. O papa Bonifácio VIII enviou-lhe vários legados para protestar. Ele mandou, notavelmente, ao rei uma carta intitulada Ausculta fili, contendo um aviso impregnado de doçura paternal. No entanto, Pierre de la Flotte, um dos próximos do rei, escondeu a carta e substituiu-a por outra, toda seca e picante, contendo exigências desmedidas. Outro conselheiro do rei, Guillaume de Nogaret, elaborou um ato de acusação contra Bonifácio VIII, considerando-o herético, portanto, deposto do pontificado. Filipe, o Belo, convocou os Estados do reino em 10 de abril de 1302. Pierre de la Flotte acusou o papa de vários crimes. "Mas sobretudo ele acusou Bonifácio de pretender que o rei lhe era submisso pelo temporal de seu reino e que devia reconhecer que o mantinha dele; como prova, Flotte apresentou a carta que ele próprio havia fabricado" (Rohrbacher, t. VIII, p. 389).
Em 1303, Bonifácio VIII se encontrava na cidade italiana de Anagni. Soldados franceses chegaram. Nogaret aproximou-se dele e ameaçou levá-lo a Lyon para ser deposto por um concílio geral. O pontífice respondeu dignamente: "Aqui está minha cabeça, aqui está meu pescoço. Estou disposto a sofrer tudo pela fé de Cristo e pela liberdade da Igreja; papa, legítimo vigário de Jesus Cristo, ver-me-ei pacientemente condenado e deposto por hereges!" (in: Rohrbacher, t. VIII, p. 396). Esta última palavra atemorizou Nogaret: seu pai havia sido queimado como albigense! Cumprindo as ordens do rei, os soldados prenderam o papa e chegaram à impudência de esbofeteá-lo. No entanto, Deus castigou muito severamente este crime de sacrilégio e lesa-majestade!
O "esbofeteamento de Anagni", ou seja, o golpe dado a Bonifácio VIII em Anagni, atraiu sobre essa cidade a ruína. O sucessor de Bonifácio VIII, São Bento XI, excomungou os autores e cúmplices do atentado. "Um fato memorável deve ser notado aqui. O anátema pronunciado pelo papa São Bento sobre a cidade de Anagni, assim como o de Davi sobre a montanha de Gelboé, foi executado pelos eventos. Esta cidade, até então muito rica e muito populosa, não parou de decair desde aquela época. Eis como fala sobre ela um viajante do século XVI, Alexandre de Bolonha: 'Anagni, cidade muito antiga, meio arruinada e desolada. Passando por lá no ano de 1526, vimos com espanto imensas ruínas, em particular as do palácio construído antigamente por Bonifácio VIII. Tendo perguntado a causa, um dos principais habitantes nos disse: "A causa é a captura do papa Bonifácio; desde esse momento, a cidade sempre esteve em decadência: a guerra, a peste, a fome, os ódios civis a reduziram ao estado calamitoso que vocês veem [...]. Por isso, não faz muito tempo, o pequeno número de cidadãos que ainda restava, tendo procurado ansiosamente qual poderia ser a causa de tantos males, reconheceram que era o crime de seus ancestrais, que haviam traído o papa Bonifácio, crime que não tinha sido expiado até então. Em consequência, eles suplicaram ao papa Clemente VII que lhes enviasse um bispo para absolvê-los do anátema incorrido por seus pais, por terem posto as mãos sobre o soberano pontífice'” (Raynald, anno 1303, no 43)" (Rohrbacher, t. VIII, p. 399).
O rei Filipe, o Belo, autor principal do crime, deixou três filhos. Eles se sucederam no trono, mas nenhum deles teve filhos. Assim se extinguiu a dinastia de Filipe, o Belo. Ela foi substituída, coisa surpreendente, pela posteridade de Carlos, conde de Valois, amigo e capitão-geral de Bonifácio VIII!
A cidade de Roma, que participou do crime, foi privada da presença de seus pontífices durante sessenta e oito anos. Após o atentado de Anagni, de fato, os papas, não se sentindo mais seguros na Itália, fixaram sua residência em Avignon (de 1309 a 1377).
A França havia participado do crime: foi punida pela Guerra dos Cem Anos (1337 - 1453): invasão pelos ingleses e guerra civil devido à cessão (inválida) do reino ao rei da Inglaterra. Deus enviou Santa Joana d'Arc para salvar a monarquia de direito divino e o pretendente legítimo ao trono, Carlos VII.
O castigo providencial da França foi reconhecido oficialmente pelo Conselho Real de Carlos VI. Em um conselho extraordinário de regência, começou-se a buscar a causa dos males do país. Um dos presentes disse "que ele havia visto várias histórias e que todas as vezes que os papas e os reis da França tinham estado unidos em boa amizade, o reino da França tinha estado em boa prosperidade; e ele suspeitava que as excomunhões e maldições que o papa Bonifácio VIII fez sobre Filipe, o Belo, até a quinta geração, fossem a causa dos males e calamidades que se viam. Essa coisa foi muito ponderada e considerada por aqueles da assembleia" (Crônica de Carlos VI, escrita por Monsenhor Juvenal des Ursins, durante a vida de seu pai Jean des Ursins, advogado do rei no parlamento que havia participado da reunião; Monsenhor Juvenal des Ursins, arcebispo de Reims, desempenhou um papel importante no processo de reabilitação de Joana d'Arc; encontramos esta citação na obra notável do abade Marie Léon Vial: Jeanne d'Arc et la monarchie, 1910, p. 121).
Deus enviou Santa Joana d'Arc para salvar a monarquia, como dissemos. Mas há um outro aspecto de sua missão que merece ser meditado: sua luta pela infalibilidade e autoridade do pontífice romano. Também é digno de atenção que os mesmos juízes iníquos que condenaram a santa eram os piores inimigos do papa reinante e chegaram a depô-lo (invalidamente, claro) por (suposto) crime de heresia e cisma. Este aspecto desconhecido da história de Santa Joana d'Arc merece uma reflexão mais atenta.
C. Os carrascos de Santa Joana d'Arc
Santa Joana d'Arc foi entregue por Jean de Luxembourg, que estava a serviço do duque de Borgonha, aliado da Inglaterra. Condenada em Rouen, seu dossiê foi enviado para a faculdade de teologia de Paris. A Sorbonne (200 teólogos mais 16 bispos e abades!) a condenou injustamente.
Um historiador perspicaz compara a atitude dos doutores galicanos depravados em relação a Santa Joana d'Arc com a que tiveram em relação ao papa reinante, Eugênio IV, quando estavam reunidos no conciliábulo cismático de Basileia. Este conciliábulo contava apenas com 60 bispos ou padres (contra 480 bispos reunidos em Ferrara, depois Florença, para apoiar Eugênio IV). Por outro lado, havia entre 300 e 400 doutores, provenientes em sua maioria da universidade de Paris, foco do galicanismo:
"Na perseguição à donzela, os doutores parisienses desprezaram a sentença dos bispos reunidos em Poitiers; na sessão que tentou depor o grande Eugênio IV, havia apenas 39 prelados mitrados, a maioria abades; sete ou oito bispos apenas votaram pelo crime; mas havia mais de 300 doutores. Vários dos motivos da pretensa condenação do pontífice são idênticos aos da pretensa condenação da donzela: ambos são declarados violadores dos santos cânones, em revolta contra o santo concílio, cismáticos, hereges, obstinados, etc." (J.BJ. Ayroles: Jeanne d'Arc sur les autels et la régénération de la France, terceira edição, Paris 1886, p. 168).
Muitos dos teólogos que condenaram Santa Joana d'Arc tiveram, de fato, uma parte preponderante no conciliábulo de Basileia, que defendia a superioridade do concílio sobre o papa ("conciliarismo") e chegou a depor o papa legítimo Eugênio IV:
• Guillaume Érard, que havia atacado violentamente Santa Joana d'Arc, lançou a assembleia de Basileia no caminho funesto do cisma;
• O abade Loyseleur, que havia simulado amizade para arrancar da candida acusada os segredos da confissão e desorientá-la com conselhos pérfidos, estava a caminho de Basileia quando morreu subitamente;
• Midi, o falsário que redigiu os caluniosos doze artigos contra Joana d'Arc, apoiava a assembleia cismática de Basileia diante do parlamento de Paris;
• Beaupère, que havia interrogado Joana com animosidade, foi um dos doutores de Basileia;
• Courcelles, que fez um requisitório tão parcial que o tribunal rejeitou a maior parte dele, propôs submeter Joana à tortura (contrariando a lei, que proibia torturar mulheres, idosos e crianças); ele foi a alma do conciliábulo de Basileia e o apóstolo do galicanismo.
Instada a retratar-se de seus (supostos) erros, Santa Joana d'Arc, em várias ocasiões, apelou ao papa. Mas seus juízes, imbuídos da heresia galicana anti-romana, não deram a menor atenção. Aqui está, a título de exemplo, um diálogo em que Joana apelou ao papa de Roma, apelo que seus juízes se recusaram a transmitir por desprezo ao papa:
"Eu me submeto a Deus e ao nosso Santo Padre, o papa". O que responderam os doutores? "Isso não é suficiente; não se pode ir buscar nosso Santo Padre tão longe; e também os ordinários são juízes cada um em seu diocese. É por isso que você deve se submeter à nossa Mãe, a Santa Igreja, e aceitar o que os clérigos e pessoas competentes dizem e determinaram sobre suas palavras e ações" (Processo ordinário, sessão de 24 de maio de 1431). Em última análise, Santa Joana d'Arc foi levada à fogueira por causa do galicanismo!
Essa violação do direito de apelação motivou a anulação do processo pela papado vinte e cinco anos depois: "Vistas as recusas, submissões, apelos e múltiplas requisições pelos quais a dita Joana reclamou que todos os seus ditos e feitos fossem transmitidos à Sé Apostólica e ao nosso santíssimo Senhor, o soberano pontífice, ao qual ela se submetia e submetia todos os seus atos [...], declaramos que os ditos processos e sentenças estão manchados de dolo, calúnia, iniquidade, mentira, erro manifesto de direito e de fato, [...] nulos, inválidos, inexistentes e vãos" (Julgamento do processo de reabilitação, 7 de julho de 1456).
Assim se justificava, a título póstumo, a confiança absoluta de Santa Joana d'Arc na infalibilidade pontifical, expressa na sessão de 2 de maio de 1431: "EU CREIO MUITO BEM QUE A IGREJA MILITANTE NÃO PODE ERRAR NEM FALHAR!".
[Excertos extensos dos processos foram publicados em francês: Le Procès de condamnation et le Procès de réhabilitation de Jeanne d'Arc traduzidos, apresentados e anotados por Raymond Oursel, Paris 1959.]
D. O grande cisma do Ocidente
Os cardeais franceses recusaram-se a reconhecer o papa legítimo Urbano VI, que eles mesmos haviam acabado de eleger. Eles elegeram, em oposição ao papa em Roma, um antipapa que fixou sua residência em Avignon. Esse "grande cisma do Ocidente" durou trinta e nove anos (1378-1417).
O grande cisma do Ocidente, em que dois ou até três pretendentes disputavam a tiara pontifical, abalou o prestígio do papado e fortaleceu os movimentos anti-infalibilistas em toda a Europa. Como foi o concílio ecumênico de Constança que depôs vários pretendentes à tiara, e como esse mesmo concílio declarou ser a autoridade suprema da Igreja (decreto não confirmado por Martinho V), alguns teólogos afirmaram que o concílio era superior ao papa e que os decretos do soberano pontífice deveriam ser confirmados pelo consentimento da Igreja universal para entrarem em vigor. Essa teoria herética é chamada de "conciliarismo".
Na verdade, o conciliarismo é baseado em uma falsificação. Em dezembro de 1865, um prelado descobriu nos arquivos da biblioteca vaticana os manuscritos originais de todas as sessões do concílio de Constança. Ele notou que falsificadores haviam copiado infielmente os atos originais: substituíram uma letra por outra, trocando a letra "d" pela letra "n". Mudando apenas uma letra do alfabeto, transformaram a palavra "finem" em "fidem", o que dá um sentido totalmente diferente. Pois o concílio de Constança se reuniu para pôr "fim" ao cisma, e não para julgar a "fé" do papa (portanto, não para sustentar que o concílio seria superior ao papa).
"Este sínodo, legitimamente reunido em nome do Espírito Santo, formando um concílio geral que representa a Igreja Católica militante, detém diretamente de Jesus Cristo seu poder, ao qual toda pessoa de todo estado, de toda dignidade, até mesmo papal, é obrigada a obedecer, no que diz respeito à extinção e à erradicação do referido cisma (obedire tenetur in his quae pertinent ad finem et extirpationem dicti schismatis) " (concílio de Constança, 4ª sessão, 30 de março de 1414). VERSÃO FALSA: "é obrigada a obedecer no que diz respeito à fé e à erradicação do referido cisma".
E. Os galicanos
O conciliarismo, heresia baseada em uma falsificação, tornou-se infelizmente a tese oficial dos doutores galicanos em 1682, durante o reinado de Luís XIV.
No século XVII, de fato, Luís XIV quis espoliar o papa de uma renda[1] e, para se justificar, fez com que o clero francês redigisse a declaração de 1682, que negava a infalibilidade do papa. A declaração do clero galicano de 1682 fazia depender do consentimento da Igreja universal, reunida em concílio, a validade irreformável dos julgamentos doutrinais do papa.
Essa declaração estava em contradição com a antiga crença da Igreja da França (leia os numerosos testemunhos e citações em Mgr de Ségur: Le souverain pontife). A faculdade de teologia de Paris havia até condenado várias vezes como herética a opinião de certos doutores partidários do "papa falível" (Marsílio de Pádua em 1330, Jean Morand em 1534, Marc Antoine de Dominis mais tarde).
A declaração de 1682 "não havia sido emitida em total liberdade e consciência, mas sim sob o império do medo ou com vista ao favor real [...]. Ela não foi para a Igreja galicana fonte de nenhuma glória, de nenhuma liberdade, mas sim uma mancha e uma verdadeira servidão" (Pio IX: breve dirigido em 17 de fevereiro de 1869 a Charles Gérin, autor de muito interessantes Recherches historiques sur l’assemblée du clergé de France de 1682, Paris 1869).
Tournély, que era um teólogo partidário da heresia galicana, admitiu ainda assim que esta declaração tinha sido subscrita por medo do todo-poderoso rei-sol: "Não podemos esconder, diante da massa de testemunhos reunidos por Bellarmino, Launoy e outros, que é muito difícil não reconhecer como certa e infalível a autoridade da Sé Apostólica ou da Igreja Romana; mas é ainda mais difícil conciliar esses testemunhos com a declaração do clero de França [de 1682], da qual não nos é permitido afastar-nos" (Tournély: Praelect. theol. De Ecclesia Christi, q. 5, a. 3, Paris 1727, 1. II, p. 134).
Por servilismo ao rei, praticamente todos os bispos da França (eram mais de uma centena) assinaram - exceto três defensores intrépidos da fé. Luís XIV secretamente desprezava os bispos-cortesãos e admirava a firmeza dos três prelados que ousaram enfrentá-lo. Ele disse com um toque de humor: "Tenho três bispos em meu reino".
A declaração do clero galicano foi revogada e anulada por Inocêncio XI (breve Paternae caritati, 11 de abril de 1682) e por seu sucessor Alexandre VIII (constituição Inter multiplices, 4 de agosto de 1690). Em um decreto de 7 de dezembro de 1690, Alexandre VIII condenou 33 proposições heréticas, incluindo a 29ª: "O poder do pontífice romano sobre o concílio, e sua infalibilidade na decisão das questões de fé, é uma afirmação fútil e refutada centenas de vezes". Esta proposição condenada resumia o pensamento galicano.
En 1684, Luís XIV encarregou Monsenhor Bossuet de defender os princípios galicanos anti-infaibilistas. O Papa Bento XIV criticou severamente a Defensio cleri gallicani de Monsenhor Bossuet em uma bula de 13 de julho de 1748, dirigida ao inquisidor geral da Espanha: "Seria difícil encontrar uma obra que seja tão contrária à doutrina recebida em todos os lugares, exceto na França, sobre a infalibilidade do Sumo Pontífice definindo ex cathedra, e sobre sua superioridade sobre todo concílio ecumênico. No tempo de Clemente XII, nosso predecessor de feliz memória, houve a intenção de proibir esta obra, e acabou-se por decidir não fazer nada a respeito, não apenas por causa da reputação do autor que tanto mereceu da religião em muitos outros aspectos, mas também por receio fundado de provocar novos distúrbios". Muitas obras que exaltavam as "liberdades da Igreja galicana" (na verdade, sua subserviência ao rei da França) foram colocadas no Índice.
Em 1693, é verdade, os bispos da França se retrataram, enviando uma carta coletiva ao Papa Inocêncio XIII. Luís XIV também acabou por revogar a declaração de 1682. No entanto, essa declaração herética teria consequências funestas no futuro:
· ela deu origem, no século seguinte, ao "febronianismo" (uma heresia que contaminou o Império Germânico: ver abaixo);
· inspirou a "Constituição Civil do Clero", que precipitou a França no cisma durante a Revolução Francesa;
· foi propagada pelos teólogos franceses (Napoleão Bonaparte até ordenou expressamente aos professores de seminário que ensinassem a declaração de 1682 aos futuros padres), o que fortaleceu consideravelmente o movimento anti-infaibilista.
Notáveis obras foram escritas no século XIX contra o galicanismo. Esta heresia foi definitivamente derrotada por Pio IX e os Padres do Vaticano, que especificaram claramente, contra os galicanos, que uma decisão do Sumo Pontífice é "irreformável por si mesma, e não em virtude do consentimento da Igreja" (Pastor aeternus, cap. 4).
[1] O rei queria privar a Santa Sé das receitas dos bispados vacantes, chamadas "annates". As "annates" são uma taxa sobre os rendimentos atuais de certos benefícios eclesiásticos vacantes, destinada à "Câmara Apostólica". A Câmara Apostólica é um tribunal da Cúria Romana responsável pela gestão do tesouro e dos bens do Estado Eclesiástico, bem como por certas questões relacionadas aos benefícios. É presidida por um cardeal chamado "camerlengo".
[2] Dom Prosper Guéranger: A Monarquia Pontifical, Paris e Le Mans 1869
Joseph de Maistre: Do Papa (muitas edições)
Joseph de Maistre: Da Igreja Galicana em sua relação com o Sumo Pontífice, Lyon e Paris 1821
Mgr de Ségur: O Sumo Pontífice, em: Obras Completas, Paris 1874, vol. III
F. Os Hussitas
Outros oponentes da infalibilidade do papa foram os hussitas. O Concílio de Constança (15ª sessão, 6 de julho de 1415, confirmada por Martinho V em 22 de fevereiro de 1418) condenou várias proposições de João Huss (no mesmo dia da sessão, Huss foi queimado). A 7ª proposição condenada foi: "Pedro não foi e não é a cabeça da Santa Igreja Católica". A 29ª: "Os apóstolos e os sacerdotes fiéis de Cristo dirigiram firmemente a Igreja nas coisas necessárias para a salvação antes que a função de papa fosse introduzida; e assim fariam até o dia do julgamento em caso de uma falha totalmente possível do papa".
O que devemos concluir da condenação da proposição 29 de Huss? A Igreja usou A INFALIBILIDADE de seu magistério solene (concílio ecumênico aprovado pelo papa) para afirmar que UMA FALHA DO PONTÍFICE ROMANO É IMPOSSÍVEL!
G. A Heresia de Pedro de Osma
No século XV, a Igreja qualificou como "escandalosa e herética" a seguinte proposição: "Ecclesia urbis Romae errare potest" ("A Igreja da cidade de Roma pode errar"). Esta proposição, extraída das obras de um doutor espanhol chamado Pedro de Osma, foi censurada em 15 de dezembro de 1476 pelo vigário capitular de Saragoça e em 24 de maio de 1478 por uma comissão de teólogos presidida pelo arcebispo de Toledo. O papa Sisto IV confirmou sua sentença por um julgamento EX CATHEDRA:
"Declaramos [...] que as proposições acima mencionadas são falsas, contrárias à santa fé católica, errôneas, escandalosas, totalmente estranhas à verdade da fé, contrárias aos decretos dos santos Padres e às constituições apostólicas, e que contêm uma heresia manifesta" (Sisto IV: constituição apostólica na forma de bula Licet ea, 9 de agosto de 1478).
O que devemos concluir da condenação de Pedro de Osma por Sisto IV? A Igreja utilizou sua infalibilidade (julgamento ex cathedra do pontífice romano) para afirmar o seguinte: AFIRMAR QUE UM PAPA PODE ERRAR É UMA HERESIA!
Começando nossas pesquisas sobre a infalibilidade pontifical, consultamos o Dicionário de Teologia Católica (artigo "infalibilidade do papa") e aprendemos pela primeira vez sobre a existência deste julgamento de Sisto IV. Algum tempo depois, adquirimos a edição mais recente da coletânea de Heinrich Denzinger: Símbolos e Definições da Fé Católica, Paris 1996. Foi então que fizemos uma descoberta que nos deixou perplexos: Sisto IV não teria condenado esta proposição de Pedro de Osma! A comissão teológica presidida pelo arcebispo de Toledo, reunida em Alcalá, condenou onze proposições de Pedro de Osma. No entanto, os editores do Denzinger afirmam que "das onze proposições de Alcalá, três não são mencionadas [por Sisto IV] (a saber: 7; 10; 11; mencionaremos a proposição 7: 'A Igreja da cidade de Roma pode errar', 'Ecclesia urbis Romae errare potest'); as outras proposições são citadas com variações mínimas e em ordem diferente" (Denzinger, p. 396).
Não depositamos fé cega na edição moderna do Denzinger, uma vez que os próprios editores gentilmente alertam os compradores que o verdadeiro Denzinger foi profundamente modificado a partir de 1963. A 23ª edição (1963) é obra de Adolf Schönmetzer, que "remove as exagerações papalistas [...] e introduz textos que são importantes para o diálogo ecumênico [...]. Schönmetzer eliminou uma série de textos constrangedores na perspectiva ecumênica devido à sua rigidez. [...11 minimizou a infalibilidade do magistério da Igreja" (prefácio da edição francesa, Paris 1996, p. XL).
Portanto, fomos verificar as edições anteriores do Denzinger. O resultado desta investigação é muito instrutivo. Em uma edição muito antiga (Enchiridion Symbolorum, definitionum et declarationum de rebus fidei et morum, Freiburg 1913, p. 253, No 730), a proposição está de fato entre as proposições condenadas por Sisto IV, e o tipógrafo até se preocupou em destacar a palavra "errar": "Ecclesia urbis Romae errare potest".
No entanto, já na edição de 1937, esta famosa proposição é mencionada apenas como uma nota de rodapé! Ela começa a ser relegada ao esquecimento, sendo removida do corpo principal do texto e colocada em um lugar que geralmente não é lido pela maioria dos leitores.
Em seguida, na edição alemã de 1963, Schönmetzer contesta que esta proposição tenha sido mencionada pelo papa. A edição francesa de 1996 segue o mesmo caminho, como vimos anteriormente.
Querendo esclarecer esta questão de uma vez por todas, verificamos o assunto voltando diretamente às fontes, ou seja, à grande coleção em nove volumes de textos magisteriais reproduzidos integralmente (!) pelo cardeal Pietro Gasparri. E aí, a fraude astuta de Schönmetzer veio à tona: o papa menciona várias proposições heréticas de Pedro de Osma relacionadas à confissão e às indulgências, e acrescenta (o que Schönmetzer oculta!!!) que ainda condena as outras proposições de Pedro de Osma:
« ... e as outras [proposições] que deixamos de mencionar devido à sua enormidade (que aqueles que conhecem delas as esqueçam, e que aqueles que não têm conhecimento delas não sejam informados por nossa presente!), nós as declaramos falsas, contrárias à santa fé católica, errôneas, escandalosas, totalmente estranhas à verdade da fé, contrárias aos decretos dos santos Padres e às constituições apostólicas, e contendo uma heresia manifesta ».
Portanto, ao contrário do que afirmam os editores modernos do Denzinger, o papa realmente mencionou a proposição de Pedro de Osma sobre a possibilidade de erro da Igreja. Além disso, ele considerou essa proposição tão enorme, grave e perniciosa que julgou melhor não revelar seu conteúdo. Não seria melhor que apenas a comissão de teólogos e ele próprio soubessem da existência de uma máxima tão perversa? A história provou que ele estava certo: a disseminação da heresia de Pedro de Osma nos séculos subsequentes resultou em terríveis guerras religiosas iniciadas pelos protestantes e na apostasia de nações inteiras. Foi necessário convocar um concílio ecumênico específico (Vaticano I) contra essa heresia.
Hoje em dia, são poucos os católicos que acreditam sem hesitação que a proposição "A Igreja da cidade de Roma pode errar" é uma HERESIA CONDENADA EX CATHEDRA.
"Meu Deus, eu creio firmemente em TUDO o que você revelou e que a Santa Igreja Romana ME ORDENA a crer, porque é você, Ó VERDADE INFALÍVEL, que o revelou a ela e você não pode nos enganar nem se enganar" (oração da manhã, "ato de fé").
Os inimigos incessantemente denunciados por São Pio X continuaram seu trabalho de minar os textos da Verdade, modificando de uma edição para outra. Não é mais surpreendente que padres ou monges idosos tenham recebido um ensino errado durante sua formação teológica.
Vamos tomar um exemplo entre tantos outros: o reitor do seminário francês em Roma, Padre Le Floch. Esse professor de seminário totalmente herético tinha como lema reduzir ao máximo a infalibilidade pontifical. Ele afirmou, em 1926: "A heresia que está por vir será a mais perigosa de todas; consiste na exageração do respeito devido ao papa e na extensão ilegítima de sua infalibilidade."
Padre Le Floch teve como aluno um seminarista que viria a ser conhecido mais tarde: Monsenhor Marcel Lefebvre...
[1]Esta é a conclusão da lista das heresias condenadas:
Et romanum pontificem purgalorii poenam remittere, et super his quae universalis Ecclesia statuit, dispensare non posse. Sacramentum quoque poenitentiae, quantum ad collationem gratiae, naturae, non autem institutionis novi aut veteris testamenti exsistere, et alias quas propter earum enormitatem (ut illi qui de eis notitiam habent obliviscantur earum, et qui de eis notitiam non habent ex praesentibus non instruantur in eis) silentio praetereundas ducimus, falsas, sanctae catholicae fidei contrarias, erroneas, et scandalosas, ac a fidei veritate alienas, ac Sanctorum Parrum decretis, et Apostolicis constitutionibus contrarias fore, manifestam haeresim continere, dictarum literarum, et per illas sibi concessae facultatis vigore, declaravit, et pro talibus haberi, et reputari debere decrevit , prout in quibusdam authenticis scripturis desuper confectis. plenius continetur » (Sixte IV: constitution apostolique sous forme de bulle Licet ea, 9 août 1478, § 3, in: Pietro Gasparri (éd.): Codicis Juris Canon ici Fontes, cura emi. Petri card. Gasparri editi, Rome 1947, t. 1., p. 85 - 87, n° 58).
H. Os protestantes
Os pensadores hostis à infalibilidade papal logo encontraram novos aliados: o século XVI gerou os protestantes. Leão X (bula Exsurge Domine, 15 de junho de 1520) condenou algumas proposições de Martinho Lutero, incluindo: 7ª: "É certo que não está ao poder da Igreja ou do papa estabelecer artigos de fé, e muito menos leis concernentes aos costumes ou boas obras". 28ª: "Se o papa pensasse de tal ou qual maneira com grande parte da Igreja, ele não estaria errado; no entanto, não é pecado nem heresia pensar o contrário, especialmente em uma questão que não é necessária para a salvação, até que um concílio universal condene uma opinião e aprove a outra".
Historiadores protestantes atacaram a infalibilidade papal, alegando que certo papa teria naufragado na fé. Infelizmente, alguns teólogos católicos, em vez de realizar pesquisas científicas (que teriam provado a inadequação das fábulas protestantes), acharam mais conveniente evitar o golpe, inventando uma distinção absurda entre "doutor privado" (falível) e "doutor público" (infalível). Segundo eles, o Papa Honório I teria "apenas" desviado como "doutor privado". Essa maneira desajeitada de defender a infalibilidade teve um efeito prejudicial: ela credenciou, nos círculos católicos, a opinião de que um papa poderia errar na fé. Felizmente, São Roberto Belarmino e o Concílio do Vaticano desfizeram essa opinião herética!
I. Os jansenistas
No século XVII, os jansenistas travaram uma luta surda e obstinada contra Roma. Argumentavam com distinções sutis: estavam dispostos a obedecer ao "sedes" (a Sede apostólica), mas não ao "sedens" (o papa sentado na Sede)! Dezenas de obras jansenistas, que pregavam a insubordinação contra o papa e o apelo (daí o nome de "apelantes") a um futuro concílio contra o papa, foram colocadas no Index.
Jansenistas e galicanos redigiram a Constituição Civil do Clero (1790), que subvertia a hierarquia eclesiástica e levava a França ao cisma.
J. Os febronianos
Justinus Febronius (pseudônimo de Nikolaus von Hontheim, bispo auxiliar de Tréveris, 1701 - 1790) deu origem à seita dos "febronianos". Segundo ele, o papa não seria infalível, pois Cristo teria conferido a infalibilidade apenas ao concílio ecumênico, ao qual o papa estaria completamente subordinado.
Além disso, se um papa se opuser aos decretos de um concílio nacional e separar um reino de sua comunhão, Fébronius defendia que essa Igreja nacional deveria ser provida de um "chefe extraordinário e temporário": o rei ou o imperador.
Foi especialmente essa proposta que seduziu Joseph II (1741 - 1790), imperador maçom do Sacro Império Romano-Germânico. Desejando se tornar o líder da Igreja austríaca, este monarca pretensioso começou a reformar o que ele desdenhosamente chamava de "piedade barroca" (Barockfrömmigkeit): ele proibiu procissões, introduziu o vernáculo na liturgia, modificou textos litúrgicos, reduziu o número de velas no altar, restringiu o culto aos santos etc. Ele confiscou os bens da Igreja, suprimiu ordens religiosas e impediu o clero austríaco de se comunicar com Roma. Joseph II chegou ao ponto de ordenar que, por questões econômicas, os funerais fossem racionalizados: os falecidos deveriam ser enterrados obrigatoriamente "completamente nus"!
As doutrinas de Fébronius foram postas em prática pelo imperador não apenas nas províncias austríacas, mas também na Toscana, onde seu irmão Leopoldo era grão-duque. A introdução do febronianismo na Toscana ocorreu com a cumplicidade do bispo Scipion Ricci, que se tornou tristemente célebre pelo famoso sínodo herético que presidiu em sua cidade episcopal de Pistoia em 1786 (ver capítulo 7).
O livro de Fébronius (De statu Ecclesiae et legitima potestate romani pontificis, 1763) também provocou uma decadência quase geral da religião na Alemanha, embora os bispos alemães o tenham condenado como sendo "cheio de escândalo e perigo, um filho das trevas, a seiva das heresias e um produto de Satanás" (citado por Pio VI em sua resposta ao arcebispo de Mainz, 1789). O livro de Fébronius foi várias vezes proibido pelo Santo Padre (colocado no Índice em 27 de fevereiro de 1764, 3 de fevereiro de 1766, 24 de maio de 1771 e 29 de março de 1773). Clemente XIII descreveu o autor como "um homem astuto e de má fé, misturando habilmente heresia e aparência católica", e "cujo livro saiu da oficina de Satanás"[1].
Fébronius foi refutado por São Alfonso de Ligório (Defesa do poder supremo do soberano pontífice contra Justin Fébronius) e por um notável estudioso recomendado pelos Padres do Vaticano: Francisco Antônio Zaccaria (Anti-Febronio, 1767, tradução alemã Augsburgo 1768; tradução francesa Paris 1859 - 1860).
[1] « Callidus fraudum artifex, [...] sive haereticus. qualem ex ipso libro possumus suspicari, sive catholicus, qualis videri vult. [...] Ejusmodi libri, qui fortasse in officina Satanae cuduntur » (Clément XIII: Carta ao bispo de Wurzburgo, 24 de março de 1764).!
K. Os maçons
O século XVIII viu surgir os maçons e os racionalistas, claramente hostis a qualquer infalibilidade: "O que devemos impor", conforme se lê em uma revista maçônica, "é a convicção de que cada um deve formar suas próprias opiniões, através dos resultados de suas reflexões ou dos ensinamentos que recebeu e que lhe pareceram bons. E se cada um tem a liberdade de formar sua própria opinião, deve respeitar essa mesma liberdade nos outros, [...] pensar que, como o erro é uma fraqueza comum à espécie humana, ele próprio pode estar errado" (revista maçônica Acácia, março de 1908).
Para dissipar o erro de homens contaminados pela ideologia anti-infalibilista herdada do protestantismo, do galicanismo e da maçonaria, o Papa Pio IX, no século XIX, convocou um concílio no Vaticano. Em Pastor aeternus é indicado o motivo da convocação deste concílio: "Como neste tempo [...] não faltam homens que contestam sua autoridade, julgamos absolutamente necessário afirmar solenemente a prerrogativa [da infalibilidade] que o Filho único de Deus dignou-se unir à função pastoral suprema".
A maçonaria respondeu convocando um "anti-concílio". O movimento anti-infalibilista secular culminou na realização de um "anti-concílio", que ocorreu exatamente no mesmo dia em que começava o Concílio do Vaticano. Este anti-concílio maçônico ocorreu em Nápoles, em 8 de dezembro de 1869, exatamente no dia da abertura do Concílio do Vaticano em Roma.
O convite foi assim formulado: "Aos pensadores livres de todas as nações. Post tenebras lux!"
O local da reunião foi Nápoles, porque esta cidade "teve a glória de se opor constantemente às pretensões e interferências da Corte de Roma, depois de ter, nos dias mais sombrios da Idade Média, [...] repelido de maneira constante e enérgica aquele infame tribunal da Inquisição. [...] Assim, no mesmo dia em que, na cidade eterna, abrirá esse concílio, cujo objetivo evidente é apertar as correntes da superstição e nos fazer recuar em direção à barbárie, nós, pensadores livres [...], nova maçonaria agindo à luz do sol" etc., etc. (in: Schneemann: Acta..., col. 1254 - 1255).
O grão-mestre da maçonaria francesa ofereceu seu apoio oficial. Os delegados franceses presentes no contra-concílio fizeram uma declaração final explosiva:
"Considerando que a ideia de Deus é o suporte de todo despotismo e de toda iniquidade; considerando que a religião católica é a mais completa e terrível personificação dessa ideia; [...] os pensadores livres de Paris assumem o compromisso de trabalhar para abolir pronta e radicalmente o catolicismo, e de solicitar seu aniquilamento, com todos os meios compatíveis com a justiça, incluindo o uso da força revolucionária, que é a aplicação na sociedade do direito de legítima defesa" (ibidem, col. 1258 - 1259).
Na época do Concílio do Vaticano I, um alto dignitário da maçonaria se regozijou com "o apoio valioso que encontramos há vários anos em um partido poderoso, que nos serve como intermediário entre nós e a Igreja, o partido católico liberal. Este é um partido que precisamos manejar com cuidado e que serve aos nossos interesses mais do que pensam os homens mais ou menos proeminentes que pertencem a ele na França, na Bélgica, em toda a Alemanha, na Itália e até em Roma, ao redor do próprio papa" (in: Mgr Delassus: Verdades Sociais e Erros Democráticos, 1909, reedição Villegenon 1986, p. 399).
Entre os Padres conciliares, havia de fato bispos opostos à infalibilidade. Eles formavam um verdadeiro grupo, liderado pelo Bispo Dupanloup. Os anti-infaibilistas tinham apoio na imprensa, no mundo político e até na maçonaria, como relatado por um contemporâneo e testemunha ocular, o Visconde de Meaux (memórias citadas por Jacques Ploncard d'Assac: A Igreja Ocupada, segunda edição, Chiré-en-Montreuil 1983, p. 100 - 102). Os anti-infaibilistas contavam com o apoio dos carbonários (maçons italianos), que planejavam privar o papa de sua soberania temporal, assim como o imperador francês Napoleão III, que também era carbonário. Ao ver que os Padres conciliares estavam prestes a definir a infalibilidade pontifical, a maçonaria tentou interromper o concílio provocando uma guerra militar contra Pio IX. O papa, tendo conhecimento desse plano, acelerou o processo e a infalibilidade pontifical foi votada in extremis, por um dia de diferença! A votação do Pastor aeternus ocorreu em 18 de julho de 1870; a declaração de guerra da França à Prússia no dia seguinte (19 de julho); a evacuação de Roma pelos franceses (portanto, sem mais proteção militar) em 5 de agosto, o que permitiu aos "patriotas" italianos tomar a Cidade Eterna em 20 de setembro e expulsar Pio IX de seu estado.
L. Os velhos católicos
Após a definição do dogma da infalibilidade pontifical (18 de julho de 1870), alguns anti-infaibilistas persistiram em seu erro e formaram a seita dos "velhos católicos".
Muitos livros dos velhos católicos, que afirmavam que um papa poderia errar, foram colocados no Índice.
M. Os modernistas
Nos séculos XIX e XX, os hereges conhecidos como "modernistas" buscaram minar a Igreja de dentro, permanecendo em seu seio sem romper abertamente com o Papa. Pio IX, Leão XIII e São Pio X os condenaram repetidamente. Os modernistas evitaram os golpes de duas maneiras:
- Primeiro, distorcendo o sentido das encíclicas (uma censura se tornava uma aprovação, um documento geral se transformava em um texto destinado apenas à Igreja da Itália), e
- Segundo, tentando classificar os escritos antimodernistas dos papas na categoria "falível", para minimizar sua importância.
Assim, habituou-se a fazer a equação errônea: solene = infalível; ordinário ≠ falível. "A infalibilidade do Syllabus, que teve seus defensores, hoje é praticamente abandonada", conforme se lê no Dicionário de Teologia Católica (artigo "infalibilidade do papa"). Por que essa dúvida sobre a infalibilidade do Syllabus prevaleceu sobre os defensores da infalibilidade? Simplesmente porque os modernistas, condenados pelo Syllabus, se multiplicaram! Em vez de atacar frontalmente, criticando abertamente o conteúdo, eles atacaram de lado, alegando que o modo pelo qual o conteúdo é veiculado não seria infalível. E assim conseguiram seus intentos.
Para evitar condenações, os modernistas evitaram afirmações diretas (um escrito herético é fácil de identificar e colocar no Índice), mas inauguraram uma prática de simplesmente ignorar as condenações doutrinárias emitidas pelos sumos pontífices. Foi nesse perigoso terreno que Pio XI os combateu, denunciando aqueles que "agem exatamente como se os ensinamentos e ordens promulgados tantas vezes pelos sumos pontífices, especialmente por Leão XIII, Pio X e Bento XV, tivessem perdido seu valor inicial ou mesmo não precisassem mais ser considerados". O papa concluiu com um julgamento formal: "Este fato revela uma espécie de modernismo moral, jurídico e social; nós o condenamos tão formalmente quanto o modernismo dogmático" (Pio XI: encíclica Ubi arcano, 28 de dezembro de 1922).
Inquérito Histórico: Infiltrações Antigas e Recentes
UMA CINQUENTA DE ANTIPAPAS
A. Algumas informações estatísticas
B. Usurpadores heréticos ou flertando com os hereges
C. "Anacleto II"
D. Rampolla
A. Algumas informações estatísticas
Antipapa é o termo usado para qualquer pessoa que tome o nome de papa e exerça, ou pretenda exercer, suas funções sem fundamento canônico. Assim, um antipapa pode ser um papa eleito de maneira não canônica […], um competidor designado em circunstâncias duvidosas contra um papa eleito regularmente […], ou até mesmo um intruso que se afirme pela força durante um pontificado […]. Na Antiguidade e na Alta Idade Média, usava-se principalmente o termo "intruso", que implicava invasão e usurpação (invasor, pervasor, usurpador); menos frequentemente, como mais tarde, usava-se "heresiarca" ou "cismático". Antíteses do termo "papa" eram bastante comuns: "falso papa" (falsus papa, adulterinus papa), "pseudo-papa" e até o helenismo "catopapa" (Philippe Levillain: Dicionário Histórico da Papado, Paris 1994, entrada "antipapa"). Em grego, katw = abaixo, saído dos infernos ou do reino dos mortos. Catopapa = papa morto.
Um antipapa não é um verdadeiro papa, mas um usurpador eleito de forma irregular e, portanto, não reconhecido pela Igreja Romana. É um impostor sem autoridade nem assistência do Espírito Santo.
Usurpar a tiara é um pecado gravíssimo. Santa Catarina de Siena fez críticas severas aos três cardeais italianos culpados por abandonar "Cristo na terra, o papa Urbano VI", para se juntarem ao antipapa e aos cardeais cismáticos. A santa acusou: "Demônios encarnados elegeram o demônio" (Carta 31, in: Rohrbacher, t. IX, p. 41).
Seria inadmissível admitir - mesmo como uma especulação teórica puramente hipotética - a possibilidade de uma usurpação do título de "soberano pontífice" por um homem de nossa época? Um ocupante ilegítimo da Cátedra de São Pedro - algo jamais visto? Jamais visto, portanto impensável, inadmissível?
Na verdade, este caso hipotético não é algo "jamais visto", mas sim "já visto", portanto pensável, admissível! Pois a história da Igreja está marcada pela aparição de cerca de cinquenta intrusos. O que poderia ter acontecido em algum momento da Idade Média muito bem poderia se repetir na segunda metade do século XX.
No volume 1 dos Atos de São Pio X (Bonne Presse, Paris) encontra-se a lista cronológica oficial (Annuario pontifico) dos papas e antipapas, lista que complementamos com informações fornecidas por Guérin (Os Concílios Gerais e Particulares, Bar-le-Duc 1872) e Rohrbacher (História Universal da Igreja Católica). A partir disso, estabelecemos uma estatística abrangendo dezenove séculos de papado, excluindo o século XX.
De um total de 300 (100%), tivemos: 244 papas legítimos (81%)
56 impostores (19%), dos quais 45 eram antipapas (15%) e 11 eram papas duvidosos (4%). "Papa duvidoso" = dois ou até três pretendentes à tiara, mas sem saber qual é o papa legítimo (especialmente durante o Grande Cisma do Ocidente de 1378 a 1417, onde os "papas duvidosos" de Avignon, Pisa e Roma competiam entre si). "Papa dubius, papa nullus - Um papa duvidoso é um papa nulo".
Entre os pretendentes à tiara, um em cada cinco (!) era ilegítimo ou duvidoso.
Ao longo de dezenove séculos (100%), a Igreja experimentou 12 séculos (63%) com antipapas ou papas duvidosos e 7 séculos (37%) sem antipapas nem papas duvidosos. Os séculos "com" predominam!
B. Usurpadores heréticos ou flertando com os hereges
Enquanto um verdadeiro pontífice supremo está seguro de nunca desviar da fé, o mesmo não se pode dizer de um falso papa. Assim, não é surpreendente ver que nove falsos papas foram não apenas cismáticos, mas também hereges. Por exemplo, mencionemos Novaciano, que não apenas era um herege, mas até mesmo um "heresiarcha" (fundador de uma seita herética). Ele sustentava que nunca se deveria perdoar novamente aos cristãos que sacrificaram aos ídolos, mesmo que se arrependessem sinceramente. Em 251, Novaciano "enviou dois homens de seu grupo para três bispos simples e rudes que moravam em uma pequena área da Itália e os trouxe para Roma. [...] Quando chegaram, Novaciano os trancou em um quarto, os embriagou e se fez ordenar bispo [de Roma]. O papa Cornélio, em um concílio de sessenta bispos, condenou Novaciano e o expulsou da Igreja" (Pluquet: Dictionnaire des hérésies, Paris 1847 (vol. XI da Encyclopédie théologique editada pelo abade J.P. Migne), artigo "Novaciano"). A seita dos novacianos tomou o nome de "cataros" (puros) e perdurou no Ocidente até o século VIII (não confundir com os "cátaros" albigenses dos séculos posteriores).
Os católicos africanos, que haviam considerado o antipapa Novaciano como verdadeiro papa, se retrataram e prestaram obediência a Cornélio, o papa legítimo, nestes termos: "Confessamos nosso erro; fomos vítimas de uma fraude; fomos enganados pela perfídia e pelos discursos enganosos; pois mesmo que parecesse que estávamos em comunhão com um homem cismático e herege, nosso coração sempre esteve na Igreja" (in: Heinrich Denzinger: Symboles et définitions de la foi catholique, Paris 1996, p. 33).
Como exemplo de usurpador católico, mas flertando com os hereges, podemos mencionar "Félix II". Ele foi eleito pelos arianos para substituir o papa exilado São Libério. "A eleição ocorreu de maneira bastante estranha. Três eunucos representaram a assembleia do povo; três bispos, indignos desse nome, entre os quais estava Acácio de Cesaréia na Palestina [ariano que teve papel preponderante no exílio de São Libério], impuseram-lhe as mãos no palácio do imperador [o ariano Constâncio]; pois o povo romano não permitiu que uma ordenação tão irregular ocorresse na igreja, e nenhum habitante de Roma quis entrar nela desde então, quando Félix estava presente. No entanto, é justo reconhecer que ele sempre manteve a fé de Niceia e foi irrepreensível em sua conduta, exceto pela associação que tinha com os arianos desde antes de sua ordenação" (Rohrbacher, vol. III, p. 150).
C. "Anacleto II"
"Anacleto II" (1130 - 1138) era um "marrano", ou seja, um falso convertido de origem judaica. Sua família, os Pierleoni, havia acumulado uma enorme fortuna através da usura, o que lhe permitiu ascender ao cardinalato. Uma vez cardeal, ele despojou as igrejas e, com esse ouro, subornou outros cardeais em vista do futuro conclave. O papa Honório II, já moribundo, percebendo que o bloco judaizante havia se tornado predominante, reduziu o sagrado colégio a oito cardeais, eliminando assim muitos cardeais partidários dos Pierleoni. Os eleitores legítimos elegeram Inocêncio II. Poucos dias depois, Pierleoni, tendo seduzido dois terços dos outros cardeais, se fez eleger (anti)papa, sob o nome de "Anacleto II".
Segundo os contemporâneos, "Anacleto II" despojou as igrejas. Citando um deles, o abade Ernold: "Quando até mesmo os maus cristãos que o seguiam se recusaram a destruir os cálices e crucifixos de ouro, para fundi-los, Anacleto executou este plano através de judeus. Estes últimos destruíram com entusiasmo os vasos sagrados e as imagens. Esses objetos foram vendidos e com esse dinheiro [...], Anacleto foi capaz de perseguir os partidários de Inocêncio II" (in: Maurice Pinay: Verschwonmg gegen die Kirche, Madrid 1963, p. 547).
Inocêncio II teve que fugir para a França. São Bernardo tentou unir a Inocêncio II as duas potências principais da Europa, Alemanha e França. Escreveu ao imperador alemão Lotário em 1135: "É uma afronta a Cristo que um homem de origem judaica esteja sentado no trono de Pedro" (carta 139, in: Sancti Bernardi opera, Roma 1974, vol. VII, p. 335 ou Obras completas de São Bernardo, Paris 1865 - 1867, vol. 1, p. 261). São Bernardo interveio no concílio de Etampes (1130), convocado pelo rei da França, Luís VI, o Gordo. O rei apoiou então Inocêncio II. São Bernardo frustrou as tentativas diplomáticas de "Anacleto II", que se vangloriava de "restaurar à Igreja a pureza dos primeiros tempos" através de reformas (!).
São Norberto defendeu a causa do papa legítimo no concílio de Wurzburgo. O episcopado alemão se uniu a Inocêncio II. No grande concílio de Reims em 1131, convocado por Inocêncio II e São Bernardo, os bispos da Inglaterra, Castela e Aragão também reconheceram o verdadeiro papa. "Anacleto II" tinha a seu favor a Itália e a Sicília.
Seguindo os conselhos de São Bernardo e São Norberto, o imperador Lotário empreendeu uma cruzada contra o usurpador, mas falhou. Em 1135, Lotário partiu novamente rumo a Roma, pelo qual o papa legítimo agradeceu em uma carta: "A Igreja, inspirada por Deus, te escolheu como legislador, como um segundo Justiniano, e te elegeu para que combata a infâmia herética dos judeus, como um segundo Constantino" (in: Pinay, p. 551). Esta segunda cruzada também falhou, e o antipapa permaneceu no Trono de Pedro até sua morte (25 de janeiro de 1138). "Demos graças a Deus por ter afundado este miserável na morte", exclamou São Bernardo na época.
D. Rampolla
Na morte de Leão XIII, os católicos quase tiveram um papa maçom, até mesmo um maçom que alcançou os mais altos graus dos cultos luciferianos! O cardeal Rampolla di Tindaro, secretário de Estado de Leão XIII, frequentava regularmente aos sábados uma loja próxima à abadia de Einsiedeln (Suíça) e a cada quinze dias uma loja interna em Zurique. Esta loja interna fazia parte da O.T.O., Ordo Templi Orientis. Este Ordem do Templo Oriental tinha afiliações com diversas organizações, incluindo a Igreja Católica Gnóstica; a Ordem dos Templários (Cavaleiros Templários); a Igreja Oculta do Santo Graal; a Fraternidade Hermética da Luz; a Ordem dos Rosacruzes de Heredom; bem como várias organizações maçônicas: os Iluminados da Baviera; o rito antigo e primitivo da Maçonaria (sistema com 32 graus iniciáticos); o rito de Memphis (97 graus); o rito de Misraim, fundado pelo irmão judeu Bédarride (90 graus); o rito escocês antigo e aceito (33 graus); a Ordem dos Martinistas (fundada pelo luciferiano Saint-Martin); o rito de Swedenborg (que previu antecipadamente a Revolução Francesa) (informações fornecidas por Georges Virebeau: Prélats et Francs-Maçons, Paris 1978, p. 28-33).
Rampolla era um iniciado de alto grau, pertencente aos oitavo e nono graus da O.T.O., os únicos graus autorizados a se aproximar do Grande Mestre Geral Nacional e do Chefe Supremo da Ordem, chamado Fater Superior (Irmão Superior) ou O.H.O. (Outer Head of the Order). É interessante notar que a Ordo Templi Orientis foi fundada por Aleister Crowley, considerado o maior satanista dos tempos modernos e que se autodenominava o Anticristo! A decência impede relatar em detalhes as orgias e rituais luciferianos que ele organizou com seus discípulos.
Monseigneur Jouin, fundador e diretor da Revue Internationale des Sociétés Secrètes, ao ter em mãos as provas da afiliação do cardeal Rampolla, encarregou seu editor-chefe, o marquês de La Franquerie, de levá-las aos cardeais e bispos da França. Félix Lacointa, diretor do jornal Le Bloc Anti-Révolutionnaire (ex-Bloc Catholique), testemunhou em 1929: "Durante nossa última conversa com Monsenhor Marty, bispo de Montauban, ao mantê-lo informado das descobertas recentes e ao mencionarmos o cardeal Rampolla di Tindaro, ele mencionou que, durante sua visita ad limina a Roma, pouco tempo após a morte do antigo Secretário de Estado de Leão XIII, ele foi chamado por um cardeal [Merry del Val, Secretário de Estado de São Pio X] que detalhou que na morte do cardeal Rampolla, provas concretas de sua traição foram descobertas em seus papéis. Esses documentos incriminadores foram levados ao Papa Pio X: o santo pontífice ficou chocado, mas desejando preservar a memória do prelado traidor da desonra e para evitar um escândalo, ele disse, emocionado: 'O pobre homem! Queimem!' E os papéis foram queimados na presença dele" (segundo Virebeau, p. 28).
O poder oculto incumbiu o irmão Rampolla de duas missões:
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Estabelecer dentro do Vaticano uma loja (a de "São João de Jerusalém"), que forneceria altos dignitários da Santa Sé;
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Ser eleito papa na morte de Leão XIII. Rampolla realizou a primeira tarefa, mas falhou por pouco na segunda.
No conclave, Rampolla conseguiu concentrar a maioria dos votos, mas o cardeal Pucielsko y Puzyna, arcebispo de Cracóvia, apresentou uma carta escrita pelo governo da monarquia austro-húngara. O imperador Francisco José vetou a eleição de Rampolla. Por quê? A polícia austríaca tinha conhecimento da afiliação do cardeal. Como esse motivo não foi divulgado durante o conclave, os cardeais ficaram escandalizados com essa interferência do poder civil. No próximo escrutínio, Rampolla recebeu mais votos, mas, protestando contra o veto, declarou que não aceitaria. O sagrado colégio então elegeu Giuseppe Sarto, que assumiu o nome de Pio X. Em sua primeira encíclica, o novo papa, ainda sem saber os motivos por trás do veto, protestou contra a interferência da Áustria no conclave. Foi somente após a morte de Rampolla que ele descobriu o motivo da intervenção imperial.
Algumas décadas depois, o sobrinho do cardeal luciferino formou (ou continuou) um círculo de conspiração, apostando em... Montini (ver capítulo 10)!
Documentos de Virgo-Maria sobre Rampolla
Conclusão
A história eclesiástica registra 56 usurpadores do trono pontifical, incluindo 9 hereges. Ao contrário de um verdadeiro papa, um pseudo-pontífice pode cair em heresia. Daí uma regra simples de discernimento: um homem que ensina erros na fé não pode ser papa, mas é certamente um impostor.
Houve épocas na história da Igreja em que ela enfrentou impostores que se autoproclamavam "papa". A situação atual apresenta algumas semelhanças com os tempos de São Bernardo, quando a Sé de Pedro foi ocupada por um usurpador marrano. No entanto, as duas situações não são completamente idênticas: em oposição ao antipapa ("Anaclet II"), havia um papa legítimo (Inocêncio II), além do braço secular ainda católico. Hoje, pelo contrário, os hereges instalados na Sé de Pedro reinam como mestres sem oposição; eles não são "antipapas" porque não foram eleitos "contra" um papa legítimo. Em vez de chamá-los de "antipapa", deveríamos designá-los mais apropriadamente por outro termo tradicional: "invasor", que pode ser traduzido como "envahisseur" ou "usurpador".
Amadeu de Saboia foi um usurpador que adotou o pseudônimo de "Félix V" como artista. No entanto, o Concílio de Ferrara-Florença (1438 - 1445, 9ª sessão) chamou esse usurpador não de "Félix V", mas de "Amadeu anticristo" ("Amedeus antichristus"). Da mesma forma, nós designaremos os usurpadores atuais não pelos seus pseudônimos, mas por seus nomes verdadeiros: Angelo Roncalli (em vez de "João XXIII"), Giovanni Battista Montini (em vez de "Paulo VI"), Albino Luciani (em vez de "João Paulo I") e Karol Wojtyla (em vez de "João Paulo II"). Ao falar deles, nunca usaremos o título de "papa", "Santo Padre" ou "sucessor de Pedro". Vamos até evitar a expressão "sucessores de Pio XII".
Os clérigos da Igreja conciliar, não sendo católicos, não são nem "bispos do lugar" nem "cardeais da Igreja romana". Portanto, devem ser designados apenas pelo seu nome de família, por exemplo, "Honoré" (em vez de "Dom Honoré") ou "Ratzinger" (em vez de "cardeal Ratzinger").
Somente o pontífice romano tem o direito de convocar e confirmar um concílio geral. No entanto, o Vaticano II foi convocado não por um pontífice romano, mas por um usurpador (Roncalli) e foi confirmado por outro usurpador (Montini). Portanto, é ilícito atribuir à reunião do Vaticano II o título de "concílio" (ou mesmo de "sacrosanctum concilium"!). Deve ser chamado de "conciliábulo Vaticano II". Um "conciliábulo" é uma assembleia ilegítima, cujos atos são nulos e sem efeito.
A história eclesiástica conhece mais de uma centena de conciliábulos, como veremos no próximo capítulo.
Resumo: um papa nunca ensinará um erro na fé, mas a história da Igreja conhece dezenas de antipapas, dos quais vários eram hereges.
O Papa São Libério foi banido pelo imperador por se recusar a excomungar São Atanásio. Durante seu exílio na Trácia, os arianos em Roma prestaram obediência ao antipapa "Félix II". De 355 a 365, a Sé de Pedro em Roma foi ocupada por um falso papa que praticava o ecumenismo!
A ortodoxia heroica de São Libério foi destacada por um de seus sucessores: "E quanto a esses pontífices, quem ousará dizer que falharam, mesmo em um ponto, na missão que receberam de Cristo, de confirmar seus irmãos? Longe disso; para permanecer fiéis a esse dever, alguns seguem sem hesitar o caminho do exílio, como Libério, Silvério, Martinho; outros corajosamente tomam nas mãos a causa da fé ortodoxa e de seus defensores que apelaram ao papa, vingando a memória deles mesmo após sua morte" (Bento XV: encíclica Principi apostolorum, 5 de outubro de 1920).
Uma Centena de Conciliábulos
"Não se dá o nome de igrejas [em grego ecclesia = assembleia, concílio], mas de conciliábulos aos conventículos dos hereges" (concílio geral africano, realizado em Cartago em 398, cânone 71).
Um concílio com o papa está protegido do erro; um concílio sem papa pode se equivocar, e de fato na história da Igreja ocorreu que bispos reunidos em concílio sem papa caíram em heresias. Exemplos de conciliábulos:
No conciliábulos de Rimini (359), centenas de bispos de todo o mundo foram enganados pelos arianos e assinaram uma fórmula suscetível de interpretação herética. "O universo gemeu e se surpreendeu por se tornar ariano" (São Jerônimo).
O conciliábulos de Constantinopla in Trullo (692), realizado pelos cristãos do Oriente, permitiu que homens casados fossem ordenados padres. Ao saberem disso, os cristãos do Ocidente, fiéis ao celibato eclesiástico, zombaram dos Orientais incapazes de guardar a continência.
O Concílio de Basileia (1431 - 1443) foi dissolvido pelo papa, mas então se revoltou contra essa decisão. A partir desse momento, não era mais um concílio, mas um conciliábulo. Os prelados (apenas algumas dezenas de bispos, mas centenas de teólogos) se declararam superiores ao papa e o depuseram, o que causou grande indignação aos centenas de bispos fiéis reunidos nos concílios de Ferrara e Florença com Eugênio IV (que condenaram o conciliábulo em 1438). Os prelados reunidos em Basileia até elegeram um antipapa, "Félix V". Este sínodo cismático foi condenado pelo V Concílio de Latrão. São Antonino chamou este sínodo de Basileia de "um conciliábulo sem força e a sinagoga de Satanás" (História, parte III, título 22, capítulo 10, nº 4). São João Capistrano o descreveu como "uma assembleia profana e excomungada, uma caverna de serpentes e um antro de demônios" (Sobre o poder do papa e dos concílios, início da segunda parte, III, nº 8). O bispo de Meaux o chamou de "sínodo em delírio" (em: Odoric Raynald: Anais Eclesiásticos, 1750, ano 1441, nº 9).
A Assembleia do Clero Galicano (1682) alegou erroneamente que os príncipes não estariam abaixo do papa, que o concílio era superior ao papa e que as declarações do papa só seriam infalíveis com o consentimento da Igreja universal. As decisões dessa assembleia foram anuladas pelo papa em 1690.
O Sínodo de Pistoia (1786) caiu em muitos erros: democratização da Igreja, reforma da liturgia (contra relíquias no altar; a favor do vernáculo!), reforma da disciplina, atribuição de infalibilidade ao concílio nacional sem o papa. O papa Pio VI (constituição Auctorem fidei, 28 de agosto de 1794) condenou nada menos que 85 proposições retiradas dos atos do sínodo, mas não foi ouvido de forma alguma.
Sob o Diretório, de fato, o conciliábulo nacional francês de 1797, presidido pelo abade maçom Grégoire, atacou vigorosamente as relíquias, as velas, e o uso do latim. Solicitaram-se missas celebradas na língua vernácula e expressou-se um desejo de ecumenismo "estendido até aos representantes do judaísmo".
Ao consultar a coleção de concílios editada por Paul Guérin (Os Concílios Gerais e Particulares, Bar-le-Duc 1872), encontram-se 1138 concílios católicos, além de 96 conciliábulos.
Entre os concílios católicos, dois concílios ecumênicos não foram integralmente aprovados pelo papa reinante. O 28º cânone do Concílio de Calcedônia (atribuindo uma importância exagerada ao bispo de Constantinopla) e um cânone do Concílio de Constança (afirmando que o concílio é superior ao papa) não foram reconhecidos.
CONCLUSÃO:
O episcopado reunido em concílio nacional, ou mesmo os bispos e cardeais de todo o mundo reunidos em concílio geral, podem errar na fé. O único garante é o papa.
Nunca foi visto um concílio dito "ecumênico" (geral), aprovado por um papa, ser herético. Se os bispos reunidos no Concílio de 1963 a 1965 estiverem errados, isso não indicaria que lhes faltava o garante?
Isso será examinado no próximo capítulo.
Resumo: um concílio é infalível com o papa, mas sujeito ao erro sem o papa; existem cerca de cem conciliábulos que erraram.
VATICANO II: CONCÍLIO INFALÍVEL OU CONCILIÁBULO FALÍVEL
- A. Vaticano II: pastoral ou dogmático?
- B. Magistério infalível extraordinário ou ordinário
- C. Valor de obrigação do Vaticano II
- D. Contradição entre Vaticano II e a doutrina católica
- E. É permitido contestar este conciliábulo?
Vaticano II é o triunfo de uma corrente herética, chamada de "católicos liberais" (século XIX), depois "modernistas" (século XX). Os ensinamentos do Vaticano II são contrários à fé. Quem os adere se separa da Igreja Católica.
Podemos estabelecer o seguinte raciocínio:
§ 1. Um concílio geral é infalível (Vaticano I: Dei Filius, capítulo 3), desde que seja confirmado pelo pontífice romano (Código de Direito Canônico de 1917, cânone 227).
§ 2. O Vaticano II foi um concílio geral. Mas errou.
§ 3. Portanto, o homem que confirmou o Vaticano II não foi um pontífice romano.
Portanto, Montini não era papa e o Vaticano II não foi um "concílio", mas um "conciliábulo", ou seja, uma assembleia herética cujos atos são nulos.
Um concílio com o papa está livre do erro. Se o Vaticano II errou, isso prova que Montini não era papa. Este raciocínio muito simples e claro deveria ser suficiente.
No entanto, alguns pensadores tentam evitar a conclusão deste raciocínio (que prova que Montini é um impostor). Eles procedem da seguinte maneira:
§ 1. Eles contestam o dogma da infalibilidade dos concílios gerais (imitando assim Martinho Lutero).
§ 2. Além disso, eles afirmam que o Vaticano II não teria afirmado sua própria infalibilidade. Segundo eles, este concílio teria tido "um caráter pastoral, mas não dogmático". Portanto, não teria tomado nenhuma decisão infalível.
§ 3. Sua conclusão: como o Vaticano II não teria afirmado sua infalibilidade, não se poderia provar que Montini não era papa. Portanto, ele seria papa.
A. Vaticano II: pastoral ou dogmático?
O que significa "pastoral"? Seria sinônimo de "disciplinar"? Mas então, o caráter "disciplinar" não exclui o caráter dogmático, e vice-versa, porque desde Niceia até o Vaticano I, todos os concílios ecumênicos trataram da fé e todos (exceto o II e III de Constantinopla) também trataram igualmente da disciplina.
O adjetivo "pastoral" é derivado do substantivo comum "pastor". Os pastores são ministros religiosos que têm a responsabilidade pelas almas. E a responsabilidade pelas almas não requer que o pastor fale tanto dos dogmas a serem cridos quanto da moral a ser observada? O "caráter pastoral do Vaticano II" está longe de excluir a doutrina, pelo contrário: "Para cumprir seu dever pastoral, nossos predecessores trabalharam incansavelmente na propagação da doutrina" (Vaticano I: Pastor aeternus, capítulo 4). "Consideramos um dever de nossa missão pastoral expor a toda a comunidade cristã, nesta carta encíclica, a doutrina..." (Pio XII: Mystici corporis, 29 de junho de 1943). "A responsabilidade pastoral do magistério está assim ordenada para garantir que o povo de Deus permaneça na verdade que liberta. Para cumprir este serviço, Cristo dotou os pastores com o carisma da _infa…
É verdade que Montini falou do "caráter pastoral" do Vaticano II, mas Wojtyla lhe atribuiu um caráter doutrinal: "...a continuidade do concílio com a Tradição, especialmente em pontos doutrinais que..." (motu proprio Ecclesia Dei, 2 de julho de 1988). Roncalli, também, atribuiu-lhe um caráter doutrinal, pois ele tinha designado para o conciliábulo "como tarefa principal melhor guardar e explicar o depósito precioso da doutrina cristã" (Wojtyla: constituição apostólica Fidei depositum, 11 de outubro de 1992). O caráter pastoral está intimamente ligado ao aspecto doutrinal: "Os Padres conciliares conseguiram elaborar, ao longo de quatro anos de trabalho, um conjunto considerável de exposições doutrinais e diretrizes pastorais" (ibidem).
É verdade que vários textos conciliares são "constituições pastorais". Mas existem também dois textos conciliares que têm exatamente o título de "constituição DOGMÁTICA Lumen Gentium" e "constituição DOGMÁTICA Dei Verbum! Como "constituições dogmáticas" poderiam vir de um conciliábulo supostamente "não-dogmático"?
Além disso, em Dignitatis Humanae encontram-se palavras que indicam um caráter dogmático, como "doutrina, verdade, palavra de Deus, Revelação divina".
O Vaticano II não foi apenas pastoral, mas também dogmático. O Vaticano II foi pastoral e dogmático ao mesmo tempo.
O Vaticano II foi também dogmático, pois o dogma, segundo o sentido comum da palavra, são as verdades da fé a serem cridas, derivadas da Revelação. No Vaticano II, a liberdade de culto e de imprensa foi apresentada como contida na Sagrada Escritura, portanto, como sendo de fé divina. "Este Concílio Vaticano investiga a tradição sagrada e a santa doutrina da Igreja" (Dignitatis Humanae, § 1); a liberdade religiosa tem seu fundamento na "palavra de Deus" (§ 2); ela corresponde "à ordem estabelecida por Deus mesmo" (§ 3); é necessária para uma sociedade preocupada "com a fidelidade dos homens para com Deus e sua santa vontade" (§ 6); agir contra ela seria "agir contra a vontade de Deus" (§ 6); "esta doutrina da liberdade tem suas raízes na Revelação divina, o que, para os cristãos, é um motivo a mais para ser fiel a ela" (§ 9); ela corresponde "à palavra e ao exemplo de Cristo" e "os apóstolos seguiram o mesmo caminho" (§ 11); por isso, "a Igreja, fiel à verdade do Evangelho, segue o caminho que Cristo e os apóstolos seguiram ao reconhecer o princípio da liberdade religiosa como conforme à dignidade do homem e à Revelação divina [...] Esta doutrina, recebida de Cristo e dos apóstolos, ela a guardou e transmitiu ao longo dos tempos" (§ 12).
B. Magistério infalível extraordinário ou ordinário?
Para negar a infalibilidade do Vaticano II, algumas pessoas se baseiam na famosa declaração feita por Montini em 12 de janeiro de 1966: "Dado o caráter pastoral do concílio, este evitou proclamar segundo o modo 'extraordinário' dogmas afetados pela nota da infalibilidade". Isso parece dar razão aos opositores da infalibilidade do Vaticano. No entanto, esta frase foi truncada. Não nos contentemos com o texto truncado do discurso de Montini, mas também leiamos o restante, conforme relatado no L'Osservatore Romano de 13 de janeiro de 1966: "Dado o caráter pastoral do concílio, este evitou proclamar segundo o modo 'extraordinário' dogmas afetados pela nota da infalibilidade. No entanto, o concílio atribuiu a seus ensinamentos a autoridade do magistério supremo ordinário". Montini assimilou o Vaticano II ao magistério ordinário. No entanto, como ensina o Vaticano I (Dei Filius, capítulo 3), o magistério ordinário também é sempre infalível.
Na verdade, esta declaração de Montini é bastante estranha: ele classifica um concílio (ou melhor, um "conciliábulo"!) como pertencente ao "magistério ordinário", cometendo assim um erro grosseiro de classificação. Por definição, todo concílio, especialmente um concílio geral, faz parte do magistério extraordinário. Independentemente do que Montini disse, o Vaticano II faz parte do magistério extraordinário, não do magistério ordinário. Poderíamos invocar, em apoio a esta afirmação, uma frase de Wojtyla: "O Segundo Concílio do Vaticano SOLIDAMENTE recordou que o direito à liberdade religiosa é sagrado para todos os homens" (discurso de 22 de dezembro de 1979). Poderíamos ainda nos referir ao seu motu proprio Ecclesia Dei de 2 de julho de 1988, que assimila o Vaticano II ao magistério extraordinário, colocando-o entre os concílios ecumênicos (que, por definição, pertencem ao magistério extraordinário): "O resultado alcançado pelo movimento promovido por Mons. Lefebvre pode e deve ser uma oportunidade para todos os fiéis católicos refletirem sinceramente sobre sua própria fidelidade à Tradição da Igreja, autenticamente interpretada pelo magistério eclesiástico, ordinário e extraordinário, especialmente nos concílios ecumênicos, desde Niceia até o Vaticano II".
Então? Extraordinário ou ordinário? Na nossa opinião: extraordinário. Mas na verdade, pouco importa o modo, porque seja ordinário ou extraordinário, o magistério deve ser considerado como sendo infalível, conforme as palavras de Pio XII: "Sempre que se faz ouvir a voz do magistério da Igreja, tanto ordinário quanto extraordinário, recebam esta voz com ouvidos atentos e espírito dócil" (Pio XII aos membros do Angelicum, 14 de janeiro de 1958). Ou ainda Leão XIII: "Todas as vezes, portanto, que a palavra deste magistério declara que tal ou tal verdade faz parte do conjunto da doutrina divinamente revelada, cada um deve crer com certeza que isso é verdadeiro" (Leão XIII: encíclica Satis Cognitum, 29 de junho de 1896).
À conclusão de Dignitatis humanae, Montini aprovou integralmente todo o texto, exercendo sua autoridade suprema como (suposto) Vigário de Cristo: "Todo o conjunto e cada um dos pontos que foram estabelecidos nesta declaração agradaram aos Padres. E nós, pelo poder apostólico que nos foi confiado por Cristo, em união com os veneráveis Padres, os aprovamos no Espírito Santo, os decretamos, os estabelecemos e ordenamos que o que foi estabelecido no concílio seja promulgado para a glória de Deus. Roma, em São Pedro, 7 de dezembro de 1965. Eu, Paulo, bispo da Igreja Católica".
Segundo o Vaticano II, a liberdade religiosa faz parte da fé católica, pois está contida no Evangelho. Negá-la seria, de acordo com as próprias palavras de Montini citadas acima, ir contra o veredicto do Espírito Santo, que falou através do órgão de um concílio ecumênico infalível.
Por sua vez, Wojtyla aprovou o Catecismo da Igreja Católica (Paris 1992), onde se lê no n° 891: "A infalibilidade prometida à Igreja reside também no corpo dos bispos quando exerce seu magistério supremo em união com o sucessor de Pedro" (constituição dogmática Lumen Gentium, § 25; cf. Vaticano I), especialmente em um concílio ecumênico. Quando, pelo seu magistério supremo, a Igreja propõe algo "para ser acreditado como revelado por Deus" (constituição dogmática Dei Verbum, § 10) e como ensinamento de Cristo, "é necessário aderir na obediência da fé a tais definições" (Lumen Gentium, § 25). Se compararmos os termos deste catecismo com os de Dignitatis humanae, concluímos que o Vaticano II cumpre as condições de infalibilidade: "Revelado por Deus" (C.I.C.) = "raízes na Revelação divina" (D.H.); "ensinamento de Cristo" (C.I.C.) = "doutrina recebida de Cristo" (D.H.).
Além disso, o caráter "pastoral" do Vaticano II não diminui sua infalibilidade, pelo contrário: "A carga pastoral do magistério é assim ordenada para assegurar que o povo de Deus permaneça na verdade que liberta. Para cumprir este serviço, Cristo dotou os pastores do carisma da infalibilidade em matéria de fé e moral" (Catecismo da Igreja Católica, n° 890).
C. Valor de Obligação do Vaticano II
Montini impôs aos fiéis a aceitação do ensinamento não apenas de Dignitatis humanae, mas de todos os textos conciliares. Em seu discurso de 12 de janeiro de 1966, ele afirmou: "O concílio atribuiu aos seus ensinamentos a autoridade do magistério supremo ordinário, o qual é tão manifestamente autêntico que deve ser acolhido por todos os fiéis segundo as normas estabelecidas pelo concílio, considerando a natureza e o propósito de cada documento".
Montini fez anexar a Lumen gentium uma declaração que já havia ordenado ser lida na aula conciliar por Felici, secretário do conciliábulo. "Perguntou-se qual qualificação teológica deve ser atribuída à doutrina exposta neste esquema. A comissão doutrinal respondeu que se baseia nas regras gerais conhecidas por todos, e remete à sua declaração de 6 de março de 1964: 'Considerando o costume conciliar e o propósito pastoral do presente concílio, este sagrado sínodo define que a Igreja deve reter apenas os elementos relativos à fé e aos costumes que ele declarou abertamente como tais'".
O vocabulário utilizado em Dignitatis humanae indica claramente que a liberdade religiosa é um "elemento relativo à fé e aos costumes" (§ 10: "Portanto, é plenamente conforme ao caráter próprio da fé que, em questões religiosas, seja excluída qualquer forma de coerção").
E outro texto conciliar que deve ser considerado como relacionado à fé é o decreto sobre o ecumenismo Unitatis redintegratio. Pois o esquema preparatório desse decreto foi aprovado pelos Padres em 1º de dezembro de 1962 da seguinte forma: "Após a conclusão do exame do decreto sobre a unidade da Igreja, os Padres do concílio o aprovam como um documento que reúne as verdades comuns da fé" (in: Documentos conciliares. Concílio Ecumênico Vaticano II. A Igreja. O ecumenismo. As Igrejas orientais, Centurion, Paris 1965, p. 166). Dignitatis humanae e Unitatis redintegratio, além das duas constituições dogmáticas Dei Verbum e Lumen gentium, que contêm elementos relacionados à fé, devem ser "mantidos" (Comissão doutrinal, 6 de março de 1964, citado acima).
Todo este conciliábulo tem "um valor particular de obrigação" (Wojtyla, 1º de setembro de 1980). Este conciliábulo é, para os conciliares, O concílio por excelência. Tem, aos seus olhos, uma infalibilidade e um valor de obrigação que ultrapassa em muito todos os outros concílios. Montini exclamou indignado: "Como hoje alguém poderia se comparar a São Atanásio [alusão a Monsenhor Lefebvre] enquanto ousa combater um concílio como o Segundo Concílio do Vaticano, que não tem menos autoridade, e que é até, em alguns aspectos, mais importante do que o de Niceia?" (Montini: Carta a Monsenhor Lefebvre, 29 de junho de 1975).
Wojtyla, por sua vez, classificou esta reunião na categoria dos concílios ecumênicos, aos quais todo bom cristão deve obedecer. Segundo ele, o Vaticano II definiu verdades de fé em conexão com a Revelação divina: "Por sua vez, a Sé Apostólica tinha um único objetivo nessas conversas com você [Monsenhor Lefebvre]: promover e proteger essa unidade na obediência à Revelação divina, traduzida e interpretada pelo magistério da Igreja, especialmente nos vinte e um concílios ecumênicos, de Niceia ao Vaticano II" (carta de Wojtyla a Monsenhor Lefebvre, 9 de junho de 1988). Segundo Montini e Wojtyla, o Vaticano II é um concílio ecumênico que desfruta da mesma autoridade e infalibilidade que os concílios ecumênicos de Niceia, Calcedônia, Constantinopla, Latrão, Trento e Vaticano I.
D. Contradição entre o Vaticano II e a doutrina católica
Os maus livros foram sempre combatidos, a liberdade de imprensa sempre abominada. São Paulo mesmo encorajou os cristãos convertidos a queimar publicamente seus livros de feitiçaria (Atos dos Apóstolos XIX, 19).
No palácio dos papas em Avignon está afixado um decreto pontifical da época de Bento XIV: os impressores culpados de imprimir escritos dos hereges protestantes deveriam sofrer nada menos que A PENA DE MORTE!!
"É preciso lutar com coragem, tanto quanto a coisa o exige, e exterminar com todas as forças o flagelo de tantos livros funestos; nunca se fará desaparecer a matéria do erro, se os elementos criminosos da corrupção não perecerem consumidos pelas chamas" (Clemente XIII: encíclica Christianae reipublicae salus, 25 de novembro de 1766).
"Essa licença de pensar, de dizer, de escrever e até de fazer imprimir impunemente [...] tudo o que pode sugerir a imaginação mais desregrada" é "um direito monstruoso" (Pio VI: breve Quod aliquantum, 10 de março de 1791).
A liberdade de imprensa é uma "liberdade execrável pela qual nunca se terá horror suficiente" (Gregório XVI: encíclica Mirari vos, 15 de agosto de 1830).
A condenação da liberdade de imprensa faz parte do magistério pontifício ordinário. Este ensinamento é infalível, segundo São Pio X (juramento antimodernista): "Eu, N., abraço e recebo firmemente todas e cada uma das verdades que a Igreja, por seu magistério infalível, definiu, afirmou e declarou, especialmente esses chefes de doutrina que são diretamente dirigidos contra os erros deste tempo".
No entanto, o Vaticano II se opõe a esse ensinamento infalível, afirmando: "Os grupos religiosos também têm o direito de não ser impedidos de ensinar e manifestar sua fé publicamente, de viva voz e por escrito" (Dignitatis humanae, § 4). Assim, xintoístas, cainitas (seita cujos discípulos se esforçam para cometer todo tipo de pecado, imitando Caim), supra-lapsários (grupo protestante), gomaristas (idem), luciferianos (antigamente discípulos de Lúcifer de Cagliari, combatidos por São Jerônimo; hoje, adeptos do culto a Lúcifer), adoradores da cebola (existem na França atualmente) e adeptos de todas as outras seitas bizarras - perdão, deveria ter dito "grupos religiosos" - estão autorizados a espalhar seus delírios pela imprensa.
Isso levanta um problema de autoridade: a liberdade de imprensa foi condenada pelo magistério pontifício ordinário "infalível" (São Pio X). No entanto, essa mesma liberdade de imprensa foi aprovada pelo Vaticano II como decorrente da "Revelação divina" (termo que envolve a infalibilidade do Vaticano II).
Da mesma forma, a liberdade dos cultos, qualificada como "desastrosa e uma heresia para sempre deplorável" por Pio VII (carta apostólica Post tam diuturnas, 29 de abril de 1814), foi apresentada como uma verdade de fé pelo Vaticano II.
Um dos redatores de Dignitatis humanae, o Padre Congar, escreveu que, segundo este texto, a liberdade religiosa estava contida na Revelação. No entanto, ele mesmo admitiu que tal afirmação era falsa. "A pedido do Papa, eu colaborei nos últimos parágrafos da declaração sobre a liberdade religiosa: era para mostrar que o tema da liberdade religiosa já aparecia na Escritura, mas isso não é verdade" (in: Éric Vatré: A la droite du Père, Paris 1994, p. 118). Que confissão! Declarar que uma doutrina é revelada, sabendo perfeitamente que isso é falso! Os bispos do conciliábulo que aprovaram este texto - incluindo Montini - são impostores!
A liberdade religiosa é até contrária à Revelação. Quando os judeus adoraram o bezerro de ouro, Moisés os parabenizou? Ele não os encorajou a "manifestar livremente a eficácia singular de sua doutrina para organizar a sociedade e vivificar toda a atividade humana" (Dignitatis humanae, § 4). A inexistência do direito à liberdade religiosa é uma verdade revelada. Por exemplo, Deus ordenou a Gideão que derrubasse o altar erguido a Baal por seu próprio pai (Juízes 6:25). O profeta Elias matou com suas próprias mãos os sacerdotes de Baal (2 Reis 18:40). Elias é o maior dos profetas, pois foi especialmente honrado por Nosso Senhor Jesus Cristo durante a Transfiguração (portanto, Cristo é contra a liberdade religiosa). O sucessor de Elias, Eliseu, ungiu Jeú. O rei Jeú mandou massacrar todos os seguidores de Baal, demolir o altar e "também derrubaram o templo de Baal e fizeram dele um latrina, o que ele é até hoje" (2 Reis 10:27). Esta latrina perto de Jerusalém é chamada de Geena...
"Além disso, a liberdade religiosa exige que os grupos religiosos não sejam impedidos de manifestar livremente a singular eficácia de sua doutrina para organizar a sociedade e vitalizar toda a atividade humana" (Dignitatis humanae, § 4). No entanto, Cristo disse: "Eu sou o caminho, a verdade e a vida" (João 14:6). Ele não disse que outras religiões além da sua trazem vida. Além disso, Cristo disse: "Sem mim, nada podeis fazer" (João 15:5). Ele não disse que algo pode ser feito (organizar eficazmente a sociedade) por meio de Buda ou Maomé. Cristo disse: "Quem não crer será condenado" (Marcos 16:16). Portanto, Ele não deu permissão para honrar o Ser supremo (termo querido pelos maçons) por meio de qualquer culto X. Se o Vaticano II afirma que budistas, muçulmanos, protestantes, animistas, etc., têm o direito de "honrar publicamente a divindade suprema" (Dignitatis humanae, § 4; a expressão "divindade suprema" também aparece em Nostra aetate), isso prova que os prelados adotaram a ideologia e a linguagem das lojas maçônicas, assim como Wojtyla em Assis, pedindo aos seus convidados para simplesmente rezar "a uma potência suprema", "o Ser absoluto", "uma potência acima de todas as nossas forças humanas", "essa realidade que está além de nós".
"Divindade suprema"? Um comentarista atento poderia até destacar que o adjetivo "suprema" implica que também existem divindades inferiores. O Vaticano II estaria então professando o politeísmo...
Passamos agora ao decreto sobre o ecumenismo intitulado Unitatis redintegratio, também aprovado "no Espírito Santo" por Montini, em 21 de novembro de 1964. "Justificados pela fé recebida no batismo, incorporados a Cristo, eles têm direito a ser chamados de cristãos, e os filhos da Igreja Católica os reconhecem justamente como irmãos no Senhor" (§ 3). É um passo curioso e inédito: os adeptos das diversas seitas heréticas ou cismáticas são agora considerados ter fé?!
"As 'ações sagradas' desses irmãos 'certamente podem efetivamente produzir a vida da graça, e deve-se reconhecer que elas dão acesso à comunhão da salvação. [...] O Espírito de Cristo não se recusa a usá-las [das seitas protestantes ou cismáticas] como meios de salvação" (ibidem).
O Vaticano II obriga a crer como verdade de fé divina ("deve-se reconhecer") que o protestantismo leva à salvação. A infalibilidade está claramente envolvida.
Mas Pio IX ensinou ex cathedra o contrário: "É também muito conhecido esse dogma católico: que ninguém pode se salvar fora da Igreja Católica, e aqueles não podem obter a salvação eterna que conscientemente se mostram rebeldes à autoridade e às definições da Igreja, bem como aqueles que estão separados voluntariamente da unidade da Igreja e do pontífice romano, sucessor de Pedro, a quem foi confiada pelo Salvador a guarda da vinha" (Pio IX: carta Quanto conficiamus, 10 de agosto de 1863).
E os concílios anteriores a Pio IX vão na mesma direção. Citamos apenas um texto pouco conhecido do Concílio de Sens, realizado em 1528: "O luteranismo é uma exalação da serpente infernal". E esse mesmo concílio não era realmente favorável à liberdade religiosa: "Nós suplicamos [...] ao rei [...] que demonstre o zelo com que está preenchido pela religião cristã, afastando todos os hereges das terras de sua obediência, exterminando essa peste pública, preservando nesta fé essa monarquia", e proibimos "as reuniões secretas dos hereges".
E. É permitido contestar este concílio?
Sim, mas a argumentação precisa ser contundente! O argumento de "concílio pastoral" não tem validade, pois este concílio também foi doutrinal (é o próprio Wojtyla quem assegura isso, e, pela primeira vez, ele está certo: constituição dogmática Dei Verbum; constituição dogmática Lumen gentium!). E dizer que o Vaticano II não teria engajado sua infalibilidade solene também não faz sentido: por definição, todo concílio faz parte do magistério solene! Mesmo adotando o ponto de vista (equivocado) de Montini, classificando o Vaticano II na categoria do magistério ordinário universal, a infalibilidade ainda estaria engajada (Vaticano I: Dei Filius, cap. 3).
Afirmar que este concílio é contrário à Tradição está de acordo com a verdade. Contestar o Vaticano II argumentando a flagrante contradição com a sã doutrina é um bom reflexo do católico. No entanto, este reflexo instintivo não é suficiente, por si só, para resolver uma questão misteriosa: como é possível que um concílio ecumênico, em princípio assistido pelo Espírito Santo, tenha errado?
O primeiro concílio, o de Jerusalém, escolheu uma fórmula que se tornou célebre: "Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós" (Atos dos Apóstolos XV, 28). O Papa Pio XII ensina: "Cristo, embora invisível, preside aos concílios da Igreja e os guia com a sua luz" (encíclica Mystici corporis, 29 de junho de 1943, baseando-se em São Cirilo de Alexandria: Ep. 55 de Synod.). Montini, agindo como doutor público da Igreja universal, aprovou o Vaticano II "no Espírito Santo". Montini e Wojtyla colocam o Vaticano II no mesmo nível que os vinte concílios ecumênicos (de Niceia até o Vaticano I).
Ou qualquer pessoa que conteste um concílio ecumênico - como os arianos contra Niceia ou os protestantes contra Trento - é herege. Pretender que se pode pensar de forma diferente de um concílio ecumênico é uma heresia. Eis a 29ª proposição de Martinho Lutero: "Foi-nos dado o poder de refutar a autoridade dos concílios, de contradizer livremente seus atos, de nos tornar juízes dos atos que eles promulgaram, e de afirmar com segurança tudo o que nos parece verdadeiro; que isso seja aprovado ou reprovado por qualquer concílio". Esta proposição foi condenada por Leão X (bula Exsurge Domine, 16 de maio de 1520). Ao negar a infalibilidade de um concílio geral, Lutero avançava uma doutrina até então desconhecida na Igreja. Lutero fez "discípulos" no século XX: os modernistas (clérigos católicos contaminados pelos erros modernos) começaram também a contradizer os concílios, levando o Papa São Pio X a retomar a condenação da 29ª proposição de Lutero em sua encíclica Pascendi, de 8 de setembro de 1907. Por meio de seu motu proprio Praestantia, de 18 de novembro de 1907, ele adicionou a pena de excomunhão ipso facto para aqueles que propagassem doutrinas condenadas em Pascendi.
Os católicos não podem invocar nem as Escrituras nem a Tradição contra um concílio ecumênico (como o Vaticano II), pois os protestantes usaram a Bíblia contra Trento e os velhos católicos defenderam a Tradição contra o Vaticano I. Também não se pode referir a Monsenhor Lefebvre, pois (deve-se lembrar desse truísmo) a autoridade doutrinal suprema na Igreja não é um bispo emérito, mas sim o pontífice romano. Ora, Montini assegurou, como doutor público, a conformidade deste concílio com a Tradição, e Wojtyla também certificou, como doutor público, que o Vaticano II estava de acordo com a Tradição:
"Nada do que foi decretado neste concílio, assim como nas reformas que decidimos para sua implementação, é contrário ao que a Tradição bimilenar da Igreja contém de fundamental e imutável. Disso somos garantes, não por nossas qualidades pessoais, mas pelo cargo que o Senhor nos conferiu como legítimo sucessor de Pedro e pela assistência especial que Ele nos prometeu como a Pedro: 'Eu orei por ti, para que tua fé não desfaleça'" (Lucas XXII, 32). Com nós é garantido o episcopado universal" (Montini: Carta a Monsenhor Lefebvre, 11 de outubro de 1976).
« A amplitude e a profundidade dos ensinamentos do Concílio Vaticano II exigem um compromisso renovado de aprofundamento, que permitirá destacar a continuidade do concílio com a Tradição, especialmente em pontos de doutrina que, talvez devido à sua novidade, ainda não foram plenamente compreendidos em alguns setores da Igreja » (Wojtyla: motu proprio Ecclesia Dei, 2 de julho de 1988).
Os católicos devem seguir até o fim as exigências da Verdade e respeitar toda a Tradição, incluindo a sentença de Leão X condenando a 29ª proposição de Lutero. Se é proibido contestar um concílio ecumênico legítimo, restam apenas duas soluções canonicamente corretas: ou aceitar religiosamente o Vaticano II como um dom do Espírito Santo à Igreja; ou verificar se esse concílio foi realmente ecumênico ou não. Mas não se pode agradar a gregos e troianos, aceitando que esse conciliábulo figure oficialmente entre os concílios ecumênicos e, ao mesmo tempo, ignorá-lo (atitude luterana).
CADA um dos concílios ecumênicos é invulnerável. TODO concílio ecumênico é assistido pelo Espírito Santo. Este é o ensinamento EX CATHEDRA de Pio XII em Mystici corporis (pois o papa escreveu esta encíclica "como doutor da Igreja universal" para ensinar "todo o povo de Deus" os "mistérios revelados por Deus")!
Adicionemos ainda o especialista por excelência em infalibilidade: o Papa Pio IX: "Se eles acreditavam firmemente, junto com os outros católicos, que o concílio ecumênico é governado pelo Espírito Santo, que é somente pelo sopro deste Espírito divino que ele define e propõe o que deve ser crido, jamais lhes ocorreria que coisas não reveladas ou prejudiciais à Igreja poderiam ser definidas e impostas à fé, e não imaginariam que manobras humanas poderiam deter o poder do Espírito Santo e impedir a definição de coisas reveladas e úteis à Igreja" (bula Dolendum profecto, 12 de março de 1870).
É crucial entender o seguinte: se o Vaticano II é um dos concílios ecumênicos, ele É inspirado pelo Paráclito e, portanto, teologicamente e canonicamente invulnerável! Por outro lado, se não é ecumênico (por falta do guardião: o Papa), não possui a garantia da assistência do Espírito Santo, mesmo com a presença de muitos bispos (como no conciliábulo de Rimini, por exemplo).
Aqueles que insistem em considerar Montini como Papa devem nos demonstrar de forma plausível como Cristo, ao contrário de suas quatro promessas (Lucas 20, 32; Mateus 16, 18 e 28, 19-20; João 14, 15-17), poderia abandonar seu Vigário durante um concílio ecumênico???
Da mesma forma, devem explicar de maneira coerente por que a fórmula "Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós" (Concílio dos Apóstolos em Jerusalém) teria funcionado, enquanto a fórmula "Aprovamos no Espírito Santo" (Vaticano II) não funcionaria???
Em suma, afirmar que se pode rejeitar um concílio ecumênico aprovado por um Papa (Montini) equivale a dar razão a Lutero contra Leão X e São Pio X.
Conclusão
O Vaticano II afirmou sua infalibilidade, mas mesmo assim errou. Como explicar essa falha?
Montini afirma ter CONFIRMADO "NO ESPÍRITO SANTO", enquanto o Vaticano II É HERÉTICO em vários pontos. Isso PROVA que ele não poderia ter sido um verdadeiro Papa e que o Espírito Santo não o assistiu. Se ele tivesse sido Papa, a Igreja universal, apoiada em Pedro, não poderia ter errado, como ensina o Doutor Angélico (Suma Teológica, suplemento da III parte, q. 25, a. 1).
Conhecemos a famosa exclamação dos Padres do Concílio Ecumênico de Calcedônia: "Pedro falou pela boca de Leão!" Bem, Pedro falou pela boca de Montini? Se sim, aqueles que contestam o Vaticano II não seriam melhores do que os contestadores nestorianos, que recusaram o veredicto de Pedro em Calcedônia; se não, Montini não era o sucessor de Pedro. Tertium non datur. ("Não há terceira solução").
Dizer que Montini não teria falado de modo algum seria ridículo, já que ele aprovou todos e cada um dos documentos conciliares em seu próprio nome. E afirmar que ele teria agido apenas como um "doutor privado" seria grotesco: aprovar um concílio ecumênico é um ato público, destinado a ser levado ao conhecimento de todo o mundo. Pedro falou pela boca de Montini? Est est, non non!
Além disso, Montini ele próprio estabeleceu muito claramente que ele engajava sua infalibilidade para certificar a ortodoxia do Vaticano II: "Nada do que foi decretado neste concílio, assim como nas reformas que decidimos implementar para colocá-lo em prática, está em oposição ao que a Tradição bimilenar da Igreja comporta de fundamental e imutável. Disso, nós garantimos, em virtude não de nossas qualidades pessoais, mas do cargo que o Senhor nos confiou como sucessor legítimo de Pedro e da assistência especial que Ele nos prometeu como a Pedro: 'Eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça' (Lucas XXII, 32). Conosco está garantido o episcopado universal.
E você não pode invocar a distinção entre dogmático e pastoral para aceitar alguns textos deste concílio e rejeitar outros. Certamente, tudo o que é afirmado em um concílio não requer um assentimento da mesma natureza: apenas o que é afirmado como objeto de fé ou verdade anexa à fé, por meio de atos "definitivos", exige um assentimento de fé. Mas o restante também faz parte do magistério solene da Igreja, ao qual todo fiel deve dar uma acolhida confiante e uma aplicação sincera.
Resta que, em consciência, você diz que ainda não vê como conciliar alguns textos do concílio [...] com a sã tradição da Igreja [...]. Mas como uma dificuldade pessoal interior [...] permitiria que você se erigisse publicamente como juiz daquilo que foi adotado legitimamente e praticamente por unanimidade, e conscientemente levasse uma parte dos fiéis ao seu repúdio? Se as justificações são úteis para facilitar intelectualmente a adesão [...], elas não são por si mesmas necessárias para o assentimento de obediência que é devido ao concílio ecumênico e às decisões do papa. É o sentido eclesial que está em questão [...].
Nós dizemos a você, irmão, que você está em erro. E com todo o ardor de nosso amor fraternal, COM TODO O PESO DE NOSSA AUTORIDADE COMO SUCESSOR DE PEDRO, convidamos você a se retratar, a se corrigir e a parar de infligir feridas à Igreja de Cristo.
[Exigimos de você uma retratação pública de seu repúdio ao Vaticano II]. Esta declaração deve afirmar que você adere francamente ao concílio ecumênico Vaticano II e a todos os seus textos - sensu obvio -, que foram adotados pelos Padres do concílio, aprovados e promulgados por nossa autoridade. Pois tal adesão sempre foi a norma na Igreja desde os primórdios, no que diz respeito aos concílios ecumênicos" (Montini: Carta a Monsenhor Lefebvre, 11 de outubro de 1976).
Certos pensam que Montini perdeu o pontificado ao assinar Dignitatis humanae. Nós, ao contrário, pensamos que ele nunca o possuía desde o início, pois, se tivesse sido legitimamente eleito papa, o carisma da infalibilidade o teria preservado de cair em heresia. Se ele nunca foi papa desde o início, isso significa que sua eleição deve ter sido inválida. As razões da invalidade de sua eleição serão apresentadas no capítulo 10.
Mas antes disso, no capítulo 9, faremos um estudo "bis" sobre seu sucessor Wojtyla.
Resumo: O Vaticano II, sendo princípio infalível, errou porque lhe faltava um elemento constitutivo essencial: um papa.
Veneráveis sereias! Nosso convidado de honra no Concílio Vaticano II irá explicar como a liberdade religiosa "tem suas raízes na Revelação divina".
9. WOJTYLA É CATÓLICO?
A. Uma doutrina heterogênea
B. Wojtyla aprovou ex cathedra as heresias?
C. "Eu creio em Deus Pai todo-poderoso" [ERROS SOBRE O PODER POLÍTICO]
D. Eu creio em Deus, "criador de todas as coisas" [EVOLUCIONISMO]
E. Eu creio "em um só Senhor, Jesus Cristo" [O CRISTO-REI DESTRUÍDO PELO HOMEM-REI]
F. Eu creio no "Filho único de Deus" [JESUS NÃO É O MESSIAS]
G. Eu creio que o Filho é "consubstancial ao Pai" ["DA MESMA NATUREZA" SEGUNDO ÁRIO E A IGREJA CONCILIAR]
H. Eu creio que "Ele nasceu da Virgem Maria" [ATAQUE CONTRA O DOGMA DA IMACULADA CONCEIÇÃO]
I. Eu creio que "Ele desceu aos infernos" [HERESIAS DE ABELARDO E DE CALVINO]
J. Eu creio que "Ele subiu aos céus" [FICÇÃO METAFÓRICA]
K. "Eu creio que "Ele virá julgar os vivos e os mortos" [HERESIA DE ZANINO DE SOLCIA AMPLIADA POR WOJTYLA]
L. "Eu creio no Espírito Santo" [TRÊS PECADOS WOJTYLIANOS CONTRA O ESPÍRITO SANTO]
M. Eu creio "na Igreja, una, santa, católica e apostólica" ["A RELIGIÃO À LA CARTE"]
A. Uma doutrina heterogênea
A doutrina de Wojtyla é heterogênea: por um lado, ele enuncia heresias dogmáticas; por outro, ele defende a moral. Por quê?
Wojtyla deseja unir as religiões monoteístas. É um retorno aos Dez Mandamentos de Moisés. Uma tentativa de judaizar a Igreja, simplesmente. Wojtyla dissolve os dogmas do cristianismo, mas mantém a moral: judeus, cristãos e muçulmanos, todos nós temos o mesmo único Deus; todos somos filhos de Abraão; todos defendemos a ordem moral. E assim está feito! Os conservadores, tranquilizados pelos discursos moralizadores de Wojtyla, se alegram e esquecem de abrir uma investigação canônica por crime de heresia contra ele! Segundo eles, Wojtyla também diz coisas boas. Por isso, concedem a ele o que chamam de "fé residual". Sic! Isso significa que a alma de Wojtyla é em grande parte herética, mas que ainda resta um pequeno resíduo de fé católica. A alma de Wojtyla está em grande parte obscurecida pela heresia, mas ainda há um pequeno canto de alma católica, "senão ele não seria papa". Sic! Os defensores dessa teoria extraordinária insinuam, de certa forma, que um ser humano pode ter duas almas, uma má e uma boa, o que é uma heresia anatematizada pelo VIII Concílio Ecumênico, cânon 11. A expressão "fé residual" ou a teoria do canto católico dentro da alma herética evita afirmar claramente que Wojtyla não tem fé, portanto não é católico de forma alguma, portanto fora da Igreja Católica, portanto...? Sim! Se ele não é católico, qual é a consequência disso? Um não-católico pode ser o líder da Igreja Católica? Eis a questão crucial que se contorna ao inventar o termo "fé residual"!
Ato de fé "Meu Deus, creio firmemente em tudo o que a Santa Igreja Católica, Apostólica e Romana me ordena crer...". A fé consiste em crer em tudo. Aquele que nega mesmo uma única verdade do catolicismo não tem fé alguma. Ele não teria nem mesmo uma "fé residual". "Tal é a natureza da fé que nada é mais impossível do que crer em uma coisa e rejeitar outra. [...] Aquele que, mesmo em um único ponto, recusa seu assentimento às verdades divinamente reveladas, realmente abdica completamente da fé, pois recusa se submeter a Deus como Ele é a suprema verdade e o próprio motivo da fé" (Leão XIII: encíclica Satis cognitum, 29 de junho de 1896).
Wojtyla enuncia heresias. O fato de ele também enunciar verdades sobre a moral não o desculpa de forma alguma. Pelo contrário, isso apenas agrava seu caso. O jogo duplo é característico dos piores inimigos da fé: os modernistas! "Ao ouvi-los, ao lê-los, poderíamos ser tentados a acreditar que estão em contradição consigo mesmos, que são oscilantes e incertos. Longe disso: tudo é medido, tudo é intencional neles [...]. Uma página de seu trabalho poderia ser assinada por um católico; vire a página, você pensa estar lendo um racionalista" (São Pio X: encíclica Pascendi, 8 de setembro de 1907).
Se Wojtyla dissesse exclusivamente coisas ruins, não seria aceito pelos "conservadores". Para ser aceito, ele precisa então "fingir" (dixit São Pio X: Pascendi), dizendo também coisas boas, o que adormece a vigilância dos conservadores. Para atrair os conservadores, ele enrola seu veneno em uma camada grossa de chocolate fino e oferece a eles um praliné muito tentador... fazendo-os confundir alhos com bugalhos.
A mesma tática já foi usada por Montini durante o conciliábulo. Quando os bispos conservadores protestavam contra uma passagem herética, Montini fazia adicionar uma passagem ortodoxa que dizia exatamente o oposto. Tranquilizados, os conservadores votaram em Dignitatis humanae. O chocolate fez com que engolissem o veneno. E uma vez que a declaração foi votada, o sucessor de Montini, Karol Wojtyla, deixando de lado as "boas passagens", destacaria as "más passagens", citando repetidamente e principalmente o detestável parágrafo 2, que defende a liberdade religiosa!
B. Wojtyla aprovou ex cathedra heresias?
Certos pensadores, obrigados a admitir a evidência de que Wojtyla professa heresias, ainda assim tentam salvá-lo, alegando que ele seria papa apesar de suas heresias. Eis o raciocínio deles: ele teria "apenas" (apenas! Como se fosse uma trivialidade...) desviado como um simples particular, mas não como um doutor ensinando ex cathedra.
Esse raciocínio é baseado em uma análise incorreta da situação. Pois Wojtyla utilizou (pelo menos uma vez) sua autoridade como doutor ex cathedra para impor heresias. Ele aprovou ex cathedra o Catecismo da Igreja Católica, que contém heresias em vários pontos. Este catecismo contém várias heresias: evolucionismo, abandono do Filioque, direito à insurreição, liberdade religiosa, deicídio. Tomemos, por exemplo, a apresentação do deicídio pelo Catecismo da Igreja Católica, para demonstrar a HERESIA FORMAL de quem o redigiu e de quem o aprovou.
Vamos primeiro resumir a doutrina cristã sobre o deicídio. Quem é responsável pela morte de Jesus? Ouçamos o ensinamento da Igreja Católica. "Eles afiaram as suas línguas como uma espada" [Salmo 63]. Que os judeus não digam: "Nós não matamos Cristo". É verdade que eles o entregaram ao juiz Pilatos, para parecerem, de alguma forma, inocentes de sua morte. Pois Pilatos, tendo-lhes dito: "Fazei-o morrer vós mesmos", eles responderam: "Não nos é permitido matar ninguém". Eles queriam rejeitar a injustiça de seu ato sobre a pessoa do juiz; mas poderiam eles enganar a Deus, que também é juiz? Pilatos foi participante de seu crime na medida do que ele fez; mas se comparado a eles, ele é encontrado muito menos culpado. Pois ele insistiu tanto quanto pôde para livrá-lo de suas mãos; e foi por isso que ele o mostrou a eles após a flagelação. Ele fez Jesus ser flagelado não com a intenção de perdê-lo, mas porque queria apaziguar a fúria deles, esperando que, ao ver o estado em que ele estava depois da flagelação, eles se suavizassem e desistissem de querer matá-lo. Então, isso é o que ele fez. Mas quando os judeus persistiram em sua perseguição, vocês sabem que ele lavou as mãos e declarou que não era o autor dessa morte, e que ele permanecia inocente. Mesmo assim, ele o fez morrer, mas se ele é culpado por tê-lo condenado, mesmo que relutantemente, eles são inocentes, aqueles que o obrigaram a obter essa condenação? De modo algum. Pilatos pronunciou a sentença contra Jesus, ordenou que fosse crucificado, e o imolou como se fosse ele mesmo; mas foram vocês, ó judeus, que realmente o mataram. Como vocês o mataram? Com a espada de suas línguas, pois afiaram suas línguas. E quando o feriram, senão quando gritaram: "Crucifica-o, crucifica-o"? (Matinas da Sexta-feira Santa, sexta lição, retirada do Tratado sobre os Salmos (Salmo 63) de Santo Agostinho).
Esta lição de Santo Agostinho, aprovada pela Santa Igreja, está em conformidade com a Revelação. Aqui estão alguns trechos das Sagradas Escrituras que confirmam isso.
Pilatos perguntou aos judeus: "Então, que farei de Jesus, que é chamado Cristo?". Todos eles responderam: "Crucifica-o!". O governador replicou: "Mas que mal ele fez?". E eles começaram a gritar ainda mais alto: "Crucifica-o!". Pilatos, vendo que não conseguia nada, mas que, se continuasse a tentar salvar Jesus, o tumulto aumentaria ainda mais, trouxe água, lavou as mãos diante de todo o povo, e disse: "Estou inocente do sangue deste justo; vede isso por vós mesmos". E TODO O POVO respondeu: "Que o seu sangue caia sobre nós e sobre nossos filhos" (Mateus 27:22-25).
Que os judeus tenham pedido a crucificação de Jesus não é apenas evidente no trecho de São Mateus citado acima, mas também nos relatos de São Marcos (15:11-14), São Lucas (23:18-23) e São João (19:6-15). No Evangelho segundo São João, encontramos não apenas os mesmos gritos ("Crucifica-o!"), mas também um diálogo muito instrutivo entre Jesus e Pilatos. Falando a Pilatos, Nosso Senhor ele próprio (!) define claramente o grau de responsabilidade dos judeus e de Pilatos: "Aquele que me entregou a ti cometeu pecado maior do que o teu, que me condenas por fraqueza" (João 19:11).
O primeiro papa, São Pedro, dirigiu-se assim ao povo judeu: "Homens de Israel [...] Jesus de Nazaré, varão aprovado por Deus entre vós com milagres, prodígios e sinais, que Deus por ele fez no meio de vós, como vós mesmos bem sabeis; a este, que vos foi entregue pelo determinado conselho e presciência de Deus, prendestes, crucificastes e matastes pelas mãos de injustos [...]. Deus o ressuscitou, soltando-o dos grilhões da morte" (Atos dos Apóstolos 2:22-23, 36).
Ao pregar em Antioquia da Pisídia, o apóstolo São Paulo exclamou na sinagoga: "Os moradores de Jerusalém e os seus príncipes [...] não tendo achado nenhuma causa de morte, pediram a Pilatos que ele fosse morto" (Atos dos Apóstolos 13:27-28). O mesmo apóstolo escreveu aos fiéis de Tessalônica: "Porque vós, irmãos, haveis sido feitos imitadores das igrejas de Deus que na Judéia estão em Jesus Cristo; porquanto também padecestes de vossos próprios concidadãos o mesmo que os judeus lhes fizeram a eles, os quais mataram também o Senhor Jesus e os seus próprios profetas, e nos têm perseguido, e não agradam a Deus, e são contrários a todos os homens; impedindo-nos de anunciar aos gentios a salvação, para encherem sempre a medida dos seus pecados; mas a ira de Deus caiu sobre eles até ao fim" (1 Tessalonicenses 2:14-16).
Agora, mostremos a contradição entre a doutrina cristã e o ensinamento da Igreja conciliar. Os conciliares negam que os judeus sejam responsáveis pelo deicídio (Nostra aetate, § 4). A lição litúrgica da Sexta-Feira Santa, que afirma expressamente que os judeus são os instigadores da crucificação de Jesus, foi suprimida. O Catecismo da Igreja Católica (nº 597) nega explicitamente que os judeus sejam responsáveis pelo deicídio: "Não se pode atribuir a responsabilidade global aos judeus de Jerusalém".
Vamos agora provar que os autores deste catecismo são hereges. Estes autores são hereges porque contestam a Sagrada Escritura. São hereges porque eles próprios indicam várias referências bíblicas, mas ensinam exatamente o oposto do que é claramente afirmado nesses textos bíblicos!
"Considerando a complexidade histórica do processo de Jesus manifestada nos relatos evangélicos, e seja qual for o pecado pessoal dos atores do processo (Judas, o Sinédrio, Pilatos), que só Deus conhece, não se pode atribuir a responsabilidade ao conjunto dos judeus de Jerusalém, apesar dos gritos de uma multidão manipulada e das críticas globais contidas nos apelos à conversão após o Pentecostes" (Catecismo da Igreja Católica, nº 597).
Esta frase do catecismo inclui, em nota de rodapé, 9 referências escriturísticas (Marcos 15:11; Atos dos Apóstolos 2:23, 36; 3:13-14; 5:30; 7:52; 10:39; 13:27-28; 1 Tessalonicenses 2:14-15). Os autores, apesar de se referirem a esses textos, contradizem-nos formalmente, negando a responsabilidade dos judeus "apesar" dos gritos da multidão judaica e "apesar" das críticas globais que os apóstolos dirigiram ao povo deicida após o Pentecostes. Os autores do catecismo reconhecem que sua teoria contradiz a Sagrada Escritura, já que eles próprios usam a palavra "apesar". O termo "apesar" e as 9 referências bíblicas provam que eles sabem que sua tese é contrária à Revelação. SUA HERESIA FORMAL é assim evidente. Pois se uma verdade é revelada, "manter uma opinião falsa sobre esses assuntos é, por si só, incorrer em heresia, especialmente se for feito com obstinação" (São Tomás de Aquino: Summa Theologiae, I, q. 32, a. 4). A obstinação dos autores do Catecismo da Igreja Católica é particularmente grave, pois eles se opõem ao discurso de São Pedro no dia de Pentecostes, e portanto, ao próprio Espírito Santo! O Espírito Santo disse pela boca de São Pedro: "Homens de Israel [...] vós o crucificastes".
Além disso, a Igreja definiu que os judeus são deicidas (matinas da Sexta-feira Santa, sexta lição). Os redatores do Catecismo da Igreja Católica (C.E.C.), de certa idade, celebraram por décadas na liturgia antiga; portanto, eles conhecem a sexta lição da Sexta-feira Santa, mas a contradizem obstinadamente. "Uma vez que a Igreja definiu que esta posição leva a uma consequência contrária à fé, o erro nesta matéria não está mais isento de heresia. [...] Aquele que, nesta questão, mantiver uma opinião falsa, percebendo que ela leva a uma consequência contrária à fé, cairá no pecado da heresia" (São Tomás de Aquino: Summa Theologiae, I, q. 32, a. 4).
Os redatores do C.E.C., assim como Wojtyla que o aprovou, são, portanto, hereges. Vamos agora provar que Wojtyla aprovou este catecismo pseudo-católico não apenas como "simples particular", mas como "doutor falando ex cathedra".
Wojtyla (constituição apostólica Fidei depositum, 11 de outubro de 1992) impôs ex cathedra à Igreja universal o Catecismo da Igreja Católica. "O Catecismo da Igreja Católica, que eu aprovo no último dia 25 de junho e hoje ordeno a publicação em virtude da autoridade apostólica, é uma exposição da fé da Igreja e da doutrina católica, confirmada ou iluminada pelas Sagradas Escrituras, pela Tradição apostólica e pelo magistério eclesiástico. Eu o reconheço como [...] uma norma segura para o ensino da fé. [...] A aprovação e a publicação do C.E.C. constituem um serviço que o sucessor de Pedro quer prestar à Santa Igreja Católica [...]: o de sustentar e confirmar a fé de todos os discípulos do Senhor Jesus (cf. Lucas 22). [...] Portanto, peço aos pastores da Igreja e aos fiéis que recebam este catecismo [...], que lhes é dado para servir como um texto de referência seguro e autêntico para o ensino da doutrina católica". Os termos utilizados implicam a infalibilidade: como "sucessor de Pedro", em virtude de sua "autoridade apostólica", Wojtyla "pede" a "todos" os fiéis que recebam este catecismo como uma "norma segura" da fé católica.
Wojtyla aprovou ex cathedra um catecismo herético. Portanto, como poderia ele ser o Vigário de Cristo?
Wojtyla nega vários artigos do Credo. Abaixo estão alguns exemplos de textos heréticos. Esta é uma lista não exaustiva de erros na fé cometidos por Wojtyla. Eles serão apresentados metodicamente, seguindo a ordem adotada pelo Credo de Niceia-Constantinopla.
[1] A diferença entre "herege formal" e "herege material" é explicada no Apêndice C.
C. "Eu creio em Deus, Pai Todo-Poderoso" [ERROS SOBRE O PODER POLÍTICO]
É bem conhecido que "toda autoridade vem de Deus" (São Paulo) e que, por reconhecimento e dever, os líderes governamentais devem exercer sua autoridade de acordo com a vontade de Deus, fazendo cumprir a moral cristã e proibindo as falsas religiões.
Wojtyla ensina três erros sobre o poder político:
1. Ele deturpa a noção de "bem comum";
2. Ele contesta São Paulo sobre a obediência devida ao governo;
3. Ele promove a liberdade religiosa, que é uma heresia.
1. O QUE É O "BEM COMUM"? O "bem comum" significa que a sociedade está orientada para promover o bem-estar material, é claro. Mas o "bem comum" requer, em primeiro lugar e acima de tudo, que as condições sejam ótimas para ajudar os cidadãos a alcançar sua salvação eterna. "O governo deve, de fato, esforçar-se para promover a salvação daqueles a quem ele governa" (Santo Tomás de Aquino: De regimine principum ad regem Cypri, cap. 2). Em outras palavras, o Estado deve ser cristão.
O objetivo do poder político é o seguinte: o governo deve permitir que os cidadãos vivam de acordo com as leis de Deus. "A absurdez da opinião de que é necessário separar as coisas do Estado e as da Igreja se entende sem dificuldade. A própria natureza clama por isso, é necessário que a sociedade dê aos cidadãos os meios e facilidades para passar suas vidas com honestidade, isto é, de acordo com as leis de Deus" (Leão XIII: encíclica Libertas, 20 de junho de 1888). Hino a Cristo Rei: "Que os chefes das nações o honrem com um culto público, que os magistrados e juízes o venerem, que as leis e as artes expressem sua realeza" (Hino das segundas vésperas da festa de Cristo Rei).
Este hino foi suprimido sob Montini. A separação entre a Igreja e o Estado ocorreu por iniciativa de Montini (Colômbia 1973, Portugal 1975, Espanha 1976) e de Wojtyla (Peru 1980, Itália 1984). É importante notar a diferença em relação às separações anteriores: por exemplo, na França, quando o governo maçônico da Terceira República impôs unilateralmente a separação entre a Igreja e o Estado, o Papa São Pio X protestou solenemente e a declarou nula perpetuamente. No entanto, as separações das décadas de 1970 e 1980 ocorreram por iniciativa da hierarquia vaticana, que teve que superar as resistências dos governos! Em uma conferência realizada em Barcelona em 29 de dezembro de 1975, Monsenhor Lefebvre revelou que havia aprendido, do próprio secretário da Conferência Episcopal Colombiana, que o Vaticano havia pressionado a presidência da república durante dois anos para obter a separação entre Igreja e Estado na Colômbia!
A noção de "bem comum" foi redefinida pela seita conciliar: "Em nome do bem comum, as autoridades públicas são obrigadas a respeitar os direitos fundamentais e inalienáveis da pessoa humana. [...] O bem comum reside no exercício das liberdades naturais [...] incluindo o direito à liberdade justa, inclusive em assuntos religiosos" (Catecismo da Igreja Católica, nº 1907). Este catecismo enumera ainda como componentes do bem comum: alimentação, vestuário, saúde, trabalho, paz - mas não faz NENHUMA menção às leis cristãs, cuja observância conduz à felicidade eterna!
Se o Estado coloca todas as religiões em pé de igualdade, é "a apostasia legal" da sociedade! Este é o veredicto do Papa Leão XIII, que ensina: um Estado que adota a liberdade religiosa adota "uma posição condenada não apenas pela fé, mas pela razão e pelo sentimento comum dos antigos pagãos eles mesmos": é "a APOSTASIA legal" da sociedade (Leão XIII: carta Egiunto, 19 de julho de 1889).
2. A OBEDIÊNCIA DEVIDA AO GOVERNO: A revolta contra o poder é permitida? Não, absolutamente. É proibido rebelar-se contra os chefes, pois todo poder vem de Deus, e não do povo. "Temei a Deus, honrai o rei!" (1 Pedro 2, 17). "Todo homem esteja sujeito às autoridades superiores; porque não há autoridade que não venha de Deus; e as autoridades que existem foram instituídas por Deus. Portanto, aquele que se opõe à autoridade resiste à ordenança de Deus; e os que resistem trarão sobre si mesmos condenação" (Romanos 13, 1-2).
Um cristão pode "resistir à opressão" de um governo verdadeiramente tirânico? "Se, no entanto, os príncipes ultrapassarem temerariamente no exercício de seu poder, a doutrina católica não permite se insurgir contra eles por si mesmos, para que a tranquilidade da ordem não seja cada vez mais perturbada e a sociedade não sofra maior dano. E quando o excesso chega ao ponto em que não parece haver mais esperança de salvação, a paciência cristã ensina a procurar o remédio no mérito e nas orações fervorosas a Deus" (Leão XIII: encíclica Quod apostolici, 28 de dezembro de 1878).
As palavras do grande Papa Leão XIII se confirmaram pelos eventos. Pois a oração é um meio mais eficaz do que a revolta: as revoltas húngara, tcheca, polonesa e da Alemanha Oriental foram esmagadas pelos tanques soviéticos, enquanto os austríacos, através da recitação do terço, conseguiram fazer as tropas soviéticas de ocupação se retirarem. Da mesma forma, no Brasil, um ditador comunista fugiu após a população recitar o terço.
Primeira heresia de Wojtyla: o poder não vem de Deus, mas do povo (muitos discursos de Wojtyla em favor da democracia moderna surgida em 1789).
Segunda heresia de Wojtyla: a revolta armada contra o governo é autorizada. "A resistência à opressão do poder político não recorrerá legitimamente às armas, exceto se estiverem reunidas as seguintes condições: 1. em caso de violações certas, graves e prolongadas dos direitos fundamentais; 2. depois de terem sido esgotados todos os outros recursos; 3. sem provocar desordens piores; 4. houver uma esperança fundamentada de sucesso; 5. se for impossível prever razoavelmente soluções melhores" (Catecismo da Igreja Católica, nº 2243). Nota bene: Wojtyla autoriza a revolta não quando a religião cristã é atacada, mas quando os princípios ímpios de 1789 não são aplicados!
3. A LIBERDADE RELIGIOSA, MARCO PARA O ESTABELECIMENTO DA RELIGIÃO UNIVERSAL: A liberdade religiosa corresponde ao solve (= dissolver, destruir o antigo) dos maçons. A construção de uma federação universal de todas as religiões corresponde ao coagula (= coagular, construir sobre novas bases) maçônico. Montini iniciou a primeira fase; Wojtyla inaugura a segunda: solve et coagula!
Wojtyla incessantemente propaga a liberdade religiosa usque ad nauseam. E ele vai ainda mais longe, pois considera que as preces dos adeptos de outras religiões, dirigidas aos seus ídolos ou manitus, são mais eficazes do que uma Ave Maria. Durante o encontro de Assis (26 de outubro de 1986), de fato, nenhuma Ave Maria foi recitada. Em contrapartida, uma estátua de Buda foi colocada sobre o altar católico e incensada!
Durante a abertura da porta selada na cerimônia de inauguração da suposta "ano santo" (pseudo-jubileu do ano 2000), uma cerimônia surpreendente foi vista. Wojtyla estava vestido com um manto de todas as cores, predominando o azul, uma cor não litúrgica. Cantores protestantes, judeus e muçulmanos entoavam seus cânticos, enquanto mulheres asiáticas não cristãs adornavam a porta sagrada com flores e a esfregavam com aromas (quem sabe a qual rito pagão isso correspondia!). Incensos foram queimados enquanto um instrumento de cordas japonês tocava uma melodia oriental.
Em outubro de 1988, em Estrasburgo, Wojtyla disse, conversando com jovens: "Agora que estou prestes a me tornar o representante da religião universal..." Esta religião universal não terá dogmas, como profetizou Victor Hugo: "O século XX será o da extinção dos dogmas". O único dogma que restará será o culto ao homem. O dogma do Homem-Deus (= NSJC) será agora aplicado a cada homem, que se tornará assim, ele próprio e acima de tudo, "homem-deus". Cada religião, "unida na diversidade" com as outras religiões, contribuirá com sua liturgia e cerimônias peculiares para um toque folclórico na religião universal. O futuro não é difícil de prever: será a federação de todas as religiões do globo, sob a orientação benevolente do Anticristo.
D. Eu creio em Deus, "Criador de todas as coisas" [EVOLUCIONISMO]
Deus criou os animais "segundo a sua espécie" (Gênesis 1,24). Portanto, a evolução das espécies é contrária à Revelação (além disso, é cientificamente falsa).
Deus criou não um meio macaco, nem um pitecantropo, mas um homo sapiens: "Homem e mulher Ele os criou" (Gênesis 1,27). A teoria de que o homem descende do macaco é insustentável: até hoje, nenhum arqueólogo encontrou o famoso "elo perdido" entre o macaco e o homem. O Dr. Dubois, em seu leito de morte, confessou que o pitecantropo (que ele supostamente descobriu em 1891) era na verdade um falso criado a partir do crânio de um macaco, para criar a ilusão de um elo perdido. O "homem de Piltdown" é obra de um falsificador, como reconhecido pelo Museu Britânico. O "homem de Pequim" é uma impostura do pseudo-arqueólogo e pseudo-teólogo Teilhard de Chardin (mentor de Montini). Haeckel, para justificar sua teoria da "recapitulação" (o embrião humano passaria por todos os estágios animais conforme cresce no ventre materno), fez desenhos fantasiosos. O pseudo-paleontólogo indiano Gupta foi pego em flagrante: os fósseis que supostamente descobriu na Índia na verdade comprou na Europa! Quando os pseudo-geólogos datam minerais, automaticamente eliminam resultados que não se encaixam em sua teoria preconcebida; as datas que aproximadamente coincidem com o evolucionismo são anotadas em seus relatórios; aquelas que se encaixam são destacadas no corpo do texto. E assim por diante. Qual é o objetivo deles? "Liberar a ciência de Moisés" (free science from Moses), como declarado abertamente por um evolucionista, ou seja, minar a credibilidade do Gênesis, escrito por Moisés sob a inspiração de Deus. A Bíblia, no entanto, não contém erros históricos ou científicos, conforme declarado pelo Papa Leão XIII (encíclica Providentissimus Deus, 18 de novembro de 1893).
O evolucionismo não é apenas uma heresia, mas também uma ineptidão e até mesmo uma fraude do ponto de vista científico. No entanto, é exaltado no Catecismo da Igreja Católica, no número 283: "A questão das origens do mundo e do homem tem sido objeto de numerosas pesquisas científicas que enriqueceram grandemente nosso conhecimento sobre a idade e as dimensões do cosmos, o desenvolvimento das formas vivas, o surgimento do homem. Essas descobertas nos convidam a admirar ainda mais a grandeza do Criador, a Lhe render graças por todas as suas obras e pela inteligência e sabedoria que Ele concede aos cientistas e pesquisadores. Com Salomão, estes podem dizer: 'Foi Ele quem me deu o conhecimento verdadeiro [...]' (Sabedoria 7, 17-21)".
Vamos reconsiderar as (supostas) contribuições desses mesmos cientistas, enaltecidas pelos redatores do Catecismo:
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"a idade do cosmos": 6.000 anos segundo a cronologia bíblica, doutrina arruinada pelas especulações dos cientistas que falam de bilhões de anos sem qualquer prova;
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"as dimensões do cosmos": Deus criou o mundo do nada e o ordenou em seis dias, doutrina arruinada pela teoria do Big Bang;
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"o desenvolvimento das formas vivas": segundo a Bíblia, Deus criou os animais cada um segundo sua espécie, doutrina arruinada pelo evolucionismo darwinista;
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"o surgimento do homem": Adão e Eva foram criados por Deus, doutrina arruinada pela invenção da fábula do macaco, nosso ancestral.
E todos esses agnósticos ou ateus fraudulentos recebem o selo da suprema qualidade: Deus lhes teria "dado o conhecimento verdadeiro"! É o cúmulo!
Na manhã do lançamento deste famoso catecismo anti-católico (1992), um de seus redatores, Honoré (pseudo-arcebispo de Tours), fez uma declaração no rádio "France Inter". Uma jornalista lhe fez a seguinte pergunta: "Se entendi corretamente, a Igreja adotou a teoria da evolução?". E Honoré exclamou: "Mas é claro!"
Quatro anos após o lançamento do Catecismo da Igreja Católica, Wojtyla fez a apologia do evolucionismo. A teoria da evolução, disse ele, é "mais do que uma hipótese". A "convergência" dos trabalhos científicos "constitui por si só um argumento significativo a favor desta teoria" (mensagem à Academia Pontifícia de Ciências, 22 de outubro de 1996). Essa mudança de posição da Igreja, esse abandono do criacionismo, causou grande alvoroço na imprensa da época. Uma vitória total para os ateus! Um golpe de mestre ainda mais pernicioso porque, precisamente nesse momento, cientistas criacionistas haviam começado a minar seriamente o edifício oficial dos evolucionistas. Não havia de fato uma "convergência" das teorias evolucionistas, mas sim uma "convergência" das evidências criacionistas. Que sorte Wojtyla ter vindo em socorro dos evolucionistas, cujas especulações haviam se tornado indefensáveis do ponto de vista estritamente científico!
E. Eu creio "em um só Senhor, Jesus Cristo" [O CRISTO-REI DESTRONADO PELO HOMEM-REI]
Jesus disse a Pilatos: "Eu sou rei". O Papa São Gregório Magno ensina: "Os magos reconhecem em Jesus a tripla qualidade de Deus, homem e rei. Eles oferecem ao rei o ouro, ao Deus o incenso, ao homem a mirra. Porém, há alguns hereges que creem que Jesus é Deus, creem também que Jesus é homem, mas absolutamente se recusam a crer que seu reinado se estenda por toda parte".
"Sunt vero nonnulli haeretici" - Wojtyla certamente faz parte desses "poucos hereges" denunciados por São Gregório. Pois ele destronou o Cristo-Rei em favor do homem-rei. Cristo não seria rei: "Não é a soberania sobre o homem, é a soberania para o homem" (Wojtyla: mensagem de Natal de 1980). Em sua homilia do Domingo de Ramos do mesmo ano, ele já havia proferido este blasfêmia: "Jesus de Nazaré aceita nossa liturgia como aceitou espontaneamente o comportamento da multidão de Jerusalém, porque ele quer que desta maneira se manifeste a verdade messiânica sobre o reino, que não significa domínio sobre os povos, mas que revela a realeza do homem".
"Diz-se, e é a pedra angular maçônica, que o grande segredo de alguma forma é a eminente realeza do homem. É a afirmação da primazia do homem diante da Revelação [...]. O homem, diz a maçonaria, é um Deus possível. Organizemo-lo socialmente, internacionalmente, universalmente, e ele poderá brincar com o Deus da lenda e do pesadelo que o persegue. É a libertação do homem em relação ao divino. [...]. Pretender possuir a verdade, formulá-la em dogmas imperativos, impondo-a à fé, corresponde a um regime que já passou da hora" (in: Léon de Poncins: A Maçonaria Segundo Seus Documentos Secretos, quarta edição, Chiré-en-Montreuil, 1972, p. 14).
Pilatos disse, mostrando Jesus à multidão: "Eis o homem". Wojtyla aplica isso de forma blasfema a qualquer homem na rua: "Quero dizer em voz alta aqui, em Paris, na sede da UNESCO, com respeito e admiração: 'Eis o homem'. A educação consiste em fazer o homem tornar-se cada vez mais homem" (Documentation catholique, 15 de junho de 1980).
Que o homem se torne cada vez mais cristão e virtuoso é o objetivo da educação católica. Que ele se torne cada vez mais homem é um objetivo digno dos maçons anticlericais!
F. Eu creio no "Filho único de Deus" [JESUS NÃO É O MESSIAS]
Em 24 de junho de 1985, a Comissão Pontifícia para as Relações com o Judaísmo publicou Notas para uma apresentação correta dos judeus e do judaísmo na pregação e na catequese da Igreja Católica (in: Documentação Católica de 21 de julho de 1985, p. 733 - 738). Ela observou que "o povo de Deus" (judeus + cristãos!) estava dividido sobre o messias: para alguns, era necessário aguardar o "retorno" do messias que já veio uma vez (ponto de vista cristão); para outros, era necessário aguardar a "vinda" do messias que ainda não veio de forma alguma (ponto de vista judaico). Entre essas duas opções, a comissão escolheu a dos judeus! Portanto, a comissão considera que Jesus não é o messias. Isso parece incrível, mas está escrito em todas as letras. "O povo de Deus da Antiga e da Nova Aliança tende para objetivos análogos: a vinda ou o retorno do Messias - mesmo que seja a partir de dois pontos de vista diferentes. [...]. Judeus e cristãos [... devem] preparar o mundo para a vinda do messias trabalhando juntos". E essas Notas... foram calorosamente aprovadas por Wojtyla em 28 de outubro de 1985!
G. Eu creio que o Filho é "consubstancial ao Pai" ["DA MESMA NATUREZA" SEGUNDO ÁRIO E A IGREJA CONCILIAR]
Segundo o credo do Concílio de Niceia (325), o Filho é "consubstancial" (da mesma substância) que o Pai. Os arianos negaram esse dogma e tentaram substituí-lo por "da mesma natureza" que o Pai. Em 359, o Papa São Libério excomungou todos aqueles que recusaram o termo "consubstancial": "Os termos 'hipóstase' e 'consubstancial' são como uma fortaleza inexpugnável, que sempre desafiará os esforços dos arianos" (in: Constant, t. J, p. 401 - 403).
Acreditava-se que o arianismo estava morto e enterrado. Mas não! Ário está de volta! Os missais em língua francesa da nova missa "traduzem" o termo "consubstancialem" por... "da mesma natureza"! E há muitas outras "traduções" questionáveis. "É importante também notar que os erros de tradução do latim da nova missa são os mesmos em todas as línguas vernáculas, exceto o polonês. [...]. Não há dúvida de que os erros de tradução tiveram a clara aprovação de Paulo VI. O arcebispo Hannibal Bugnini nos informa em suas memórias que Paulo VI reservou para si a aprovação das traduções" (Rama P. Coomaraswamy: Os problemas da nova missa, Lausanne 1995, p. 115). As reclamações feitas contra esses erros de tradução sempre foram deliberadamente ignoradas por Montini e Wojtyla.
H. Eu creio que "Ele se encarnou da Virgem Maria" [ATAQUE CONTRA O DOGMA DA IMACULADA CONCEIÇÃO]
Segundo a doutrina católica, é a bem-aventurada Virgem Maria quem esmaga a cabeça da serpente. "Ela te comanda, a altíssima Mãe de Deus, a Virgem Maria, que, desde o primeiro instante de sua Imaculada Concepção, esmagou, pela sua humildade, a tua cabeça cheia de orgulho" (Leão XIII: _Exorcismo contra Satanás e os anjos apóstatas).
Wojtyla ensina uma heresia: "Já tivemos a oportunidade de lembrar anteriormente que esta versão 'Ela te esmagará a cabeça' não corresponde ao texto hebraico, no qual não é a mulher, mas sim sua descendência, seu descendente, que deve esmagar a cabeça da serpente. Este texto atribui, portanto, não a Maria, mas a seu Filho, a vitória sobre Satanás" (Wojtyla, in: Osservatore Romano, 30 de maio de 1996).
O Concílio de Trento decretou que a tradução latina feita por São Jerônimo (chamada "Vulgata") é a versão "autêntica", oficial da Bíblia. De acordo com a Vulgata e também segundo os exegetas católicos, é realmente a mulher que esmaga a cabeça da serpente. Assim entendeu a Tradição católica, e assim foi DEFINIDO EX CATHEDRA pelo Papa Pio IX, ao proclamar O DOGMA DA IMACULADA CONCEIÇÃO!!! "Deus predisse e anunciou que colocaria inimizade entre ti e a mulher", e, sem dúvida alguma, ela esmagou a cabeça venenosa dessa mesma serpente; e por esta razão, eles [os Padres da Igreja] afirmaram que a mesma Virgem bem-aventurada foi, pela graça, isenta de toda mancha de pecado [...] A Virgem bem-aventurada, toda bela e toda imaculada, esmagou a cabeça da cruel serpente e trouxe salvação ao mundo" (Pio IX: constituição Ineffabilis Deus, 8 de dezembro de 1854).
E Pio IX acrescentou o seguinte: "Se alguém tiver a presunção [...] de pensar contra a nossa definição [da Imaculada Conceição], que aprenda e saiba que, CONDENADO PELO SEU PRÓPRIO JULGAMENTO, ele sofreria naufrágio na fé e CESARIA DE ESTAR NA UNIDADE DA IGREJA; e que, além disso, ele incorreria, POR ISSO MESMO, nas penas do direito, se ousasse expressar em voz alta ou por escrito ou de qualquer outra maneira externa que fosse o que ele pensa".
I. Eu creio que "Ele desceu aos infernos" [HERESIA DE ABELARDO E DE CALVINO]
Segundo a doutrina cristã bimilenar, Jesus morreu, desceu aos infernos (= aos limbos, mas não ao inferno), ressuscitou e depois subiu ao céu.
Segundo o herege Abelardo, combatido por São Bernardo, Nosso Senhor desceu aos infernos não com sua alma, mas "apenas em poder". Wojtyla retomou a heresia abelardiana em seu discurso na audiência geral de 11 de janeiro de 1989.
O herege genebrino Calvino também afirmava que a descida aos infernos seria uma descida imaginária (Calvino: Instituição da Religião Cristã, 1536, livro II, cap. XVI, § 10-12).
J. Eu creio que "Ele subiu aos céus" [FICÇÃO METAFÓRICA]
Segundo Wojtyla, a ascensão de Jesus é uma "representação metafórica". Isso significa que a ascensão é apenas uma imagem, uma ficção poética. De acordo com Wojtyla, o relato da ascensão é "uma frase 'condensada' em poucos dias pelos textos que tentam apresentá-la de forma acessível para aqueles acostumados a raciocinar e falar por meio de metáforas temporais e espaciais".
K. Eu acredito que Ele 'voltará para julgar os vivos e os mortos' [HERESIA DE ZANINUS DE SOLCIA AMPLIFICADA POR WOJTYLA]
Proposição condenada: 'Todos os cristãos serão salvos' (Erro de Zaninus de Solcia condenado pelo papa Pio II: carta Cum sicut, 14 de novembro de 1459).
A Igreja conciliar vai além de Zaninus de Solcia: não apenas todos os cristãos, mas até mesmo todos os homens sem exceção são salvos. 'Pela sua encarnação, o Filho de Deus de certo modo se uniu a todo homem' (declaração conciliar Gaudium et Spes, § 22, citada no Catecismo da Igreja Católica, nº 521). Jesus Cristo 'se uniu para sempre a cada um' (Wojtyla, 22 de dezembro de 1979). Portanto, ou Jesus queima em união com os condenados, ou todos os homens são salvos. Qualquer que seja a opção escolhida, é herética."
L. Eu creio no Espírito Santo" [TRÊS PECADOS WOJTYLIANOS CONTRA O ESPÍRITO SANTO]
O herege Wojtyla:
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Abandona o Filioque,
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Atribui ao Espírito Santo a obstinação no paganismo e
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Arruína a teologia dos sacramentos.
1. ABANDONO DO FILIOQUE: Primeiramente, o dogma católico. O Espírito Santo procede do Pai e do Filho (em latim: Filioque). Os gregos cismáticos (inadequadamente chamados de "ortodoxos") negam este dogma. Fotius negou-o, assim como o bispo de Constantinopla, Miguel Cerulário, que desencadeou o cisma oriental em 1054. Os gregos retornaram à doutrina correta durante o Segundo Concílio de Lyon, mas logo caíram novamente no erro. Eles reconheceram novamente o Filioque no Concílio Ecumênico de Florença, depois que um cardeal latino citou uma sentença de São Epifânio, um dos Padres da Igreja gregos muito venerado pelos orientais. No entanto, após o concílio, os gregos voltaram à sua heresia. Em 1453, oito anos após o Concílio de Florença, a cidade de Constantinopla foi capturada pelos turcos. Os gregos haviam blasfemado contra o Espírito Santo ~ sua capital foi invadida no dia de Pentecostes, que é a festa do Espírito Santo!
Que os gregos tenham sido punidos por Deus por terem negado o Filioque não se deve apenas a essa extraordinária coincidência de datas, mas também a uma revelação privada do bem-aventurado Constante de Fabriano (falecido em 1481). Ele fazia fervorosas orações para que os muçulmanos não invadissem Constantinopla. No entanto, Deus revelou-lhe que permitiria a invasão turca para punir os gregos cismáticos, culpados por terem negado o Filioque.
Laxismo wojtyliano: ao invés de distinguir entre os "católicos" que reconhecem o Filioque e os "hereges" gregos que negam este dogma, Wojtyla transforma os cismáticos (e hereges) gregos em "cristãos orientais". Segundo ele, existiria uma "tradição oriental" e uma "tradição ocidental", que seriam complementares. "Esta legítima complementaridade, se não for rigidificada, não afeta a identidade da fé na realidade do mesmo mistério confessado" (Catecismo da Igreja Católica, nº 248).
Esta maneira de apresentar a fé é errônea:
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A verdadeira tradição oriental favorece o Filioque (São Gregório de Nissa, São Epifânio), enquanto os gregos cismáticos a traem. Os gregos até agem como falsificadores, pois suprimiram em escritos de São Gregório de Nissa e também nos atos do Sexto Concílio Ecumênico passagens onde o dogma do Filioque é ensinado!
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Não há "complementaridade", mas negação da fé solenemente definida no Concílio de Florença por gregos e latinos!
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Aquele que permanece firmemente ligado ao Filioque é hipocritamente acusado de "rigidez na complementaridade": não se poderia desacreditar melhor a sã intransigência sobre um artigo de fé católica e divina!
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É de fé que a adição do "Filioque" no credo foi uma medida razoável e útil.
Wojtyla afirma até mesmo que a Igreja romana precisaria das luzes dos hereges gregos: "Por serem complementares, as duas tradições são, até certo ponto, imperfeitas se consideradas isoladamente. É no encontro delas que podem se complementar mutuamente e apresentar uma interpretação menos inadequada do 'mistério oculto desde séculos e gerações, mas agora manifestado aos santos'" (Documentation catholique, 16 de fevereiro de 1986, p. 183).
Os gregos negam um artigo de fé. Wojtyla alinha-se a eles. "Alguns católicos, incluindo o papa, admitem que se possa recitar o credo sem o Filioque, como foi feito em São Pedro de Roma" (Michel Endokimov, La Croix, 15 de fevereiro de 1986).
2. A OBSTINAÇÃO NO PAGANISMO, FRUTO DO ESPÍRITO SANTO: Wojtyla retoma algumas antigas heresias. Mas ele também sabe ser criativo. De fato, devemos a ele uma invenção original. A obstinação no paganismo seria... o fruto do Espírito Santo!
"O Espírito Santo está até misteriosamente presente nas religiões e culturas não-cristãs" (discurso de 26 de março de 1982). Isso é evidentemente falso, pois contrário às Sagradas Escrituras: "Todos os deuses das nações pagãs são demônios" (Salmo XCV, 5). Mais uma vez, chegamos à mesma conclusão: Wojtyla é um herege. Pois aquele que sustenta o contrário do que foi claramente revelado na Bíblia é, ipso facto, um herege (São Tomás: Suma Teológica, I, q. 32, a. 4).
Qualquer pessoa que estude as religiões não-cristãs rapidamente percebe que são um tecido de absurdos e até de torpezas. Bem, a partir de agora, a adesão a tais erros deve ser atribuída ao Espírito Santo. Citando Wojtyla: "A firmeza na crença daqueles que professam religiões não-cristãs vem do Espírito da Verdade" (encíclica Redemptor hominis, 4 de março de 1979).
Existem traduções de Redemptor hominis que são inexatas: a firmeza dos pagãos seria "às vezes um efeito do Espírito da Verdade". A divergência entre os tradutores exige um exame do texto latino oficial da encíclica. Aqui está ele: "Nonne interdum firma persuasio non christianas religiones profitentium, quae et ipsa procedit a Spiritu veritatis, extra fines aspectabiles Corporis mystici operante - forsitan confundat christianos...". Uma tradução correta seria formulada assim: "Não acontece por vezes que a firme convicção daqueles que professam religiões não-cristãs - que também procede do Espírito da Verdade, operando além dos limites visíveis do Corpo místico - não envergonhe os cristãos...?".
É verdade que a frase está na forma interrogativa, mas ela contém no meio uma afirmação. O "quae et ipsa" se refere à "firma persuasio". A proposição afirmativa inserida no meio da frase interrogativa é esta: "firma persuasio non christianas religiones profitentium procedit a Spiritu veritatis, extra fines aspectabiles Corporis mystici operante". Isso significa afirmar que a obstinação no paganismo anticrostão procede do Espírito Santo.
3. RUÍNA DA TEOLOGIA SOBRE OS SACRAMENTOS: Em outra encíclica (Dominum et vivificantem, 18 de maio de 1986), Wojtyla afirma a suposta habitação do Espírito Santo "no coração de cada homem". O Espírito Santo "é dado aos homens. E da abundância deste Dom não criado, cada homem recebe em seu coração o dom criado particular pelo qual os homens se tornam participantes da natureza divina. Assim, a vida humana é penetrada pela vida divina." Com esta encíclica, Wojtyla arruína a teologia católica sobre os sacramentos, fonte da graça. Se todos têm o Espírito Santo, para que servem então o batismo ou a confissão? Sempre este novo dogma do "homem-deus".
[1] Os verdadeiros registros do Sétimo Concílio, mantidos pelos Latinos, mencionam "Credimus et in Spiritum sanctum Dominum, et vivificatorem, ex Patre Filioque procedentem"; enquanto nos exemplares mantidos pelos Gregos, lê-se apenas "ex Patre procedentem". No Concílio de Florença (onde se reuniram Gregos e Latinos), o cardeal Julianus observou esta omissão. Julianus obteve suas informações de Emmanuel Caleca, um tipo de "transfuga" grego convertido à Igreja Latina e Romana em 1396 (informação encontrada em Baronius: Annales Ecclesiastici, anno 680). Os Gregos, para negar o Filioque, removeram a preposição "ex" de um texto de São Gregório de Nissa (informação encontrada em Guérin: Les conciles généraux et particuliers, Bar-le-duc 1872, t. II, p. 557).
[2] "Portanto, em nome da Santa Trindade, do Pai, do Filho e do Espírito Santo, com a aprovação deste santo concílio universal de Florença, NÓS DEFINIMOS ESTA VERDADE DE FÉ para que seja crida e recebida por todos os cristãos, e que todos a professam: que o Espírito Santo procede eternamente do Pai e do Filho (ex Patre et Filio), e que ele possui sua essência e seu ser subsistente tanto do Pai quanto do Filho ao mesmo tempo, e que procede eternamente de ambos como de um único princípio e de uma única espiração" (Concílio de Florença: bula Laetentur caeli, 6 de julho de 1439).
[3] "NÓS DEFINIMOS AINDA MAIS: a explicação contida nestas palavras: 'Filioque' foi adicionada ao símbolo de maneira lícita e razoável para iluminar a verdade e por uma necessidade urgente naquela época" (Concílio de Florença: bula Laetentur caeli, 6 de julho de 1439).
M. Eu creio "na Igreja una, santa, católica e apostólica" [A RELIGIÃO À LA CARTE]
Wojtyla, com o objetivo de federar todas as religiões do globo, revaloriza as religiões não-católicas:
- LUTERANISMO: Primeiramente, recordemos alguns dados históricos. Os luteranos são considerados hereges e foram alvo de vários anátemas pelo Concílio de Trento. Para justificar suas especulações, Lutero falsificou a Bíblia. Ele acrescentou uma palavra a uma frase de São Paulo ("a fé salva" tornou-se "a fé somente salva") e suprimiu a epístola de São Tiago por causa da frase "a fé sem obras é morta". Lutero fez Comentários de Mesa (Tischgespräche) desagradáveis sobre a sexualidade de Nosso Senhor; "casou-se" com uma freira, frequentemente se embriagava e acabou se enforcando após uma orgia. Ele admitiu em seus escritos que sua doutrina sobre a Missa era do diabo.
Lutero exclamava: "Quando a Missa for abolida, eu penso que teremos derrubado o papado! [...] Tudo desmoronará quando sua Missa sacrílega e abominável desabar". Alguns séculos depois, seu desejo foi realizado: seis pastores protestantes deram instruções à comissão litúrgica de Montini, que criou uma "nova Missa" luterano-conciliar.
Pequeno detalhe significativo: a Missa católica invoca a Deus nove vezes (Kyrie eleison. Kyrie eleison. Kyrie eleison. Christe eleison, etc.). Isso imita os nove coros dos anjos, como explica Dom Guéranger. O Novus Ordo Missae de Montini contém apenas três invocações (Kyrie eleison. Christe eleison. Kyrie eleison). Isso imita a Deutsche Messe ("Missa alemã") codificada por Lutero, que reduziu para três o número de invocações.
"Venho a vocês, ao legado espiritual de Martinho Lutero, venho como peregrino" (encontro de Wojtyla com o Conselho da Igreja Evangélica, em 17 de novembro de 1980). "Este diálogo encontra seu sólido fundamento, segundo os textos evangélicos luteranos, naquilo que nos une mesmo após a separação: ou seja, a palavra das Escrituras, as confissões de fé, os concílios da Igreja antiga" (Mensagem de Wojtyla a Willebrands por ocasião do 500º aniversário do nascimento de Lutero; Documentation catholique, 4 de dezembro de 1983, p. 1071). Wojtyla, portanto, tem a mesma "confissão de fé" que os luteranos, que são considerados hereges.
A "Confissão de Augsburgo" (Confessio Augustana) é a profissão de fé fundamental da seita luterana. Foi redigida por Melanchton (amigo de Lutero) em latim e alemão, e apresentada ao imperador Carlos V durante a Dieta de Augsburgo em 1530. Em 31 de outubro de 1999, aniversário da "Confissão de Augsburgo", luteranos e conciliares assinaram uma "Declaração Comum sobre a Justificação", além de um "Apêndice". Aqueles que assinam ou elogiam a declaração comum são anátemas pelo Concílio de Trento. No entanto, a sala de imprensa do Vaticano (www.vatican.va) anunciou: "LOUVOR DA DECLARAÇÃO COMUM SOBRE A JUSTIFICAÇÃO" e reproduziu um discurso que culminava com esta frase: "Um documento como este constitui uma base sólida para a continuidade da pesquisa teológica ecumênica" (Wojtyla: discurso durante o Angelus, 31 de outubro de 1999).
Um trecho do apêndice desta declaração comum passou praticamente despercebido. No entanto, é surpreendente ao extremo! Aqui está ele: "A Igreja Católica e a Federação Luterana Mundial iniciaram o diálogo e o continuaram como parceiros com direitos iguais (‘par cum pari’) . Apesar das diferentes concepções de autoridade na Igreja, cada parceiro respeita o processo seguido pelo outro para tomar decisões doutrinárias" (Apêndice à declaração, nº 4, in: Documentation catholique, 1999, p. 722).
O dogma da infalibilidade é assim negado indiretamente: se "respeitar o processo seguido pelo outro para tomar decisões doutrinais" significa endossar a insurgência de Lutero contra Leão X, absolver a revolta dos protestantes contra a infalibilidade do papado e da Igreja Católica, definida solenemente no Vaticano I! E se considerarmos que a Igreja Católica e a seita luterana dialogam como "par cum pari", estamos destruindo completamente a constituição divina da Igreja, pois essa expressão latina deve ser traduzida como "de igual para igual". Mas, segundo o Papa Pio VII, "colocar a Igreja - a santa e imaculada esposa de Cristo, fora da qual não há salvação - em pé de igualdade com as seitas dos hereges" é uma "heresia desastrosa e eternamente deplorável" (Pio VII: carta apostólica Post tam diuturnas, 29 de abril de 1814)!
Poderíamos traduzir de outra forma a expressão "par cum pari". Mas o resultado seria igualmente prejudicial para a Igreja. Encontramos em Cícero (Cato Major, de senectute, 7) a seguinte frase: "pares cum paribus congregantur", que significa "os semelhantes se reúnem".
Conclusão: os protestantes são hereges. Os conciliares que se reúnem com eles provam por si mesmos que também são hereges. Como disse o grande filósofo grego Platão: "o semelhante se reúne ao semelhante".
2. ISLAM: "Ele é Deus único, Deus implorado. Ele não gerou nem foi gerado" (surata muçulmana, pronunciada em 26 de outubro de 1986 em Assis). "Aquele que crê na Trindade é impuro da mesma forma que o excremento e a urina" (artigo 2 da lei muçulmana).
Wojtyla estaria se convertendo ao islamismo? Um trecho de um de seus discursos sugere isso. "Os muçulmanos são nossos irmãos na fé em Deus único" (discurso aos muçulmanos, Paris, 31 de maio de 1980). Em maio de 1985, Wojtyla, ao se dirigir aos muçulmanos da Bélgica, mencionou "nossos respectivos livros sagrados"! Em 14 de maio de 1999, ele abraçou o Corão! Em 21 de março de 2000, ele rezou desta maneira: "Que São João Batista proteja o Islã" (Osservatore Romano, edição francesa de 28 de março de 2000)!
3. ANIMISMO: "Fugi da idolatria. O que os pagãos sacrificam é oferecido aos demônios, e não a Deus. E eu não quero que vocês tenham comunhão com os demônios. Vocês não podem beber da taça do Senhor e da taça dos demônios ao mesmo tempo. Não queremos provocar o ciúme do Senhor? Será que somos mais fortes do que ele?" (1 Coríntios 10:14-22).
IDOLATRIA WOJTYLIANA: Segundo o Osservatore Romano (edição italiana, agosto de 1985, em um artigo intitulado "Uma oração na floresta sagrada"), Wojtyla participou do culto a falsas divindades na "floresta sagrada" do lago Togo. Um feiticeiro evocou espíritos infernais: "Poder da água, eu te invoco; ancestrais, eu os invoco...". Em seguida, foi apresentado a Wojtyla um recipiente cheio de água e farinha; ele se curvou e espalhou a mistura em todas as direções. Este rito pagão significa que aquele que recebe a água, símbolo da prosperidade, a compartilha com os ancestrais ao espalhá-la sobre a terra. Wojtyla sabia perfeitamente que se tratava de um ritual religioso: "Particularmente característica foi a reunião de oração no santuário do lago Togo, onde rezei, pela primeira vez, com os animistas" (La Croix, 23 de agosto de 1985).
Nas Ilhas Fiji, ele consumiu o kava (uma bebida mágica preparada por feiticeiros, contendo uma droga).
4. BUDISMO E HINDUÍSMO: Na Índia, em 2 de fevereiro de 1986, uma sacerdotisa de Shiva marcou Wojtyla na testa com o sinal do tilac (fotografado em La Croix). Em 5 de fevereiro, em Madras (Sul da Índia), trouxeram-lhe uma cana-de-açúcar trançada em forma de lingam (falo), uma oferenda hindu ao deus carnal. Um homem aplicou-lhe vibhuti (cinzas "sagradas", feitas de esterco de vaca).
"A colaboração entre todas as religiões é necessária para a causa da humanidade [...] Hoje, como hindus, sikhs, budistas, jainistas, parsis e cristãos, estamos reunidos para proclamar a verdade sobre o homem [...] Discriminações baseadas em raça, cor, crença, sexo ou origem étnica são radicalmente incompatíveis com a dignidade humana" (Wojtyla, em: La Croix, 4 de fevereiro de 1986). O Dictionnaire pratique Quillet (1963) define o termo "discriminação" como "Faculdade de distinguir, discernir. A discriminação entre o bem e o mal". Wojtyla não distingue mais entre verdadeiro e falso; segundo ele, todas as religiões proclamam "a verdade sobre o homem". Mas então, se os hindus, etc., já proclamavam a verdade muito antes da Encarnação, para que serviu fundar o cristianismo?
Wojtyla, descalço em peregrinação ao túmulo de Gandhi, compartilha seu entusiasmo com a multidão: "Que estas palavras [as bem-aventuranças] e outras expressões dos livros sagrados das outras grandes tradições religiosas presentes no solo fértil da Índia sejam uma fonte de inspiração para todos os povos [...] Mahatma Gandhi nos ensinou que se todos os homens e mulheres, independentemente de suas diferenças, se apegarem à verdade, com respeito e dignidade únicos de todo ser humano, uma nova ordem mundial, uma civilização do amor, pode ser alcançada" (Documentation catholique, 1986, p. 284-285). Assim, os católicos deveriam agora meditar nos textos do paganismo da Índia ("livros sagrados!"), a fim de ter sucesso onde dois mil anos de cristianismo falharam. Gandhi era maçom. Além disso, ele foi iniciado na teosofia. Sua doutrina "não violenta" foi um fracasso, pois ele foi assassinado e a Índia descolonizada imediatamente mergulhou em guerra civil. Segundo Wojtyla, o ensinamento de Mahatma seria mais eficaz do que o de Nosso Senhor Jesus Cristo, chamado de "Príncipe da Paz", e mais eficaz do que sua santa Mãe, invocada como "Rainha da Paz".
«Aquele que vos fala hoje está convencido de que o homem é o caminho que a Igreja Católica deve seguir para ser fiel a si mesma. [...] Não é isso que Mahatma Gandhi expressou: 'O que eu quero alcançar, pelo que tenho me esforçado [...] é a realização de mim mesmo: ver Deus face a face'» (Documentation catholique, 1986, p. 289). Segundo a filosofia panteísta da Índia, todo homem tem dentro de si uma parte de Deus. A "realização espiritual" consiste em despertar a consciência de que se é Deus. É por isso que Gandhi, ao se ver a si mesmo, pensa estar vendo a Deus, que não é senão Gandhi mesmo! O homem é Deus; é por isso que, para Wojtyla, o caminho da Igreja é o homem. Wojtyla está imerso na gnose panteísta.
"Permitam-me dirigir uma saudação especial aos membros da tradição budista enquanto se preparam para celebrar os festivais do nascimento de Buda. Que sua alegria seja completa e sua felicidade plena" (Seul, 6 de maio de 1984). Que espírito missionário!
5. JUDAÍSMO: Em 1935, um memorando secreto da B’nai B’rith (uma associação maçônica exclusiva para judeus) mencionava os progressos alcançados na questão da infiltração: "Empurramos alguns de nossos filhos para se integrarem no corpo católico com a missão explícita de trabalhar muito mais eficazmente na desintegração da Igreja Católica. [...] Nisso, seguimos o conselho de nosso príncipe dos judeus, que sabiamente disse: 'Façam alguns de nossos filhos cardeais e bispos para que eles destruam a Igreja'" (in: La lettre de l’alliance Saint-Michel, nº 73, Modane, fevereiro de 1996).
Em 1963, Maurice Pinay (pseudônimo do bem informado jesuíta Saenz y Arriaga) distribuiu seu Complot contre l’Église aos bispos reunidos no Vaticano, revelando os planos dos marranos: a revogação da excomunhão dos comunistas, a condenação do antissemitismo, a modernização da Igreja.
Pouco antes da morte de Roncalli, Pinay, na prefácio da edição austríaca, profetizou: "A insolência do comunismo, da maçonaria e do judaísmo chegou a tal ponto que eles já falam em colocar sob seu controle o próximo conclave, com o objetivo de colocar um de seus auxiliares no trono de São Pedro". Ele estava se referindo a Montini, cujos pais eram judeus.
Em 12 de março de 2000, Ratzinger, o suposto prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, inaugurou de maneira bastante estranha uma cerimônia de arrependimento: ele acendeu um candelabro de sete braços, que é, como todos sabem, o símbolo por excelência do judaísmo. Durante a cerimônia, o pseudo-pontífice Wojtyla fez um pedido de perdão sem precedentes: "Deus de nossos pais, tu escolheste Abraão e sua descendência para que o teu nome seja levado às nações: estamos profundamente entristecidos pelo comportamento daqueles que, ao longo da história, os fizeram sofrer, eles que são teus filhos e, ao pedir-te perdão, queremos nos comprometer a viver uma fraternidade autêntica com o povo da aliança".
Esta maneira de apresentar o povo judeu é judaica e não cristã: os judeus se consideram como "filhos da aliança" (a organização maçônica judaica se chama precisamente "B'nai B'rith", que significa "filhos da aliança"). Por outro lado, os cristãos ainda falam da "antiga aliança". Esse uso remonta ao próprio Cristo: não foi Ele quem instituiu, na Quinta-Feira Santa, "uma aliança nova e eterna" com os cristãos? O fato de Wojtyla usar a expressão "povo da aliança" e não "povo da antiga aliança" provavelmente se explica por suas origens familiares. Na época de sua eleição, a Tribune juive revelou que sua mãe era judia.
Em abril de 1999, Ariel Sharon, líder do Likud (um partido político de direita em Israel), visitou Wojtyla e lhe presenteou um mapa-múndi do século XVII, Nova totius terrarum orbis tabula, onde a Judeia e Samaria são mencionadas em latim. Wojtyla olhou para o mapa e repetiu várias vezes: "Eu estou chegando na Terra Prometida". Sharon ficou surpreso que Wojtyla evocasse "a Terra Prometida dos judeus e não a Terra Santa dos cristãos". Então, diante dos olhares atônitos de seus interlocutores, Wojtyla, com os olhos semi-cerrados, recitou em hebraico o nome de cada um dos lugares santos listados em latim no mapa (Paris-Match, 6 de abril de 2000)!
Em 26 de março de 2000, Wojtyla foi ao Muro das Lamentações, o último vestígio do Templo de Salomão em Jerusalém e um lugar sagrado do judaísmo. Seguindo uma prática exclusivamente judaica, ele colocou um pequeno bilhete em uma rachadura no muro. Neste bilhete estava escrita sua solicitação de perdão aos judeus conforme citado acima.
O escritor israelense Yoram Kaniuk explicou esse gesto judaico de Wojtyla da seguinte maneira: "É absurdo esperar que o papa expresse um arrependimento maior ou se desculpe mais do que já fez pelo Holocausto e pela Inquisição, assim como pelos milênios de ódio. Ele não tem mandato de seus predecessores, que, por serem papas, não podiam errar. Ele tem, por outro lado, um mandato de amor recebido de seu Deus e que vem de sua mãe, tanto para se desvencilhar disso como cristão, quanto ao mesmo tempo para pedir piedade como órfão de uma judia" (Yoram Kaniuk: artigo no La Repubblica de 22 de março de 2000, citado pela revista Sodalitium, nº 50, junho/julho de 2000).
Um ashkenazi, Aaron Lustiger (pseudo-arcebispo de Paris), acrescentou uma observação interessante: "Ele orou, ele orou como um crente [judeu], que sabe que este muro de Herodes é o muro do Templo onde reside a glória de Deus" (La Croix, 6 de abril de 2000).
Entretanto, o Templo de Jerusalém não é mais de forma alguma um lugar "onde reside a glória de Deus", pelo contrário! Pois os anjos guardiães deixaram o Templo... no dia de Pentecostes! "O que poderia ser mais impressionante do que o terrível ruído que os sacerdotes ouviram dentro do santuário no dia de Pentecostes, e aquela voz clara que saiu do fundo deste lugar sagrado: 'Saímos daqui, saímos daqui'? Os santos anjos protetores do Templo declararam claramente que o abandonavam, porque Deus, que havia estabelecido ali sua morada durante tantos séculos, o tinha rejeitado" (Mgr. Jacques Bénigne Bossuet: Discurso sobre a história universal, 1681, parte II, capítulo 21, citando como referências o historiador judeu Flávio Josefo: A Guerra dos Judeus, livro VII, capítulo 13 (outras fontes livro VI, capítulo 5) e o historiador pagão romano Tácito: Histórias, livro V, capítulo 13).
Em 29 de agosto de 70, o Templo foi destruído pelo exército romano, como punição pelo deicídio, conforme profetizado pelo Filho de Deus (Mateus XXIV, 1-2; Lucas XIX, 41-44). Os habitantes de Jerusalém, por não terem reconhecido o Messias, foram reduzidos à escravidão pelos romanos. O povo judeu foi expulso da Palestina e disperso pelo mundo. Assim surgiu a "diáspora".
Algumas colunas do Templo de Jerusalém destruído foram transportadas para Roma e reutilizadas na construção da Basílica de São Pedro. Assim, de certa forma, o novo Templo, o novo "lugar sagrado" por excelência, agora está em Roma.
O profeta Daniel e o próprio Nosso Senhor predisseram "a abominação da desolação no lugar santo" (Mateus XXIV, 15)!
No contexto bíblico, "abominação" frequentemente é sinônimo de "ídolo", porque o culto falso aos ídolos é abominável. O "lugar santo", como mencionamos, agora está em Roma. E Roma não tem como ídolo Karol Wojtyla, líder de um culto falso?
São Vicente Ferrer (1350 - 1419) viveu durante o Grande Cisma do Ocidente, quando vários falsos papas estavam em atividade. Segundo São Vicente, "um falso papa é um ídolo", e obedecer a tal ídolo equivale a um ato de idolatria. "O papa legítimo é o pai universal dos cristãos, e a Igreja é a mãe. Portanto, ao prestar obediência a alguém que não é papa e ao atribuir-lhe as honras papais, violamos o primeiro mandamento da primeira tábua, que ordena: 'Não terás outros deuses diante de mim; não farás para ti imagem esculpida, nem figura alguma do que está em cima nos céus' (Deuteronômio V, 7-9). O que é um falso papa, senão um deus estrangeiro neste mundo, um ídolo, uma imagem ou representação fictícia de Cristo?" (São Vicente Ferrer: Tratado sobre o Cisma Moderno, parte 1, capítulo 3).
INQUÉRITO CANÔNICO: A VISIBILIDADE DA IGREJA
UM NÃO CATÓLICO PODE SER ELEITO PAPA?
A. Uma lei de direito divino
B. Um princípio constante da legislação eclesiástica bimilenar
C. A constituição apostólica Cum ex apostolicum (1959) do papa Paulo IV
D. Paulo IV emitiu um julgamento ex cathedra
E. O papa São Pio V ordena que as prescrições de Paulo IV sejam "observadas inviolavelmente"
F. O papa São Pio X inclui a bula de Paulo IV no direito canônico
G. O papa Pio XII confirma a inelegibilidade dos não-católicos ao soberano pontificado
A. Uma lei de direito divino
Quem é elegível para o conclave?
"São elegíveis todos aqueles que, de direito divino ou eclesiástico, não são excluídos. São excluídas as mulheres, as crianças, os dementes, os não batizados, os hereges e os cismáticos" (Raoul Naz: Traité de droit canonique, Paris 1954, t. 1, p. 375, reprisado pelo Dictionnaire de théologie catholique, artigo "élection").
"É uma opinião comum que a eleição de uma mulher, uma criança, um demente ou um não-membro da Igreja (não batizado, herege, apóstata, cismático) seria nula por lei divina." [1]
A opinião de que um homem herege ocupando a Sé de Pedro possa, no entanto, ser papa é praticamente rejeitada por unanimidade por todos os doutores e teólogos de todas as épocas. "Essa opinião é defendida por um único teólogo, entre os 136 antigos e modernos cujas posições pudemos verificar sobre este assunto. Estamos falando do canonista francês D. Bouix (falecido em 1870)" (Arnaldo Xavier da Silveira: La nouvelle messe de Paul VI: Qu’en penser?, p. 246).
Até os protestantes sabem que os conclaves são regidos pelo princípio da catolicidade dos candidatos à tiara. "É elegível qualquer cristão (mesmo um leigo) masculino, católico, que não tenha caído em heresia" (Realencyclopädie für protestantische Theologie und Kirche, terceira edição, Leipzig 1904, artigo "Papstwahl").
A cláusula de catolicidade que rege os conclaves é uma lei de direito divino. Nosso Senhor deu o exemplo: antes de colocar São Pedro à frente da Igreja, ele primeiro pediu que fizesse sua profissão de fé. Só depois de se certificar da ortodoxia do "papabile" é que Cristo o designa como pedra fundamental da Igreja. "«E vós», disse-lhes ele, «quem dizeis que eu sou?». Simão Pedro tomou a palavra: «Tu és o Cristo», disse ele, «o Filho do Deus vivo!». Então Jesus tomou a palavra e lhe disse: «És feliz, Simão, filho de Jonas, pois não foi a carne e o sangue que te revelaram isso, mas meu Pai que está nos céus. E eu te declaro: Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela»" (Mateus XVI, 15-18).
Que a cláusula de catolicidade dos candidatos à tiara seja uma lei de direito divino foi bem destacada pelo jesuíta espanhol Francisco Suarez (1548-1617). Suarez era célebre como filósofo, teólogo e jurista. Depois de mostrar, baseando-se em passagens das Escrituras, que a fé é o fundamento da Igreja, Suarez escreve: "Por isso, se a fé é o fundamento da Igreja, ela também é o fundamento do pontificado e da ordem hierárquica da Igreja. Isso é confirmado pelo fato de que essa é a razão dada para explicar por que Cristo pediu a São Pedro uma profissão de fé antes de lhe prometer o papado (Mateus XVI, 13-20)" (Francisco Suarez: De fide, disputatio X, seção VI, nº 2, in: Opera omnia, Paris 1858, t. XII, p. 316).
Entre os teólogos católicos, o mais célebre é sem dúvida o doutor angélico. Sua obra principal, a Suma Teológica, foi colocada no altar durante o Concílio de Trento. Ora, nesta Suma, encontramos duas passagens particularmente interessantes:
São Tomás ensina que a eleição de um candidato mau (e todo herege é mau!) é juridicamente contestável: "De acordo com o direito (in Glos. em ch. Custos) basta escolher o que é bom, mas não é necessário que se decida pelo melhor. [...] Para que uma eleição não possa ser contestada perante o tribunal eclesiástico, basta que o eleito seja um homem de bem, mas não é necessário que seja o melhor, porque nesse caso toda eleição poderia ser contestada" (Suma Teológica, II-II, q. 63, a. 2).
Em outro lugar, o doutor angélico ensina que nem os cismáticos, nem os hereges podem governar a Igreja: "São Cipriano (Carta 52) diz que aquele que não observa nem a unidade do espírito, nem a união da paz, e que se separa da Igreja e da assembleia dos sacerdotes, não pode ter nem o poder, nem a dignidade episcopal. Embora os cismáticos possam ter o poder de ordem, são, no entanto, privados do poder de jurisdição. [...] O poder de jurisdição [...] não se apega de maneira imutável àquele que o recebe. Portanto, ele não existe nos cismáticos e hereges; por conseguinte, eles não podem nem absolver, nem excomungar, nem conceder indulgências, nem fazer nada semelhante. Se fizerem essas coisas, elas são nulas. Assim, quando se diz que os cismáticos e os hereges não têm poder espiritual, deve-se entender por isso o poder de jurisdição" (Suma Teológica II-II, q. 39, a. 3).
Nossos ancestrais na fé às vezes contestaram a eleição de tal ou tal falso papa. A história eclesiástica é tão rica em ensinamentos!
Na época paleocristã, os Padres da Igreja são unânimes sobre a incompatibilidade radical entre a heresia e o soberano pontificado. Exemplo: o antipapa Novaciano, que era cismático e herege, foi declarado deposto do clero por São Cipriano. "Ele não pode ter o episcopado, e se foi inicialmente bispo, separou-se [por sua heresia] do corpo episcopal de seus confrades e da unidade da Igreja" (São Cipriano: livro IV, epístola 2).
Na Idade Média, o caminho seguido pelos católicos foi o seguinte: não depor um papa, mas contestar a validade da eleição de um antipapa intruso. O historiador alemão Zimmermann, após analisar uma a uma as deposições dos antipapas sucessivos, resume assim os princípios do procedimento: "Parecia perfeitamente legítimo afastar tal herege de sua posição usurpada e desconsiderar, neste caso, a máxima jurídica 'a primeira Sé não é julgada por ninguém'. O que se tirava de tal papa, só se retirava aparentemente, pois ele nunca havia realmente possuído; é por isso que seu pontificado era ilegítimo desde o início e ele mesmo só deveria ser considerado como um invasor do Santo Sé. Nas fontes sobre as deposições de papas, pode-se ler – ainda mais frequentemente do que a suspeita de simonia, e sem dúvida não por acaso – a acusação de usurpação, o que colocava em dúvida um pontificado em sua raiz, pois se expressava assim que o referido acusado nunca havia sido um ocupante legítimo da 'primeira Sé' ou nunca teria tido o direito de se considerar como tal. É por isso que a palavra 'invasio' volta regularmente nas fontes, como termo técnico para um pontificado que deve ser considerado como ilegítimo" (Harald Zimmermann: Papstabsetzungen des Mittelalters, Graz, Viena e Colônia 1968, p. 175).
A mesma observação é feita no Dicionário de Teologia Católica (artigo "deposição"): quando se privava os antipapas cismáticos de seu ofício, não se os depunha do pontificado, mas, importante nuance, se lhes tirava um pontificado que eles nunca haviam possuído desde o início. "Na verdade, os papas cismáticos foram simplesmente tratados como usurpadores e despojados de uma Sé que não possuíam legitimamente (cf. o decreto contra os simoníacos do concílio de Roma de 1059, Hardouin, t. VI, col. 1064; Graciano, dist. LXXIX, c. 9; Gregório XV: constituição Aeterni Patris (1621), sect. XIX, Bullarium romanum, t. III, p. 446). Os concílios que os atingiram apenas examinaram seus títulos à tiara. Não foram os papas que julgaram, mas a eleição e o ato dos eleitores."
[1] Arnaldo Xavier da Silveira: La nouvelle messe de Paul VI: Qu’en penser?, Chiré-en-Montreuil 1975, p. 298; o autor indica em nota suas referências: Ioannes-B. Ferreres: Institutiones canonicae, Barcelona 1917, t. I, p. 132; Matthaeus Conte a Coronata: Institutiones iuris canonici, Turim 1928, volume I, p. 360; Franciscus Schmalzgruber: Ius ecclesiasticum universum, Roma 1843, t. I, parte II, p. 376, nº 99; Caetano: De auctoritate..., cap. 26, nº 382, p. 167 - 168.
B. Um princípio constante da legislação apostólica bimilenar
Os não-católicos são "irregulares", o que os exclui não apenas do soberano pontificado, mas também do clero em geral. "As irregularidades são defeitos contrários às regras canônicas, pelos quais se é afastado das ordens ou de suas funções" (Louis Thomassin: Ancienne et nouvelle discipline de l’Église, Bar-le-Duc 1864 - 1867, l. VII, p. 564). Os defeitos se dividem em:
· irregularidades ex defectu (defeito corporal: epilepsia, debilidade mental, etc.) e em
· irregularidades ex delicto (delito: heresia, homicídio, aborto, bigamia, etc.).
O direito eclesiástico em vigor até São Pio X declarava apóstatas e hereges como irregulares (cânon Qui in aliquo, dist. 51 e cânon Qui bis. de consecratione, dist. 4). Essa disposição foi retomada por São Pio X em seu novo código de direito canônico: "São irregulares ex delicto: os hereges, os apóstatas da fé e os cismáticos" (Codex iuris canonici, 1917, cânon 985, nº 1).
Que os não-católicos sejam irregulares é um princípio constante da legislação eclesiástica bimilenar. Aquele que não é católico não pode se tornar nem sacerdote, nem bispo, nem papa. Esta regra é absoluta e não sofre nenhuma exceção. Citamos alguns documentos legislativos a esse respeito:
O primeiro documento provém de um papa que conheceu pessoalmente São Pedro. O papa São Clemente I (morto no ano 90) escreveu as regras da Igreja Católica em suas Constituições Apostólicas. Um capítulo, intitulado "Como devem ser aqueles que serão ordenados", enumera os critérios de recrutamento do clero. "Escolhei bispos, sacerdotes e diáconos dignos do Senhor, ou seja, homens piedosos, justos, mansos, não avarentos, amigos da verdade, comprovados, santos, que não fazem acepção de pessoas, que são competentes para ensinar a linguagem da piedade, E QUE SE MOSTREM DE UMA RETIDÃO PERFEITA ('que cortem corretamente') EM RELAÇÃO AOS DOGMAS DO SENHOR" (São Clemente I: Constitutiones apostolicae, livro VII, cap. 31).
Os Statuta Ecclesiae Antiqua (meados ou fim do século V) prescrevem um exame de fé antes da consagração episcopal. "Aquele que deve ser ordenado bispo será examinado previamente para saber [...] se ele afirma com palavras simples os ensinamentos da fé. [...] [segue uma enumeração dos numerosos pontos de doutrina sobre os quais o candidato deve ser interrogado]. Quando, tendo sido examinado sobre todos esses pontos, ele for considerado plenamente instruído, então [...] que seja ordenado bispo".
São Ivo de Chartres (1040-1116, bispo de Chartres; a não confundir com o padroeiro dos juristas, São Ivo, 1253-1303) participou da elaboração do direito canônico. Devemos a ele uma vasta coleção de leis, intitulada Decretos. Ele cita uma lei do papa São Leão IV (século IX): "A eleição e a consagração do futuro pontífice romano devem ser feitas conforme a justiça E AS LEIS CANÔNICAS" (Decreti, quinta parte, cap. 14, dist. 63, cap. Inter nos). E a primeira e principal lei canônica é – evidentemente – que o candidato seja católico! Isso é o mínimo...
Esta lei também é citada por Graciano (Decreto, primeira parte, dist. 63, cap. 31). O monge italiano Graciano reuniu leis dispersas e as compilou em uma coleção jurídica conhecida como Decreto (1140). Assim, ele lançou os fundamentos da ciência do direito canônico. Sua coleção de leis tornou-se uma autoridade a partir do século XII; no século XVI, o papa Gregório XIII ordenou uma publicação oficial em nome da Igreja. "Graciano (Dist. LXXXI) recusa a entrada de hereges e apóstatas no clero. Portanto, eles ainda são considerados irregulares" (Thomassin, t. III, p. 591).
São Tomás de Aquino, que frequentemente cita as leis compiladas por Graciano, ensina: "Aqueles que são irregulares em virtude do direito da Igreja não estão autorizados a ascender às ordens sagradas" (Suma Teológica, II-II, q. 187, a. 1; cf. também II-II, q. 185, a. 2).
O célebre XIX Concílio Ecumênico, reunido em Trento de 1545 a 1563, prescreve um exame da ortodoxia dos candidatos ao sacerdócio nestes termos: "Quando o bispo desejar conferir as ordens, ele convocará à cidade, na quarta-feira anterior ou no dia que desejar, todos os que desejarem recebê-las; e assistido por homens versados nas Sagradas Escrituras e bem instruídos nas ordenanças eclesiásticas, ele os examinará cuidadosamente sobre sua família, pessoa, idade, educação, costumes, doutrina e fé" (Concílio de Trento: Decreto de Reforma, cap. 7, 23ª sessão, 15 de julho de 1563).
A disciplina bimilenar se reflete no pontifical romano. Segundo este venerável livro, em uso desde tempos imemoriais, é necessário examinar a retidão doutrinária dos candidatos ao episcopado antes de sua consagração. O examinador se dirige assim ao candidato: "A antiga instituição dos Padres ensina e prescreve que aquele que é escolhido para a ordem do episcopado seja previamente examinado com o maior zelo". Entre as questões sobre a fé e os costumes dirigidas ao candidato, está a seguinte: "Você quer acolher com veneração, ensinar e servir as tradições dos Padres ortodoxos, bem como as decretais e constituições da Santa Sé Apostólica?" (Pontificale Romanum Summorum Pontificum Iussu Editum a Benedicto XIV et Leone XIII Pontificibus Maximis Recognitum et Castigatum, Mechliniae [Malinas, Bélgica] 1958, cerimônia "De consecratione electi in episcopum", rubrica "Examen").
De acordo com a Tradição bimilenar, os não-católicos não são admitidos nem ao sacerdócio, nem ao governo da Igreja.
O não-católico, como já dissemos, não pode de forma alguma ser admitido ao clero. Ainda mais: a Igreja é extremamente severa, pois desconfia até mesmo dos hereges convertidos: “Aqueles que, abandonando a heresia ou o cisma, vêm para a Igreja Católica não são admitidos ao clero” (Santo Agostinho: De unico Baptismo, cap. 12).
Desde o início do cristianismo até os dias de hoje, mesmo os hereges convertidos ao catolicismo (!) são considerados irregulares. Um dos primeiros concílios, o de Elvira, na Espanha (c. 300-303), declarou essa irregularidade de forma tão afirmativa e severa que é um sinal de que essa prática era muito antiga. “Se alguém, vindo de qualquer heresia, se juntar a nós como fiel (leigo), ele não deverá ser promovido ao clero de forma alguma. Quanto aos que foram ordenados anteriormente [quando ainda estavam na seita herética], eles devem certamente ser destituídos do clero” (Concílio de Elvira, cânon 51).
O papa São Inocêncio I (401 - 417) decreta: “A lei de nossa Igreja Católica é impor as mãos e conceder apenas a comunhão laica [não admitir nos cargos do clero] aos batizados que vêm a nós após terem deixado os hereges e não escolher ninguém entre eles para conferir as honras do clero”. E o papa esclarece que essa prática está conforme a Tradição, a saber, “as antigas regras, transmitidas (traditas) tanto pelos apóstolos quanto pelos homens apostólicos, que a Igreja Romana mantém e ordena que sejam mantidas” (São Inocêncio I: carta Magna me gratulatio, 18 de dezembro de 414, dirigida aos bispos da Macedônia).
Aquele que nasceu em uma seita herética, mas se converte mais tarde, não pode ser admitido ao clero. O católico que se torna herege, mas depois se retrata, também não pode se tornar sacerdote. “Quanto àquele que passa da fé católica para a heresia ou apostasia”, continua São Inocêncio I (ibidem), “mas que, [depois] se arrepende e quer voltar [à Igreja Católica], ele poderia ser autorizado a ser admitido nos cargos do clero? Aquele cujo crime não pode ser apagado, a menos que faça uma longa penitência? Após sua penitência, não lhe será permitido se tornar clérigo, em virtude das leis eclesiásticas (cânones) que são autoritárias”.
Se já os antigos hereges convertidos ao catolicismo são, por princípio, não admitidos ao sacerdócio, entender-se-á facilmente que os hereges que persistem na sua heresia não poderão, de forma alguma e sob nenhum pretexto, ser admitidos ao clero, e muito menos ao soberano pontificado!
C. A constituição apostólica Cum ex apostolicum (1559) do papa Paulo IV
Esse ensinamento tradicional foi codificado juridicamente no século XVI pelo papa Paulo IV. O papa Paulo IV redigiu um texto legislativo para evitar que um cardeal suspeito de heresia pudesse ser eleito papa. Ele confidenciou a um de seus próximos: "Para dizer a verdade, queríamos nos opor aos perigos que ameaçavam o último conclave e tomar em vida precauções para que o diabo não coloque no futuro um dos seus no Trono de São Pedro" (in: Louis Pastor: Histoire des papes depuis la fin du Moyen Âge, Paris 1932, vol. XIV, p. 234).
O que aconteceu "no último conclave"? O cardeal herético Morone, que fazia ecumenismo com os protestantes, quase foi eleito papa, mas foi afastado após a intervenção enérgica do prefeito do Santo Ofício da Inquisição, o cardeal Carafa (futuro Paulo IV). Carafa abriu secretamente processos contra alguns cardeais, incluindo Morone. Com a morte do papa Júlio III (1555), os cardeais Carafa, Pio de Carpi e Juan Alvarez trouxeram ao conclave um dossiê dos processos contra vários papáveis. As acusações graves e documentadas de heresia contra Morone, Pole e Bertano impediram sua eventual eleição (cf. Massimo FIRPO: Inquisizione romana e Controriforma. Studi sul cardinal Giovanni Morone e il suo processo di eresia, Bolonha 1992, p. 312).
Carafa foi eleito e tomou o nome de Paulo IV. Ele encarcerou Morone e redigiu a bula Cum ex apostolatus (15 de fevereiro de 1559), segundo a qual a eleição de um homem que, mesmo que apenas uma vez, tenha errado em matéria de fé antes da eleição, não poderia ser válida.
A constituição apostólica na forma de bula Cum ex apostolatus de 15 de fevereiro de 1559 do papa Paulo IV estipula, no § 6, que um homem que tenha se desviado da fé não pode de forma alguma se tornar pontífice, mesmo que todos os cardeais estejam de acordo, mesmo que os católicos de todo o mundo lhe prestem alegre obediência durante décadas. Todos os atos e decisões de tal pseudo-pontífice seriam juridicamente nulos e sem efeito, e isso ipso facto, sem que seja necessária outra declaração por parte da Igreja.
Aqui estão os principais trechos do texto de Paulo IV[^1]:
« A carga apostólica, confiada a nós por Deus apesar de nossa indignidade, nos impõe o cuidado geral do rebanho do Senhor. Para guardá-lo na fé e conduzi-lo no caminho da salvação, devemos, como pastores atentos, vigiar constantemente e cuidar diligentemente de afastar do aprisco do Senhor aqueles que, em nossa época, entregues aos pecados, confiando em suas próprias luzes, se insurgem com uma rara perversidade contra a regra da verdadeira fé e, distorcendo a compreensão das Sagradas Escrituras, esforçam-se por dividir a unidade da Igreja Católica [...]. Se desdenham ser discípulos da verdade, não devem continuar a ensinar o erro.
§ 1. Diante da situação atual tão grave e perigosa, não se deve permitir que se acuse o pontífice romano de desviar na fé. Ele é na terra o Vigário de Deus e de Nosso Senhor Jesus Cristo; ele possui a plenitude da autoridade sobre as nações e os reinos; ele é o juiz universal e não deve ser julgado por ninguém nesta vida. Além disso, quanto maior é o perigo, maior deve ser a vigilância completa e atenta, para que os falsos profetas, ou mesmo outros homens, revestidos de autoridade secular, não possam lamentavelmente capturar nas suas redes as almas simples e arrastar consigo para a perdição e a ruína da condenação os inúmeros povos confiados ao seu cuidado e direção, tanto espiritual como temporal; também para que nunca sejamos testemunhas da "abominação da desolação no lugar santo" anunciada pelo profeta Daniel, enquanto desejamos com todo o nosso poder, com a ajuda de Deus, segundo nosso encargo pastoral, capturar as raposas que se esforçam por devastar a vinha do Senhor e afastar os lobos dos apriscos, para não nos assemelharmos a cães mudos incapazes de latir, nem nos perdermos com maus agricultores, nem sermos comparados a mercenários.
§ 2. Após madura deliberação sobre este assunto com nossos veneráveis irmãos, os cardeais da Santa Igreja Romana, por seu conselho e com seu assentimento unânime, pela nossa autoridade apostólica, aprovamos e renovamos todas e cada uma das sentenças, censuras e penas de excomunhão, suspensão, interdição e privação que foram promulgadas e decretadas, de qualquer maneira que seja, contra os hereges e os cismáticos: [...] »
· todos os pontífices romanos, nossos predecessores [...] até através de suas cartas extravagantes;
· os sagrados concílios da Igreja de Deus;
· os santos Padres em seus decretos e estatutos;
· os sagrados cânones, constituições e ordenanças apostólicas;
e desejamos que sejam observados perpetuamente e reintegrados em pleno vigor, se necessário, e que permaneçam assim.
Elas se aplicam a todos aqueles que, até agora, tenham sido pegos em flagrante, confessado ou sido convencidos de terem se desviado da fé católica, caído em alguma heresia, incorrido em cisma ou o terem suscitado ou cometido. Elas se aplicam ainda [...] àqueles que, no futuro, ou se desviarem, ou caírem em heresia, ou incorrerem em cisma [...].
§ 3. [...] De acordo com esta nossa constituição, VÁLIDA PARA SEMPRE, por repulsa a um crime tão grande, o mais grave e pernicioso possível na Igreja de Deus, na plenitude de nosso poder apostólico, nós decidimos, estabelecemos, decretamos e definimos:
[§ 4 e 5: os clérigos ou príncipes seculares hereges são depostos de seus cargos; o § 6 trata do conclave:]
§ 6. [...] que se acontecer que um bispo, mesmo exercendo a função de arcebispo, patriarca ou primaz; que um cardeal da Igreja romana, mesmo legado; que um soberano pontífice, mesmo antes de sua promoção ou elevação ao cardinalato ou ao pontificado supremo, tenha se desviado da fé católica ou caído em alguma heresia, a promoção ou elevação, mesmo que tenha ocorrido com o consentimento unânime de todos os cardeais, é NULA, INVÁLIDA, VAZIA, e não se poderá dizer que se tornou válida ou que se tornaria válida porque o interessado aceita a carga, recebe a consagração, ou assume depois o governo e a administração ou pela entronização do pontífice romano, ou pelo ato de ajoelhar-se diante dele, ou pelo ato de obediência prestado por todos, independentemente da duração dessa situação.
A eleição não poderá ser considerada legítima em qualquer uma de suas partes, e ela não confere nem pode ser considerada conferir qualquer poder de comando, seja no campo espiritual ou temporal, a tais homens promovidos a bispos, arcebispos, patriarcas ou primazes, ou elevados ao cardinalato ou ao pontificado supremo. Todas as suas palavras, todos os seus atos e gestos, todos os seus atos administrativos, com tudo o que deles decorre, NÃO TÊM O MENOR EFEITO JURÍDICO, e não conferem a ninguém o menor direito. Tais pessoas assim promovidas ou elevadas seriam, por esse fato mesmo, SEM QUE NECESSITE DE QUALQUER OUTRA DECLARAÇÃO ULTERIOR, privadas de toda dignidade, posição, honra, título, autoridade, função e poder ao mesmo tempo [...].
§ 7. É lícito se desvincular impunemente da obediência e do serviço para com eles [os não-católicos promovidos como pseudo-papa] e evitá-los como mágicos, pagãos, publicanos, hereges [...]; e para maior confusão daqueles homens assim promovidos ou elevados, se eles desejarem continuar a governar ou administrar, será lícito apelar contra eles ao braço secular [...].
§ 8. Não obstante... etc. [fórmula habitual de promulgação; o mesmo para o § 9]
§ 10. Portanto, a nenhuma pessoa será permitido violar este texto de nossa aprovação, inovação, sanção, estatuto, derrogação, vontade e decreto com temerária audácia. Se alguém tiver a presunção de tentar isso, saiba que atrairá sobre si a indignação de Deus Todo-Poderoso e dos bem-aventurados apóstolos Pedro e Paulo.
[1] Cette bulle figure dans les Codicis Juris Canonici Fontes, Typis Polyglottis Vaticanis, Rome 1947, t. 1, p. 163 - 166. Comme l’indique le titre de ce recueil, il s’agit d’une collection des « sources » (fontes) ofticielles du droit ecclésiastique, édité par le cardinal Gasparri, membre de la commission pontificale (présidée par SI. Pie X) qui élabora le code de 1917. Typis Polylottis Vaticanis est la maison d’édition du Saint-Siège. Dans ce recueil, le texte de la bulle est reproduit jusqu’au § 7 inclusivement. Le contenu est ainsi repris, car les § 8 sqq. sont seulement les/ormu_les stéréotypées de promulgation,_ identiques pour tous les textes pontificaux. Afin de gagner de la place, ces paragraphes stéréotypés finaux ne sont pas imprimés dans les Fontes, mais seulement sous-entendus par un début de citation suivi de la mention « etc. ». Le Bullarium roman/IIII reproduit la bulle en entier (§ 1 - 10, plus les signatures du pape et des cardinaux).
[2] On appelle « lettres extravagantes » celles qui ne sont pas contenues dans le droit canonique.
[3] « … perpetuum valitura constitutione [...], de apostolicae potestatis plenitudine sancimus, statuimus, decernimus et definimus... »
[4] « … si ullo umquam tempore apparuerit [...] romanum pontificem ante eius promotionem [...] a fide catholica deviasse, aut in aliquam haeresim incidisse, promolio, seu assumptio de eo etiam in concordia, et de unanimi omnium cardinalium assensu facta, nulla, irrita, et inanis existat… »
D. Paulo IV emitiu um julgamento ex cathedra
A constituição apostólica de Paulo IV é uma definição dogmática solene ex cathedra, que preenche as quatro condições de infalibilidade estabelecidas pelo primeiro Concílio do Vaticano, a saber:
- COM SUA SUPREMA AUTORIDADE APOSTÓLICA: "na plenitude de nosso poder apostólico"
- O PAPA DEFINE: "Nós [...] definimos"
- UMA DOUTRINA SOBRE A FÉ: o documento trata diretamente da fé, visto que o termo aparece várias vezes no texto. Este é o principal objetivo de Paulo IV: proteger a fé contra os hereges.
- Além disso, a bula não trata do modo eleitoral (portanto, disciplinar). Não especifica que os eleitores são os cardeais, nem que devem deliberar em determinada sala, etc.
O historiador Pastor afirmava que o texto de Paulo IV seria disciplinar, e não dogmático. Esta interpretação não é mais sustentável nos dias de hoje, pois desde que Pastor escreveu sua "História dos papas desde o fim da Idade Média", a Igreja forneceu uma "interpretação autêntica" do texto de Paulo IV. Desde São Pio X, de fato, os teólogos são obrigados a considerar este texto não como disciplinar, mas como doutrinal (relativo à fé). Por quê? Porque a Igreja o relacionou com uma boa dúzia de cânones do Código de Direito Canônico de 1917 que tratam de heresia, retidão doutrinal, renúncia à fé e propagação de doutrinas condenadas (ver Apêndice B).
Especificamente, "Nós decidimos, estabelecemos, decretamos" uma doutrina "válida para sempre", portanto, irreformável por si mesma, e que todos devem observar sob pena de incorrer na indignação de Deus Todo-Poderoso e dos bem-aventurados apóstolos Pedro e Paulo.
Além disso, o Papa Paulo IV escolheu expressar sua vontade por meio de uma constituição apostólica em forma de bula, o que representa o ápice da solenidade de um documento pontifical. "A constituição apostólica se distingue por seu alcance geral e alto grau de solenidade"; ela é "um instrumento normativo essencial nas mãos do soberano pontífice" (Philippe Levillain: "Dicionário Histórico da Papado", Paris 1994, artigo "constituição apostólica").
Assim, Paulo IV, falando solenemente ex cathedra, emitiu um julgamento dogmático infalível. Sua decisão, irreformável por si mesma, PERMANECERÁ EM VIGOR ATÉ O FIM DOS TEMPOS.
E. O Papa São Pio V ordena que as prescrições de Paulo IV sejam "observadas inviolavelmente"
Após a morte de Paulo IV, os arquivos da Inquisição foram incendiados pelo povo, resultando na falta de provas e no encerramento do processo contra o Cardeal Morone. Este último foi libertado da prisão. Quando o Papa Pio IV faleceu em 1565, Morone estava prestes a ascender à Cátedra de São Pedro. O Cardeal Michel Ghislieri (futuro Papa São Pio V) estava determinado a evitar a eleição de Morone a qualquer custo. Ele resgatou o processo de Morone, que tinha guardado e mantido cuidadosamente nos dobras de sua túnica por anos. Ghislieri interveio assim contra Morone: "O novo pontífice não deve ter nenhuma reputação de condescendência com a heresia, e nesse aspecto Morone não oferece ao sagrado colégio as garantias necessárias" (segundo o Cardeal Georges Grente: "O Papa dos grandes combates São Pio V", Paris 1956, p. 35). O conclave elegeu não o Cardeal Morone, mas o Cardeal Ghislieri, que assumiu o nome de "Pio V".
Ghislieri foi o segundo sucessor de Paulo IV. Antes de se tornar papa, o Cardeal Ghislieri tinha trabalhado sob as ordens de Paulo IV, que o havia promovido a prefeito da Inquisição. Ele admirava a luta intransigente do santo idoso contra os hereges e a corrupção dos costumes. No dia de sua elevação ao pontificado, perguntaram-lhe qual seria a linha de conduta de seu pontificado. São Pio V respondeu com entusiasmo: "Aquela de Paulo IV!" (segundo Carlo Bromato: "História de Paulo IV, Sumo Pontífice", Ravena 1748, segunda edição 1753, vol. II, p. 616).
O Papa São Pio V ordenou solenemente que as prescrições de Paulo IV fossem fielmente observadas. "Por nosso próprio movimento e conhecimento certo, e na plenitude de nosso poder apostólico [...] concernente à constituição de Paulo IV, [...] dada em 15 de fevereiro de 1559, renovamos agora seu teor, e ainda o confirmamos. E queremos e ordenamos que seja observada inviolavelmente e com o maior cuidado, conforme sua sequência e teor" (São Pio V: motu proprio "Inter multiplices curas", 21 de dezembro de 1566, § 1).
O termo "series", usado por São Pio V, significa "sequência, continuidade". Isso significa que a bula de Paulo IV deve ser considerada em seu encadeamento lógico e contínuo, do começo ao fim.
F. O Papa São Pio X faz inserir a bula de Paulo IV no código de direito canônico
Também São Pio X desejava que a bula de Paulo IV fosse observada, pois a tomou como referência para o novo código de direito canônico.
Esta mesma bula possui um valor jurídico inegável até os dias de hoje, pois foi incorporada no código de direito canônico de 1917. Este código foi elaborado por uma comissão pontifical presidida por São Pio X e promulgado pelo Papa Bento XV (constituição apostólica "Providentissima", 27 de maio de 1917).
Com o desejo de reunir todas as leis eclesiásticas em um único código, São Pio X decidiu: "1. Instituímos um conselho, ou, como se diz, uma comissão pontifical, à qual será confiada a direção e a responsabilidade por todo este assunto. Ela será composta por um certo número de Suas Eminências Reverendíssimas os cardeais, que serão nomeados especificamente para este fim pelo pontífice. 2. Este Conselho será presidido pelo pontífice, e na sua ausência, pelo cardeal decano dos cardeais assistentes. [...] " (São Pio X: motu proprio "Arduum sane", 19 de março de 1904).
Esta comissão, presidida por São Pio X, tinha um duplo objetivo, como explicou o secretário da comissão, o cardeal Gasparri:
-
"distribuir metodicamente todo o direito canônico em cânones ou artigos, à maneira dos códigos modernos";
-
"fazer uma coleção de todos os documentos [...] dos quais os mencionados cânones ou artigos foram emprestados" (cardeal Gasparri: carta de 5 de abril de 1904, in: F. Cimetier: "As fontes do direito eclesiástico", Paris 1930, p. 195).
A bula de Paulo IV foi explicitamente e especificamente incluída nesta coleção das "Fontes" do código de direito canônico ("Codicis Juris Canonici Fontes. cura emi. Petri card. Gasparri editi, Rome 1947, 1. J, p. 163 - 166). Isso é significativo: de acordo com a carta do cardeal Gasparri citada acima, isso significa que o código "emprestou" algo da bula de Paulo IV. Em outras palavras, o fato de a bula de Paulo IV estar nas "Fontes..." indica que suas disposições foram incorporadas ao direito canônico de 1917.
Além das "Fontes...", pode-se consultar o próprio "Codex iuris canonici". Existem duas edições: uma apenas com o texto das leis e outra com o texto das leis e suas fontes. Estas edições anotadas são pouco conhecidas, mas extremamente valiosas! A equipe de canonistas que trabalhou sob a direção de São Pio X cuidadosamente registrou o nome dos documentos legislativos anteriores que serviram de base para cada novo cânone. O secretário desta comissão pontifical, o cardeal Gasparri, publicou o código adicionando, para cada cânone, notas de rodapé com os documentos do magistério que serviram de fonte para elaborar o texto. A coleção com estas preciosas "fontium annotatione" (notas com as fontes) tem o título: "Codex iuris canonici, Pii X pontificis maximi iussu digestus, Benedicti papae XV auctoritate promulgatus, praefatione, fontium annotatione et indice analytico-alphabetico ab emo. Petro card. Gasparri auctus." Esta é uma edição oficial, feita pelo secretário da comissão pontifical que elaborou o código, publicada pela editora do Vaticano Typis Polyglottis Vaticanis (veja a reprodução em fac-símile no Apêndice B).
Ao consultar as "fontium annotatione" do "Codex..." (e também ao consultar o índice geral das "Codicis Juris Canonici Fontes...", 1. IX), percebe-se que a constituição apostólica em forma de bula de Paulo IV foi inserida no direito eclesiástico não menos que QUINZE VEZES! Quinze cânones se referem explicitamente a ela. No topo está o próprio texto do cânone; abaixo, na nota de rodapé, estão todas as referências que foram usadas para elaborar esse cânone (veja a reprodução em fac-símile no Apêndice B).
Todos e cada um dos parágrafos da bula (1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7) são mencionados no código. A bula foi incorporada na íntegra.
G. O Papa Pio XII confirma a inelegibilidade dos não-católicos para o pontificado supremo
Uma bula pontifical não precisa absolutamente ser confirmada pelo sucessor do papa falecido para permanecer em vigor. Por exemplo: "Espalhou-se o boato de que, após a morte de Clemente XII, a pena de excomunhão estipulada em sua bula [In eminenti, 4 de maio de 1738, contra os maçons] seria sem efeito, já que essa bula não havia sido expressamente confirmada por seu sucessor. Certamente era ABSURDO pretender que as bulas dos antigos pontífices caíssem em desuso se não fossem expressamente aprovadas por seus sucessores" (Leão XII: Carta apostólica Quo graviora, 13 de março de 1826).
A bula de Paulo IV, "válida perpetuamente", não precisa ser confirmada por ninguém. Se, no entanto, foi confirmada por São Pio V e São Pio X, foi simplesmente para que não caísse no esquecimento e fosse observada escrupulosamente.
A bula de Paulo IV às vezes é dita ter sido revogada. Mas revogada por quem? E quando? Que nos seja citado então o papa que explicitamente revogou esta bula! Até hoje, ninguém conseguiu fornecer tal documento. Esta bula está oficialmente incluída no código das leis da Igreja Católica (ver apêndice B). Portanto, ela não foi revogada, muito pelo contrário!
Para que uma lei eclesiástica perca sua validade jurídica, é necessário que seja explicitamente revogada por um papa. "Para que uma lei na Igreja seja suprimida, é necessário que um documento a declare expressamente. Isso é claro nos 30 primeiros capítulos do código publicado por Bento XV. No entanto, nenhum documento oficial suprimiu a bula de Paulo IV, que está, ao contrário, oficialmente incluída no corpo das leis canônicas" (Padre Mouraux, in: Bonum certamen, nº 80).
Vamos considerar um caso concreto de revogação. O Papa Júlio II (constituição Cum tam divino, 19 de fevereiro de 1505) declarou nulas as eleições simoníacas. Mais tarde, São Pio X aboliu explicitamente este impedimento à elegibilidade: "O crime de simonia é abominável, tanto do direito divino quanto do direito humano. Como é amplamente estabelecido que é absolutamente reprovável na eleição do pontífice romano, assim também nós o reprovamos e o condenamos, e aplicamos aos culpados a pena de excomunhão latae sententiae, embora tenhamos suprimido a nulidade da eleição simoníaca (que Deus afaste tal eleição!) decretada por Júlio II (ou qualquer outro decreto pontifício), para remover um pretexto para questionar a validade da eleição do pontífice romano" (São Pio X: constituição Vacante Sede Apostolica, 25 de dezembro de 1904, § 79).
A cláusula de simonia, explicitamente abolida por São Pio X, não está mais em vigor; por outro lado, a cláusula de catolicidade, nunca revogada por ninguém, permanece em vigor. Aliás, ninguém no mundo poderia revogar a cláusula de catolicidade, pois esta cláusula é uma lei de direito divino e, além disso, um dogma definido ex cathedra!
Em 1945, o Papa Pio XII publicou um novo regulamento que rege o conclave (constituição Vacantis Apostolicae Sedis, 8 de dezembro de 1945, in: Documentation catholique de 26 de outubro de 1958). Nele, ele confirma que as leis estabelecidas no direito canônico devem ser observadas, pois pressupõe que o pretendente tenha sido eleito conforme o direito eclesiástico antes de ser coroado com a tiara. Isso é evidenciado pela expressão "após a eleição canonicamente feita" (Pio XII: constituição Vacantis Apostolicae Sedis, § 100). Os termos "canonicamente feita" significam conforme os "cânones" (= regras, leis) estabelecidos pelo código de direito canônico.
No § 101 da constituição de Pio XII, é feita uma referência precisa ao cânone 219, que trata do pontífice romano recém-eleito. "O pontífice romano legitimamente eleito...". A palavra "legitimamente" é sinônimo de "canonicamente", ou seja, de acordo com as leis eclesiásticas ("legitime electus" tem como etimologia "lex, legis" = a lei).
Aquele que não foi eleito legitimamente não se torna papa de forma alguma! No cânone 109, de fato, é explicitamente especificado que, "por direito divino, alcança-se o pontificado supremo, DESDE QUE A ELEIÇÃO TENHA SIDO LEGÍTIMA!"
Então, quais são as leis a serem observadas durante um conclave para que a eleição do pontífice supremo seja legítima, canônica, válida, juridicamente inatacável?
O cânone 167, § l, que trata da eleição dos clérigos, estipula o seguinte: "Não podem dar votos [...] 4° aqueles que deram seu nome a uma seita herética ou cismática ou que aderem publicamente a ela". Se os não-católicos já são excluídos do direito de "eleger", presume-se que a intenção do legislador era, a fortiori, privá-los do direito de "ser eleitos". Pode-se objetar que isso não está explicitamente no texto da lei, e concordamos com isso. Na época em que o código foi elaborado, era óbvio que um candidato a um cargo eclesiástico deveria ser católico. O fato de que hoje em dia seja necessário provar essa evidência apenas mostra a distorção mental de nossa época. Mas é bastante fácil demonstrá-lo!
Um leigo poderia ser eleito validamente papa, mas é mais conveniente que o eleito seja escolhido entre os cardeais. No entanto, os cardeais, conforme especificado no código, devem ser "eminentes em doutrina" (cânone 232, § 1). Uma vez que lhes é exigido superar outros clérigos pela excelência de sua doutrina, é justo esperar deles, no mínimo, retidão doutrinal simples. Isso é o mínimo necessário.
Se um cardeal aderisse, por exemplo, a uma seita protestante, tornar-se-ia, por isso mesmo, inelegível. Pois, de acordo com o direito, clérigos que aderem a uma seita não-católica "são ipso facto infames" (cânone 2314, § 1, no 3). E "aquele que é atingido por infâmia de direito é [...] incapaz de obter benefícios, pensões, cargos e dignidades eclesiásticas" (cânone 2294, § 1, com uma referência, em nota, ao § 5 da bula de Paulo IV).
Que se deva professar a fé católica para ser papável é evidente em muitos outros textos legislativos. Segundo o cânone 343, o bispo deve zelar pela salvaguarda da ortodoxia em sua diocese. Como o bispo de Roma poderia zelar pela manutenção da fé em sua diocese e também no mundo inteiro, se fosse firmemente contrário à fé católica? Além disso, antes de poder se tornar bispo, é necessário ter feito previamente uma profissão de fé católica (cânone 332, § 2). Da mesma forma, o cânone 1406 prescreve a recitação de uma profissão de fé aprovada pelo Santo Sé para aqueles que acabaram de ser promovidos a bispos, cardeais, etc. Se um bispo já deve professar a verdadeira fé, não é natural e evidente que o papa, que também é bispo, deva ter a fé?
Que todo candidato ao supremo pontificado deva ter a fé é confirmado pelo princípio jurídico da "irregularidade" dos não-católicos. Cânone 985, nº 1: "São irregulares ex defectu: os hereges, os apóstatas da fé e os cismáticos". Seu crime de heresia, que resulta em uma irregularidade de natureza perpétua (cânone 983), torna os antigos hereges irregulares mesmo após sua conversão ao catolicismo (Comissão pontifícia para a interpretação autêntica do Codex iuris canonici, 30 de julho de 1934, in: Acta Apostolicae Sedis, Roma 1934, p. 494).
Os hereges convertidos (!) podem, mediante uma dispensa especial reservada à Santa Sé, acessar o sacerdócio, mas não estão habilitados a acessar o episcopado. Segundo o cânone 991, § 3, "a irregularidade que foi objeto de dispensa (!) permite o acesso às ordens menores, até mesmo ao sacerdócio, mas torna inelegível para o cardinalato, o episcopado, o abaciato, a prelazia nullius, o cargo de superior em uma religião clerical isenta". Ora, todo papa é bispo de Roma! Sua "irregularidade" impede os hereges convertidos (sem mencionar os não-católicos) de acessar o episcopado e, consequentemente, o supremo pontificado. A eleição de um "irregular" para o supremo pontificado é juridicamente NULA E SEM EFEITO!
Cânon 2335: "Aqueles que se associam à seita maçônica ou a outras associações desse tipo, que conspiram contra a Igreja ou contra as legítimas autoridades civis, incorrem por esse fato na excomunhão reservada à Sé Apostólica".
Cânon 2336: "§ 1. Clérigos que cometeram uma infração conforme aos cânones 2334 ou 2335, além das penas estabelecidas por esses cânones, devem ser suspensos ou privados de seu cargo, benefício, dignidade, pensão ou renda, se tiverem. Os religiosos devem ser punidos com a privação do cargo e a perda do direito de eleição ativa ou passiva, e por outras penas de acordo com as regras de sua ordem monástica. § 2. Além disso, clérigos ou religiosos que aderem à maçonaria ou a outras associações semelhantes devem ser denunciados à Sagrada Congregação do Santo Ofício". O Santo Ofício (antigamente chamado de "Inquisição") tem a tarefa de descobrir e punir os hereges.
Portanto, o cânon 2336 estipula que um maçom não pode ser papa.
O cânon 188 é crucial. "Por uma renúncia tácita admitida pelo próprio direito, qualquer cargo fica vago por si mesmo e sem qualquer declaração, se o clérigo [...] 4° se afasta publicamente da fé católica". Assim, um não-católico não pode se tornar papa, pois, devido à sua não-catholicidade, há uma "renúncia tácita" ao supremo pontificado.
Este cânone pode ser invocado para contestar a validade da eleição de uma pessoa que não é mais católica, mesmo desde a constituição de Pio XII. Pois Pio XII não anula de forma alguma o direito canônico, pelo contrário, ele explicitamente reafirma essas regras do direito eclesiástico em sua constituição. No entanto, poder-se-á objetar ainda que Pio XII fala do "verdadeiro papa" após a aceitação da eleição. Segundo Pio XII (Vacantis Apostolicae Sedis, § 100 e § 101), é necessário que a pessoa eleita pelo conclave aceite sua eleição. "Você aceita a eleição que acaba de ser feita canonicamente de sua pessoa como sumo pontífice? Este consentimento dado [...] faz imediatamente do eleito um VERDADEIRO papa e ele adquire por este fato e pode exercer uma plena e absoluta jurisdição sobre o universo inteiro". Certamente, mas analisemos mais profundamente! Pio XII diz claramente "a eleição que acabou de ser feita canonicamente".
Um homem não-católico é incapaz de receber o pontificado. De fato, a defeção na fé constitui automaticamente uma "renúncia tacitamente" a qualquer cargo eclesiástico (cânone 188, nº 4). Esta renúncia tácita impede a aceitação da eleição pelo eleito. Mesmo que ele aceite verbalmente sua eleição, essas palavras são invalidadas por sua não-catholicidade e ele não é papa de forma alguma. Este raciocínio é de lógica elementar: é impossível aceitar o pontificado enquanto ao mesmo tempo renuncia-se por ter abandonado a fé!
Que o cânone 188 possa e deva ser aplicado durante o conclave é claramente evidente nas "fontium annotatione" (veja a reprodução fotográfica na página seguinte, e também as reproduções maiores no Apêndice B). Essas "anotações" foram feitas pelo legislador para cada cânone, a fim de fornecer referências incontestáveis para uma interpretação correta da lei. Cada cânone inclui, ao pé da página, uma nota que serve como auxílio à interpretação. Ela indica várias "fontes" (ou "fontes", ou seja, textos doutrinários ou legislativos que devem ser usados como referência para entender o cânone em questão). No cânone 188 estão incluídas várias "fontes" doutrinais, incluindo os §§ 3 e 6 da bulle de Paulo IV, que tratam precisamente da eleição do sumo pontífice!
Aqui está a reprodução fotográfica de uma edição anotada do código de direito canônico, elaborado por São Pio X e promulgado por Bento XV em 27 de maio de 1917. Para uma melhor compreensão, adicionamos algumas explicações nas margens (consulte também o Apêndice B no final de nosso trabalho).
Fac-símile da página 47 do Codex Iuris Canonici. Promulgado pela autoridade de São Pio X, Pontífice Máximo, e elaborado sob a autoridade de Bento XV, com uma introdução, anotação de fontes e um índice analítico-alfabético aumentado pelo mesmo Cardeal Gasparri, Tipis Polyglottis Vaticanis, Roma 1918.
Tudo se relaciona: Pio XII faz referência ao direito canônico, e o direito canônico, por sua vez, faz referência à bulle de Paulo IV. Assim, o conclave DEVE observar as disposições dos §§ 3 e 6 da constituição Cum ex apostolatus de Paulo IV, sob pena de NULIDADE DA ELEIÇÃO!
Uma questão ainda resta a ser resolvida. Pio XII especificou claramente que nem mesmo a excomunhão de um eleito poderia invalidar a eleição.
"Nenhum cardeal pode ser excluído de qualquer maneira da eleição ativa e passiva do sumo pontífice sob o pretexto ou motivo de qualquer excomunhão, suspensão, interdição ou outro impedimento eclesiástico. Nós suspendemos essas censuras apenas para esta eleição; elas manterão seus efeitos para todo o resto" (Pio XII: Vacantis Apostolicae Sedis, § 34).
Isso não significa que os hereges (excomungados segundo o cânone 2314) tenham se tornado elegíveis! Pois Pio XII de forma alguma escreveu:
"Nós autorizamos os hereges a se elegerem papa"!
Ele nunca escreveu algo semelhante. Ele simplesmente suspendeu toda excomunhão durante o tempo que dura o conclave.
Por que suspender toda excomunhão? É impossível que o papa tenha pensado nos hereges, pois os clérigos não-católicos são automaticamente destituídos de seu cargo (cânone 188) e não têm o direito de votar (cânone 167). Portanto, Pio XII estava apenas considerando os cardeais excomungados por algum delito que não seja heresia. De fato, pode-se ser não-herético, mas excomungado. Aqui estão alguns delitos punidos com excomunhão pelo direito canônico: tráfico de relíquias falsas (2326), violação do claustro monástico (2342), usurpação de bens da Igreja (2345), aborto (2350), etc. Suponhamos que um cardeal, por ganância, se envolveu no tráfico de relíquias falsas. Sua excomunhão é suspensa durante o conclave. Se ele for católico, esse cardeal é elegível.
Por outro lado, um homem não-católico permanece inelegível. Pois ele enfrenta um DUPLO obstáculo:
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sua excomunhão e
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sua não-catholicidade.
Certamente, Pio XII levanta (pelo tempo que durar o conclave) todas as excomunhões. Mas o homem herege, mesmo que não esteja temporariamente excomungado, não faz parte dos candidatos papáveis, pois outro obstáculo, a cláusula de catholicidade, ainda é aplicável a ele.
Que Pio XII fosse muito apegado à cláusula de catholicidade é evidente para quem conhece bem este papa de santa memória. Podemos mencionar quatro indícios:
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Pio XII considerava "um patrimônio da Igreja" precioso, "constituído principalmente pela fé, que recentemente defendemos contra novos perigos" (discurso no primeiro congresso internacional dos religiosos, 8 de dezembro de 1950). Como poderia este papa, que valorizava a defesa do patrimônio da fé como a menina dos seus olhos, desejar ignorar o princípio da catholicidade durante a eleição pontifical?
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Este papa tinha tanta preocupação em manter a integridade da fé que passava horas e horas todos os dias atrás de sua máquina de escrever (não se deitava antes da uma da manhã) para expor a doutrina sã e refutar erros. Para suas pesquisas, Pio XII "tinha uma enorme biblioteca de manuais especializados, enciclopédias e resumos de ciências, totalizando mais de cinquenta mil volumes. Ele era assistido em suas pesquisas pelo Padre Hentrich e pelo sempre fiel Padre Robert Leiber, além de uma equipe improvisada de jesuítas bem-intencionados. Intransigente quanto à precisão, não hesitava em criticar seus auxiliares, verificando e re-verificando cada referência e citação. Um dia ele disse a um monsenhor: 'O papa tem o dever de fazer tudo melhor em todos os aspectos; outros podem ser perdoados por suas imperfeições, mas para o papa, nunca. Não!'" (John Cornwell: O Papa e Hitler. A história secreta de Pio XII, Paris 1999, p. 437). Como este "maníaco" da verdade, este inimigo implacável de qualquer erro, mesmo involuntário, poderia tolerar a ideia de que, após sua morte, alguém usasse seu nome para afirmar que ele teria autorizado um herege a se tornar papa?
- Este papa enriqueceu o missal, criando um ofício que não existia antes dele: o "comum dos papas". Naturalmente, a seita conciliar se apressou em suprimir este ofício. Por quê? Porque este ofício contém duas orações extraordinárias que constituem uma poderosa proteção para os católicos desejosos de permanecer integralmente católicos.
Aqui está o texto da secreta: "Munera quae tibi, Domine, laetantes offerimus, suscipe benignus, et praesta ut, intercedente beato N, Ecclesia tua et fidei integritate laetetur, et temporum tranquillitate semper exsultet" ("Aceitai com bondade, Senhor, os dons que alegremente vos oferecemos, para que, pela intercessão do bem-aventurado N., vossa Igreja se alegre na INTEGRIDADE DA FÉ e se regozije sempre na tranquilidade dos tempos").
Aqui está o texto da pós-comunhão: "Refectione sancta ellutritam gubema, quaesumus, Domine, tuam placatus Ecclesiam: ut potenti moderatione directa, et incrementa libertatis accipiat et in religionis integritate persistat" ("Ó Senhor, que aplacado governais vossa Igreja com a santificação do alimento sagrado, concedei-lhe, vos pedimos, que dirigida por vossa poderosa providência, ela receba o crescimento da liberdade e persista na INTEGRIDADE DA RELIGIÃO").
Isso é o que o Papa Pio XII desejava para o "comum dos pontífices": que eles perseverassem na fé católica integral e que a Santa Igreja conservasse a integridade da religião! Como ele poderia desejar abolir a cláusula de catholicidade que governa o conclave, já que esta cláusula é parte integrante da fé?
- Um ano antes de sua morte, Pio XII declarou: "Se um leigo fosse eleito papa, ele só poderia aceitar a eleição sob a condição de estar apto para receber a ordenação e estar disposto a ser ordenado; o poder de ensinar e governar, assim como o carisma da infalibilidade, ser-lhe-iam concedidos desde o momento de sua aceitação, mesmo antes de sua ordenação" (Discurso no segundo Congresso Mundial do Apostolado dos Leigos, 5 de outubro de 1957). Or nous avons vu plus haut que pour être apte à recevoir l’ordination, il faut être catholique (canon 985). Un non-catholique est inapte. Si l’élu du conclave n’est pas apte à recevoir l’ordination, dit Pie XII (5 octobre 1957, cité ci-dessus), il ne peut pas accepter le pontificat. Ainsi donc, PIE XII A CONFIRMÉ EXPRESSÉMENT LA CLAUSE DE CATHOLICITÉ EN 1957.
E lembremos que o mesmo Pio XII já havia confirmado a cláusula de catolicidade em 1945, ao exigir que a eleição fosse "canonicamente feita", ou seja, em conformidade com o cânone 188, que remete à bula de Paulo IV.
E o que diz o Santo Papa Pio X? Ele diz: "Após a eleição feita canonicamente..." Não, não é um erro de impressão. Esta frase é realmente dele! "Post electionem canonice factam consensus electi per cardinalem decanum nomine totius S. Collegii requiratur" (Santo Pio X: constituição Vacante Sede Apostolica, 25 de dezembro de 1904, § 87, com uma nota de referência ao Ceremoniale Romanum, livro 1, título 1, De conclavi et electione papae, § 34).
Resumamos a situação jurídica. Segundo o cânon 241, "estando vacante a Sé Apostólica, o sagrado colégio dos cardeais e a Cúria Romana não possuem outro poder senão aquele definido na constituição Vacante Sede Apostolica de 25 de dezembro de 1904 de Pio X". Santo Pio X concedeu aos cardeais o poder de eleger de maneira canônica o novo papa. Os cardeais não têm o poder de eleger de maneira não canônica um não-católico. Uma tal eleição feita não canonicamente constitui um abuso de poder, que torna o conclave juridicamente nulo e inválido.
Nota bene: Os haereticis ("hereges" = aqueles que contestam conscientemente a doutrina católica), assim como os errantes ("errantes" = aqueles que erram na fé por ignorância), são excluídos do pontificado pelo Papa Paulo IV. De fato, estão excluídos das eleições aqueles que "se desviaram da fé católica OU TAMBÉM (aut) caíram em alguma heresia".
Portanto, para contestar a eleição de tal ou qual candidato, basta constatar que ele "se desviou da fé", independentemente de ter desviado conscientemente ou por ignorância, e independentemente de ter recebido ou não um aviso de seus superiores (monição canônica individual). Se os escritos ou discursos do candidato contiverem um erro na fé, isso é suficiente para invalidar a eleição, pois a constituição Cum ex apostolatus torna inelegíveis não apenas os hereges formais, mas também aqueles que se desviam da fé por ignorância do magistério. Um único erro na fé - involuntário ou voluntário - e a eleição é nula "por si mesma, sem que seja necessário qualquer outra declaração posterior" (Cum ex apostolatus, § 6).
Para aqueles que se interessam, realizamos um estudo que define o que é um homem "herege", explica o que constitui "pertinácia" e prova que Roncalli, Montini, Luciani, Wojtyla são "pertinazes" (consultar o anexo C).
Conclusão
Os não-católicos são inelegíveis por cinco razões:
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Existe uma "lei divina", ou seja, enraizada nas Escrituras. De acordo com as Escrituras, nenhum não-católico pode se tornar (Mateus XVI, 15) ou permanecer (Tito III, 10-11 e João 10-11) o líder dos católicos. Uma lei de direito divino obriga independentemente do direito eclesiástico (como especificado no cânone 6, nº 6).
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Os não-católicos são excluídos do clero e dos cargos eclesiásticos não apenas pelas Escrituras, mas também pela Tradição (Santos Cipriano, Agostinho, Tomás, etc.).
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A cláusula de catolicidade foi definida ex cathedra por um pontífice romano (Paulo IV, 1559). De acordo com o Vaticano I (Pastor aeternus, cap. 4), tal definição é "irreformável por si mesma, e não em virtude do consentimento da Igreja"; se alguém ousar afirmar o contrário, "seja anátema".
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O texto de Paulo IV não apenas está implicitamente contido, mas também é citado explicitamente no Codex iuris canonici, não apenas uma vez, mas em QUINZE lugares diferentes.
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O regulamento que rege os conclaves, redigido por Pio XII em 1945, estabelece que a eleição deve ser "canonicamente feita" (= de acordo com o direito canônico) para ser válida.
Aquele que se desvia da fé não é papável: esta é a lei católica. Agora, façamos a aplicação prática desta lei.
Resumo: aqueles que se desviaram da fé católica antes de sua eleição não são elegíveis para serem Papa.
ÚLTIMA OBJEÇÃO, POUCA SERIEDADE: Pio XII não menciona explicitamente os hereges como sendo inelegíveis. Portanto, eles seriam elegíveis.
@ Um pouco de humor... A título de piada, observemos que Pio XII também não menciona que o eleito deva obrigatoriamente ser um ser humano. Por que então excluir do conclave os animais? Deus não falou através da boca de um jumento (Números XXII, 28-30)? E um doutor da Igreja não retomou esta anedota em um tratado especializado sobre a questão do Papa (!) (São Roberto Belarmino: De romano pontifice, livro IV, capítulo 6)? E o primeiro Papa (!) não elogiou a pregação deste jumento (2. Pedro II, 15-16)? Além disso, uma mula não ensinou o dogma da presença real de Nosso Senhor na Eucaristia ao se ajoelhar diante da hóstia, seguindo a instrução de Santo Antônio de Pádua? Peixes não ergueram suas cabeças fora d'água para ouvir um sermão deste mesmo santo? E o historiador Suetônio não relata que o imperador romano Calígula nomeou seu cavalo como cônsul? Se os animais são capazes de falar, de defender o dogma contra os incrédulos, de apreciar a sã doutrina de um bom pregador e de governar um vasto império, por que seriam excluídos das eleições para o pontificado supremo? Já que a constituição Vacantis Apostolicae Sedis de Pio XII não exclui os animais do conclave, isso deve ser permitido. Q.E.D.
Uma brincadeira duvidosa, deslocada ao abordar um assunto tão grave? Digamos apenas que nossa piada tinha como objetivo levar até o absurdo a lógica daqueles que afirmam que os hereges são elegíveis, porque Pio XII não teria estipulado nada a respeito deles em Vacantis Apostolicae Sedis.
RONCALLI, MONTINI, LUCIANI E WOJTYLA DESVIARAM-SE DA FÉ ANTES DE SUA ELEIÇÃO?
A. O juramento de São Pio X traído
B. Aplicação prática da lei a Angelo Roncalli
C. Aplicação prática da lei a Giovanni Battista Montini
D. Aplicação prática da lei a Albino Luciani
E. Aplicação prática da lei a Karol Wojtyla
Conclusão do capítulo
A. O juramento antimodernista de São Pio X traído
Para combater os hereges modernos (chamados "modernistas"), o Papa São Pio X instituiu todo um programa de luta: vigilância nos seminários, censura de livros e periódicos, conselhos diocesanos de vigilância, e o juramento antimodernista (São Pio X: motu proprio Sacrorum antistitum, 1º de setembro de 1910).
A resposta dos modernistas não demorou: após a morte deste santo Papa, espalharam o boato de que suas prescrições contra o modernismo não teriam mais valor, pois não teriam sido incorporadas no novo código de direito canônico, promulgado em 1917 por seu sucessor, Bento XV. O novo Papa desfez a manobra desleal dos modernistas ao publicar um esclarecimento.
"As prescrições acima mencionadas [de Pascendi e de Sacrorum antistitum], dadas por causa das serpentes contidas nos erros modernistas, são, por sua natureza, temporárias e transitórias, e não puderam, por essa razão, ser integradas no código de direito canônico. Por outro lado, enquanto o vírus do modernismo não cessar completamente de existir, elas devem manter sua plena força [de lei], até que o Sé Apostólico decida de outra forma" (decreto do Santo Ofício sobre os conselhos de vigilância e o juramento antimodernista, aprovado e confirmado pelo Papa Bento XV "por sua autoridade suprema", dado em Roma em 22 de março de 1918, in: Acta Apostolicae Sedis, Roma 1918, p. 136).
De acordo com as prescrições de São Pio X (Sacrorum antistitum), todo homem deve prestar um "juramento antimodernista" antes de se tornar clérigo, ou antes de assumir uma cátedra de ensino ou um cargo eclesiástico. E o que diz esse juramento? "Eu, N..., abraço e recebo firmemente todas e cada uma das verdades que foram definidas, afirmadas e declaradas pelo magistério infalível da Igreja, principalmente os princípios de doutrina que são diretamente contrários aos erros deste tempo". Assim, todo padre é esperado estar familiarizado com os escritos pontifícios dirigidos contra o liberalismo: Mirari vos, o Syllabus, e muitos outros documentos hoje colocados de lado. Além disso, o futuro clérigo ainda deve jurar: "Também me submeto, com a devida reverência, e adiro de todo o coração a todas as condenações, declarações, prescrições encontradas na encíclica Pascendi e no decreto Lamentabili". Portanto, todo padre é esperado conhecer esses dois escritos antimodernistas do santo Papa Pio X.
São Pio X (motu proprio Sacrorum antistitum, 1º de setembro de 1910) obrigou todos os clérigos a recitar o juramento. E acrescentou esta frase: "No entanto, se alguém - o que, Deus não permita! - tiver a audácia de violar este juramento, que seja imediatamente encaminhado (illico) ao tribunal do Santo Ofício". E, como todos sabem, os inquisidores do Santo Ofício têm o dever de identificar e punir os hereges!
Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla não puderam se esquivar desta obrigação de prestar o juramento antimodernista. Isso PROVA INEQUIVOCAMENTE que eles conheciam, portanto, todos os textos pontifícios antiliberais e antimodernistas. Foi com pleno conhecimento de causa que eles desobedeceram voluntariamente e gravemente ao magistério da Igreja Católica, através de todas as reformas que empreenderam ao assumirem o poder, assim como por sua doutrina liberal e modernista, pregada do alto da cátedra de São Pedro, que se tornou uma cátedra de pestilência.
São Pio X, em sua encíclica Pascendi de 8 de setembro de 1907, denunciou veementemente os modernistas hereges e seu programa de reforma: "Que releguem a filosofia escolástica [...] entre os sistemas obsoletos, e que ensinem aos jovens seminaristas a filosofia moderna, a única verdadeira, a única adequada ao nosso tempo [...]. Que nos catecismos não se insira mais, em matéria de dogmas, senão aqueles que tenham sido reformados e que sejam compreensíveis pelo vulgo. No que diz respeito ao culto, que se diminua o número das devoções exteriores [...]. Que o governo eclesiástico seja reformado em todas as suas partes, especialmente na disciplinar e dogmática. Que seu espírito, seus métodos externos se harmonizem com a consciência, que se inclina para a democracia [...]. Reforma das congregações romanas, especialmente as do Santo Ofício e do Índice. Que o poder eclesiástico mude 'de linha de conduta no terreno social e político'. Todo este programa de demolição dos modernistas, denunciado por São Pio X, foi no entanto realizado meio século mais tarde, pelos hereges do Concílio. Montini teve até a audácia, em 1967, de suprimir o juramento!
Estas palavras de São Pio X são mais atuais do que nunca: "Não lutamos mais, como no início, com sofistas que se apresentam cobertos de peles de ovelha, mas com inimigos declarados e cruéis, inimigos de dentro, que, tendo feito um pacto com os piores inimigos da Igreja, se propõem à destruição da fé. Falamos desses homens que, todos os dias, se levantam audaciosamente contra a sabedoria que nos vem do céu: arrogam-se o direito de reformá-la, como se estivesse corrompida; pretendem renová-la, como se o tempo a tivesse tornado obsoleta; desejam aumentar seu desenvolvimento e adaptá-la aos caprichos, ao progresso e às conveniências do século, como se ela fosse contrária não apenas à leviandade de alguns, mas ao próprio bem da sociedade" (Sacrorum antistitum).
Segundo São Pio X (Pascendi), os modernistas são "os piores inimigos da Igreja". E segundo este mesmo santo Papa, o modernismo é "o esgoto coletor de todas as heresias" (motu proprio Praestantia, 18 de novembro de 1907).
Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla estão completamente imersos nesta cloaca maxima que é o modernismo. Eles são verdadeiramente hereges, uma vez que perjuraram seu juramento. Seu programa de demolição da Igreja Católica é herético do começo ao fim. Como eles prestaram o juramento antimodernista, é absolutamente certo que eles conhecem a doutrina católica. Sua pertinácia está assim comprovada. Portanto, eles são indiscutivelmente hereges formais. Como perjuros que violaram seu juramento antimodernista, deveriam ter sido levados perante o Santo Ofício da Inquisição da perversidade herética, conforme as diretrizes de São Pio X. Que nenhum clérigo tenha tido a ideia (ou a coragem) de denunciá-los ao Santo Ofício faz parte do "mistério da iniquidade".
De qualquer forma, devemos lembrar: Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla são modernistas, ou seja, hereges da pior espécie. No entanto, um papa (como amplamente demonstrado na primeira parte) nunca cairá em heresia. Portanto, desde o início, eles nunca foram papas. Sua eleição deve ter sido inválida, pois se tivessem sido eleitos validamente, o carisma da infalibilidade os teria preservado de cair nos esgotos da heresia modernista.
Este raciocínio é confirmado pelos fatos: basta examinar um pouco a biografia desses perjuros para descobrir que eles já haviam se desviado da fé antes de sua eleição para o (pseudo) pontificado supremo.
A lei de Paulo IV, retomada por São Pio V, São Pio X e Pio XII, certamente se aplica a eles.
[1] A noção de "pertinácia" é estudada detalhadamente no apêndice C.
B. Aplicação prática da lei a Angelo Roncalli
Roncalli foi iniciado em uma seita gnóstica na Turquia em 1935 (Pier Carpi: As Profecias do Papa João XXIII, Roma 1976; tradução francesa Paris 1976, depois 1978). Ele entrou para a maçonaria quando era núncio em Paris (informação fornecida pelo padre Mouraux em sua revista Bonum Certamen; o padre Mouraux tinha um paroquiano cujo irmão estava inscrito na mesma loja que Roncalli).
Antes de sua eleição, Roncalli recebeu do poder oculto a previsão de que se tornaria papa, bem como as instruções para governar a Igreja conforme os pontos de vista das lojas maçônicas, especialmente convocando um concílio. O boletim ocultista Os Ecos do Sobrenatural de fato publicou o testemunho de Gaston Bardet, autor de vários livros pseudo-místicos, para não dizer luciferianos. Seu nome de iniciação é "Jean de la Joie". Ele é martinista. Saint-Martin, maçom do século XVIII, financiou a Revolução Francesa e fundou sua própria seita luciferiana, a dos "martinistas". Aqui está o testemunho de Gaston Bardet: "Em relação ao concílio, escrevi ao cardeal Roncalli (ex-núncio em Paris, do qual eu era conselheiro) em 14 de agosto de 1954, para anunciar sua futura eleição [para o papado] e pedir um encontro durante as férias em seu país natal para estudar seu primeiro trabalho [...]: o Concílio. E eu esclareci: 'Você gostaria de refletir sobre tudo isso, pois não haverá tempo para hesitar. Assim que subir ao trono pontifício, o plano deve ser executado imediatamente e surpreender todos os políticos'" (Os Ecos do Sobrenatural, dezembro de 1961 / janeiro de 1962, in: Latour, Loubier e Alexandre: Quem ocupa o trono de Pedro?, Villegenon 1984, p. 17). Quatro anos antes da morte de Pio XII, a maçonaria já havia designado seu sucessor e lhe atribuído seu primeiro trabalho: convocar um concílio revolucionário, guiado pelas lojas maçônicas!
Desde o início do século XX, houve adeptos do (falso) ecumenismo. "Esse movimento começou na Igreja Católica com uma tentativa de reforma litúrgica às vésperas da Primeira Guerra Mundial por um monge belga, Dom Lambert Beauduin. No entanto, aos poucos suas iniciativas começaram a colidir com a ortodoxia romana, e o Papa Pio XI não demorou a reagir, condenando essa tentativa em sua encíclica Mortalium animos em 1928. Infelizmente, apesar dessa censura e de sucessivos exílios, Dom Lambert Beauduin continuou a trabalhar nas sombras. Desde 1924, ele havia desenvolvido uma amizade fiel com Monsenhor Roncalli, que havia ingressado na diplomacia após perder, devido ao seu modernismo, sua cátedra no Ateneu Lateranense. Ao saber da morte de Pio XII, o idoso Dom Lambert, então com 85 anos, confidenciou ao Padre Bouyer (L. Bouyer: Dom L. Beauduin, um homem da Igreja, Casterman, 1964, p. 180): 'Se eles elegerem Roncalli, tudo estará salvo; ele será capaz de convocar um concílio e consagrar o ecumenismo'. As ideias do reformador haviam conquistado o coração do futuro papa. João XXIII declararia um dia (Bouyer, p. 135): 'O método de Dom Lambert Beauduin é o correto'" (Padre Daniel Le Roux: Pedro, tu me amas? João Paulo II: Papa da Tradição ou Papa da Revolução?, Escurolles 1988, p. 36).
Depois de (invalidamente) eleito, Roncalli proclamou que a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) era um "passo e avanço para o estabelecimento de uma ordem jurídica e política para todos os povos existentes no mundo". Ele fez uma lista interminável de direitos (vestuário, alimentação, descanso etc.), e acrescentou o direito "à liberdade na busca da verdade e, com a salvaguarda das exigências da ordem moral e do bem comum, o direito de poder expressar e divulgar sua opinião". A religião foi mencionada por último, indicando que era o elemento menos importante aos seus olhos. Além disso, ele nem sequer reivindicou o direito dos católicos de viver em um Estado católico, mas sim o ímpio direito dos hereges de professar sua heresia. "Deve-se também contar entre os direitos do homem que cada um possa honrar a Deus de acordo com a justa regra da consciência e professar sua religião na vida privada e pública" (encíclica Pacem in terris, 11 de abril de 1963). Roncalli fez entregar um exemplar de sua encíclica à ONU, em sinal de solidariedade. Assim, ele contradisse a posição papal, varrendo com essas poucas linhas duzentos anos de advertências pontifícias contra os princípios da revolução. Quando a ONU adotou a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), o Vaticano protestou (Osservatore Romano, 15 de outubro de 1948). Mas Roncalli chegou, e A MAÇONARIA SENTOU NO TRONO DE PEDRO.
A culminância do "mistério da iniquidade": este maçom foi "beatificado" (?) em 3 de setembro de 2000!
C. Aplicação prática da lei a Giovanni Battista Montini
Nos anos 1970, o príncipe Scotersco, ao retornar de Roma a Paris, revelou que possuía provas formais de que Montini era maçom. Ele foi assassinado naquela semana e seus documentos desapareceram.
Winckler revelou que o sobrinho de Rampolla havia formado um grupo de cardeais que esperava "ter sucesso com Montini onde Rampolla havia falhado" e que Montini era um agente dos judeus (Winckler conseguiu se infiltrar nesse grupo de traidores porque erroneamente o consideravam um marrano; testemunho em Latour, Loubier e Alexandre: Quem Ocupa a Cátedra de Pedro?, Villegenon 1984, p. 61-62).
Montini adotou a teologia panteísta de Teilhard de Chardin, teologia que foi colocada no Índice sob o Papa Pio XII. Montini, antes de sua (inválida) elevação ao (pseudo) pontificado soberano, fez observações singulares em um discurso em Turim: "O homem moderno não chegará um dia, à medida que seus estudos científicos progredirem e descobrirem leis e realidades ocultas por trás do rosto silencioso da matéria, a ouvir a voz maravilhosa do espírito que pulsa nela [heresia panteísta, popularizada na década de 1950 por Teilhard de Chardin]? Não será essa a religião do futuro? Einstein ele mesmo vislumbrou a espontaneidade de uma religião do universo. Ou talvez não seja essa, hoje, a minha religião?" (Documentation catholique 1960, páginas 764-765). Montini assim deixou entrever que o panteísmo evolucionista já era sua religião pessoal. Não é desinteressante notar que essa "religião do universo" inspirará o missal montiniano: "Bendito sejas, Deus do universo". E quem é esse "Deus do universo"? A resposta a essa pergunta será fornecida no capítulo 13...
O amigo e mentor de Montini foi o filósofo herege Jacques Maritain, falecido em 1973. Maritain escreveu: "À cristandade medieval de tipo sacral e teocrático [...] deve suceder hoje uma nova cristandade caracterizada [...] pela emancipação recíproca do temporal e do espiritual, e pelo pluralismo religioso e cultural da cidade". Maritain é conhecido como o pai da liberdade religiosa do Concílio Vaticano II. Ele foi antecipadamente condenado, por exemplo, por Leão XIII (encíclica Longinqua oceani, 6 de janeiro de 1895).
D. Aplicação prática da lei a Albino Luciani
Luciani era um defensor da pílula contraceptiva (mesmo após a publicação da Humanae Vitae de Montini). Ele lutou contra a Missa de São Pio V em seu próprio diocese. Escreveu um artigo contra Monsenhor Lefebvre, onde defendia a liberdade religiosa, apoiava a nova missa e se tornava apóstolo do pluralismo, do ecumenismo e do diálogo; ele chamava essas três ideias de "as palavras mais sagradas". Em sua conclusão, comparou Monsenhor Lefebvre a um discípulo de Voltaire, que dizia: "O papa é uma pessoa sagrada; então beijemos seus pés, mas amarremos suas mãos". [1].
Logo após sua elevação ao (pseudo) pontificado, ele recomendou aos educadores as obras do maçom italiano Carducci, autor do infame Hino a Satanás. Em 1910, Monsenhor Delassus (La conjuration antichrétienne) lamentou que alguns educadores católicos tivessem sido seduzidos pelos escritos de Carducci; em 1978, os educadores católicos foram apresentados a esses mesmos escritos como modelo a ser seguido! O discurso de Luciani, publicado no Osservatore Romano, causou escândalo. Alguns chegaram a questionar se ele próprio não seria maçom.
[1] Albino Luciani: "Lefebvre como Voltaire", em: Il Gazzettino di Venezia, junho de 1977. A citação que Luciani faz é aproximada, pois Voltaire (Le sottisier, "soberania real dos papas") escreveu textualmente: "O papa é um ídolo a quem se amarram as mãos e se beijam os pés".
E. Aplicação prática da lei a Karol Wojtyla
Quando Wojtyla chegou a Nancy, o prefeito, que era maçom, o recebeu conferindo-lhe a qualidade de maçom (testemunho do padre Mouraux, residente em Nancy).
O jovem Wojtyla foi influenciado pela teosofia. Em Wadowice, ele encontrou Mieczyslav Kotlarczyk, diretor e teórico de teatro, e foi iniciado em uma dramaturgia esotérica. Kotlarczyk era adepto do ocultismo. "Sobre a relação entre palavras e coisas, Kotlarczyk leu e meditou textos da tradição teosófica (de Helena Petrovna Blavatsky), de fonética e linguística (Otto Jespersen), da tradição hebraica (Ismar Elbogen), fundindo tudo em uma síntese totalmente pessoal. Annie Besant e Rudolf Steiner foram sucessores de Madame Blavatsky na liderança da sociedade teosófica. O cristianismo de Steiner era um cristianismo 'cósmico', não dogmático e, claro, evolucionista. Incluía uma iniciação à magia ocultista que conectava seus adeptos com 'forças', permitindo o exercício do 'pensamento fora do corpo'. Os meios de difusão do steinerianismo eram e ainda são o teatro, a dança, etc." (Le Roux: Pierre m'aimes-tu?, p. 63). Wojtyla escreveu um prefácio para um livro de Kotlarczyk e pregou em seu funeral.
Wojtyla descrevia a atmosfera na qual trabalhava como ator da seguinte forma: "Era uma missão, uma vocação; era o sacerdócio da arte. Os atores, como 'sacerdotes da arte', dotados de uma força ilimitada para renovar o mundo, para refazer toda a humanidade, para curar a moral através da beleza pregada, transmitiam os mais altos valores metafísicos. Essas eram as ideias cantadas pelo 'arcipreste' Kotlarczyk" (em: ibidem, p. 64). O vocabulário utilizado - "força ilimitada, sacerdotes da arte, renovar o mundo, curar a moral" - não é muito católico...
§No momento do Vaticano II, Wojtyla tornou-se apóstolo da ideologia das lojas maçônicas, o que lhe valeu aplausos da maçonaria. "É preciso aceitar o perigo do erro. Não se abraça a verdade sem ter certa experiência do erro. Portanto, é necessário falar do direito de procurar e errar. Reivindico a liberdade para conquistar a verdade" (terceira sessão do conciliábulo Vaticano II, in: Bulletin du Grand Orient de France, nº 48; novembro/dezembro de 1964).
Quando estava à frente da arquidiocese de Cracóvia, Wojtyla visitou Taizé duas vezes. Ele convidou o irmão Roger para pregar diante de 200.000 trabalhadores da mina (Le Monde, 7 de outubro de 1986). Em Kroscienko, aos pés dos Cárpatos, ele demonstrou sua simpatia pelo movimento "Oasis", a "Taizé polonesa" (Témoignage chrétien, 28 de maio de 1979). Tornando-se pseudo-papa, ele visitou Taizé no início de outubro de 1986: "Passamos por Taizé como passamos perto de uma fonte".
Durante o retiro que Wojtyla pregou diante de Montini e seus colaboradores em 1976, intitulado O sinal da contradição, ele definiu assim a "função real" que Jesus reivindicou diante de Pilatos: "A função real - munus regale - não é principalmente o direito de exercer autoridade sobre os outros, mas de revelar a realeza do homem. Esta realeza está inscrita na natureza humana, na estrutura da pessoa" (Karol Wojtyla: O sinal da contradição, Paris 1979, p. 176). Em suma, todos os homens são reis - exceto Jesus!
Aqui está a tradução para o português:
Em 1969, Wojtyla publicou, em polonês, um livro herético que depois foi traduzido para o francês: Pessoa e Ato.
Para Wojtyla, "o homem se realiza como pessoa" e é "cada ato que representa um cumprimento da pessoa". A norma para realizar um ato é a "norma de sua subjetividade pessoal". Portanto, não importa o ato, as noções de bem e mal são iguais. Todo ato é bom, desde que seja realizado.
Wojtyla vai além: a transcendência, a liberdade e a verdade não estão mais fora do homem: agora são os próprios atos do homem que tornam possível a transcendência e a liberdade, e que estabelecem a norma da verdade. "A pessoa é transcendente por sua própria ação, porque é livre". A escolha do ato marca a liberdade. E a verdade consiste em se realizar, ou seja, em existir realizando atos de acordo com seus próprios valores. "O poder normativo da verdade encontra sua explicação no dever", que "consiste em se realizar a si mesmo".
Assim, para Wojtyla, o propósito na terra e a felicidade consistem em se realizar: "Realizar-se, se realizar e ser feliz é quase a mesma coisa".
Deus é praticamente ausente nesta obra, ou apenas marginalmente presente. O paraíso não interessa ao autor. O homem pode prescindir de Deus, seu criador, pois se compreende como criador, porque "o homem se cria através do ato".
Essa concepção wojtyliana do homem se encaixa perfeitamente em um movimento filosófico moderno chamado "existencialismo". O existencialismo foi explicitamente condenado por Pio XII (encíclica Humani generis, 12 de agosto de 1950).
Em 1972, Wojtyla publicou um vade-mécum do Vaticano II para os fiéis poloneses (traduzido para o francês em 1981: Nas Fontes da Renovação). O autor nega um artigo da fé católica.
Wojtyla é assim "pego em flagrante" (cf. a bula de Paulo IV) por ter desviado da fé antes de sua eleição.
Wojtyla negou um artigo do credo antes de sua eleição, o da unidade da Igreja. Primeiramente, a doutrina sólida: "A Igreja é constituída na unidade por sua própria natureza. Ela é UNA, embora as heresias tentem dividi-la em várias seitas" (São Clemente de Alexandria: Stromates VII, 17). A unidade existe na Igreja Católica. Os hereges e cismáticos devem se unir à unidade existente, convertendo-se ao catolicismo.
Segundo Wojtyla, porém, a unidade da Igreja foi perdida. Católicos, "irmãos separados" (= protestantes hereges) e "ortodoxos" (= gregos cismáticos e hereges) devem reconstruir juntos uma unidade que não mais existe. "A Igreja [está atualmente] dividida pelos homens", mas "os homens, com a ajuda da graça e apesar das divisões atuais e antigas, alcançarão um dia essa unidade que é a da Igreja no pensamento e na vontade de Cristo: 'Por uma humilde oração, devemos pedir perdão a Deus e aos irmãos separados, assim como perdoamos àqueles que nos ofenderam'" (Vaticano II: Unitatis redintegratio, § 7) (Karol Wojtyla: Nas Fontes da Renovação, Paris 1981, p. 261). Portanto, os católicos também seriam culpados de cisma, pois deveriam pedir perdão a Deus por terem pecado contra a unidade.
Mesma linha após sua eleição (inválida): "Estamos caminhando para a unidade que caracterizava a Igreja apostólica em seus primórdios, e que buscamos" (encíclica Ut unum sint, 25 de maio de 1995). "A divisão dos cristãos está em contradição com a verdade que eles têm a missão de defender" (ibidem). "Não há dúvida de que o Espírito Santo age nesta obra de 'recomposição da unidade dos cristãos'" (ibidem).
Em 12 de março de 2000, diante do mundo inteiro, Wojtyla pediu perdão por todos os pecados da Igreja Católica, incluindo o de ser responsável pela perda da unidade. Etchegaray, presidente do comitê do pseudo-jubileu do ano 2000, rezou assim: "Oremos para que o reconhecimento dos pecados que romperam a unidade do corpo de Cristo e feriram a caridade fraterna abra caminho para a reconciliação e a comunhão de todos os cristãos". Wojtyla continuou imediatamente: "Pai misericordioso, na véspera de sua paixão, teu Filho rezou pela unidade daqueles que creem nele, mas, contra sua vontade, eles se opuseram e se dividiram, se condenaram mutuamente e lutaram uns contra os outros. Invocamos com força o teu perdão e te pedimos para nos dar um coração arrependido, para que todos os cristãos, reconciliados contigo e entre si, formando um único corpo e um único espírito, possam reviver a alegre experiência da plena comunhão" (em: La Croix, 13 de março de 2000).
No dia de sua ordenação, Karol Wojtyla (assim como Roncalli, Montini e Luciani) pronunciou este juramento antimodernista (imposto por São Pio X a todos os padres): "A fé não é um sentimento religioso cego, surgindo das profundezas sombrias do subconsciente moralmente informado sob a pressão do coração e o impulso da vontade". Com seu juramento antimodernista, Wojtyla comprometeu-se a não substituir o depósito da fé "por uma criação da consciência humana, que se formou gradualmente pelo esforço dos homens".
No entanto, este juramento foi uma mentira, porque, na verdade, Wojtyla tinha uma concepção diametralmente oposta da fé, como ele confidenciou a seu amigo Frossard: "Nunca considerei minha fé como 'tradicional' [...] Ao considerar objetivamente minha própria fé, sempre constatei que ela não tinha nada a ver com qualquer conformismo, que nasceu nas profundezas do meu próprio 'eu', que também era fruto dos esforços de minha mente buscando uma resposta para os mistérios do homem e do mundo" (em: André Frossard: Não Tenhais Medo, Paris 1982, p. 40-41).
A fé é um dom de Deus, pelo qual aderimos firmemente às verdades do catecismo. No entanto, Wojtyla, como bom maçom, rejeita o que ele chama de "verdades prontas". Ele disse a seu amigo Frossard: "A fé não constrange a inteligência, não a submete a um sistema de verdades prontas" (em: Frossard, p. 63). Isso está em completo oposto ao juramento antimodernista, segundo o qual a fé "é um verdadeiro assentimento da inteligência à verdade recebida de fora pela audição".
"Diga-me quem você admira, e eu direi quem você é.
"Teólogos tão eminentes como Henri de Lubac, Y. Daniélou, Y. Congar, H. Küng, R. Lombardi, Karl Ralmer e outros desempenharam um papel extraordinário nesses trabalhos preparatórios" do conciliábulo do Vaticano II (Wojtyla: entrevista em 1963 com o Padre Malinski: Meu Amigo Kami Wojtyla, Paris 1980, p. 189). Todos os teólogos mais escandalosos não só são elogiados por Wojtyla, mas às vezes são elevados ao (pseudo) cardinalato por ele. Resumimos brevemente as teses de todos esses teólogos, que Wojtyla tanto aprecia.
BALTHASAR afirma que o inferno está vazio.
Hans Urs von Balthasar, que o Le Monde de 20 de outubro de 1981 qualificou como "mentor de João Paulo II", foi criado cardeal em 28 de junho de 1988.
CAMARA acredita que o marxismo é legítimo. O Evangelho é um fermento revolucionário. "Longe de rejeitar a socialização, devemos aderir a ela com alegria como uma forma de vida social mais adequada ao nosso tempo e mais conforme ao Evangelho". Marx está certo ao criticar a religião como sendo "o ópio do povo", porque "a Igreja apresenta aos párias um cristianismo passivo, alienado e alienante, verdadeiramente um ópio para as massas" (1968).
Em 15 de agosto de 1981, Wojtyla parabenizou Dom Helder Camara: "Tua alma de pastor contribui para nossa santificação. [...] Temos por ti um amor especial".
CONGAR, várias vezes exilado por Pio XII devido à sua heresia, jubila: "Fui agraciado. As grandes causas que tentei servir culminaram no concílio: renovação eclesiológica... reformismo, ecumenismo, leigos". "A Reforma nos supera em quatro séculos nas demandas do espírito moderno".
"Teólogo eminente" segundo Wojtyla (em: Malinski: Meu Amigo Karol Wojtyla, p. 189).
KÜNG nega todos os dogmas. Ele é tristemente famoso por seus ataques à divindade de Jesus e à infalibilidade pontifical.
"Teólogo eminente" segundo Wojtyla!
LUBAC faz uma confusão entre natural e sobrenatural. Cada homem é Deus: "Ao revelar o Pai e ser revelado por ele, Cristo completa a revelação do homem a si mesmo" (1938).
Lubac foi criado cardeal por Wojtyla em 2 de fevereiro de 1983. "Inclino minha cabeça diante do Padre Henri de Lubac, teólogo jesuíta que estava nos primeiros lugares, ao lado do Padre Congar, ambos tendo tido dificuldades com Roma antes do período conciliar" (Wojtyla na França, Le Monde, 3 de junho de 1980).
MARITAIN advoga pela separação entre Igreja e Estado: "À cidade medieval de tipo sacral e teocrático deve suceder hoje uma nova cristandade, caracterizada pela emancipação mútua do temporal e do espiritual, e pelo pluralismo religioso e cultural da cidade". Maritain acredita em uma anistia final obtida por Satanás.
Maritain foi amigo e mentor de Montini e Wojtyla. Maritain "sustentou que uma concepção justa da pessoa humana era a base necessária para qualquer estrutura social e política digna do homem" (Wojtyla para o centenário do nascimento de Maritain, 1983).
RAHNER acredita que cada homem é Deus: "Em minha essência, há Deus". Ele nega o privilégio da Imaculada Conceição, porque nega o pecado original. Esse dogma "não significa de maneira alguma que o nascimento de um ser seja acompanhado por algo contaminante, por uma mancha, e que para evitá-lo, Maria deveria ter tido um privilégio" (1968). Negação da transubstanciação e do inferno.
"Karl Rahner faleceu aos 80 anos. Entre as provas de estima, Rahner acabara de receber votos pessoais de João Paulo II" (Témoignage chrétien, 9 de abril de 1984).
KIERKEGAARD, HUSSERL E SCHELER batizaram sua filosofia de "existencialismo". Segundo esses filósofos, os Evangelhos não são históricos, mas um testemunho da Igreja. Os dogmas se tornam relativos e mutáveis. A Redenção não passa de uma vitória sobre a injustiça, o racismo, o fascismo. Cristo é apenas um homem exemplar. Os sacramentos são apenas símbolos, etc.
Wojtyla, embora sua tese de doutorado sobre "A possibilidade de fundamentar uma ética cristã com base filosófica em Max Scheler" tenha sido criticada por seus examinadores, faz constantes referências aos filósofos Kierkegaard, Husserl e Scheler.
QQuando Wojtyla foi eleito, um cardeal visitou Jean Guitton, amigo de Montini e... maçom. Jean Guitton estava preocupado: o sucessor de Montini iria questionar as conquistas maçônicas de seu antecessor? O cardeal o tranquilizou: "As pessoas são tão tolas que acreditam que basta ser polonês para ter fé!" (testemunho de Michèle Reboul, secretária de Jean Guitton que assistiu à conversa).
[1] A expressão usada por Le Roux é imprecisa, pois Steiner deixou a teosofia e fundou sua própria seita, que ele chamou de "antroposofia". O centro dos antropósofos está localizado em Dornach (Suíça), onde Steiner mandou construir um edifício de madeira chamado "Goetheanum", que foi destruído por um incêndio e substituído por um edifício de pedra. A "eurythmie" (uma forma de dança teatral esotérica) é um componente essencial da antroposofia.
Conclusão
Considerando que Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla desviaram da fé antes do conclave, sua eleição é inválida de acordo com o direito divino e o direito eclesiástico.
A Igreja já tomou uma decisão antecipada: "Por renúncia tácita admitida pelo próprio direito, qualquer ofício fica vago de fato e sem qualquer declaração, se o clérigo [...] 4° se afasta publicamente da fé católica" (cânone 188). Um renomado canonista comenta sobre a noção de "renúncia tácita" do cânone 188: "Sabe-se que ela é o efeito de uma presunção legal e nem precisa ser objeto de um julgamento declarativo" (Raoul Naz: Dictionnaire de droit canonique, Paris 1957, artigo "ofícios eclesiásticos").
A Igreja já tomou uma decisão ao promulgar uma lei chamada "irritante". O que significa "lei irritante"? A palavra vem do latim in-ratus, que significa não ratificado, nulo. Segundo o cânone 11, leis irritantes determinam que um ato é nulo. "Leis irritantes ou incapacitantes são aquelas que decidem explicitamente ou em termos equivalentes que um ato é nulo ou que uma pessoa é incapaz".
A Igreja já resolveu a "questão do papa", pois estabeleceu uma lei irritante, de acordo com a qual a eleição de um não-católico é automaticamente nula, já que o § 6 da lei eclesiástica Cum ex apostolatus torna inválidas "de fato, sem necessidade de qualquer outra declaração posterior", as eleições de Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla.
Este é o que os canonistas chamam de "nullitas latae sententiae plenissima", ou seja, um ato eleitoral nulo de pleno direito, sem qualquer intervenção posterior de um tribunal eclesiástico. Segundo o Dictionnaire de droit canonique (artigo "nullités"), "a nullitas latae sententiae plenissima anula o ato tanto no foro interno quanto no foro externo, na ausência de qualquer sentença judicial". Este dicionário especifica que qualquer pessoa simples (até mesmo um leigo) está autorizada a constatar essa nulidade e agir conforme necessário. As eleições de Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla SÃO nulas desde já; qualquer católico está autorizado a tornar este fato conhecido.
É até mesmo um dever proclamar a invalidez dessas eleições. Pois o Papa Paulo IV redigiu uma "constituição" à qual todo católico deve obedecer sob pena de pecado. Segundo Santo Tomás de Aquino, de fato, "a ignorância da lei não desculpa. Ora, a constituição do papa estabelece a lei. Portanto, aquele que faz algo contra a constituição do papa por ignorância é inescusável. [...] A ignorância é um pecado, quando se ignora algo que se pode e deve saber; todos são obrigados a conhecer a constituição do papa. Se alguém a ignora por negligência, não está isento de culpa se age contra a constituição" (Santo Tomás de Aquino: Quaestiones quodlibetales, n.º 1, q. 9, a. 3).
A constituição de Paulo IV é indubitavelmente um "ato do Santo Sé". Portanto, de acordo com o cânone 2333, a oposição direta para impedir a execução dos atos do Santo Sé é um crime punível com excomunhão.
Aqueles que se opõem à constituição de Paulo IV incorrem ipso facto em uma maldição divina (Cum ex apostolatus, § 10).
Resumo: Visto que Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla desviaram da fé antes do conclave, sua eleição é inválida de acordo com a lei divina e a legislação eclesiástica vigente.
O TRONO PAPAL PODE SUBSISTIR TEMPORARIAMENTE SEM PAPA?
- A ausência de papa
- Conclusão do capítulo
Ausência de Papa
Desde a morte de Pio XII, não há mais um papa. Este fato não é de modo algum incompatível com a noção de "visibilidade" da Igreja, pois o Trono Pontifício e a Igreja Católica podem subsistir temporariamente sem um papa. A Igreja visível às vezes possui um papa, às vezes está sem papa. A vacância do Trono Apostólico é um fenômeno completamente normal, que ocorreu mais de 250 vezes na história da Igreja. A cada morte de um papa, o Trono Apostólico permanece vago por alguns meses, às vezes anos. Se a vacância do Trono Apostólico fosse contrária à visibilidade da Igreja, a Igreja teria desaparecido e ressuscitado mais de 250 vezes desde sua fundação! Quem defenderia tal absurdo?
A Igreja Católica e o Trono Apostólico são pessoas jurídicas (cânone 100). Uma pessoa jurídica de direito eclesiástico é de natureza perpétua (cânone 102). Por ser de natureza perpétua, a Igreja Católica não pode desaparecer, mesmo que temporariamente privada de um papa.
"Mesmo que vários meses ou anos se passem sem eleger um novo papa, ou mesmo que antipapas surjam, como aconteceu algumas vezes, o intervalo não destruirá de forma alguma a sucessão, porque então o clero e o corpo dos bispos sempre subsistem na Igreja com a intenção de eleger um sucessor para o papa falecido assim que as circunstâncias o permitirem" (Padre Barbier: Les trésors de Cornelius a Lapide..., Paris 1856, l. J, p. 724 - 725).
São Pio X previu a possibilidade de vacância do Trono, e previu tão bem que promulgou um regulamento completo para essa situação (constituição Vacante Sede Apostolica, 25 de dezembro de 1904). Além disso, ele até criou um cânone específico para essa circunstância. "Com o Trono Apostólico vago, o sagrado colégio dos cardeais e a cúria romana não têm outro poder além do definido na constituição Vacante Sede Apostolica de 25 de dezembro de 1904 de Pio X" (cânone 241).
Certamente! Aqui está a tradução para o português:
"Este santo pontífice até previu que a Sé Apostólica possa ser ocupada por um usurpador! Eis o que ele decretou a esse respeito: 'Quando um cargo eclesiástico está vago de direito, mas ainda ocupado ilegitimamente, pode ser conferido a outro, desde que, segundo o costume dos santos cânones, sua ocupação seja declarada ilegítima; e essa declaração deve ser mencionada no ato da nomeação' (cânone 151).
Outro santo Papa que se preocupou com a vacância da Sé Apostólica foi São Pio V. Este Papa também considerou não ser de modo algum impossível que a Sé se torne um dia vaga. Ele também regulou essa eventualidade, não administrativamente, mas liturgicamente. No missal do altar, no início, estão as instruções sobre como celebrar a missa. É bem especificado que - devemos dizer? ORDENADO! - em caso de vacância da Sé Apostólica, o celebrante deve omitir a menção do Papa no cânone da missa ('Una cum famulo tuo papa nostro N.'). 'Onde se diz "em união com vosso servo nosso Papa N.", expressa-se o nome do Papa; por outro lado, quando a Sé Apostólica está vaga, as palavras acima mencionadas são omitidas' (São Pio V: Missale Romanum; "Ritus servandus in celebratione Missae", capítulo 7, § 2). O padre deve retomar o texto a partir de "e de todos os ortodoxos,,27".
O célebre liturgista Dom Prosper Guéranger (Explicação das orações e cerimônias da missa, reedição 27 São Pio V prescreve que se ore assim: "Te igitur, clementíssimo Pai, por Jesus Cristo, teu Filho, nosso Senhor, suplicantes rogamos e pedimos que aceites e abençoes estes + dons, estes + presentes, estes + santos sacrifícios imaculados. Em primeiro lugar, os que te oferecemos pela tua santa Igreja católica: que dignes pacificar, guardar, unir e governar em todo o mundo, e por todos os ortodoxos, cultores da fé católica e apostólica. Lembra-te, Senhor... etc Bruxelas 1986, p. 106) comenta: 'Se a Sé Apostólica estivesse vaga, essa menção seria omitida'."
"O mesmo autor tem palavras reconfortantes para os cristãos que vivem durante a vacância da Sé Apostólica: 'Que um Decius, com suas violências, provoque uma vacância de quatro anos no Trono de Roma; que se levantem antipapas apoiados uns pela popularidade, outros pela política dos príncipes; que um longo cisma torne duvidosa a legitimidade de vários pontífices; o Espírito Santo permitirá que o teste se desenrole, fortalecerá, durante sua duração, a fé de seus fiéis; finalmente, no momento marcado, ele produzirá seu eleito, e toda a Igreja o receberá com aclamação' (Dom Guéranger: L’année liturgique, quarta-feira de Pentecostes).
Lucius Lector (Le conclave, Paris s.d., publicado sob Leão XIII) escreveu nada menos que 784 páginas sobre as leis e cerimônias que regem os conclaves e a vacância da Sé Apostólica. V. Martin escreveu um livro sobre a vacância (Les cardinaux et la curie, Tribunaux et offices, la vacance du Siège apostolique, Paris 1930). Charles Pichon publicou Le pape, le conclave, l’élection et les cardinaux (Paris 1955). Se esses livros foram escritos, é uma prova de que a existência de uma vacância da Sé Apostólica é teologicamente possível!
A vida da Igreja visível continua, mesmo quando privada de um papa. Houve até consagrações de bispos durante a vacância da Sé Apostólica.
E o Papa Paulo IV especifica que essa vacância pode durar muito tempo. Se um usurpador fosse eleito ilegitimamente, a Sé estaria vacante, 'e isso, independentemente da duração dessa situação' (Cum ex apostolatus, § 6).
Que a privação de um papa dure anos, até décadas, é certamente lamentável, mas de modo algum impossível. Vacância (25 de outubro de 304 - 27 de maio de 308) entre São Marcelino e São Marcelo I: três anos e sete meses. Vacância (29 de novembro de 1268 - 1º de setembro de 1271) entre Clemente IV e São Gregório X: dois anos e nove meses. Vacância (1º de abril de 1292 - 5 de julho de 1294) entre Nicolau IV e São Celestino V: dois anos e três meses. Papas duvidosos (portanto, inválidos) durante o Grande Cisma do Ocidente (1378 - 1417): trinta e nove anos (se adicionarmos a linha cismática dos antipapas do Concílio de Basileia, chegaríamos a setenta anos!).
CONCLUSÃO DO DÉCIMO SEGUNDO CAPÍTULO: Segundo os cânones 100 e 102, a Igreja subsiste perpetuamente. Em caso de vacância da Sé Apostólica, ela é governada pelo cânone 241. A vacância da Sé Apostólica é um fenômeno doloroso, porém não incompatível com a noção de 'visibilidade' da Igreja.
A visibilidade da Igreja compreende quatro características distintas, que serão delineadas no próximo capítulo."
Conclusão
A vacância da cátedra de Pedro é prevista pela legislação eclesiástica. Ela não interrompe a vida da Igreja. Portanto, não é de modo algum incompatível com a noção de "visibilidade" da Igreja Católica.
AS QUATRO MARCAS DA IGREJA VISÍVEL
A. A marca da unidade
B. A marca da santidade
C. A marca da catolicidade
D. A marca da apostolicidade
E. A Igreja conciliar não possui as quatro marcas da Igreja visível!
Conclusão
A. A marca da unidade
"Não há senão um só Senhor, uma só fé, um só batismo" (Efésios IV, 4). "Só há uma fé que TODOS devem guardar e professar publicamente" (Catecismo Romano).
Os 2.221 bispos que votaram, em 28 de outubro de 1965, na declaração Nostra aetate do Concílio Vaticano II, caíram diretamente sob um anátema do Concílio Vaticano I:
Concílio Vaticano II: Declaração Nostra aetate (1965): "O budismo ensina [...] um caminho pelo qual os homens [...] podem 'adquirir o estado de libertação perfeita, alcançar a iluminação suprema por seus próprios esforços'."
Concílio Vaticano I (1870): De revelat., cânon 3 (citado em Pascendi): "Se alguém disser que o homem não pode ser elevado a um conhecimento e a uma perfeição que excedam a natureza, mas que ele pode e deve, por um progresso contínuo, 'finalmente alcançar por si mesmo a posse de todo o verdadeiro e todo o bem', que seja anátema."
Poderíamos multiplicar os exemplos de divergência entre a fé católica e a crença conciliar. A esse respeito, Romano Amerio forneceu um livro com mais de 600 páginas (Iota unum), deixando de lado pelo menos cinquenta temas!
A Igreja conciliar não professa a mesma fé que a Igreja Católica. Portanto, LHE FALTA A MARCA DE UNIDADE.
B. A marca da santidade
"A Igreja é santa porque ela sozinha possui o culto do sacrifício legítimo e o salutar uso dos sacramentos, estes instrumentos eficazes da graça divina pelos quais Deus nos comunica a santidade" (Catecismo Romano).
Montini fez elaborar uma nova missa pelo maçom Bugnini e seis pastores protestantes. O resultado é apropriado. Como simples exemplo, observe que a invocação do Espírito Santo ("Vinde, Espírito Santo...") foi suprimida e substituída por: "Bendito sejais, Senhor Deus do universo". Mas quem é esse "Deus do universo"? Um livro escrito por um maçom luciferiano convertido fornece a resposta: "O que é então o Senhor dos Céus, senão o Deus dos preguiçosos, ociosos e vagabundos, que imaginam o espírito e se satisfazem com matéria; que vivem de ideias e consomem a realidade? Não há espírito sem matéria, e eles são identificados um ao outro, ou então o Senhor dos Céus é o Deus do Nada; enquanto Satanás, pelo contrário, é o Deus do Universo! O Deus do Universo, pois ele compreende em um único ser espírito e matéria, sendo que uma não pode subsistir sem a outra. Apenas esse deve ser para nós o Deus que governa ambos, e esse é Satanás" (Domenico Margiotta: Le palladisme. Culte de Satan-Lucifer dans les triangles maçonniques, Grenoble 1895, p. 44).
A luta católica está focada na "missa de sempre". Este foco faz esquecer que todos os rituais e todos os sacramentos foram mudados. O rito foi mudado em todos os lugares, a matéria e a forma às vezes.
À luz dessas informações sucintas, pode-se afirmar que a Igreja conciliar não possui um "sacrifício legítimo" e que os outros sacramentos, em sua maioria duvidosos ou inválidos, contribuem pouco para a santificação. Por isso, LHE FALTA A MARCA DA SANTIDADE.
C. A marca da catolicidade
"Todos os fiéis que existiram desde Adão até hoje, todos aqueles que existirão enquanto o mundo existir, ao professar a verdadeira fé, pertencem a esta mesma Igreja estabelecida sobre os apóstolos e os profetas" (Catecismo Romano). "Católico" significa "universal". A fé "católica" é "universal" no tempo e no espaço: é o que foi crido por todos, em toda parte e em todos os tempos, como disse São Vicente de Lérins (Commonitorium, 434).
Uma rápida análise (nossa investigação) ou numerosos e volumosos estudos (publicados por católicos desde os anos 1960) provam abundantemente que a crença professada pela Igreja conciliar não tem nada de "católica", pois está em contradição com o que foi crido e ensinado nos dois mil anos de catolicismo, ou até mesmo nos seis mil anos, pois a Igreja começou com Adão, como diz o Catecismo Romano e como explica magistralmente o padre Barbier (Les trésors de Cornelius a Lapide..., Paris 1856).
Além dos estudos católicos, pode-se citar até mesmo confissões dos próprios conciliares, que se orgulham publicamente de não serem mais católicos!
Segundo o (pseudo) prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, o texto conciliar Gaudium et Spes "desempenha o papel de um contra-syllabus na medida em que representa uma tentativa de uma reconciliação oficial da Igreja com o mundo como ele se tornou desde 1789" (Ratzinger: Les Principes de la théologie catholique, tradução francesa 1985, p. 426). Os conciliares, portanto, renegam o ensinamento ex cathedra do Syllabus de Pio IX! Isso é uma apostasia.
Congar, um dos teólogos mais importantes do Vaticano II, afirmou: "A Igreja fez, pacificamente, sua revolução de outubro" (in: Monsenhor Lefebvre: Lettre ouverte aux catholiques perplexes, Paris 1985, p. 133).
Enfrentando a ideologia dos direitos humanos, a Igreja "passou de um comportamento de condenação a um comportamento positivo e encorajador" (Comissão Pontifícia "Justiça e Paz": L'Église et les droits de l'homme, Cidade do Vaticano 1975, p. 21). Triunfo póstumo dos maçons de 1789!
Como a Igreja conciliar não é católica, LHE FALTA A MARCA DA CATOLICIDADE.
D. A marca da apostolicidade
"Eis um último caráter próprio que nos faz distinguir a verdadeira Igreja: ela remonta aos apóstolos, que publicaram o Evangelho. A doutrina da Igreja não é uma doutrina nova que apenas começou a aparecer, mas é aquela mesma que foi ensinada pelos apóstolos e espalhada por eles por toda a terra. Por isso, os Padres do Concílio de Niceia, inspirados por Deus, para nos fazer compreender o que era a Igreja Católica, acrescentaram no Credo a palavra 'apostólica'" (Catecismo Romano).
Os apóstolos queimaram livros ímpios (Atos dos Apóstolos XIX, 19); Montini suprimiu o Índice e elogiou a liberdade de imprensa.
O apóstolo São Paulo proibiu sacrificar aos ídolos (1 Coríntios X, 14-22); Wojtyla o fez na África e na Índia.
O apóstolo São Pedro acusou os judeus de deicídio (Atos dos Apóstolos II, 23); o Vaticano II (Nostra aetate, § 4) nega esse fato.
Os apóstolos e os discípulos de Nosso Senhor expulsavam demônios; a seita conciliar suprimiu os exorcismos do batismo, o exorcismo das santas óleos na Quinta-feira Santa, o sal exorcizado, o pequeno exorcismo de Leão XIII recitado no final da missa, a ordem dos exorcistas (Montini suprimiu a ordem dos exorcistas em 15 de agosto de 1972, concedendo, no entanto, aos bispos a faculdade de manter um exorcista se achassem bom). Em 29 de setembro de 1985 (Documentação Católica, 1986, p. 197), a Congregação para a Doutrina da Fé formalmente proibiu que qualquer um recitasse o pequeno ou grande exorcismo de Leão XIII. As orações para os agonizantes foram expurgadas: toda menção ao demônio, adversário temível na última hora, foi suprimida. As completas dos beneditinos foram amputadas da bela lição do apóstolo São Pedro: "Irmãos, sede sóbrios e vigilantes, porque o vosso adversário, o diabo, anda ao redor como um leão, rugindo, procurando a quem devorar; resisti-lhe firmes na fé" (1 Pedro V, 8).
Os líderes conciliares assim derrubaram todas as defesas sobrenaturais contra as forças infernais. Isso é diametralmente oposto ao ensinamento dos apóstolos São Pedro (citado acima) e São Paulo, segundo o qual devemos lutar contra os poderes infernais espalhados pelos ares (Efésios VI, 10-17).
A Igreja conciliar é diferente daquela estabelecida pelos apóstolos. Isso significa que LHE FALTA A MARCA DA APOSTOLICIDADE.
A Igreja conciliar não possui as quatro notas da Igreja visível!
A Igreja conciliar não possui as notas de unidade, santidade, catolicidade e apostolicidade, que são os sinais da Igreja visível. Portanto, a Igreja conciliar não é a Igreja visível!
Em setembro de 1988, Dom Lefebvre proferiu uma palestra sobre a visibilidade da Igreja, demonstrando que a Igreja conciliar não possuía essas quatro notas, enquanto os católicos que rejeitaram a Igreja conciliar as possuíam (bons sacramentos, doutrina católica, poder episcopal remontando aos apóstolos). Ele resumiu mais tarde essa palestra em duas frases: "Somos nós que somos a Igreja visível". "São os outros que não fazem mais parte dela" (entrevista em Le Choc, nº 6, Paris 1989).
Aqui estão os principais trechos de sua conferência crucial, intitulada A visibilidade da Igreja e a situação atual, proferida diante dos antigos seminaristas em Ecône, em 9 de setembro de 1988 (in: Bulletin officiel du district de France de la Fraternité Sacerdotale Saint Pie X, nº 29, setembro de 1988):
"[...] Onde está a Igreja visível? A Igreja visível é reconhecida pelos sinais que sempre deu para sua visibilidade: ela é UNA, SANTA, CATÓLICA E APOSTÓLICA.
Eu pergunto a vocês: onde estão os verdadeiros sinais da Igreja? Estão mais na Igreja oficial (não se trata da Igreja visível, mas da Igreja oficial) ou em nós, no que representamos, no que somos? É claro que somos nós que guardamos a UNIDADE da fé, que desapareceu na Igreja oficial. Um bispo acredita nisso, outro não, a fé é diversa, seus catecismos abomináveis contêm heresias. Onde está a unidade da fé em Roma?
Onde está a unidade da fé no mundo? Somos nós que a mantivemos. A unidade da fé realizada em todo o mundo é a CATOLICIDADE. No entanto, essa unidade da fé no mundo já não existe mais, portanto, praticamente não há mais catolicidade. Em breve, haverá tantas igrejas católicas quantos bispos e dioceses. Cada um tem sua maneira de ver, de pensar, de pregar, de ensinar seu catecismo. Não há mais catolicidade.
A APOSTOLICIDADE? Eles romperam com o passado. Se fizeram alguma coisa, foi isso mesmo. Eles não querem mais o que aconteceu antes do Concílio Vaticano II.
A apostolicidade: nós estamos ligados aos apóstolos pela autoridade. Meu sacerdócio vem dos apóstolos; o seu sacerdócio vem dos apóstolos. Somos filhos daqueles que nos deram o episcopado. Nosso episcopado desce do santo Papa Pio V e através dele remontamos aos apóstolos. Quanto à apostolicidade da fé, cremos na mesma fé dos apóstolos. Não mudamos nada e não queremos mudar nada.
E então, a SANTIDADE. Não vamos nos fazer elogios ou louvores.
Tudo isso mostra que somos nós que temos os sinais da Igreja visível. Se ainda há uma visibilidade da Igreja hoje, é graças a vocês. ESSES SINAIS NÃO SE ENCONTRAM MAIS NOS OUTROS. Eles não têm mais a unidade da fé, e é a fé que é a base de toda visibilidade da Igreja.
A catolicidade é a fé una no espaço. A apostolicidade é a fé una no tempo, e a santidade é o fruto da fé, que se concretiza nas almas pela graça de Deus, pela graça dos sacramentos. É completamente falso nos considerar como se não fizéssemos parte da Igreja visível.
Não somos nós, mas os modernistas que estão saindo da Igreja. Quanto a dizer "sair da Igreja visível", É UM ERRO ASSIMILAR A IGREJA OFICIAL E A IGREJA VISÍVEL.
Todos os domingos na missa, os católicos cantam o Credo de Nicéia-Constantinopla. « ...Et unam, sanctam, catholicam et apostolicam Ecclesiam ». Desprovida das notas de unidade, santidade, catolicidade e apostolicidade, a Igreja conciliar não representa de forma alguma a verdadeira Igreja visível, como fica claro no credo, definido pelos Padres de Nicéia, retomado pelos Padres de Constantinopla e devidamente explicado pelos Padres de Trento (Catecismo Romano**). Reconhecer Roncalli, Montini, Luciani e depois Wojtyla como chefes da verdadeira Igreja é contradizer um artigo do Credo de Nicéia-Constantinopla!!!
O Catecismo Romano foi escrito justamente para ajudar os fiéis a discernir a verdadeira Igreja e a não confundí-la com seitas que são sua contrafação. Estudamos cuidadosamente os critérios fornecidos por este catecismo e, com a ajuda desses pontos de referência, descobrimos que a Igreja conciliar não é mais do que uma seita qualquer, fundada por impostores. Então, como homens que não fazem parte da Igreja visível poderiam ser sua cabeça? Desde quando se pode ser o Vigário de Cristo sem fazer parte do corpo místico de Cristo?!
Dom Antonio de Castro-Mayer, bispo emérito de Campos (Brasil), compreendeu muito bem que a Igreja visível não tem nada a ver com a Igreja conciliar. Na véspera das ordenações episcopais em Ecône (1988), de fato, Dom de Castro-Mayer defendia a validade da causa católica:
« Deixe o mundo dizer que essas consagrações são feitas em desacordo com a cabeça visível da Igreja. Mas deixe-me fazer uma pergunta. Onde está a cabeça visível da Igreja? Podemos aceitar como cabeça visível da Igreja um bispo que coloca divindades pagãs no altar ao lado de Nosso Senhor Jesus Cristo? Se todos os homens de Igreja vierem a aceitar os ensinamentos de Assis, este erro de colocar as divindades pagãs no mesmo nível de Nosso Senhor, qual será a consequência? Será a apostasia geral » (in: Bonum certamen, no 132, ou ainda in: Simple lettre, Serre-Nerpol julho/agosto de 1993).
Aqui está o texto integral (traduzido do latim) de uma declaração corajosa de um arcebispo da Igreja Romana:
DECLARAÇÃO
Nos dias de hoje, sob que aspecto a Igreja Católica nos aparece? Em Roma reina o "papa" João Paulo II, cercado pelo colégio cardinalício, bem como um grande número de bispos e prelados. Fora de Roma, a Igreja Católica parece florescente com seus bispos e padres. Os católicos estão em número imenso. Todos os dias, a missa é celebrada em tantas igrejas e, no dia do Senhor, as igrejas acolhem muitos fiéis para ouvir a missa e receber a sagrada comunhão.
Mas, aos olhos de Deus, qual é o aspecto da Igreja de hoje? Essas missas - diárias e dominicais, às quais os fiéis assistem - agradam a Deus? De modo algum! Pois essa missa é idêntica para católicos e protestantes. Por essa razão, ela não é agradável a Deus e é inválida. A única missa agradável a Deus é a missa de São Pio V, que um pequeno número de padres e bispos, dos quais eu faço parte, celebram.
É por isso que, na medida do possível, abrirei um seminário para candidatos a um sacerdócio agradável a Deus.
Além dessa "missa" que desagrada a Deus, há muitos elementos que Deus rejeita, como por exemplo na ordenação dos padres, na consagração dos bispos, no sacramento da confirmação e no da unção dos enfermos.
Além disso, esses "padres" professam:
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o modernismo,
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um falso ecumenismo,
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a adoração do homem,
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a liberdade de abraçar qualquer religião;
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eles não querem condenar as heresias nem expulsar os hereges.
É por isso que, como bispo da Igreja Católica Romana, julgo que a Sé da Igreja Católica em Roma está vaga e que é meu dever, como bispo, fazer tudo o que estiver ao meu alcance para que a Igreja Católica Romana perdure, em vista da salvação eterna das almas.
Junto a esta declaração alguns documentos muito elucidativos:
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São Pio V: bula Quo primum;
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Concílio de Trento, 22ª sessão;
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Pio VII: brefo Adorabile eucharistiae, e Concílio de Florença: Decreto para os armênios; Decreto para os jacobitas;
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São Pio V: Missal Romano: "Dos defeitos na celebração da missa": "Defeitos de forma";
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Pio VI: Constituição Auctorem fidei; São Pio X: decreto Lamentabili e encíclica Pascendi;
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Concílio de Florença: Decreto para os jacobitas; Pio IX: encíclica Quanta cura; Bonifácio VIII: bula Unam sanctam;
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Codex iuris canonici, cânone 1322;
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Paulo IV: bula Cum ex apostolatus; Codex iuris canonici, cânone 188, nº 4;
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Pontificale romanum: "Da consagração dos eleitos ao episcopado": "Forma do juramento" e "Exame".
Munique, 25 de fevereiro de 1982
Pierre Martin Ngô-dinh-Thuc, arcebispo.
Conclusão
Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla não fazem parte da Igreja visível, mas de uma seita não-católica. Aquele que não faz parte do corpo místico de Cristo não pode, de forma alguma, ser o Vigário de Cristo. "Não pode ser a cabeça da Igreja aquele que não é membro dela" (São Roberto Belarmino: De romano pontifice, livro II, cap. 30).
Demonstração em três partes de que esses homens não são papas:
§ 1. "Seria absurdo dizer que aquele que está fora da Igreja possa presidi-la" (Leão XIII: encíclica Satis cognitum, 29 de junho de 1896).
§ 2. "Somente são verdadeiramente contados como membros da Igreja aqueles que receberam o batismo de regeneração e professam a verdadeira fé" (Pio XII: encíclica Mystici corporis, 29 de junho de 1943).
§ 3. Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla não professam a verdadeira fé.
Conclusão: aquele que não professa a verdadeira fé não é um membro do corpo da Igreja e, portanto, não pode ser o chefe supremo dela.
Resumo: a Igreja dita "conciliar", não possuindo as quatro notas características da verdadeira Igreja, é uma seita, uma "imitação de Igreja". Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla lideram uma seita herética; eles não são papas da Igreja católica.
"Uma vez que se ataca a própria cidadela da fé, [...] devemos lembrar deste preceito frequentemente ensinado por São Carlos Borromeu (Concílio Provincial, cap. 1): 'O primeiro e maior cuidado dos pastores deve ser ocupar-se da conservação integral e inviolável da fé católica, desta fé que a Santa Igreja Romana professa e ensina, e sem a qual é impossível agradar a Deus'" (São Pio X: encíclica Editae saepe Dei, 26 de maio de 1910).
Um dos artigos da fé particularmente atacado nos dias de hoje é este: "Creio na Igreja una, santa, católica e apostólica" (ordinário da missa, recitação do Credo de Niceia-Constantinopla).
"Que se faça ressoar o Credo: por este canto a verdadeira fé se afirma de maneira brilhante e a alma das populações católicas, avivando sua crença, se prepara para receber a comunhão do corpo e do sangue de Cristo" (III Concílio de Toledo, 589, cânon 2).
CONCLUSÃO
A. A invalidade dos Conclaves
Quando o conclave termina, um cardeal anuncia uma « grande alegria » ao povo: « Habemus papam! » (« Nós temos um novo papa! »). Desde a morte de Pio XII, uma pergunta atormenta muitas consciências: Habemus papam? Nosso Senhor não poderia de forma alguma permitir a apostasia geral sem antes ter deixado todos os argumentos para discerni-la e para se manter afastado dela. Da mesma forma, a « questão do papa » já deveria ter sido resolvida de antemão, pela própria papado, inspirada e regida pelo Espírito Santo.
A CHAVE para compreender a crise atual da Igreja Romana é a INVALIDEZ DOS CONCLAVES. Os homens que chegaram ao poder desde a morte de Pio XII haviam se desviado da fé antes dos conclaves. Sua elevação ao pontificado foi, portanto, inválida. Esta constatação tem como fundamentos:
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A constituição apostólica Cum ex apostolatus de Paulo IV, datada de 15 de fevereiro de 1559, retomada quinze vezes no código de direito canônico de 1917, e notadamente no cânon 188;
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A exclusão dos maçons dos cargos eclesiásticos no cânon 2336;
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A retidão doutrinal exigida dos bispos e cardeais (cânones 232, 343 e 1406);
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A noção de "irregularidade", que exclui os não-católicos do sacerdócio, do episcopado e do pontificado supremo: cânones 985 e 991, além do discurso de 5 de outubro de 1957 do papa Pio XII.
Não sendo papas, eles podiam desviar-se da fé e levar os fiéis ao erro, o que não teria acontecido "em nenhum momento" (Inocêncio III: carta Apostolicae Sedis primatus, 12 de novembro de 1199) se fossem verdadeiros sucessores de Pedro. O concílio de Vaticano II - que, em princípio, deveria ter sido um concílio ecumênico infalível - pôde errar e efetivamente errou, porque lhe faltava o elemento constitutivo obrigatório: o papa (cf. Santo Tomás: Suma Teológica, suplemento da Parte III, q. 25, a. 1 e Vaticano I: Pastor aeternus, prólogo).
Aquele que se desviou da fé não é de modo algum elegível como papa, conforme a Sagrada Escritura (Mateus XVI, 15) e a Tradição (Santos Cipriano, Agostinho, Tomás de Aquino, etc.). Além disso, a cláusula de catolicidade foi definida ex cathedra por um pontífice romano (Paulo IV, 1559), o que a torna "irreformável por si mesma, e não em virtude do consentimento da Igreja" (Vaticano I: Pastor aeternus, cap. 4). Além do mais, o texto de Paulo IV foi explicitamente retomado no Codex iuris canon ici de 1917. E o regulamento que rege os conclaves, redigido por Pio XII em 1945, estipula claramente que a eleição deve ser "feita de acordo com o direito canônico" para ser válida. Em uma palavra: só se torna papa "sob a condição de que a eleição tenha sido legítima" (cânon 109)!
B. A "ABOMINAÇÃO DA DESOLAÇÃO NOS LUGARES SANTOS"
Por que querer afastar a todo custo os não-católicos do clero e, sobretudo, do pontificado supremo? É o papa Paulo IV quem dá a resposta: “Diante da situação atual tão grave e tão perigosa, não deve haver possibilidade de reprovar o pontífice romano por desviar-se na fé. Ele é na terra o Vigário de Deus e de Nosso Senhor Jesus Cristo; ele tem a plenitude da autoridade sobre as nações e os reinos; ele é o juiz universal e não deve ser julgado por ninguém aqui embaixo. Além disso, quanto maior o perigo, maior deve ser a vigilância, para que os falsos profetas [...] não possam [...] arrastar consigo à perdição e à ruína da condenação os povos inumeráveis confiados aos seus cuidados”, o que seria a “abominação da desolação no lugar santo” anunciada pelo profeta Daniel (Cum ex apostolatus, § 1).
“Pode-se entender por ‘abominação da desolação’”, explica São Jerônimo, “o dogma perverso. Quando o virmos estabelecido no lugar santo, ou seja, na Igreja, e se apresentando como Deus, devemos fugir da cidade para as montanhas”, ou seja, sair dessa pseudo-Igreja herética (São Jerônimo, in: leitura de matinas do breviário romano, 24º domingo depois de Pentecostes). E como o dogma pode ser pervertido em grande escala ao ponto de contaminar (quase) toda a Igreja? Evidentemente, por um herege eleito (falso) papa, em violação das leis divinas e eclesiásticas. Segundo Paulo IV, a instalação de um não-católico na cadeira de Pedro constitui a “abominação da desolação”, anunciada pelo profeta Daniel e também por Nosso Senhor (Mateus XXIV, 15). Esta interpretação das Sagradas Escrituras feita por Paulo IV concorda com o ensinamento do Padre e Doutor da Igreja São Bernardo. São Bernardo, ao falar do falso papa marrano “Anacleto II”, lamentou amargamente: “A abominação está no lugar santo” (São Bernardo: Carta 124 a Hildeberto, arcebispo de Tours).
Como reconhecer um falso papa? A história eclesiástica nos ensina que houve nove falsos papas que caíram na heresia, enquanto não existe absolutamente nenhum papa que tenha se desviado da fé. Os santos doutores, os papas e os concílios certificam unanimemente que um papa nunca se desviará da fé. Daí vem uma regra de discernimento muito simples e prática: um homem que professa erros na fé é, com certeza, um impostor. Se tal falso profeta conseguir ser eleito (invalidamente) por um conclave, ele se torna uma abominável idolatria. Que ele seja adorado pelos iludidos e então estará realizada a “abominação da desolação no lugar santo”. Infelizmente para nós, esse cenário de pesadelo tornou-se realidade após a morte de Pio XII: “Onde foi instituída a sede do bem-aventurado Pedro e a cadeira da Verdade [...], lá colocaram o trono da abominação de sua impiedade” (Leão XIII: Exorcismo contra Satanás e os anjos apóstatas, 1884).
Que esses usurpadores, uma vez eleitos (invalidamente), difundam suas heresias do alto da cadeira de Pedro e eis que nasce a "Igreja herética" predita por São Cesário de Arles para o fim dos tempos! Esta "Igreja herética", diz São Cesário, eclipsará a verdadeira Igreja.
Como distinguir a verdadeira Igreja da Igreja herética? Para não confundir a verdadeira Igreja com sua(s) falsificação(ões), é necessário meditar atentamente o Catecismo Romano. Eis o que diz o catecismo de Trento, que é o catecismo oficial da Igreja Romana, que não pode errar nem nos enganar: "O Espírito Santo que preside à Igreja só a governa pelo ministério dos apóstolos. Pois foi a eles que este Espírito Santo foi primeiramente dado; e ele permaneceu sempre na Igreja como um efeito da caridade infinita de Deus para com ela. De modo que, assim como é impossível que esta Igreja, que é governada pelo Espírito Santo, possa errar, nem na fé, nem na regra dos costumes, é também necessário que todas as outras sociedades que USURPAM o nome de Igreja, sendo conduzidas pelo espírito do demônio, estejam em erros muito perniciosos, tanto na doutrina quanto nos costumes" (Catecismo Romano, rubrica "explicação do símbolo dos apóstolos", na seção "Credo in... sanctam Ecclesiam catholicam").
Segundo o catecismo de Trento, a verdadeira Igreja é governada pelo Espírito Santo, enquanto as seitas são inspiradas pelo demônio. Apliquemos agora as regras do "discernimento dos espíritos". Foi mostrado, no capítulo 13, que os dirigentes conciliares suprimiram todos os exorcismos e orações contra as forças infernais. Questão de discernimento dos espíritos: foi o Espírito Santo ou o espírito das trevas que inspirou tais reformas? Ratzinger proibiu a qualquer um de recitar os exorcismos de Leão XIII. Que espírito, então, anima a Igreja conciliar? Os maçons luciferianos prestam culto a Satanás, chamando-o de "Deus do universo". Ora, a nova missa, fabricada por um maçom (Bugnini), contém justamente uma oração dirigida ao "Deus do universo"! Questão de bom senso: a Igreja conciliar é a Igreja de Deus ou a "sinagoga de Satanás" (Apocalipse fi, 9)?
Continuemos nossa investigação baseada no Catecismo Romano. Segundo este catecismo, as seitas outras que a Igreja Católica caem em erros relativos à fé ou aos costumes. Visto que os conciliares ensinam inumeráveis erros, isso indica infalivelmente que eles certamente não fazem parte da Igreja Católica! A Igreja conciliar é uma dessas seitas que "USURPAM o nome de Igreja" (Catecismo Romano). Os chefes desta seita são usurpadores.
Quitte a enunciar uma obviedade, sublinhamos, no entanto, uma verdade simples: UM APÓSTATA NÃO PODE SER PAPA! Durante os três primeiros séculos, contam-se onze milhões de mártires das catacumbas, dos quais dois milhões e meio em Roma (número calculado pelo abade J. Gaume: História das catacumbas de Roma, Paris 1848, p. 590 - 591). Eles preferiram morrer a sacrificar às ídolos. Os "lapsi" (aqueles que "caíram") eram considerados apóstatas e, se fossem clérigos, eram tidos como depostos de seu cargo e reduzidos ao estado laico. Ora, Wojtyla sacrificou-se às ídolos voluntariamente, sem sequer ser coagido pelo medo da tortura ou da morte. É por isso que ele não pode ser papa. Onze milhões de mártires testemunham isso com seu sangue!
Uma vida humana não seria suficiente para enumerar as incontáveis blasfêmias e heresias proferidas pela seita conciliar, seja pelo (pseudo) cura de uma paróquia rural, seja pelo (pretenso) bispo local, ou pelo heresiarca supremo em Roma, que, graças à sua experiência adquirida como ex-ATOR DE TEATRO, desempenha perfeitamente seu papel de “lobo DISFARÇADO em cordeiro” (Mateus VII, 15)!
Em resumo: ANATHEMA SIT! Wojtyla é anátema, assim como os nestorianos. Os nestorianos foram anatematizados por negarem que Maria seja a mãe de Deus. Ora, segundo Wojtyla, pode-se negar que Maria seja a mãe de Deus e ainda manter a fé. Segundo ele, aqueles “que contestaram as fórmulas dogmáticas de Éfeso e de Calcedônia” são, no entanto, “testemunhas da fé cristã” (encíclica Ut unum sint, 25 de maio de 1995, § 62). Wojtyla tem a mesma crença que os nestorianos: “Temos a mesma fé vinda dos apóstolos” (ibidem).
Em 431, quando Nestório, bispo de Constantinopla, sustentou no púlpito que Maria não era a mãe de Deus, um leigo muito corajoso levantou-se em pleno sermão e pronunciou uma única palavra: “Anátema!” (Dom Guéranger: O ano litúrgico, 9 de fevereiro).
Que Wojtyla seja anátema, ou seja, excluído da comunhão da Igreja Católica, é muito fácil de demonstrar. Ele concede aos nestorianos o título de "testemunhas da fé cristã" e se recusa a reiterar a condenação dos erros de Nestório. O que acontece com todos aqueles que não querem condenar Nestório? O V Concílio Ecumênico fornecerá a resposta para essa questão crucial. O V Concílio Ecumênico (Constantinopla II, 8ª sessão, 2 de junho de 553, cânon II) declara o seguinte: "Se alguém não anatematizar Ário, Eunômio, Macedônio, Apolinário, Nestório, Êutiques e Orígenes, bem como seus escritos ímpios, e todos os outros hereges condenados e anatematizados pela Santa Igreja Católica e Apostólica e pelos quatro santos concílios acima mencionados, bem como todos aqueles que mantiveram ou mantêm opiniões semelhantes às dos hereges acima mencionados e que persistiram até a morte em sua própria impiedade, que tal pessoa seja anátema". E no cânon 14, o mesmo concílio declara: "Caso alguém se proponha a transmitir, ensinar ou escrever algo que seja contrário às declarações que formulamos, se ele for bispo ou membro do clero, visto que agiria de maneira incompatível com o estado sacerdotal e eclesiástico, será privado do episcopado ou do clero".
De acordo com o direito canônico (cânon 2257), a palavra "anathema" é sinônimo de "excomunhão solene". Wojtyla se recusa a anatematizar Nestório e os nestorianos; portanto, ele mesmo é anátema, portanto, ele é excomungado, portanto, ele está fora da Igreja, portanto, ele é privado do episcopado (sem mencionar o pontificado, que ele nunca possuiu desde o início).
E poupamos nossos leitores de uma lista exaustiva das dezenas de anátemas incorridos pelos líderes da seita conciliar por heresias, crimes e sacrilégios diversos. Basta procurar nas coleções de textos dos pontífices romanos e dos concílios católicos (ver nossa bibliografia no final do volume). O anátema mais adequado é sem dúvida o intitulado «Contra falsam synodum» ("contra o conciliábulo"! ), que se encontra na coleção jurídica de São Ivo de Chartres (Decreti, quarta parte, cap. 198): "Guardamos inviolavelmente todas as tradições eclesiásticas, sejam elas escritas ou não escritas. Portanto, se alguém violar qualquer tradição eclesiástica, seja ela escrita ou não escrita, que seja anátema". Esse anátema, por sua abrangência geral, resume melhor o "falso sínodo" do Vaticano II e todas as reformas pós-conciliares. Roncalli, Montini, Luciani e especialmente Wojtyla estabeleceram, de fato, um RECORD HISTÓRICO, acumulando uma quantidade jamais vista na história da Igreja de enormidades, blasfêmias, traições, atentados e injúrias contra a Santa Igreja.
Fenômeno surpreendente!
Que eles encontrem uma oposição tão fraca por parte dos católicos é outro fenômeno surpreendente. O nervo da guerra dos maus é a fraqueza dos bons, como dizia o saudoso papa São Pio X!
[1] « Nos dias de hoje, mais do que nunca, a principal força dos maus é a covardia e a fraqueza dos bons, e todo o nervo de guerra de Satanás reside na fraqueza dos cristãos. Oh! Se me fosse permitido, como fazia em espírito o profeta Zacarias, perguntar ao divino Redentor: "Que são estas chagas no meio das vossas mãos?", a resposta não seria duvidosa: "Elas me foram infligidas na casa daqueles que me amavam, por meus amigos que nada fizeram para me defender e que, em todas as ocasiões, se tornaram cúmplices dos meus adversários"» (S. Pio X: Beatificação de Joana d’Arc, 13 de dezembro de 1908).
« Na hora em que uma guerra tão cruel se abate contra a religião, não é permitido ceder à apatia vergonhosa, permanecer neutros, arruinar os direitos divinos e humanos por meio de compromissos duvidosos; é necessário que cada um grave em sua alma esta palavra tão clara e expressiva de Cristo: "Quem não está comigo está contra mim" (Mateus XII, 30)» (S. Pio X: encíclica E Communium rerum, 21 de abril de 1909).
C. APOLOGIA DA IGREJA ROMANA
Profissão de fé de Nicéia-Constantinopla: «Credo... Et unam, sanctam, catholicam et apostolicam Ecclesiam». A Igreja é uma sociedade visível, que se reconhece por quatro características ("notas"): ela é una, santa, católica e apostólica. Ora, de acordo com um estudo teológico feito por Dom Lefebvre (reproduzido no capítulo 13), e também de acordo com nossa própria análise baseada no Catecismo Romano, a Igreja conciliar é desprovida das quatro notas da Igreja visível. Portanto, é de fé que os conciliares não são papas: ninguém pode presidir simultaneamente uma seita não católica e a Igreja Católica! Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla pertencem a uma seita herética, e não à verdadeira Igreja. Portanto, de forma alguma podem ser papas da verdadeira Igreja. Essa é a conclusão totalmente ortodoxa e lógica do bom católico que deseja permanecer fiel ao credo e ao catecismo da Igreja una, santa, católica, apostólica e romana!
Acreditar que esses homens são impostores não é simplesmente uma opinião teológica defensável, mas sim uma certeza de fé, apoiada por inúmeras provas concordantes: Evangelhos, Padres e doutores da Igreja, doutor angélico, papas, concílios, história eclesiástica, vidas de santos e mártires, direito canônico, liturgia, catecismo. Além do credo de Nicéia-Constantinopla!
Essa maravilhosa concordância prova que o admirável magistério da Santa Igreja Romana é inspirado pelo Paráclito, conforme as promessas do divino Mestre: «Eu pedirei ao Pai, e Ele lhes dará outro Defensor, para que permaneça eternamente com vocês. É o Espírito da Verdade» (João XIV, 15-17).
O magistério da Igreja Romana é admirável. O apóstolo São Paulo já louvava a fé inabalável da Igreja da cidade de Roma, no início de sua epístola aos Romanos. "A sua fé é célebre no mundo inteiro!" E nos séculos seguintes, a fé da Igreja de Roma gozou da mesma celebridade. Por quê? Porque o pontífice romano tem uma fé tão sólida quanto a do próprio Filho de Deus (Catecismo Romano, explicação do símbolo, citando a homilia 29 de São Basílio). Os papas dispensam um ensinamento admirável, sublime, divino. Por isso, temos uma ideia tão elevada dos pontífices romanos que não os confundimos com a sua "contrafação" adúltera! O apóstolo São Pedro (2 Pedro III, 3), o apóstolo São Paulo (1 Timóteo IV, 1-2) e o apóstolo São Judas (Epístola Católica, 17-19) nos advertem que, "nos últimos tempos", muitos homens abandonarão a fé para seguir "doutrinas diabólicas, ensinadas por impostores hipócritas". Ora, a impostura consiste em "enganar por falsas aparências", notadamente "fingindo ser o que não se é". Esta definição nos parece bastante adequada para explicar a crise atual da Igreja...
E, afinal, somos bastante polidos, contentando-nos em empregar os termos "impostor" ou "usurpador". São Pedro Damião, confrontado com o pseudo-papa "Clemente III", foi muito mais veemente: "perturbador da Santa Igreja, destruidor da disciplina apostólica, inimigo da salvação da humanidade, raiz do pecado, arauto do diabo, apóstolo do Anticristo, flecha já tantas vezes disparada da aljava de Satanás, vara de Assur, filho de Belial, filho da perdição, novo herege" (in: Philippe Levillain: Dictionnaire historique de la papauté, Paris 1994, artigo "antipapa"). E o Concílio de Constança (37ª sessão, 26 de julho de 1417) qualificou o falso papa "Bento XIII" como: "perjuro, escandaloso, cismático e herege, prevaricador, notoriamente e evidentemente incorrigível, rejeitado por Deus, excluído da Igreja como um membro podre".
São Tomás de Aquino considerava que os hereges mereciam a pena de morte (Suma Teológica, II-II, q. 11, a. 3). O pacífico "doutor angélico" não hesitou em lançar contra o herege Guilherme de Saint-Amour e seus discípulos violentas invectivas: "inimigos de Deus, ministros do diabo, membros do Anticristo, ignorantes, perversos, reprovados". São Bernardo chamou Arnaldo de Brescia de "sedutor, vaso de injúrias, escorpião, lobo cruel". São Paulo qualificou assim os hereges de Creta: "mentirosos, bestas selvagens, glutões preguiçosos". São João recusou-se a cumprimentar Marcião; interrogado por este herege sobre por que não o saudava, o apóstolo chamou-o de servo de Satanás. Nosso Senhor não foi indulgente com seus inimigos: "hipócritas, sepulcros caiados, geração perversa e adúltera, raça de víboras, filhos do diabo"!
E nós, diante de hereges que estabeleceram um recorde absoluto na demolição da Igreja, deveríamos nos curvar a eles, conferir-lhes o título sagrado de "Santíssimo Pai" e assegurar-lhes "nosso devotamento filial"?! Permanecer neutros e impassíveis enquanto eles arrastam a Igreja na lama, pedindo perdão ao mundo inteiro por supostos erros cometidos pelos verdadeiros papas católicos?! Ficar indiferentes enquanto crucificam novamente Nosso Senhor?! Permanecer em silêncio enquanto o "mistério da iniquidade", outrora oculto, agora opera à luz do dia?!
D. A VIRTUDE DA ESPERANÇA
Nossa Senhora o anunciou em La Salette: "Roma perderá a fé e se tornará o trono do Anticristo". Roma perdeu a fé e está pronta para se tornar a capital do Anticristo.
Encerraremos nosso estudo sobre o "mistério da iniqüidade" com uma nota de esperança. Santa Teresinha do Menino Jesus apreciava muito um livro escrito pelo Cônego Arminjon, intitulado Fim do mundo presente e mistérios da vida futura. Nele encontramos esta frase: "No momento em que a tempestade será mais violenta, quando a Igreja estará sem piloto, quando o sacrifício não sangrento terá cessado em todo lugar, quando tudo parecer humanamente desesperado, veremos, diz São João, surgirem dois testemunhas. Um é Enoque, trisavô de Noé, o ancestral em linha direta de toda a humanidade. O outro é Elias". Atualmente, estamos privados de um "piloto", mas nos consolamos em saber que em breve Enoque e Elias virão em nosso auxílio.
Enquanto esperamos por essas duas testemunhas com sua palavra de fogo, sejamos nós mesmos apóstolos zelosos dos últimos tempos, respondendo ao apelo urgente feito por Nossa Senhora em La Salette: "Faço um apelo urgente à terra; chamo os verdadeiros discípulos do Deus vivo e reinante nos céus, chamo os verdadeiros imitadores de Cristo feito homem, o único e verdadeiro Salvador dos homens; chamo meus filhos, meus verdadeiros devotos, aqueles que se deram a mim para que eu os conduza ao meu divino Filho, aqueles que carrego como que nos meus braços, aqueles que viveram do meu espírito; finalmente, chamo os apóstolos dos últimos tempos, os fiéis discípulos de Jesus Cristo que viveram no desprezo do mundo e de si mesmos, na pobreza e na humildade, no desprezo e no silêncio, na oração e na mortificação, na castidade e na união com Deus, no sofrimento e desconhecidos do mundo. É hora de saírem e virem iluminar a terra. Vão, e mostrem-se como meus filhos queridos; estou com vocês e em vocês, contanto que sua fé seja a luz que os ilumine nestes dias de desgraça. Que seu zelo os torne famintos pela glória e pela honra de Jesus Cristo. Lutem, filhos da luz, vocês, o pequeno número que vêem claramente; pois eis o tempo dos tempos, o fim dos fins".
Posfácio
Pós-escrito
Caros leitores
Se os documentos do magistério da Igreja os convenceram, ficaríamos muito gratos se contribuíssem para a disseminação deste livro, quebrando a conspiração do silêncio. "Os modernistas perseguem com toda a malícia, com toda a acrimônia, os católicos que lutam vigorosamente pela Igreja. Não há insulto que não vomitem contra eles. [...] Quando se trata de um adversário cuja erudição e vigor intelectual os tornam temerosos, eles procuram reduzi-lo à impotência organizando em torno dele a conspiração do silêncio! Esta conduta é tanto mais condenável porque, ao mesmo tempo, sem limites nem medida, eles elogiam aqueles que se alinham com eles" (São Pio X: encíclica Pascendi, 8 de setembro de 1907).
É evidente que os modernistas infiltrados nas fileiras dos católicos farão de tudo para abafar a voz dos papas, concílios, Padres e doutores da Igreja. Mas isso não deve nos surpreender excessivamente: "Entre vós, haverá _falsos doutores, que introduzirão furtivamente heresias perniciosas" (2 Pedro 2, 1).
Seu valor será recompensado por Deus: "Embora lutar para arrancar a Terra Santa das mãos dos pagãos seja a garantia de merecer a vida eterna, pensa-se que é um mérito muito maior, se se combate a impiedade daqueles que exterminam a fé [...] e tramam a ruína geral da Igreja" (Gregório IX: bula Dei Filius, 21 de outubro de 1239).
Os autores
ANEXOS
ANEXO A: Honório I, um papa "brilhante pela sua doutrina", que "instruiu eruditamente o clero"
A. A ortodoxia de Honório comprovada pelos testemunhos de seus contemporâneos e por seus próprios escritos
B. As primeiras calúnias (640-649) contra Honório, desmascaradas pelos contemporâneos do falecido papa
C. A falsificação dos atos do Sexto Concílio Ecumênico (680-681)
D. As fraudes dos gregos contra Honório definitivamente condenadas pela Igreja
E. Os trabalhos históricos que acusam Honório de heresia são proibidos pela Igreja
A. A ortodoxia de Honório comprovada pelos testemunhos de seus contemporâneos e por seus próprios escritos
A biografia oficial de Honório, inserida no Liber Pontificalis, elogia este papa por suas numerosas boas obras, especialmente por ter instruído eruditamente o clero ("Multa bona fecit. Hic erudivit clerum", in: Liber Pontificalis, edição anotada por Louis Duchesne e alunos da Escola de Roma, Paris 1955, 1. J, p. 323). Jonas de Bobbio, que viu o papa em Roma, fez um retrato muito favorável dele: venerável, sábio, de bom conselho, gentil, humilde, "BRILHANTE PELA SUA DOUTRINA (doctrina clarens)" (Bobbio: Vida de São Bertulfo, cap. 6). Este elogio está em consonância com a epígrafe de Honório: seu nome é em grande honra, ele é sábio, grande em mérito, de poder divino em matéria de canto sagrado, "PODEROSO PELA SUA DOUTRINA (doctrina potens)" (in: Liber Pontificalis, nota explicativa 19).
Ele teve um zelo santo pela doutrina, pois repreendeu os bispos espanhóis por sua tibieza na fé. O bispo de Saragoça, Braulio, falando em nome dos bispos reunidos no Sexto Concílio de Toledo (638), tentou se justificar e concluiu com um elogio: "As duas partes do mundo, ou seja, Oriente e Ocidente, avisadas pela tua voz, compreenderam que a ajuda residia em tua presidência divina e que era necessário destruir a perfídia dos maus" (Braulio de Saragoça: Epistolario, 129, in: Georg Kreuzer: A Questão de Honório na Idade Média e na Era Moderna (coleção "Papas e Papado", vol. VIII), tese de doutorado, Stuttgart 1975, p. 19). Segundo o especialista universitário Kreuzer, Braulio fez uma alusão à valente luta de Honório contra o monotelismo.
A heresia monotelita alega que Nosso Senhor teria apenas "uma vontade", enquanto na verdade Ele possui duas: a divina e a humana. Contudo, na época de Honório, a Igreja ainda não tinha resolvido essa questão e os teólogos estavam em disputa a respeito. Além disso, os teólogos ainda discutiam uma segunda questão: Cristo possui uma ou duas vontades humanas? Portanto, três opiniões:
a) Cristo possui uma vontade divina mais uma vontade humana boa (= teologicamente correto);
b) Cristo possui apenas uma vontade (= heresia monotelita);
c) Cristo possui uma vontade humana boa (espírito) mais uma vontade humana viciosa (carne) (= heresia).
A situação é confusa, o que pode levar a mal-entendidos - o que de fato ocorreu! Pois o bispo de Constantinopla, Sérgio, questionou o papa Honório I sobre a opinião c). O papa disse que a opinião c) era falsa e aderiu à opinião a) (além disso, ordenou que todos se abstivessem de discutir sobre a questão). No entanto, os monotelitas mais tarde alegaram que o papa teria aprovado a opinião b). Daí a fábula de "Honório monotelita"!
Em vez de atacar a heresia com anátemas e excomunhões, Honório simplesmente ordenou aos teólogos que se abstivessem de discutir sobre a questão. Em sua carta Scripta fraternitatis (634) ao bispo Sérgio de Constantinopla, o papa Honório I de fato pediu que se guardasse silêncio, evitando disputas vãs amadas pelos sofistas: "Que Jesus Cristo seja o mesmo que opera coisas divinas e coisas humanas, as Escrituras mostram claramente. Mas saber se, por causa das obras da divindade e da humanidade, devemos dizer ou entender uma operação ou duas, isso não deve nos preocupar, e deixamos isso para os gramáticos, que têm o costume de vender às crianças as palavras que inventaram. [...] NSJC tem duas naturezas. Devemos rejeitar essas novas palavras que escandalizam as Igrejas, para que os simples, chocados com o termo duas operações, não nos considerem nestorianos, ou nos considerem eutiquianos, se não reconhecemos em Jesus Cristo apenas uma operação. Para não reacender o fogo de disputas mal adormecidas, confessemos com simplicidade que o mesmo Jesus Cristo opera tanto na natureza divina quanto na natureza humana. É melhor deixar os vãos dissecadores de naturezas, os filósofos inflados com voz de rãs, gritarem contra nós do que deixar o pobre povo com fome. Exortamos você, portanto, a evitar a nova expressão de uma ou duas operações, e a pregar conosco, na fé ortodoxa e na unidade católica, que Jesus Cristo único opera nas duas naturezas e tanto o que é da divindade quanto o que é da humanidade" (in: Rohrbacher, t. IV, p. 390).
Assim, o papa impôs o silêncio sobre a questão das vontades de Cristo. Essa abordagem, motivada pela preocupação de evitar disputas vãs, não é fundamentalmente má em si mesma. Séculos depois, franciscanos e dominicanos discutiam entre si se as gotas de sangue perdidas por Jesus em seu caminho da cruz permaneciam ou não em união hipostática com Nosso Senhor. O papa reinante não decidiu sobre a questão, mas proibiu os teólogos de se envolverem nesse tipo de especulação ociosa (Pio II: bula Ineffabilis, 1º de agosto de 1464). Da mesma forma, o Quinto Concílio Ecumênico de Latrão (II sessão, 14 de janeiro de 1516) impôs o silêncio, proibindo que qualquer um pretendesse determinar a data do fim do mundo.
Agora surge a questão: Honorius teria caído ele mesmo na heresia? A resposta é não. Sobre o que se tratava nos debates teológicos?
Desde o pecado original, os seres humanos têm duas vontades humanas contraditórias, a do espírito e a da carne.
Nosso Senhor, que assumiu nossa natureza sem o pecado, tomou apenas a vontade humana não corrompida pelo pecado original (tomou a do espírito, mas não a da carne). Além disso, sendo Deus, Nosso Senhor também possui uma vontade divina. Portanto, ele tem duas vontades, uma humana e outra divina.
Os monotelitas erroneamente sustentavam que Nosso Senhor tinha apenas uma única vontade (negando as duas vontades humana e divina).
O bispo de Constantinopla, Sérgio, escreveu a Honorius, reclamando que alguns afirmavam que em Nosso Senhor havia duas vontades contrárias. Enquanto ensinava longa e detalhadamente que Cristo tomou uma (e não duas) vontades humanas, Honorius afirmou brevemente (apenas de passagem, pois o objeto do questionamento de Sérgio eram as duas vontades humanas opostas) que Cristo também tinha uma vontade divina.
Portanto, o ensinamento do papa Honorius I era irrepreensível: ele acreditava e ensinava que Cristo não tinha duas vontades humanas contrárias, mas apenas uma, e que também tinha uma vontade divina.
B. Primeiras Falsificações (640-649) Contra Honorius, Desmascaradas pelos Contemporâneos do Papa Falecido
Honorius respondeu, portanto, que em Nosso Senhor não havia duas vontades humanas opostas (espírito e carne). Por um MAL-ENTENDIDO, algumas pessoas alegaram então que o papa teria negado a existência das duas vontades humana e divina!
Três anos após a morte de Honorius, seu secretário, ao descobrir o abuso que alguns monotelitas começavam a fazer no Oriente com a correspondência de seu antigo mestre, escreveu ao imperador Constantino: "Quando falamos de 'uma única vontade' no Senhor, não estávamos nos referindo à 'sua dupla natureza', mas apenas à 'sua humanidade'. Pois Sérgio, ao afirmar que em Jesus Cristo havia duas vontades contrárias, dissemos que não podíamos reconhecer nele essas duas vontades, ou seja, 'a da carne e a do espírito', como nós mesmos temos desde o pecado" (em: Mgr de Ségur: O Sumo Pontífice, em: Obras Completas, Paris 1874, vol. III, p. 269).
O papa João IV, segundo sucessor de Honorius, corroborou o mesmo em uma carta notável, ditada ao mesmo padre que havia sido secretário de Honorius. João IV também lamentou um MAL-ENTENDIDO: "Meu predecessor acima mencionado, portanto, disse em seu ensinamento sobre o mistério da encarnação de Cristo que não existiram nele, como em nós pecadores, duas vontades contrárias, a do espírito e a da carne. Alguns, porém, interpretaram isso à sua maneira e pensaram que ele teria ensinado uma única vontade de sua divindade e humanidade, o que é totalmente contrário à verdade" (João IV: carta Dominus qui dixit ao imperador Constantino III, primavera de 641).
Um santo canonizado, o abade Maximo, o Confessor, defendeu vigorosamente a memória do papa contra a tentativa dos monotelitas de se apropriarem dela. 'Deve-se rir, ou melhor, deve-se chorar ao ver esses desgraçados [bispos Sérgio e Pirro] que se atrevem a citar supostas decisões favoráveis à ímpia Ekthesis [manifesto monotelita de Sérgio, aprovado pelo imperador em 638], tentando incluir entre eles o grande Honório, e se adornam diante do mundo com a autoridade de um homem eminente na causa da religião. [...] Quem então pode ter inspirado tanta audácia a esses FALSÁRIOS? Que homem piedoso e ortodoxo, que bispo, que Igreja não os exortou a abandonar a heresia! Mas sobretudo, o que não fez o divino Honório!' (em: Ségur, p. 269).
Esse famoso santo (que mais tarde seria martirizado pelos monotelitas) analisou os escritos de Honório e concluiu que o papa reconheceu em Cristo duas vontades, a vontade divina e a vontade humana não corrompida. Ele relata que a tentativa fraudulenta dos hereges gregos de reivindicar o nome de Honório para a causa monotelita provocou indignação no clero de Roma. 'O excelente abade Anastácio, ao voltar de Roma, nos relatou que havia discutido com os sacerdotes mais respeitados de todas as grandes igrejas sobre a questão da carta que eles escreveram a Sérgio, perguntando-lhes: 'Como devemos entender a expressão: uma vontade em Cristo, contida nesta carta?' Anastácio descobriu que esta questão os afligia e que estavam prontos para defender Honório. Anastácio também conversou com o abade João Symponus, que havia redigido esta carta em latim por ordem de Honório. A opinião deste abade foi: 'Quod nullo modo mentionem in ea per numerum fecerit unios omnimodae voluntatis', ou seja, que em sua carta Honório nunca sustentou que se deveria contar apenas uma única vontade em Cristo, e esta opinião lhe foi atribuída por aqueles que traduziram a carta para o grego. Não se devia negar em Cristo a existência da vontade humana em geral, mas apenas a existência da vontade corrompida pelo pecado." (São Máximo: Tomus endereçado ao padre Marinos, 640/641, em: Charles Joseph Hefele: História dos Concílios de acordo com os documentos originais, Paris 1909, vol. III, p. 382).
Georg Kreuzer (A Questão de Honório na Idade Média e Moderna (Papas e Papado, vol. VIII), tese de doutorado, Stuttgart 1975) editou um texto grego da carta de Honório. Ele especifica que este texto apresenta nada menos que QUARENTA variantes em relação a outras versões gregas do mesmo texto!
Há um contraste evidente entre o original em latim, que é diotelita, e a tradução grega monotelita: a palavra latina "discrete" (= de forma distinta) é traduzida por um termo grego que significa exatamente o oposto: (= sem distinção)! Honório escreveu: Cristo "operou o que é humano pela carne assumida de maneira inefável e única e preenchida pela divindade de forma distinta". O falsário grego traduziu: Cristo "operou o que é humano pela carne assumida de maneira inefável e única e preenchida pela divindade sem distinção" (original latino, cópia grega infiel e tradução francesa desses dois textos em Heinrich Denzinger: Símbolos e Definições da Fé Católica, Paris 1996, p. 176). Quem é mais credível: o secretário do papa que escreveu o original em latim em Roma, ou os copistas de Constantinopla que traduziram mal a carta para o grego?
São Maximo registrou um diálogo que teve em 645 em Cartago com o monotelita Pyrrhus, que sucedeu ao bispo de Constantinopla, Sérgio, mas que foi deposto por crime de heresia e exilado na África. Após o diálogo com São Maximo, Pyrrhus renunciou aos seus erros, mas posteriormente recaiu neles, o que lhe rendeu um anátema do papa. Este diálogo é muito instrutivo, pois mostra como os monotelitas manobraram fraudulentamente para se adornar com a autoridade de Honório, que estaria (supostamente) do lado deles.
"- Pyrrhus: O que tens a dizer sobre Honório, pois ele ensinou claramente ao meu predecessor que só há uma vontade em Cristo."
·Maxime: À qui faut-il demander le sens des propositions d’Honorius, à celui qui a rédigé la lettre, ou bien à ceux de Constantinople, qui rapportent les faits en les dénaturant d’après les désirs de leur cœur?
· Pyrrhus: Claramente para aquele que a redigiu.
· Maxime: Esse ainda vive e ilustrou o Ocidente com suas virtudes e também com suas definições em matéria de fé, em conformidade com a piedade [o antigo secretário de Honório tornou-se papa com o nome de Teodoro I (642 - 649) na época (645) em que São Maximo escrevia seu Diálogo com Pyrrhus]. Eis o que ele escreveu ao falecido imperador Constantino: "Nós afirmamos que há apenas uma vontade no Senhor, não a da divindade e da humanidade, mas apenas a da humanidade; pois Sergius nos escreveu que alguns afirmavam duas vontades opostas em Cristo. Respondemos que Cristo não possui duas vontades opostas, a carne e o espírito, mas apenas uma vontade que naturalmente caracteriza sua humanidade. A prova disso é que foi mencionado membros e carne, coisas que não é lícito atribuir à divindade. Mas por que Honório não mencionou a divindade? Porque ele se limitou a responder à solicitação de Sergius, e então nos mantivemos no costume das Escrituras, que falam às vezes apenas da divindade, às vezes apenas da humanidade. Com o mesmo objetivo de evitar a divisão da pessoa de Cristo, Honório defende que não se fale de uma ou duas operações, mas afirma que Cristo age de várias maneiras" (São Maximo: Diálogo com Pyrrhus).
Jean IV (640 - 642) realizou um sínodo romano em 640: condenação do monotelismo, mas silêncio sobre Honorius!
Pouco depois da morte de Honorius, as Igrejas da África e do Oriente afirmaram a infalibilidade papal em duas cartas ao Papa São Teodoro I, terceiro sucessor de Honorius (em: Dom Prosper Guéranger: A Monarquia Pontifical, Paris e Le Mans 1869, p. 172 - 175). Portanto, Honorius não poderia ter errado!
A pedido dos bispos africanos, São Teodoro I publicou uma carta sinodal, exigindo que Paulo (bispo de Constantinopla, sucessor de Pirro que havia sido deposto pela segunda vez) abandonasse a doutrina monotelista. Paulo respondeu que reconhecia apenas uma vontade (monotelismo) e teve a audácia de invocar a autoridade de Honorius a favor de sua heresia. São Teodoro I obviamente não deu crédito a essa nova tentativa de envolver o falecido papa na causa do monotelismo. Ele anatematizou Paulo - mas não Honorius! Este fato foi relatado pelo Papa Martinho I (649 - 653) no Concílio de Latrão (em: Jean Dominique Mansi: Sacrorum Conciliorum Nova et Amplissima Collectio, Florença 1764 - 1765, reedição Paris 1901, reedição Graz 1960, vol. X, p. 878) e pelo autor da Vita Theodori (em: Liber Pontificalis).
O Concílio de Latrão, realizado em Roma em 649, reuniu 105 bispos, em sua maioria italianos, mas também gregos (!). O nome de Honorius foi mencionado neste concílio. Durante o concílio, o Papa Martinho I leu uma carta do bispo monotelita Paulo de Constantinopla para o Papa São Teodoro I. Nesta carta, Paulo afirmava se apoiar em Sérgio de Constantinopla e Honorius de Roma. Paulo escreveu: "Mas todos os piedosos doutores e pregadores retiveram em sua mente desta maneira uma vontade [= heresia monotelita: uma única vontade de Cristo]. Sobre isso, [...] temos testemunhos: com este fato concordam Sérgio e Honorius de piedosa memória, que adornam a Sé sacerdotal suprema, um aquele da Nova Roma [= Constantinopla], o outro da Antiga Roma; portanto, recebemos isto [= a doutrina monotelita] deles" (em: Mansi: Sacrorum Conciliorum Nova et Amplissima Collectio, vol. X, col. 1026). Esta carta claramente visava Honorius como monotelita. O que fez o concílio então? Anatematizou Paulo e Sérgio, mas não Honorius, indicando que os Padres de Latrão consideravam absolutamente infundada a equação "Honorius = monotelita"!
Na 5ª sessão (31 de outubro de 649, cânone 18), foram anatematizados os líderes da seita monotelita: Teodoro de Faran, Cirilo de Alexandria, Sérgio de Constantinopla e seus sucessores Pirro e Paulo - mas de forma alguma Honorius I!
Ninguém cogitava condenar este papa de santa memória, muito pelo contrário! No mesmo Concílio de Latrão, o bispo Estêvão de Dor deu um testemunho de extrema importância. São Sofrônio (bispo falecido em 638, principal adversário do monotelita Sérgio), ainda durante a vida do papa, tinha sido informado da carta de Honorius pedindo a Sérgio que guardasse silêncio. Como Sérgio continuava a propagar suas heresias, São Sofrônio então disse a Estêvão para ir de Jerusalém a Roma para informar o papa. "Marche do nascer do sol até o pôr do sol, até que chegue ao Sé apostólico, onde está o fundamento da doutrina ortodoxa, e não cesse de revelar aos homens santos que lá estão as maquinações dos hereges, até que a nova heresia seja completamente aniquilada" (em: Gerhard Schneemann: Estudos sobre a Questão de Honorius, Freiburg 1864, p. 20). Este testemunho constitui uma prova formal da ortodoxia de Honorius e do clero romano.
O sínodo reunido em Roma em 680 pelo Papa São Agatão também não condenou Honorius! São Agatão teve até a prudência de redigir expressamente duas cartas para remover qualquer possibilidade de acusação contra o falecido papa. "Com razão se acredita que o Papa Agatão fez esta declaração para remover qualquer suspeita de erro por parte de Honorius" (São Afonso: Dissertação sobre a Autoridade do Papa, artigo 1, § 3, em: Obras Completas, 1887, reeditado na Bélgica em 1975, vol. IX, p. 330). Sabendo que um concílio ecumênico estava prestes a se abrir em Constantinopla, e que os monotelitas desta cidade já haviam tentado duas vezes usar o nome de Honorius (cf. acima), o papa estabeleceu uma espécie de "certificado de ortodoxia" para todos os papas que reinaram antes dele. A autenticidade dessas duas cartas não é contestada por NENHUM historiador, enquanto muitos historiadores afirmam que os atos do Sexto Concílio Ecumênico de Constantinopla são interpolados. Portanto, na dúvida, devemos nos ater a essas duas cartas de Agatão, cuja autenticidade foi verificada e certificada PELOS PARTICIPANTES DO PRÓPRIO CONCÍLIO!
"A autenticidade da carta de Agatão ao imperador foi certificada na quarta sessão; seu conteúdo foi aprovado pelos bispos na décima oitava sessão: esta carta foi 'escrita por Deus [...] e por Agatão Pedro falou'. Portanto, esta é a carta que deve servir como guia."
O papa exortou o imperador a manter a fé "definida pelos predecessores santos e apostólicos e pelos cinco concílios ecumênicos". Esta fé, "recebemos pela tradição dos apóstolos e dos pontífices apostólicos", ou seja, pelos papas. Em seguida, Agatão expôs a sã doutrina (refutação do monotelismo) e acrescentou: "Eis a verdadeira e imaculada profissão da religião cristã, que não é inventada pela malícia humana, mas ensinada pelo Espírito Santo pela boca dos pontífices romanos" (incluindo Honorius!). Agatão, ciente de que Teodoro e Macário (e antes deles Pirro e Paulo) haviam acabado de invocar o nome de Honorius em favor da causa monotelita, tomou a iniciativa e inocentou antecipadamente o papa Honorius.
"Sob a presidência de São Pedro, esta Igreja apostólica, que é a sua, nunca se desviou do caminho da verdade para se alinhar com algum partido de erro. Em todos os tempos, a Igreja católica de Cristo inteira e os concílios universais abraçaram fielmente a sua autoridade e a seguiram em todas as coisas, como sendo a do príncipe de todos os apóstolos. Todos os veneráveis Padres se conformaram a esta doutrina apostólica [...]. Esta é a doutrina que os santos doutores ortodoxos veneraram, enquanto os hereges a perseguiram com suas acusações e a repeliram com todo o seu ódio [...]. Pela graça do Deus todo-poderoso, jamais se poderá demonstrar que esta Igreja tenha se desviado do caminho da tradição apostólica, nem que tenha sucumbido à corrupção diante das novidades heréticas, mas, graças ao príncipe dos apóstolos, ela permanece imaculada, segundo a promessa divina do Senhor [segue a citação de Lucas XXII, 32]."
O Cristo prometeu que a fé de Pedro não falhará; exortou-o a confirmar seus irmãos, O QUE OS PONTÍFICES APOSTÓLICOS, MEUS ANTECESSORES, SEMPRE FIZERAM COM AUDÁCIA. Meus predecessores 'nunca negligenciaram exortar os hereges e admoestá-los com súplicas para que abandonassem os erros dogmáticos da heresia, ou, ao menos, que se calassem', e não causassem assim um cisma ao ensinar uma vontade e uma operação em Nosso Senhor Jesus Cristo. Agatão fez aqui uma clara alusão a Honorius, que tinha pedido a Sérgio que se calasse.
Em seguida, ele prosseguiu:
"Ai de mim se eu negligenciar pregar a verdade do Senhor que estes [meus predecessores, DOS QUAIS HONORIUS] pregaram sinceramente. Ai de mim se eu enterrar a verdade com meu silêncio' (Agatão: carta Consideranti mihi ao imperador, 27 de março de 680, em: Mansi, vol. XI, col. 234 e seguintes). Como se vê, nem sequer se pode reprovar Honorius por ter guardado o silêncio, pois Agatão diz que todos os seus predecessores sem exceção pregaram a verdade e repreenderam os hereges. Já se viu um melhor certificado de bom comportamento? Lembre-se: este certificado de bom comportamento foi exaltado pelos Padres do concílio: 'Por Agatão Pedro falou!' Portanto, como poderiam eles condenar um papa por crime de heresia???"
C. A falsificação dos atos do VI Concílio Ecumênico (680-681)
No entanto, ao ler certos trabalhos históricos, encontra-se a informação de que Honório teria sido anatematizado pelo VI Concílio Ecumênico. Como explicar essa contradição entre os elogios do Papa Agatão e os registros do concílio? A explicação está na falsificação dos registros desse concílio pelos gregos.
Os gregos frequentemente falsificavam os registros dos concílios. "Adicionar ou retirar partes dos registros dos concílios eram práticas comuns entre os gregos", afirmava Anastácio, o bibliotecário (em: Ségur, p. 271). Anastácio, o bibliotecário (800-879), viveu em Roma. Ele foi arquivista dos papas e um tradutor famoso pela sua proficiência no grego.
São Roberto Belarmino escreve: "Se os gregos corromperam os concílios IV, V e VII, não é surpreendente que também tenham corrompido o VI?" (De romano pontifice, livro IV, cap. II).
Os gregos eram mal vistos por Roma devido às suas múltiplas fraudes. Os papas frequentemente se queixavam disso. O Papa São Nicolau I concedeu uma autorização baseada em um documento que ele havia recebido da Grécia, mas especificou: "desde que este documento não seja falsificado conforme o costume dos gregos" (carta ao Imperador Miguel). O Papa São Leão I, o Grande (Carta Puritatem fidei, 10 de março de 454), lamentou-se porque alguns haviam falsificado sua carta a Flaviano. Após alterarem algumas palavras e sílabas, os falsificadores afirmaram que o Papa Leão havia caído na heresia de Nestório. Uma situação semelhante aconteceria com o Papa Honório. Desde as primeiras sessões do VI Concílio, descobriu-se a presença de falsificadores entre os participantes!
Logo no início da primeira sessão, os legados pontifícios declararam que, nos últimos 46 anos, o monotelismo havia sido ensinado pelos bispos de Constantinopla Sérgio, Paulo, Pirro e Pedro, assim como por Cirilo, patriarca de Alexandria, e Teodoro, bispo de Farã (sem menção a Honório!). Apesar dos esforços do Siège apostólico, eles persistiram no erro com obstinação.
O Patriarca de Antioquia, Macários, respondeu que os monotelitas baseavam sua doutrina nos concílios, nos Padres da Igreja "e também em Honório, outrora Papa da antiga Roma" (em: Mansi, t. XI, col. 213). O concílio então examinou os documentos apresentados por Macários. Foi lido um trecho do concílio de Éfeso, que continha uma citação de São Cirilo de Alexandria. Esta citação não era monotelita (como afirmava Macários), mas diofisita. Durante a terceira sessão, foram lidos os atos do V Concílio Ecumênico: uma carta do bispo de Constantinopla, Mênas, contendo a fórmula "una voluntas", pareceu suspeita aos legados. O texto apresentado por Macários foi comparado com os originais dos arquivos imperiais, e ficou claro que Macários tinha adicionado a carta de Mênas nos atos do V Concílio! Na sétima sessão, descobriu-se que Macários também havia fabricado outro falso, uma carta do Papa Vigílio que definia (supostamente) uma "operação" de Cristo. Na nona sessão, as citações patrísticas apresentadas por Macários foram comparadas com os exemplares autênticos mantidos pelo patriarcado, e ficou provado que Macários havia falsificado os escritos dos Padres. O bispo de Antioquia persistiu e se apegou às suas (supostas) autoridades (concílios, Padres, Honório). Ele foi então anatematizado e deposto por crime de falsificação.
Na décima primeira sessão, foi lido um documento anterior de Macários, segundo o qual Honório já teria sido condenado por seu monotelismo. Isso era um mentira tão óbvia que ninguém levou a sério.
Há todas as razões para acreditar que os registros posteriores do VI Concílio tenham sido alterados por um falsário. Aqui estão algumas evidências.
A CARTA DE AGATÃO. Em sua carta ao imperador, lida na 4ª sessão, o Papa São Agatão havia condenado especificamente sete hereges monotelitas (em: Mansi, t. XI, col. 274-275). Na 13ª sessão, os Padres do concílio escreveram (supostamente!) ao Papa Agatão: "Nós excluímos do rebanho do Senhor aqueles que erraram na fé, ou, para falar como Davi, nós os matamos com anátemas, conforme a sentença pronunciada anteriormente em suas sagradas cartas contra Teodoro de Farã, Sérgio, Honório, Cirilo, Paulo, Pirro e Pedro" (em: Mansi, t. XI, col. 683). Os Padres do concílio (ou melhor: o copista que falsificou a declaração dos Padres) são aqui pegos em flagrante mentira: eles substituíram o nome de um dos condenados pelo de Honório! Vamos comparar as duas listas:
LISTA AUTÊNTICA, lida na 4ª sessão (autor: o Papa São Agatão): "1. Teodoro, o herege de Alexandria, 2. Cirilo de Alexandria, 3. Teodoro bispo de Farã, 4. Sérgio de Constantinopla, 5. Pirro (partarca de Constantinopla), 6. Paulo também, seu sucessor, 7. Pedro seu sucessor".
LISTA FALSA da SUPOSTA 13ª sessão (autor: copista falsificador): "1. Honório, 2. Cirilo, Teodoro bispo de Farã, 4. Sérgio, 5. Pirro, 6. Paulo, 7. Pedro".
O nome do herege Teodoro de Alexandria foi apagado e substituído pelo de Honório! Isso constitui uma prova incontestável de que os registros do concílio foram falsificados!
A ATITUDE DO IMPERADOR. Na carta imperial que confirmava o concílio, o imperador repetiu o anátema que supostamente atingia os seguintes hereges monotelitas: "Designamos como tais Teodoro, antigo bispo de Farã, Sérgio, antigo bispo desta cidade imperial protegida por Deus [Constantinopla]. Com eles, da mesma opinião e impiedade, estava Honorius, outrora papa da antiga Roma, que era herege como eles, concordava com eles e fortalecia a heresia; e também Cirilo, bispo de Alexandria, assim como Pirro, Pedro e Paulo..." (em: Mansi, t. XI, col. 710-711).
No entanto, de maneira bastante curiosa, esse mesmo imperador, em duas cartas endereçadas ao Papa Leão II para informá-lo dos resultados do concílio, não fez NENHUMA menção à condenação de Honorius, como destacou um historiador perspicaz. "Outra prova de que os atos foram falsificados e que o texto original não continha a condenação nem o nome de Honorius é que o imperador não estava ciente disso. Teriam sido cuidadosos em mantê-lo no escuro; portanto, ele escreveu ao Santo Leão II, sucessor de Santo Agatão, e ao concílio romano de acordo com os verdadeiros registros das sessões, nas quais ele sempre participou. Portanto, não há uma única palavra sobre Honorius nessas duas cartas" (Édouard Dumont: "Provas da falsificação dos atos do VI concílio contra Honorius", em: Annales de philosophie chrétienne, Paris 1853, p. 417). Se o concílio realmente tivesse anatematizado um papa, o imperador não teria deixado de mencionar um evento tão sensacional para Leão II. No entanto, ele não o fez. Seu silêncio prova que não houve condenação de Honorius.
Há algo de suspeito. Intrigados pela reflexão de Édouard Dumont, procuramos por essas duas cartas do imperador para Leão II. Surpresa!
Trecho da primeira carta: "A lei antiga saiu da montanha de Sião; o ápice da perfeição doutrinal está na montanha apostólica em Roma" (em: Mansi, t. XI, col. 715). De maneira muito poética, o imperador aqui faz um magnífico elogio ao papado!
"Glória a Deus, que fez coisas gloriosas e preservou a fé íntegra entre nós. De forma alguma poderá acontecer - e Deus predisse que isso nunca será - que as portas do inferno (isto é, as armadilhas da heresia) possam prevalecer contra esta pedra sobre a qual Ele fundou a Igreja" (em: Mansi, t. XI, col. 718). O imperador manifesta assim de forma extremamente explícita que nenhuma heresia jamais prevalecerá contra um papa.
Trecho da segunda carta, dirigida ao sínodo romano: "Estamos admirados com a relação de Agatão, que é a própria voz de Pedro" (em: Mansi, t. XI, col. 722). É importante lembrar que Agatão afirmou não menos que quatro vezes em sua carta ao imperador que nenhum papa falhou.
Que contraste gritante! Por um lado, o imperador enaltece o papado ("ápice da perfeição doutrinal"; "pedra" inacessível à heresia); por outro lado, ele teria anatematizado um papa "herege" da mesma forma que os monotelitas, "em acordo com eles" e que teria "fortalecido a heresia"?! Não é esta uma boa prova adicional de que os registros do concílio foram alterados?
A biografia de Agatão é uma fonte de informações independente dos atos (falsificados) do concílio. De acordo com essa biografia, os Padres, os legados e o imperador removeram dos dipticos da igreja de Santa Sofia em Constantinopla os nomes de "Cirilo, Sérgio, Pirro, Paulo e Pedro", devido à sua heresia (Liber Pontificalis, vida de Agatão, t. 1, p. 354). É notável: nenhuma menção a Honório!
UMA CARTA FICTÍCIA DE HONÓRIO. Na 13ª sessão, foram lidas duas cartas de Honório a Sérgio, o que é uma fraude! Pois Honório havia escrito apenas uma carta, não duas. Isso é atestado pelo secretário do falecido papa, que menciona uma resposta a Sérgio. A segunda carta é atribuída a "Sericus", enquanto o secretário de Honório se chamava "João". Resumo de uma tese de doutorado especializada: "O testemunho dos escritores contemporâneos nos permite considerar a segunda carta como totalmente falsa e a primeira como falsificada" (Abbé Benjamin Marcellin Constant: Étude historique sur les lettres d‘Honorius (tese de doutorado defendida em Lyon), Paris 1877, p. 57). A primeira carta (Scripta fraternitatis, 634) foi mal traduzida para o grego (cf. acima nosso exemplo latim-grego-francês); a segunda carta (Scripta dilectissimi, 634) é inautêntica (cf. também o artigo de C. Silva Tarouca em Gregorianum, nO 12, 1931, p. 44-46).
O ESTRANHO SILÊNCIO DOS LEGADOS E DO PAPA AGATÃO. Honório foi (supostamente) acusado na 12ª sessão e então anatematizado a partir da 13ª sessão. "Até a 12ª sessão do VI Concílio Ecumênico, os legados pontificais frequentemente tomavam a palavra. [...] Seu comportamento parece ainda mais estranho após a 12ª sessão. Quando as duas cartas de Honório foram lidas, não se ouviu uma palavra dos legados em sua defesa. [...] Eles aceitaram em silêncio a condenação de Honório I e confirmaram sem contestação o anátema pronunciado contra ele" (Kreuzer, p. 97-100).
No Liber Pontificalis estão as biografias oficiais dos papas. No entanto, na biografia de Agatão, não há menção da condenação de Honório. Erich Caspar (Geschichte des Papsttums, Tübingen 1930-1933,1. l, p. 609) tentou explicar a ausência da condenação de Honório I na Vita Agathonis, sugerindo que os legados pontificais teriam parado de enviar relatórios a Roma a partir de março/abril de 681 devido ao "desenvolvimento desfavorável" do concílio. No entanto, esta hipótese é desmentida pelo conteúdo da Vita em si, que ainda menciona eventos que podem ter ocorrido apenas após 26 de abril (momento da 15ª sessão) (ver Duchesne: Liber Pontificalis, 1. 1, p. 356, nota explicativa 13).
Refletindo um pouco: se Agatão realmente tivesse recebido uma notícia tão sensacional - sem precedentes na história da Igreja e em flagrante contradição com a carta que acabara de escrever para certificar a ortodoxia dos papas - ele certamente teria reagido. No entanto, na Vita Agathonis, não há menção alguma da condenação de Honório, o que sugere que é puramente fictícia. Da mesma forma, os legados, se realmente tivessem tentado anatematizar Honório, certamente teriam feito comentários a respeito. Seu silêncio repentino e anormal indica que um copista inseriu o anátema contra Honório, mas esqueceu de inventar também alguns discursos dos legados, o que teria tornado a situação plausível. "Mas suponha-se que o nome de Honório não estivesse envolvido em tudo isso, o silêncio dos legados se explicaria muito bem. Eles obviamente não teriam nada a dizer nesse caso" (Dumont: "O VI Concílio e o Papa Honório", in: Annales de philosophie chrétienne, Paris 1853, p. 58).
CARTAS FICTÍCIAS DE LEÃO II. Agatão morreu em 10 de janeiro de 681. Ele foi substituído apenas no final do ano por Leão II (681-683). O bispo de Constantinopla, Teodoro, então fabricou cartas fictícias do Papa Leão II, que teria (supostamente) confirmado o anátema contra Honório (muitas evidências de falsificação em Dumont, p. 418-419 e em Caesar Baronius: Annales Ecclesiastici, Antuérpia 1600 (várias reedições), ano 683). Dessa forma, Teodoro propagou entre os gregos a fábula do anátema contra Honório. Essa fábula chegou aos ouvidos de Roma. Dois séculos depois, Roma vingou solenemente a memória ultrajada de Honório.
D. Fraudes dos Gregos contra Honório definitivamente condenadas pela Igreja
O CONCÍLIO DE ROMA: Durante o concílio realizado em Roma em 869, o papa Adriano II fez um discurso e declarou: "Lemos que o pontífice romano julgou os prelados de todas as Igrejas; mas não lemos que ele tenha sido julgado por quem quer que seja" (citado por Leão XIII: encíclica Satis cognitum, 29 de junho de 1896). No entanto, os Gregos afirmavam que Honório tinha sido julgado. Como explicar essa discrepância entre a afirmação do papa Adriano II e a dos Gregos?
É Anastase o bibliotecário quem vai fornecer a resposta. Ele escreveu ao papa João VIII que os atos do VI Concílio Ecumênico detidos pelos Gregos estavam interpolados, porque continham elementos apócrifos do VI concílio. "É muito notável que neste concílio se encontrem vários cânones e decisões dos apóstolos e do VI concílio, cuja interpretação não é conhecida nem recebida entre nós" (Anastase: Prefácio de sua tradução do VII concílio, in: Dumont, p. 434). Assim, os Orientais acreditavam na condenação de Honório com base em atos falsificados, enquanto os Ocidentais, possuindo os atos autênticos, tinham Honório em alta estima.
Essa divergência entre Oriente e Ocidente sobre o caso de Honório é corroborada pela omissão (Gregos) ou menção (Romanos) de Honório nos dipticos após o VI concílio. Em Constantinopla, o nome de Honório foi apagado dos dipticos sob Justiniano II. Justiniano II foi assassinado pelo usurpador Bardanes, discípulo do monotelita Macário. O monotelita Bardanes restaurou Serge e Honório nos dipticos. Mas dois anos depois, ele foi deposto pelo novo imperador Anastácio II, que novamente removeu Serge e Honório dos dipticos (testemunho de um contemporâneo grego, o diácono Agatão de Constantinopla: Epílogo, 714, in: Dumont, p. 420). Em Roma, por outro lado, o nome de Honório nunca foi removido dos dipticos (testemunho de Anastase o bibliotecário, que viveu em Roma no século IX, in: Baronius, ano 681).
Cette questão dos dipticos é importante. Ser mencionado nos dipticos é uma prova de ortodoxia. "Prometo não recitar durante os santos mistérios os nomes daqueles que estão separados da comunhão da Igreja católica" (São Hormisdas: Libellus fidei, 11 de agosto de 515). O fato de Honório continuar a ser mencionado nos dipticos em Roma indica que ele nunca foi excluído da comunhão da Igreja católica. Em outras palavras, a Igreja de Roma nunca ratificou a (suposta) condenação de Honório, inventada pelo falsificador grego Teodoro e retomada pelo cismático grego Fócio.
O VIII CONCÍLIO ECUMÊNICO: Na 7ª sessão do VII Concílio Ecumênico (Constantinopla IV), o Papa Adriano II observou que os gregos, mas não os papas, afirmavam que Honório estava anátema. Adriano II afirmou que julgar um papa era completamente contrário ao direito canônico. "Esta é uma presunção intolerável que não podemos ouvir. Quem entre vocês, eu pergunto, já ouviu tal coisa, ou quem já encontrou em algum lugar menção de uma enormidade tão temerária? Nós lemos que o pontífice romano pronunciou sobre os chefes de todas as Igrejas, não lemos que alguém tenha pronunciado sobre ele. Pois embora se tenha dito que Honório foi anátema, após sua morte, pelos Orientais, deve-se saber que ele foi acusado de heresia, por causa da qual apenas é lícito aos inferiores resistir à impulso dos superiores e rejeitar suas más opiniões. Mas mesmo assim, não teria sido permitido a nenhum dos patriarcas e outros bispos proferir qualquer sentença sobre ele, se antes o pontífice do mesmo Primeiro Trono não tivesse intervindo previamente por autoridade de seu consentimento" (in: Mansi, vol. XVI, col. 126). Adriano II menciona que Honório foi acusado pelos Orientais, mas também estabelece que não há aprovação pontifical desse ato. Isso confirma que os exemplares dos atos do VI Concílio detidos pelos gregos foram alterados por falsificadores. "Os manuscritos feitos em Roma são muito mais verdadeiros do que aqueles fabricados pelos gregos, porque entre nós não se pratica nem artifícios nem imposturas" (São Gregório Magno: Carta 6 a Narses).
Adrien II, afin de montrer que nul n’a le droit d’anathématiser un pape, évoqua ensuite le cas du pape Symmaque, qui avait été accusé (calomnieusement) de plusieurs crimes. « Le roi d’Italie Théodoric, voulant attaquer le pape Symmaque jusqu’à obtenir sa condamnation en justice » convoqua de nombreux clercs de son royaume et leur dit que plusieurs crimes horribles avaient été commis par Symmaque. Il leur enjoignit de se réunir en synode et de « constater cela par un jugement ». Les prélats se réunirent par déférence pour le roi. Mais ils savaient que la « primauté » du pape ne permettait pas qu’il rut « soumis au jugement de ses inférieurs ». Que faire? Juger un pape en violation du droit, ou bien encourir la colère du roi en refusant de s’ériger en juge? « À la fin, ces prélats vraiment vénérables, quand ils virent qu’ils ne pouvaient pas, sans autorisation pontificale, porter leur main contre la tête [le pape] - et ce quels que fussent les actes du pape Symmaque dénoncés -, ils réservèrent tout au jugement de Dieu » (in: Mansi, 1. XVI, col. 126).
Toujours en vue de montrer qu’il est illicite d’accuser et de juger un pape, Adrien II cita en exemple l’attitude de Jean, évêque d’Antioche. Ce prélat avait anathématisé un évêque, mais avait interdit de s’attaquer au pape. Jean n’avait pas hésité à anathématiser 1 ‘hérétique Cyrille, évêque d’Alexandrie; et pourtant, ce même Jean écrivit dans une lettre au pape St. Célestin 1er, approuvée par le concile d’Éphèse (3e session), qu’il était illicite de juger le Siège de Rome, vénérable par l’ancienneté de son autorité. « Si l’on donnait la licence à ceux qui veulent de maltraiter par des injures les Sièges plus anciens [majores = « plus anciens » ou « plus grands »] et de porter des sentences (contrairement aux lois et canons) contre eux, alors qu’ils n’ont aucun pouvoir contre ces Sièges, les affaires de l’Église iront jusqu’à la confusion extrême » (in: Mansi, t. XVI, col. 126).
O discurso de Adriano II teve seu efeito. De fato, os Padres do concílio redigiram um cânon expresso contra alguns gregos (incluindo Fotius, que havia atacado Honorius e pretendido depor o legítimo Papa Nicolau I) que pretendiam criticar, ou mesmo julgar, os papas. A Igreja Católica nunca aceitou tal insolência. A (suposta) condenação de Honorius foi expressamente criticada por Adriano II e pelos Padres do VIIIº Concílio: "A palavra de Deus, que Cristo dirigiu aos santos apóstolos e discípulos (‘Quem vos recebe a mim me recebe’ [Mateus 10, 40] e ‘Quem vos despreza a mim despreza’ [Lucas 10, 16]), cremos que foi dirigida também a todos aqueles que, após eles e seguindo o seu exemplo, se tornaram sumos pontífices. [...] Que ninguém redija nem componha escritos ou discursos contra o santíssimo papa da antiga Roma, sob pretexto de pretensos erros que ele teria cometido; isso foi feito recentemente por Fotius, e Dióscoro muito antes dele. Qualquer um que tiver a audácia de injuriar por escrito ou sem escrito a Sé do príncipe dos apóstolos, Pedro, será condenado como eles. [...] Se um concílio universal é reunido e surge alguma incerteza e controvérsia sobre a Santa Igreja de Roma, deve-se com respeito, em toda a conveniência, investigar a questão levantada, aceitar a solução, e usá-la para o bem, sem ousar pronunciar-se contra os pontífices da antiga Roma" (VIIIº Concílio Ecumênico (867), cânon 21).
O Papa Adriano II impôs a todos os clérigos do Oriente e do Ocidente a assinatura da profissão de fé do Papa São Hormisdas. Honorius assim teve seu "certificado de ortodoxia", pois esta profissão de fé afirma que a promessa de Cristo "se cumpriu; pois a religião católica sempre foi guardada sem mancha na Sé apostólica".
DECISÕES DO VATICANO I FAVORÁVEIS A HONÓRIO I: Os Padres do Vaticano I compilaram uma lista de bons livros sobre os "casos históricos" das supostas falhas dos papas (capítulo 4).
Os Padres do Vaticano I tratam da (suposta) condenação de Honório no Sexto Concílio Ecumênico? Isso pode ser deduzido de uma alusão discreta, mas firme. No capítulo 4 da Pastor Aeternus, os Padres do Vaticano escrevem que "esta Sé de Pedro permaneceu pura de todo erro" e remetem, em nota, ao seguinte: "cf. a carta do Papa Santo Agatão ao imperador, aprovada pelo Sexto Concílio Ecumênico". Nos esquemas preparatórios da Pastor Aeternus, foram citados trechos dessa carta; no esquema definitivo, restou apenas a referência de rodapé. Segundo os Padres do Vaticano, do Sexto Concílio Ecumênico deve-se reter não uma (FICTÍCIA) condenação de Honório, mas sim a carta (AUTÊNTICA) do papa reinante, que certifica que todos os papas eram ortodoxos e lutavam contra as heresias. Além disso, eles mencionam o formulário de Hormisdas-Adriano II (ver acima) e afirmam explicitamente: "Nossos predecessores trabalharam incansavelmente na propagação da doutrina salvadora de Cristo entre todos os povos da terra e cuidaram com igual cuidado de sua conservação autêntica e pura, onde quer que tenha sido recebida".
E. Os trabalhos históricos que tratam Honorius como herege são proibidos pela Igreja.
O Bispo Jacques Bénigne Bossuet, por subserviência ao rei galicano Luís XIV, escreveu um panfleto pseudo-científico contra a infalibilidade. Ele abordou extensivamente o caso de Honorius nesta Defensio declarationis conventus cleri Gallicani anni 1682 (1730, livro VII, capítulos 21-29). Honorius teria aprovado a heresia de Sérgio e teria sido condenado no VI Concílio por precipitar a Igreja no erro. O papa reinante considerou colocar o livro de Bossuet no Índice, mas se absteve por razões políticas (para não indispor Luís XIV). Em uma carta ao inquisidor geral da Espanha, datada de 13 de julho de 1748, Bento XIV desaprovou este livro e acrescentou: "No tempo de Clemente XII, nosso predecessor de feliz memória, considerou-se proibir este trabalho, mas acabou-se concluindo não fazê-lo, não apenas por causa da reputação do autor, que tanto contribuiu para a religião em muitos outros aspectos, mas também por temer fundadamente provocar novos distúrbios".
De acordo com outros trabalhos de historiadores protestantes, galicanos e jansenistas, Honorius teria sido herege. É interessante notar que eles foram colocados no Índice[[1]]. Assim, a Santa Igreja sugere que a teoria "Honorius = herege" é uma tese ilícita!
CONCLUSÃO DE NOSSO APÊNDICE A: Dizer que Honorius foi condenado por crime de heresia é uma afirmação cientificamente falsa. Dizer que ele foi "apenas" anatematizado por sua negligência em combater a heresia também é uma afirmação falsa. De acordo com o testemunho dos contemporâneos - que estavam bem posicionados para saber! - este papa "poderoso por sua doutrina" (epitáfio) 1. lutou vigorosamente contra o monotelismo (testemunho dos bispos espanhóis), 2. esforçou-se para corrigir o monotelita Sérgio (testemunho de São Máximo).
Resumo: Honorius I foi um papa "brilhante por sua doutrina", que lutou vigorosamente contra a heresia monotelita. A Igreja definiu dogmaticamente (Vaticano I) que todos os papas sem exceção foram ortodoxos e colocou no Índice livros de pseudo-historiadores que afirmavam o contrário.
[1] Uma bibliografia de obras a favor e contra Honorius é fornecida por Wilhelm Plannet: Die Honoriusfrage auf dem Vatikanischen Konzil, tese de licenciatura em teologia, Marburg 1912. Uma bibliografia mais abrangente com um resumo do conteúdo é fornecida por Georg Kreuzer: Die Honoriusfrage im Mittelalter und in der Neuzeit (coleção "Päpste und Papsttum", vol. VIII), tese de doutorado, Stuttgart 1975. Alguns livros resumidos por Kreuzer foram colocados no Índice:
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Edmond Richer (galicano): Opera omnia, 29 de outubro de 1622 e 4 de abril de 1707; Historia Conciliorum generalium, 17 de março de 1681 (bula de Inocêncio XI);
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Simon Vigor (galicano): Opera omnia (ele calunia Honorius em sua Apologia contra Vallam), 17 de julho de 1615, 5 de março de 1622 e 23 de novembro de 1683;
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Johann Gerhard (luterano): Opera omnia (ele calunia Honorius no livro Confessio catholica), 5 de julho de 1672, 27 de abril de 1716 e 10 de maio de 1757;
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Louis Ellies du Pin (jansenista e galicano); em uma carta dirigida a Luís XIV, o Papa Clemente XI chamou este autor de "um homem de doutrina detestável e culpado de vários excessos contra a Sé Apostólica"): De antiqua Ecclesiae disciplina dissertationes historicae, 22 de janeiro de 1688 (bula de Inocêncio XI); Histoire de l'Église en abrégé, 4 de dezembro de 1719;
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Louis Maimbourg (galicano): Traité historique de l'établissement et des prérogatives de l'église de Rome et de ses évêques, 4 de junho de 1685 (bula de Inocêncio XI);
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Peter Le Page Renouf (anti-infallibiliste inglês): The condemnation of pope Honorius, 14 de dezembro de 1868;
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Janus (pseudônimo de Johann Joseph Ignaz von Döllinger, o mentor do movimento dos velhos-católicos): Der Papst und das Concil, 26 de novembro de 1869;
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Gratry: Mgr l'évêque d'Orléans et Mgr l'archevêque de Malines, proibido em 1870 pelo bispo de Estrasburgo e pela quase totalidade do episcopado francês.
ANEXO B: A bula de Paulo IV inserida no direito canônico
Ao consultar uma edição anotada do código (veja a página de título reproduzida abaixo em fac-símile), observa-se que os seguintes cânones fazem referência à bula de Paulo IV (como exemplo, a página relativa ao cânone 188 é reproduzida abaixo em fac-símile).
Provavelmente o cânone mais importante é o cânone 188 (por isso é REPRODUZIDO EM FAC-SÍMILE A SEGUIR), que se refere, no rodapé, aos §§ 3 e 6 de Paulo IV: "Por uma renúncia tácita admitida pelo próprio direito, qualquer ofício fica vago por si só e sem nenhuma declaração, se o clérigo [...] se afasta publicamente da fé católica".
Aqui estão outros cânones que incorporam alguma disposição de Paulo IV:
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Cânone 167 (referência no rodapé ao § 5 da bula de Paulo IV): "Não estão habilitados a eleger [...] 4° aqueles que deram seu nome a uma seita herética ou cismática ou que aderiram publicamente a ela".
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Cânone 218, § 1 (referência ao § 1 de Paulo IV): "O pontífice romano, sucessor do primaz São Pedro, tem não apenas um primado de honra, mas também a suprema e plena autoridade de jurisdição sobre a Igreja universal, no que diz respeito à fé e aos costumes, e no que diz respeito à disciplina e ao governo da Igreja dispersa por todo o globo".
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Cânone 373, § 4 (referência ao § 5 de Paulo IV): "O chanceler e os notários devem ter uma reputação sem mancha e acima de qualquer suspeita".
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Cânon 1435 (§ 4 e 6 de Paulo IV): (concerne à privação de benefícios eclesiásticos ou ainda à nulidade das eleições para benefícios).
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Cânon 1556 (§ 1 de Paulo IV): "O primeiro assento não é julgado por ninguém".
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Cânon 1657, § 1 (§ 5 de Paulo IV): "O procurador e o advogado devem ser católicos, maiores de idade e de boa reputação; os não católicos não são admitidos, exceto em casos excepcionais e por necessidade".
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Cânon 1757, § 2 (§ 5 de Paulo IV): "São a ser recusados como testemunhas suspeitas: 10 os excomungados, perjuros, infames, após sentença declaratória ou condenatória".
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Cânon 2198 (§ 7 de Paulo IV): "Somente a autoridade eclesiástica, às vezes recorrendo à ajuda do braço secular onde julgar necessário ou oportuno, persegue o delito que, por sua natureza, lesa apenas a lei da Igreja; as disposições do cânon 120 permanecendo intactas, a autoridade civil pune, por direito próprio, o delito que lesa exclusivamente a lei civil, embora a Igreja mantenha competência sobre ele devido ao pecado; o delito que lesa a lei de ambas as sociedades pode ser punido pelos dois poderes".
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Cânon 2207 (nenhum parágrafo de Paulo IV no Codex (esquecido?), mas ainda assim mencionado no índice das Fontes; este cânon corresponde, em nossa opinião, ao § 1 de Paulo IV): "O delito é agravado, entre outras causas: 10 pela dignidade da pessoa que comete o delito ou que é vítima dele; 20 pelo abuso da autoridade ou do cargo utilizado para cometer o delito".
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Cânon 2209, § 7 (§ 5 de Paulo IV): "O elogio do delito cometido, a participação no lucro, o ato de esconder e ocultar o delinquente, e outros atos posteriores ao delito já consumado podem constituir novos delitos, se a lei os punir com uma pena; mas, a menos que haja um acordo culpável antes do delito, eles não implicam a imputabilidade desse delito."
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Cânon 2264 (§ 5 de Paulo IV): "Todo ato de jurisdição, tanto no foro interno quanto no foro externo, realizado por um excomungado é ilícito; e se houve uma sentença condenatória ou declaratória, o ato é até mesmo inválido."
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Cânon 2294 (§ 5 de Paulo IV): "Aquele que é atingido por uma infâmia de direito é irregular, conforme o cânon 984, 5°; além disso, ele é incapaz de obter benefícios, pensões, cargos e dignidades eclesiásticas, de exercer atos legítimos eclesiásticos, um direito ou um emprego eclesiástico, e deve ser afastado de todo exercício das funções sagradas."
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Cânon 2314, § 1 (§ 2, 3 e 6 de Paulo IV): "Todos os apóstatas da fé cristã, todos os hereges ou cismáticos e cada um deles: 1° incorrem automaticamente em excomunhão; 2° a menos que, após serem advertidos, se arrependam, devem ser privados de todo benefício, dignidade, pensão, cargo ou outra função na Igreja, devem ser declarados infames e, se forem clérigos, depois de repetida advertência, devem ser depostos; 3° se derem seu nome a uma seita não católica ou aderirem publicamente a ela, são infames automaticamente e, levando em conta a prescrição do cânon 188, 4°, os clérigos, após uma advertência infrutífera, devem ser degradados."
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Cânon 2316 (§ 5 de Paulo IV): "Aquele que, de qualquer forma, ajuda espontaneamente e conscientemente a propagar a heresia, ou que participa in divinis [= que assiste ao culto de uma seita não católica] com os hereges contrariamente à prescrição do cânon 1258, é suspeito de heresia."
ANEXO C: O que é um "herege"?
A. A pertinácia
B. Ninguém deve ignorar o magistério
C. Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla são pertinazes?
D. Os hereges não fazem parte da Igreja
A. A Pertinácia
É considerado herege aquele que nega um dogma "com pertinácia". O advérbio latino "pertinaciter" pode ser traduzido para o francês como: com obstinação, teimosia, determinação.
Os teólogos distinguem duas categorias de pessoas: aquelas que estão no erro sem serem pertinazes e aquelas que aderem ao erro com obstinação:
O "herege material" é aquele que está materialmente no erro (desvio da fé), mas está neste erro por IGNORÂNCIA da doutrina católica. Ele não faz realmente parte dos "haereticis", mas está na categoria dos "errantes".
O "herege formal", por outro lado, está no erro não por ignorância, mas por malícia: ele SABE que suas ideias são contrárias ao magistério da Igreja Católica, mas ainda assim se apega a elas. Ele é herege.
São Tomás define o ato de heresia como um ato de rejeição do magistério: "É manifesto que aquele que adere à doutrina da Igreja como a uma regra infalível concorda com tudo o que a Igreja ensina; do contrário, se entre as verdades ensinadas pela Igreja ele retém apenas o que quer e deixa de lado o que não quer, ele não adere mais à doutrina da Igreja como a uma regra infalível, mas ao seu próprio julgamento. Assim, o herege que rejeita obstinadamente um único artigo de fé não está disposto a seguir o ensinamento da Igreja sobre os outros... ele possui, portanto, em matéria de fé, apenas uma opinião humana, ditada pela sua vontade" (São Tomás de Aquino: Suma Teológica, II-II, q. 5, a. 3).
Sustentando-se em São Tomás e em muitos teólogos, o Dicionário de Teologia Católica (artigo "heresia") define os termos "heresia" e "pertinácia" da seguinte forma: "O ato de heresia sendo um julgamento errôneo da inteligência, basta, portanto, para cometer o pecado de heresia, emitir consciente e voluntariamente este julgamento errôneo, em oposição ao ensinamento do magistério da Igreja. Desde o momento em que se CONHECE suficientemente a regra da fé na Igreja, e que em qualquer ponto, por qualquer motivo e de qualquer forma, se recusa a se submeter a ela, a heresia formal está consumada [...]. Esta oposição deliberada ao magistério da Igreja constitui a pertinácia, que os autores exigem para que haja pecado de heresia [...]. É preciso observar com Cajetano In IIam IIae, q. XI a. 2) e Suarez (loc. cit., nº 8), que ESTA PERTINÁCIA NÃO IMPLICA NECESSARIAMENTE uma longa obstinação por parte do herege e ADVERTÊNCIAS POR PARTE DA IGREJA".
O que constitui a pertinácia é o conhecimento e a rejeição do MAGISTÉRIO (e não o rejeito de uma admoestação canônica INDIVIDUAL). É a oposição ao magistério (e não a desobediência a um aviso individual expedido pelo ordinário do lugar) que constitui a pertinácia. Segundo o Doutor Angélico, apenas a IGNORÂNCIA do magistério eclesiástico desculpa da heresia: "... se ele não é pertinaz, mas está pronto para corrigir seu julgamento conforme determina a Igreja, e assim erra não por malícia, mas por IGNORÂNCIA, ele não é herege" (São Tomás de Aquino: Comentário sobre todas as Epístolas de São Paulo, lição 2 sobre Tito III, 10).
"Se houver aqueles que defendem sua maneira de pensar, ainda que falsa e perversa, sem colocar qualquer animosidade obstinada, mas buscando a verdade com cuidado e cautela, estando prontos para se corrigir assim que a encontrarem, não devem ser contados entre os hereges de forma alguma" (Santo Agostinho: Epist. 43, cap. 3; Decretais, § 24), porque de fato não escolhem estar em contradição com o ensinamento da Igreja. [...]. Pelo contrário, depois que as coisas foram definidas pela autoridade da Igreja universal, se alguém repugnar obstinadamente a tal decisão, ele será herege" (São Tomás: Suma Teológica, II-II, q. 11, a. 2).
Segundo o Doutor Angélico, o que constitui a pertinácia é uma oposição à verdade conhecida - e não o rejeito de uma admoestação canônica individual enviada pelo bispo local. Por isso, um homem perverso, que nega conscientemente dogmas, mas nunca foi detectado e julgado individualmente pela autoridade, ainda é considerado herege.
Se argumentássemos que é absolutamente necessário um julgamento do Sé apostólico ou do bispo local contra tal indivíduo, chegaríamos ao absurdo. Ao nosso conhecimento, Calvino nunca recebeu uma admoestação canônica individual, assim como o reformador suíço Zwinglio ou o amigo de Lutero, Melanchthon. Então, eles não seriam hereges?! Da mesma forma, milhões de protestantes que ignoraram os anátemas pronunciados pelo Concílio de Trento não seriam hereges, porque teriam que ser citados um por um diante do tribunal?!
Se apenas aqueles que rejeitaram uma admoestação canônica individual fossem considerados hereges, chegaríamos a outro absurdo. Bastaria então que a Igreja deixasse de enviar admoestações canônicas, e então nunca mais ninguém seria herege. Esta seria uma solução elegante que tornaria desnecessárias as pregações e orações pela conversão dos hereges. Adotar tal posição equivaleria a imitar a Igreja conciliar.
Nota importante: Existem dois tipos de admoestações e condenações: as individuais e as coletivas. Por exemplo, Lutero foi sujeito a uma condenação individual. Uma condenação coletiva pela Igreja geralmente se apresenta na forma "Se alguém afirmar que... (segue-se a opinião proibida)... que seja anátema". A Igreja ainda pode dar uma ordem positiva: "Definimos que... (tal dogma católico)... faz parte da Revelação divina". Qualquer pessoa que conscientemente desobedeça a tais injunções é considerada herege, sem necessidade de outra declaração por parte da Igreja.
O ensinamento de São Tomás sobre este ponto (ver acima) está perfeitamente alinhado com o que o Papa Pio IX ensina indiretamente: "Se alguém tiver a presunção [...] de pensar contrariamente à nossa definição [da Imaculada Conceição], que ele saiba e reconheça que, CONDENADO POR SEU PRÓPRIO JULGAMENTO, teria naufragado na fé e DEIXADO DE ESTAR NA UNIDADE DA IGREJA; e, além disso, incorre POR ISSO MESMO nas penas do direito, se ousar expressar o que pensa por palavra falada, por escrito ou por qualquer outra forma exterior" (Pio IX: constituição Ineffabilis Deus, 8 de dezembro de 1854).
Essas poucas citações são suficientes para definir a "pertinácia". É herege pertinaz aquele que contradiz conscientemente a doutrina católica. A admoestação canônica individual não é necessária, pois há um aviso coletivo: a voz do magistério substitui a admoestação universal dirigida a todos os fiéis.
B. Ninguém está isento de ignorar o magistério
Segundo São Tomás (Suma Teológica, I, q. 32, a. 4), todos os católicos são supostos conhecer o magistério da Igreja e as verdades reveladas na Sagrada Escritura. O código de direito canônico estipula que todos os fiéis não só devem acreditar em tudo o que a Igreja ensina (portanto, todos são supostos conhecer o magistério!), mas também são obrigados a evitar heresias ou opiniões próximas da heresia (portanto, todos são supostos conhecer os avisos contra o protestantismo, o liberalismo, o modernismo, etc.). Foi por isso que São Pio X obrigou cada clérigo a pronunciar o juramento antimodernista, para assegurar que ninguém permanecesse ignorante das condenações feitas contra os erros maçônicos modernistas.
OBRIGAÇÃO LEGAL DE CONHECER O MAGISTÉRIO: "Devem ser cridas, de fé divina e católica, todas as coisas que estão contidas na Palavra de Deus, seja escrita ou transmitida pela tradição, e que a Igreja, seja por um julgamento solene, seja pelo magistério ordinário e universal, propõe como divinamente revelado" (cânon 1323, § 1, citando o Concílio Vaticano I: Constituição Dogmática Dei Filius, 26 de abril de 1870, cap. 3, intitulado "de fide").
OBRIGAÇÃO LEGAL DE CONHECER AS HERESIAS OU ERROS PRÓXIMOS DA HERESIA: "Não é suficiente evitar a depravação herética, mas é necessário também fugir diligentemente desses erros que se aproximam mais ou menos dela. Portanto, todos devem seguir as constituições e decretos pelos quais essas opiniões são proscritas e proibidas pelo Santo Sé" (cânon 1324).
As decisões do magistério - seja para ensinar a verdade ou para proibir um erro - TÊM FORÇA DE LEI. E ninguém está isento de ignorar a lei: "A ignorância da lei geralmente não se presume" (cânon 16, § 2).
A ignorância pode ser "afetada", ou seja, voluntária, resultante da decisão de não se instruir sobre a lei para poder violá-la mais livremente. Uma atitude tão detestável não isenta de nenhuma pena latae sententiae. "A ignorância afetada da lei, ou apenas da pena, nunca desculpa de nenhuma pena latae sententiae" (cânon 2229, § 1). A pena latae sententiae, vale ressaltar, é uma punição decretada previamente pelo legislador. Por exemplo, São Pio X (motu proprio Praestantia, 18 de novembro de 1907) excomungou previamente qualquer pessoa que, no futuro, professasse os erros modernistas.
Quando a ignorância é apenas fruto de negligência, diz-se que a pessoa está em uma ignorância "crassa" (sinônimo: "supina"). Mas mesmo nesse caso, a ignorância não desculpa de nenhuma pena latae sententiae. "A ignorância crassa ou supina da lei, ou apenas da pena, não desculpa de nenhuma pena latae sententiae" (cânon 2229, § 3). A ignorância "crassa" é própria dos preguiçosos, que negligenciam instruir-se sobre o que deveriam saber. Por exemplo, um médico ou parteira que ignorasse seus deveres específicos de estado, simplesmente porque não quis ler, por exemplo, o Discurso às Parteiras de Pio XII.
Outro exemplo: um clérigo que fizesse o juramento antimodernista sem nunca ter lido os escritos antimodernistas e antiliberais aos quais o juramento faz referência explícita. Se tal clérigo - Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla, para citar alguns - caísse na heresia modernista, mesmo que por ignorância crassa, incorreria nas penas latae sententiae aplicadas aos modernistas: excomunhão e perda automática de seu cargo eclesiástico.
C. Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla são pertinazes?
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Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla têm um perfeito conhecimento da doutrina católica. A prova:
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O juramento antimodernista que prestaram (ver capítulo 11) e...
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As referências de rodapé em seus próprios escritos!
No § 2 da Dignitatis humanae (documento lido e aprovado por Montini), encontramos, de fato, uma referência à encíclica Libertas do Papa Leão XIII, na qual a liberdade religiosa é formalmente condenada!
E no § 6 da Dignitatis humanae, há uma nota que faz referência à encíclica Immortale Dei, onde Leão XIII condena a separação entre a Igreja e o Estado!
Da mesma forma, a encíclica Mortalium animos de Pio XI, que condena antecipadamente o falso ecumenismo da seita conciliar, é citada como referência de rodapé no novo código (inválido e herético) de direito canônico, promulgado em 25 de janeiro de 1983 por Wojtyla (Pontificia commissio Codici juris canonici authentice interpretando: Codex iuris canonici auctoritate Ioannis Pauli PP. II promulgatus fontium annotatione et indice analytico-alphabetico auctus, Cidade do Vaticano 1989, nota de rodapé do cânon 755, § 1).
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Da mesma forma, no Catecismo da Igreja Católica (tão querido por Wojtyla que ele o impôs a todos os conciliares), encontramos referências a documentos pontifícios diametralmente opostos às heresias de Wojtyla:
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Pio VI: breve Quod aliquantum de 10 de março de 1791, condenando os direitos do homem;
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Pio IX: encíclica Quanta cura de 8 de dezembro de 1864, proibindo os erros modernos (incluindo a liberdade religiosa);
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Leão XIII: encíclica Diuturnum de 29 de junho de 1881, encíclica Immortale Dei de 1º de novembro de 1885, encíclica Libertas de 20 de junho de 1888, que proíbem a separação entre a Igreja e o Estado;
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Pio XI: encíclica Quas primas de 11 de dezembro de 1925, sobre Cristo Rei;
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Pio XII: encíclica Mystici corporis de 29 de junho de 1943, contra uma falsa concepção da Igreja;
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Concílios ecumênicos de Niceia I e II, Constantinopla I, II, III e IV, Éfeso, Calcedônia, Latrão IV e V, Lyon II, Viena, Constança, Florença, Trento e Vaticano I.
Com um tal background cultural, Wojtyla está certamente ciente da doutrina cristã! Todas essas referências aos papas e concílios provam incontestavelmente que ele CONHECE o magistério. Portanto, é em plena CONSCIÊNCIA que ele se OPÕE a ele. Por isso, sua PERSISTÊNCIA é mais do que evidente - desde que se queira abrir os olhos e encarar a realidade de frente...
D. Os hereges não fazem parte da Igreja
Os hereges não fazem parte da Igreja, mesmo sem qualquer declaração da parte dela. São Roberto Belarmino especifica uma consequência importante do pecado da heresia: "Os hereges, antes mesmo de serem excomungados, estão fora da Igreja e privados de toda jurisdição. Pois eles se condenaram por sua própria sentença, como ensina o Apóstolo (Tito III, 10), ou seja, cortaram-se do corpo da Igreja sem excomunhão" (São Belarmino: De romano pontifice, livro II, capítulo 30).
O Catecismo do Concílio de Trento ensina o mesmo: "Os hereges e os cismáticos estão excluídos da Igreja, porque se separaram dela; de modo que não pertencem a ela mais do que um desertor pertence ao exército que abandonou. O que não impede [mas não é de modo algum obrigatório] que eles estejam sob o poder da Igreja, e que ela possa julgá-los, puni-los e atingi-los com anátema".
CONCLUSÃO DE NOSSO ANEXO C: É herege aquele que se opõe conscientemente ao magistério eclesiástico. Roncalli, Montini, Luciani, Wojtyla são hereges porque conhecem a verdadeira doutrina, mas ensinam o contrário.
"Afasta-te do homem herege!" (Tito III, 10).
"Se alguém vem a vós e não traz esta doutrina [de Jesus Cristo], não o recebais em vossa casa e nem o saudeis. Pois quem o saúda participa de suas más obras", mostrando, por essa cortesia que lhe presta, não ter horror suficiente de sua heresia (2 João 10-11).
Resumo: Aquele que, como Roncalli, Montini, Luciani ou Wojtyla, se opõe conscientemente ao magistério eclesiástico é herege e, por esse fato, está fora da Igreja.
BIBLIOGRAFIA
A. Coletâneas de textos do magistério
Acta Apostolicae Sedis (A.A.S) Jornal oficial da Santa Sé
Atos de papas de diversas épocas que foram incorporados no direito canônico: ver abaixo a coletânea de Gasparri.
Atos de Pio VI: Coleção geral das bulas e instruções de nosso santíssimo pai o papa Pio VI relacionadas à Revolução Francesa, editado pelo padre M.N.S. Guillon, Le Clere, Paris 1798, 2 vols. (edição original Roma 1796); tradução alemã: Coleção completa de todas as bulas, instruções, concessões de indulgência e negociações de nosso santo pai Pio Papa VI sobre a Revolução Religiosa Francesa, organizada e traduzida da edição romana por Dom. A. Guilleaume (sic; a ortografia correta é Guillon), 2 vols. pela H.S. Haas und Sohn, Colônia 1797; 3 vols. pela Coppenrath em Münster; 3 vols. pela W. Ranck em Leipzig.
Atos de Pio VII, Leão XII, Pio VIII, Gregório XVI: não há tradução francesa de seus atos, exceto algumas encíclicas ou documentos isolados: Cartas apostólicas de Pio IX, Gregório XVI, Pio VII, Bonne Presse, Paris (várias edições).
Atos de Pio IX: Coletânea de allocuções consistoriais, encíclicas e outras cartas apostólicas dos soberanos pontífices Clemente XII, Bento XIV, Pio VI, Pio VII, Leão XII, Gregório XVI e Pio IX citadas na encíclica e no syllabus de 8 de dezembro de 1864, Le Clere, Paris 1865.
Atos de LEÃO XIII: Atos de Leão XIII, Boa Imprensa, Paris (inúmeras edições), 7 1.
Atos de São PIO X: Atos de Pio X, Boa Imprensa, Paris (inúmeras edições), 8 1.
Atos de BENOÍTO XIV: Atos de Benedito XIV, Boa Imprensa, Paris 1924-1926, 31.
Atos de PIO XI: Atos de Pio XI, Boa Imprensa, Paris 1927-1945, 181.
Atos de PIO XII: Atos de Pio XII, Boa Imprensa, Paris 1949-1960, apenas os volumes 1-8, XIX e XX foram publicados; felizmente, existe, em outro editor, a integral desse papa: Documentos pontifícios de S.S. Pio XII, edições São Agostinho, Paris e Saint-Maurice (Suíça) 1950-1963, 211.
Bullário Romano (várias edições)
DENZINGER, Heinrich: Símbolos e definições da fé católica, Cerf, Paris 1996 (latim e francês; também existe em latim e alemão na Herder Verlag, Friburgo). AVISO: com a 23ª edição (1963), Adolf Schonmetzer reviu completamente o Enchiridion symbolorum de Denzinger, eliminando muitos textos sobre a papado e contra o ecumenismo (deriva lamentável); portanto, pode ser frutífero consultar também uma edição anterior a 1963. Curiosamente, os editores do Denzinger eles mesmos confessam seu erro na introdução de 1996: Schönmetzer "suprime as exagerações papaístas [...] e introduz textos que têm sua importância na discussão ecumênica [...] Schönmetzer eliminou uma série de textos embaraçosos na perspectiva ecumênica devido à sua rigidez. [...] minimizou a infalibilidade do magistério da Igreja".
DUMEIGE, Gervais: Textos doutrinais do magistério da Igreja sobre a fé católica, Orante, Paris 1975
GASPARRI, cardeal Pietro: Código de Direito Canônico, compilado por ordem do Papa Pio X, promulgado pela autoridade do Papa Bento XV, com prefácio, anotações de fontes e índice analítico-alfabético pelo cardeal Pietro Gasparri, Tipografia Poliglota Vaticana, Roma 1918 (existem edições posteriores; a edição de 1996 está disponível na Libreria Editrice Vaticana)
GASPARRI, cardeal Pietro: Fontes do Código de Direito Canônico. Editado pelo cardeal Pietro Gasparri, Tipografia Poliglota Vaticana, Roma (várias edições; disponível na Libreria Editrice Vaticana), 9 1.
GUÉRIN, Monsenhor Paul: Concílio Ecumênico do Vaticano. Sua história, suas decisões em latim e francês, Bar-le-Duc e Paris 1877
GUÉRIN, Monsenhor Paul: Os concílios gerais e particulares, Bar-le-Duc 1872, 3 1.
LABBE, Philippe e COSSART, Gabriel: Concílios sacrossantos..., Paris 1671-1672, 171.
MANSI, João Domingos: Coleção nova e amplíssima dos concílios sagrados, Florença 1764-1765, reedição Paris 1901, reedição Graz 1960, 53 1.
MIGNE, abade J.P.: Curso completo de Patrologia, Paris 1855 sqq.: essa coleção contém os escritos dos papas até Inocêncio III, além dos escritos dos Padres da Igreja. Ela se divide em duas séries: Série Grega (abreviação: P. G.: 161 volumes em grego com tradução latina) + Série Latina (abreviação: P.L.: 221 volumes em latim). Um século mais tarde, A.G. Hamman publicou um suplemento contendo textos (heréticos!) sob o título Suplemento à Patrologia Latina (5 volumes, 1958-1974). A patrologia de Migne está disponível em fac-símile na Brepols Publishers, Turnhout (Bélgica). A livraria Chadwick nos EUA comercializa uma versão eletrônica da série latina de Migne (abreviação: P.L.D. = Banco de Dados de Patrologia Latina), acessível apenas por meio dos computadores das universidades ou bibliotecas públicas que assinaram um contrato com essa editora.
SCHNEEMANN, Gerardus: Atos e decretos do sagrado concílio ecumênico do Vaticano, com muitos outros documentos relacionados ao concílio e sua história (coleção "Coleção Lacense", t. VII), Friburgo 1892
SOLESMES, monges de: A Igreja (coleção "Os ensinamentos pontificais"), Desclée, Bélgica 1959, 2 t. (na mesma coleção, existem outros recolhimentos temáticos, mas que não se relacionam com nosso assunto)
Nova Página
B. Obras Especializadas sobre a Papado
BELLARMIN, cardeal São Roberto: De romano pontifiee, em: Disputationes de controversiis christianae fidei adversus huius temporis haereticos, Ingolstadt 1586 - 1593; ou ainda em: Opera omnia, Paris 1870, v. 1 e II
CONSTANT, abade Benjamin Marcellin: A História da Infalibilidade dos Papas ou Pesquisas Críticas e Históricas sobre os Atos e Decisões Pontifícias que Diversos Escritores Acreditaram Contrárias à Fé, segunda edição, Lyon e Paris 1869, 2 volumes.
GUÉRANGER, Dom Prosper: A Monarquia Pontificia, Paris e Le Mans 1869
GUÉRANGER, Dom Prosper: Defesa da Igreja Romana contra as Acusações do R.P. Gratry, Paris 1870
GUÉRANGER, Dom Prosper: Resposta às Últimas Objeções, Paris 1870
NAU, Dom Paul: « O Magistério Pontifício Ordinário, Lugar Teológico. Ensaio sobre a Autoridade dos Ensinamentos do Soberano Pontífice », em: Revue thomiste, 1956, p. 389 - 412, separado em Neubourg 1962
NAU, Dom Paul: Uma Fonte Doctrinal: As Encíclicas. Ensaio sobre a Autoridade de seu Ensino, Cèdre, Paris 1952
PIGHIUS, Albert: Assertio Hierarchiae Ecclesiasticae, Colônia 1538
PIGHIUS, Albert: Explicação Diligentes e Luculenta das Controvérsias Principais Tratadas nos Concílios de Ratisbona, e pelas Quais Agora Principalmente se Agita a Fé e Religião de Cristo. Adiante, uma Apresentação sobre os Atos que Recentemente foram Publicados, dos VI. e VII. Concílios, para que Sejam Reconhecidos como Falsos e Não Genuínos. Diatribae de Alberti Pighij, Colônia 1542
ROHRBACHER, abade René François: História Universal da Igreja Católica, 1842 - 1849 (várias reedições no século XIX), 13 volumes.
SALES, Monsenhor São Francisco de: As Controvérsias, em: Obras de São Francisco de Sales, Annecy 1892, 1 volume.
SÉGUR, Monsenhor de: O Soberano Pontífice, em: Obras Completas, Paris 1874, 1 volume.
VACANT, Jean Michel Alfred: Estudos Teológicos sobre as Constituições do Concílio do Vaticano, de Acordo com os Atos do Concílio, Paris e Lyon 1895, 2 volumes.
ZACCARIA, François Antoine: Anti-Febronio, 1767, tradução alemã Augsburgo 1768; tradução francesa: L’Antifebronius ou a Primauté do Papa Justificada pelo Raciocínio e pela História, Paris 1859 - 1860, 4 volumes.