INQUÉRITO CANÔNICO: A VISIBILIDADE DA IGREJA
- UM NÃO CATÓLICO PODE SER ELEITO PAPA?
- A. Uma lei de direito divino
- B. Um princípio constante da legislação apostólica bimilenar
- C. A constituição apostólica Cum ex apostolicum (1559) do papa Paulo IV
- D. Paulo IV emitiu um julgamento ex cathedra
- E. O Papa São Pio V ordena que as prescrições de Paulo IV sejam "observadas inviolavelmente"
- F. O Papa São Pio X faz inserir a bula de Paulo IV no código de direito canônico
- G. O Papa Pio XII confirma a inelegibilidade dos não-católicos para o pontificado supremo
- Conclusão
- RONCALLI, MONTINI, LUCIANI E WOJTYLA DESVIARAM-SE DA FÉ ANTES DE SUA ELEIÇÃO?
- A. O juramento antimodernista de São Pio X traído
- B. Aplicação prática da lei a Angelo Roncalli
- C. Aplicação prática da lei a Giovanni Battista Montini
- D. Aplicação prática da lei a Albino Luciani
- E. Aplicação prática da lei a Karol Wojtyla
- Conclusão
- O TRONO PAPAL PODE SUBSISTIR TEMPORARIAMENTE SEM PAPA?
- Ausência de Papa
- Conclusão
- AS QUATRO MARCAS DA IGREJA VISÍVEL
- A. A marca da unidade
- B. A marca da santidade
- C. A marca da catolicidade
- D. A marca da apostolicidade
- A Igreja conciliar não possui as quatro notas da Igreja visível!
- Conclusão
UM NÃO CATÓLICO PODE SER ELEITO PAPA?
A. Uma lei de direito divino
B. Um princípio constante da legislação eclesiástica bimilenar
C. A constituição apostólica Cum ex apostolicum (1959) do papa Paulo IV
D. Paulo IV emitiu um julgamento ex cathedra
E. O papa São Pio V ordena que as prescrições de Paulo IV sejam "observadas inviolavelmente"
F. O papa São Pio X inclui a bula de Paulo IV no direito canônico
G. O papa Pio XII confirma a inelegibilidade dos não-católicos ao soberano pontificado
A. Uma lei de direito divino
Quem é elegível para o conclave?
"São elegíveis todos aqueles que, de direito divino ou eclesiástico, não são excluídos. São excluídas as mulheres, as crianças, os dementes, os não batizados, os hereges e os cismáticos" (Raoul Naz: Traité de droit canonique, Paris 1954, t. 1, p. 375, reprisado pelo Dictionnaire de théologie catholique, artigo "élection").
"É uma opinião comum que a eleição de uma mulher, uma criança, um demente ou um não-membro da Igreja (não batizado, herege, apóstata, cismático) seria nula por lei divina." [1]
A opinião de que um homem herege ocupando a Sé de Pedro possa, no entanto, ser papa é praticamente rejeitada por unanimidade por todos os doutores e teólogos de todas as épocas. "Essa opinião é defendida por um único teólogo, entre os 136 antigos e modernos cujas posições pudemos verificar sobre este assunto. Estamos falando do canonista francês D. Bouix (falecido em 1870)" (Arnaldo Xavier da Silveira: La nouvelle messe de Paul VI: Qu’en penser?, p. 246).
Até os protestantes sabem que os conclaves são regidos pelo princípio da catolicidade dos candidatos à tiara. "É elegível qualquer cristão (mesmo um leigo) masculino, católico, que não tenha caído em heresia" (Realencyclopädie für protestantische Theologie und Kirche, terceira edição, Leipzig 1904, artigo "Papstwahl").
A cláusula de catolicidade que rege os conclaves é uma lei de direito divino. Nosso Senhor deu o exemplo: antes de colocar São Pedro à frente da Igreja, ele primeiro pediu que fizesse sua profissão de fé. Só depois de se certificar da ortodoxia do "papabile" é que Cristo o designa como pedra fundamental da Igreja. "«E vós», disse-lhes ele, «quem dizeis que eu sou?». Simão Pedro tomou a palavra: «Tu és o Cristo», disse ele, «o Filho do Deus vivo!». Então Jesus tomou a palavra e lhe disse: «És feliz, Simão, filho de Jonas, pois não foi a carne e o sangue que te revelaram isso, mas meu Pai que está nos céus. E eu te declaro: Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela»" (Mateus XVI, 15-18).
Que a cláusula de catolicidade dos candidatos à tiara seja uma lei de direito divino foi bem destacada pelo jesuíta espanhol Francisco Suarez (1548-1617). Suarez era célebre como filósofo, teólogo e jurista. Depois de mostrar, baseando-se em passagens das Escrituras, que a fé é o fundamento da Igreja, Suarez escreve: "Por isso, se a fé é o fundamento da Igreja, ela também é o fundamento do pontificado e da ordem hierárquica da Igreja. Isso é confirmado pelo fato de que essa é a razão dada para explicar por que Cristo pediu a São Pedro uma profissão de fé antes de lhe prometer o papado (Mateus XVI, 13-20)" (Francisco Suarez: De fide, disputatio X, seção VI, nº 2, in: Opera omnia, Paris 1858, t. XII, p. 316).
Entre os teólogos católicos, o mais célebre é sem dúvida o doutor angélico. Sua obra principal, a Suma Teológica, foi colocada no altar durante o Concílio de Trento. Ora, nesta Suma, encontramos duas passagens particularmente interessantes:
São Tomás ensina que a eleição de um candidato mau (e todo herege é mau!) é juridicamente contestável: "De acordo com o direito (in Glos. em ch. Custos) basta escolher o que é bom, mas não é necessário que se decida pelo melhor. [...] Para que uma eleição não possa ser contestada perante o tribunal eclesiástico, basta que o eleito seja um homem de bem, mas não é necessário que seja o melhor, porque nesse caso toda eleição poderia ser contestada" (Suma Teológica, II-II, q. 63, a. 2).
Em outro lugar, o doutor angélico ensina que nem os cismáticos, nem os hereges podem governar a Igreja: "São Cipriano (Carta 52) diz que aquele que não observa nem a unidade do espírito, nem a união da paz, e que se separa da Igreja e da assembleia dos sacerdotes, não pode ter nem o poder, nem a dignidade episcopal. Embora os cismáticos possam ter o poder de ordem, são, no entanto, privados do poder de jurisdição. [...] O poder de jurisdição [...] não se apega de maneira imutável àquele que o recebe. Portanto, ele não existe nos cismáticos e hereges; por conseguinte, eles não podem nem absolver, nem excomungar, nem conceder indulgências, nem fazer nada semelhante. Se fizerem essas coisas, elas são nulas. Assim, quando se diz que os cismáticos e os hereges não têm poder espiritual, deve-se entender por isso o poder de jurisdição" (Suma Teológica II-II, q. 39, a. 3).
Nossos ancestrais na fé às vezes contestaram a eleição de tal ou tal falso papa. A história eclesiástica é tão rica em ensinamentos!
Na época paleocristã, os Padres da Igreja são unânimes sobre a incompatibilidade radical entre a heresia e o soberano pontificado. Exemplo: o antipapa Novaciano, que era cismático e herege, foi declarado deposto do clero por São Cipriano. "Ele não pode ter o episcopado, e se foi inicialmente bispo, separou-se [por sua heresia] do corpo episcopal de seus confrades e da unidade da Igreja" (São Cipriano: livro IV, epístola 2).
Na Idade Média, o caminho seguido pelos católicos foi o seguinte: não depor um papa, mas contestar a validade da eleição de um antipapa intruso. O historiador alemão Zimmermann, após analisar uma a uma as deposições dos antipapas sucessivos, resume assim os princípios do procedimento: "Parecia perfeitamente legítimo afastar tal herege de sua posição usurpada e desconsiderar, neste caso, a máxima jurídica 'a primeira Sé não é julgada por ninguém'. O que se tirava de tal papa, só se retirava aparentemente, pois ele nunca havia realmente possuído; é por isso que seu pontificado era ilegítimo desde o início e ele mesmo só deveria ser considerado como um invasor do Santo Sé. Nas fontes sobre as deposições de papas, pode-se ler – ainda mais frequentemente do que a suspeita de simonia, e sem dúvida não por acaso – a acusação de usurpação, o que colocava em dúvida um pontificado em sua raiz, pois se expressava assim que o referido acusado nunca havia sido um ocupante legítimo da 'primeira Sé' ou nunca teria tido o direito de se considerar como tal. É por isso que a palavra 'invasio' volta regularmente nas fontes, como termo técnico para um pontificado que deve ser considerado como ilegítimo" (Harald Zimmermann: Papstabsetzungen des Mittelalters, Graz, Viena e Colônia 1968, p. 175).
A mesma observação é feita no Dicionário de Teologia Católica (artigo "deposição"): quando se privava os antipapas cismáticos de seu ofício, não se os depunha do pontificado, mas, importante nuance, se lhes tirava um pontificado que eles nunca haviam possuído desde o início. "Na verdade, os papas cismáticos foram simplesmente tratados como usurpadores e despojados de uma Sé que não possuíam legitimamente (cf. o decreto contra os simoníacos do concílio de Roma de 1059, Hardouin, t. VI, col. 1064; Graciano, dist. LXXIX, c. 9; Gregório XV: constituição Aeterni Patris (1621), sect. XIX, Bullarium romanum, t. III, p. 446). Os concílios que os atingiram apenas examinaram seus títulos à tiara. Não foram os papas que julgaram, mas a eleição e o ato dos eleitores."
[1] Arnaldo Xavier da Silveira: La nouvelle messe de Paul VI: Qu’en penser?, Chiré-en-Montreuil 1975, p. 298; o autor indica em nota suas referências: Ioannes-B. Ferreres: Institutiones canonicae, Barcelona 1917, t. I, p. 132; Matthaeus Conte a Coronata: Institutiones iuris canonici, Turim 1928, volume I, p. 360; Franciscus Schmalzgruber: Ius ecclesiasticum universum, Roma 1843, t. I, parte II, p. 376, nº 99; Caetano: De auctoritate..., cap. 26, nº 382, p. 167 - 168.
B. Um princípio constante da legislação apostólica bimilenar
Os não-católicos são "irregulares", o que os exclui não apenas do soberano pontificado, mas também do clero em geral. "As irregularidades são defeitos contrários às regras canônicas, pelos quais se é afastado das ordens ou de suas funções" (Louis Thomassin: Ancienne et nouvelle discipline de l’Église, Bar-le-Duc 1864 - 1867, l. VII, p. 564). Os defeitos se dividem em:
· irregularidades ex defectu (defeito corporal: epilepsia, debilidade mental, etc.) e em
· irregularidades ex delicto (delito: heresia, homicídio, aborto, bigamia, etc.).
O direito eclesiástico em vigor até São Pio X declarava apóstatas e hereges como irregulares (cânon Qui in aliquo, dist. 51 e cânon Qui bis. de consecratione, dist. 4). Essa disposição foi retomada por São Pio X em seu novo código de direito canônico: "São irregulares ex delicto: os hereges, os apóstatas da fé e os cismáticos" (Codex iuris canonici, 1917, cânon 985, nº 1).
Que os não-católicos sejam irregulares é um princípio constante da legislação eclesiástica bimilenar. Aquele que não é católico não pode se tornar nem sacerdote, nem bispo, nem papa. Esta regra é absoluta e não sofre nenhuma exceção. Citamos alguns documentos legislativos a esse respeito:
O primeiro documento provém de um papa que conheceu pessoalmente São Pedro. O papa São Clemente I (morto no ano 90) escreveu as regras da Igreja Católica em suas Constituições Apostólicas. Um capítulo, intitulado "Como devem ser aqueles que serão ordenados", enumera os critérios de recrutamento do clero. "Escolhei bispos, sacerdotes e diáconos dignos do Senhor, ou seja, homens piedosos, justos, mansos, não avarentos, amigos da verdade, comprovados, santos, que não fazem acepção de pessoas, que são competentes para ensinar a linguagem da piedade, E QUE SE MOSTREM DE UMA RETIDÃO PERFEITA ('que cortem corretamente') EM RELAÇÃO AOS DOGMAS DO SENHOR" (São Clemente I: Constitutiones apostolicae, livro VII, cap. 31).
Os Statuta Ecclesiae Antiqua (meados ou fim do século V) prescrevem um exame de fé antes da consagração episcopal. "Aquele que deve ser ordenado bispo será examinado previamente para saber [...] se ele afirma com palavras simples os ensinamentos da fé. [...] [segue uma enumeração dos numerosos pontos de doutrina sobre os quais o candidato deve ser interrogado]. Quando, tendo sido examinado sobre todos esses pontos, ele for considerado plenamente instruído, então [...] que seja ordenado bispo".
São Ivo de Chartres (1040-1116, bispo de Chartres; a não confundir com o padroeiro dos juristas, São Ivo, 1253-1303) participou da elaboração do direito canônico. Devemos a ele uma vasta coleção de leis, intitulada Decretos. Ele cita uma lei do papa São Leão IV (século IX): "A eleição e a consagração do futuro pontífice romano devem ser feitas conforme a justiça E AS LEIS CANÔNICAS" (Decreti, quinta parte, cap. 14, dist. 63, cap. Inter nos). E a primeira e principal lei canônica é – evidentemente – que o candidato seja católico! Isso é o mínimo...
Esta lei também é citada por Graciano (Decreto, primeira parte, dist. 63, cap. 31). O monge italiano Graciano reuniu leis dispersas e as compilou em uma coleção jurídica conhecida como Decreto (1140). Assim, ele lançou os fundamentos da ciência do direito canônico. Sua coleção de leis tornou-se uma autoridade a partir do século XII; no século XVI, o papa Gregório XIII ordenou uma publicação oficial em nome da Igreja. "Graciano (Dist. LXXXI) recusa a entrada de hereges e apóstatas no clero. Portanto, eles ainda são considerados irregulares" (Thomassin, t. III, p. 591).
São Tomás de Aquino, que frequentemente cita as leis compiladas por Graciano, ensina: "Aqueles que são irregulares em virtude do direito da Igreja não estão autorizados a ascender às ordens sagradas" (Suma Teológica, II-II, q. 187, a. 1; cf. também II-II, q. 185, a. 2).
O célebre XIX Concílio Ecumênico, reunido em Trento de 1545 a 1563, prescreve um exame da ortodoxia dos candidatos ao sacerdócio nestes termos: "Quando o bispo desejar conferir as ordens, ele convocará à cidade, na quarta-feira anterior ou no dia que desejar, todos os que desejarem recebê-las; e assistido por homens versados nas Sagradas Escrituras e bem instruídos nas ordenanças eclesiásticas, ele os examinará cuidadosamente sobre sua família, pessoa, idade, educação, costumes, doutrina e fé" (Concílio de Trento: Decreto de Reforma, cap. 7, 23ª sessão, 15 de julho de 1563).
A disciplina bimilenar se reflete no pontifical romano. Segundo este venerável livro, em uso desde tempos imemoriais, é necessário examinar a retidão doutrinária dos candidatos ao episcopado antes de sua consagração. O examinador se dirige assim ao candidato: "A antiga instituição dos Padres ensina e prescreve que aquele que é escolhido para a ordem do episcopado seja previamente examinado com o maior zelo". Entre as questões sobre a fé e os costumes dirigidas ao candidato, está a seguinte: "Você quer acolher com veneração, ensinar e servir as tradições dos Padres ortodoxos, bem como as decretais e constituições da Santa Sé Apostólica?" (Pontificale Romanum Summorum Pontificum Iussu Editum a Benedicto XIV et Leone XIII Pontificibus Maximis Recognitum et Castigatum, Mechliniae [Malinas, Bélgica] 1958, cerimônia "De consecratione electi in episcopum", rubrica "Examen").
De acordo com a Tradição bimilenar, os não-católicos não são admitidos nem ao sacerdócio, nem ao governo da Igreja.
O não-católico, como já dissemos, não pode de forma alguma ser admitido ao clero. Ainda mais: a Igreja é extremamente severa, pois desconfia até mesmo dos hereges convertidos: “Aqueles que, abandonando a heresia ou o cisma, vêm para a Igreja Católica não são admitidos ao clero” (Santo Agostinho: De unico Baptismo, cap. 12).
Desde o início do cristianismo até os dias de hoje, mesmo os hereges convertidos ao catolicismo (!) são considerados irregulares. Um dos primeiros concílios, o de Elvira, na Espanha (c. 300-303), declarou essa irregularidade de forma tão afirmativa e severa que é um sinal de que essa prática era muito antiga. “Se alguém, vindo de qualquer heresia, se juntar a nós como fiel (leigo), ele não deverá ser promovido ao clero de forma alguma. Quanto aos que foram ordenados anteriormente [quando ainda estavam na seita herética], eles devem certamente ser destituídos do clero” (Concílio de Elvira, cânon 51).
O papa São Inocêncio I (401 - 417) decreta: “A lei de nossa Igreja Católica é impor as mãos e conceder apenas a comunhão laica [não admitir nos cargos do clero] aos batizados que vêm a nós após terem deixado os hereges e não escolher ninguém entre eles para conferir as honras do clero”. E o papa esclarece que essa prática está conforme a Tradição, a saber, “as antigas regras, transmitidas (traditas) tanto pelos apóstolos quanto pelos homens apostólicos, que a Igreja Romana mantém e ordena que sejam mantidas” (São Inocêncio I: carta Magna me gratulatio, 18 de dezembro de 414, dirigida aos bispos da Macedônia).
Aquele que nasceu em uma seita herética, mas se converte mais tarde, não pode ser admitido ao clero. O católico que se torna herege, mas depois se retrata, também não pode se tornar sacerdote. “Quanto àquele que passa da fé católica para a heresia ou apostasia”, continua São Inocêncio I (ibidem), “mas que, [depois] se arrepende e quer voltar [à Igreja Católica], ele poderia ser autorizado a ser admitido nos cargos do clero? Aquele cujo crime não pode ser apagado, a menos que faça uma longa penitência? Após sua penitência, não lhe será permitido se tornar clérigo, em virtude das leis eclesiásticas (cânones) que são autoritárias”.
Se já os antigos hereges convertidos ao catolicismo são, por princípio, não admitidos ao sacerdócio, entender-se-á facilmente que os hereges que persistem na sua heresia não poderão, de forma alguma e sob nenhum pretexto, ser admitidos ao clero, e muito menos ao soberano pontificado!
C. A constituição apostólica Cum ex apostolicum (1559) do papa Paulo IV
Esse ensinamento tradicional foi codificado juridicamente no século XVI pelo papa Paulo IV. O papa Paulo IV redigiu um texto legislativo para evitar que um cardeal suspeito de heresia pudesse ser eleito papa. Ele confidenciou a um de seus próximos: "Para dizer a verdade, queríamos nos opor aos perigos que ameaçavam o último conclave e tomar em vida precauções para que o diabo não coloque no futuro um dos seus no Trono de São Pedro" (in: Louis Pastor: Histoire des papes depuis la fin du Moyen Âge, Paris 1932, vol. XIV, p. 234).
O que aconteceu "no último conclave"? O cardeal herético Morone, que fazia ecumenismo com os protestantes, quase foi eleito papa, mas foi afastado após a intervenção enérgica do prefeito do Santo Ofício da Inquisição, o cardeal Carafa (futuro Paulo IV). Carafa abriu secretamente processos contra alguns cardeais, incluindo Morone. Com a morte do papa Júlio III (1555), os cardeais Carafa, Pio de Carpi e Juan Alvarez trouxeram ao conclave um dossiê dos processos contra vários papáveis. As acusações graves e documentadas de heresia contra Morone, Pole e Bertano impediram sua eventual eleição (cf. Massimo FIRPO: Inquisizione romana e Controriforma. Studi sul cardinal Giovanni Morone e il suo processo di eresia, Bolonha 1992, p. 312).
Carafa foi eleito e tomou o nome de Paulo IV. Ele encarcerou Morone e redigiu a bula Cum ex apostolatus (15 de fevereiro de 1559), segundo a qual a eleição de um homem que, mesmo que apenas uma vez, tenha errado em matéria de fé antes da eleição, não poderia ser válida.
A constituição apostólica na forma de bula Cum ex apostolatus de 15 de fevereiro de 1559 do papa Paulo IV estipula, no § 6, que um homem que tenha se desviado da fé não pode de forma alguma se tornar pontífice, mesmo que todos os cardeais estejam de acordo, mesmo que os católicos de todo o mundo lhe prestem alegre obediência durante décadas. Todos os atos e decisões de tal pseudo-pontífice seriam juridicamente nulos e sem efeito, e isso ipso facto, sem que seja necessária outra declaração por parte da Igreja.
Aqui estão os principais trechos do texto de Paulo IV[^1]:
« A carga apostólica, confiada a nós por Deus apesar de nossa indignidade, nos impõe o cuidado geral do rebanho do Senhor. Para guardá-lo na fé e conduzi-lo no caminho da salvação, devemos, como pastores atentos, vigiar constantemente e cuidar diligentemente de afastar do aprisco do Senhor aqueles que, em nossa época, entregues aos pecados, confiando em suas próprias luzes, se insurgem com uma rara perversidade contra a regra da verdadeira fé e, distorcendo a compreensão das Sagradas Escrituras, esforçam-se por dividir a unidade da Igreja Católica [...]. Se desdenham ser discípulos da verdade, não devem continuar a ensinar o erro.
§ 1. Diante da situação atual tão grave e perigosa, não se deve permitir que se acuse o pontífice romano de desviar na fé. Ele é na terra o Vigário de Deus e de Nosso Senhor Jesus Cristo; ele possui a plenitude da autoridade sobre as nações e os reinos; ele é o juiz universal e não deve ser julgado por ninguém nesta vida. Além disso, quanto maior é o perigo, maior deve ser a vigilância completa e atenta, para que os falsos profetas, ou mesmo outros homens, revestidos de autoridade secular, não possam lamentavelmente capturar nas suas redes as almas simples e arrastar consigo para a perdição e a ruína da condenação os inúmeros povos confiados ao seu cuidado e direção, tanto espiritual como temporal; também para que nunca sejamos testemunhas da "abominação da desolação no lugar santo" anunciada pelo profeta Daniel, enquanto desejamos com todo o nosso poder, com a ajuda de Deus, segundo nosso encargo pastoral, capturar as raposas que se esforçam por devastar a vinha do Senhor e afastar os lobos dos apriscos, para não nos assemelharmos a cães mudos incapazes de latir, nem nos perdermos com maus agricultores, nem sermos comparados a mercenários.
§ 2. Após madura deliberação sobre este assunto com nossos veneráveis irmãos, os cardeais da Santa Igreja Romana, por seu conselho e com seu assentimento unânime, pela nossa autoridade apostólica, aprovamos e renovamos todas e cada uma das sentenças, censuras e penas de excomunhão, suspensão, interdição e privação que foram promulgadas e decretadas, de qualquer maneira que seja, contra os hereges e os cismáticos: [...] »
· todos os pontífices romanos, nossos predecessores [...] até através de suas cartas extravagantes;
· os sagrados concílios da Igreja de Deus;
· os santos Padres em seus decretos e estatutos;
· os sagrados cânones, constituições e ordenanças apostólicas;
e desejamos que sejam observados perpetuamente e reintegrados em pleno vigor, se necessário, e que permaneçam assim.
Elas se aplicam a todos aqueles que, até agora, tenham sido pegos em flagrante, confessado ou sido convencidos de terem se desviado da fé católica, caído em alguma heresia, incorrido em cisma ou o terem suscitado ou cometido. Elas se aplicam ainda [...] àqueles que, no futuro, ou se desviarem, ou caírem em heresia, ou incorrerem em cisma [...].
§ 3. [...] De acordo com esta nossa constituição, VÁLIDA PARA SEMPRE, por repulsa a um crime tão grande, o mais grave e pernicioso possível na Igreja de Deus, na plenitude de nosso poder apostólico, nós decidimos, estabelecemos, decretamos e definimos:
[§ 4 e 5: os clérigos ou príncipes seculares hereges são depostos de seus cargos; o § 6 trata do conclave:]
§ 6. [...] que se acontecer que um bispo, mesmo exercendo a função de arcebispo, patriarca ou primaz; que um cardeal da Igreja romana, mesmo legado; que um soberano pontífice, mesmo antes de sua promoção ou elevação ao cardinalato ou ao pontificado supremo, tenha se desviado da fé católica ou caído em alguma heresia, a promoção ou elevação, mesmo que tenha ocorrido com o consentimento unânime de todos os cardeais, é NULA, INVÁLIDA, VAZIA, e não se poderá dizer que se tornou válida ou que se tornaria válida porque o interessado aceita a carga, recebe a consagração, ou assume depois o governo e a administração ou pela entronização do pontífice romano, ou pelo ato de ajoelhar-se diante dele, ou pelo ato de obediência prestado por todos, independentemente da duração dessa situação.
A eleição não poderá ser considerada legítima em qualquer uma de suas partes, e ela não confere nem pode ser considerada conferir qualquer poder de comando, seja no campo espiritual ou temporal, a tais homens promovidos a bispos, arcebispos, patriarcas ou primazes, ou elevados ao cardinalato ou ao pontificado supremo. Todas as suas palavras, todos os seus atos e gestos, todos os seus atos administrativos, com tudo o que deles decorre, NÃO TÊM O MENOR EFEITO JURÍDICO, e não conferem a ninguém o menor direito. Tais pessoas assim promovidas ou elevadas seriam, por esse fato mesmo, SEM QUE NECESSITE DE QUALQUER OUTRA DECLARAÇÃO ULTERIOR, privadas de toda dignidade, posição, honra, título, autoridade, função e poder ao mesmo tempo [...].
§ 7. É lícito se desvincular impunemente da obediência e do serviço para com eles [os não-católicos promovidos como pseudo-papa] e evitá-los como mágicos, pagãos, publicanos, hereges [...]; e para maior confusão daqueles homens assim promovidos ou elevados, se eles desejarem continuar a governar ou administrar, será lícito apelar contra eles ao braço secular [...].
§ 8. Não obstante... etc. [fórmula habitual de promulgação; o mesmo para o § 9]
§ 10. Portanto, a nenhuma pessoa será permitido violar este texto de nossa aprovação, inovação, sanção, estatuto, derrogação, vontade e decreto com temerária audácia. Se alguém tiver a presunção de tentar isso, saiba que atrairá sobre si a indignação de Deus Todo-Poderoso e dos bem-aventurados apóstolos Pedro e Paulo.
[1] Cette bulle figure dans les Codicis Juris Canonici Fontes, Typis Polyglottis Vaticanis, Rome 1947, t. 1, p. 163 - 166. Comme l’indique le titre de ce recueil, il s’agit d’une collection des « sources » (fontes) ofticielles du droit ecclésiastique, édité par le cardinal Gasparri, membre de la commission pontificale (présidée par SI. Pie X) qui élabora le code de 1917. Typis Polylottis Vaticanis est la maison d’édition du Saint-Siège. Dans ce recueil, le texte de la bulle est reproduit jusqu’au § 7 inclusivement. Le contenu est ainsi repris, car les § 8 sqq. sont seulement les/ormu_les stéréotypées de promulgation,_ identiques pour tous les textes pontificaux. Afin de gagner de la place, ces paragraphes stéréotypés finaux ne sont pas imprimés dans les Fontes, mais seulement sous-entendus par un début de citation suivi de la mention « etc. ». Le Bullarium roman/IIII reproduit la bulle en entier (§ 1 - 10, plus les signatures du pape et des cardinaux).
[2] On appelle « lettres extravagantes » celles qui ne sont pas contenues dans le droit canonique.
[3] « … perpetuum valitura constitutione [...], de apostolicae potestatis plenitudine sancimus, statuimus, decernimus et definimus... »
[4] « … si ullo umquam tempore apparuerit [...] romanum pontificem ante eius promotionem [...] a fide catholica deviasse, aut in aliquam haeresim incidisse, promolio, seu assumptio de eo etiam in concordia, et de unanimi omnium cardinalium assensu facta, nulla, irrita, et inanis existat… »
D. Paulo IV emitiu um julgamento ex cathedra
A constituição apostólica de Paulo IV é uma definição dogmática solene ex cathedra, que preenche as quatro condições de infalibilidade estabelecidas pelo primeiro Concílio do Vaticano, a saber:
- COM SUA SUPREMA AUTORIDADE APOSTÓLICA: "na plenitude de nosso poder apostólico"
- O PAPA DEFINE: "Nós [...] definimos"
- UMA DOUTRINA SOBRE A FÉ: o documento trata diretamente da fé, visto que o termo aparece várias vezes no texto. Este é o principal objetivo de Paulo IV: proteger a fé contra os hereges.
- Além disso, a bula não trata do modo eleitoral (portanto, disciplinar). Não especifica que os eleitores são os cardeais, nem que devem deliberar em determinada sala, etc.
O historiador Pastor afirmava que o texto de Paulo IV seria disciplinar, e não dogmático. Esta interpretação não é mais sustentável nos dias de hoje, pois desde que Pastor escreveu sua "História dos papas desde o fim da Idade Média", a Igreja forneceu uma "interpretação autêntica" do texto de Paulo IV. Desde São Pio X, de fato, os teólogos são obrigados a considerar este texto não como disciplinar, mas como doutrinal (relativo à fé). Por quê? Porque a Igreja o relacionou com uma boa dúzia de cânones do Código de Direito Canônico de 1917 que tratam de heresia, retidão doutrinal, renúncia à fé e propagação de doutrinas condenadas (ver Apêndice B).
Especificamente, "Nós decidimos, estabelecemos, decretamos" uma doutrina "válida para sempre", portanto, irreformável por si mesma, e que todos devem observar sob pena de incorrer na indignação de Deus Todo-Poderoso e dos bem-aventurados apóstolos Pedro e Paulo.
Além disso, o Papa Paulo IV escolheu expressar sua vontade por meio de uma constituição apostólica em forma de bula, o que representa o ápice da solenidade de um documento pontifical. "A constituição apostólica se distingue por seu alcance geral e alto grau de solenidade"; ela é "um instrumento normativo essencial nas mãos do soberano pontífice" (Philippe Levillain: "Dicionário Histórico da Papado", Paris 1994, artigo "constituição apostólica").
Assim, Paulo IV, falando solenemente ex cathedra, emitiu um julgamento dogmático infalível. Sua decisão, irreformável por si mesma, PERMANECERÁ EM VIGOR ATÉ O FIM DOS TEMPOS.
E. O Papa São Pio V ordena que as prescrições de Paulo IV sejam "observadas inviolavelmente"
Após a morte de Paulo IV, os arquivos da Inquisição foram incendiados pelo povo, resultando na falta de provas e no encerramento do processo contra o Cardeal Morone. Este último foi libertado da prisão. Quando o Papa Pio IV faleceu em 1565, Morone estava prestes a ascender à Cátedra de São Pedro. O Cardeal Michel Ghislieri (futuro Papa São Pio V) estava determinado a evitar a eleição de Morone a qualquer custo. Ele resgatou o processo de Morone, que tinha guardado e mantido cuidadosamente nos dobras de sua túnica por anos. Ghislieri interveio assim contra Morone: "O novo pontífice não deve ter nenhuma reputação de condescendência com a heresia, e nesse aspecto Morone não oferece ao sagrado colégio as garantias necessárias" (segundo o Cardeal Georges Grente: "O Papa dos grandes combates São Pio V", Paris 1956, p. 35). O conclave elegeu não o Cardeal Morone, mas o Cardeal Ghislieri, que assumiu o nome de "Pio V".
Ghislieri foi o segundo sucessor de Paulo IV. Antes de se tornar papa, o Cardeal Ghislieri tinha trabalhado sob as ordens de Paulo IV, que o havia promovido a prefeito da Inquisição. Ele admirava a luta intransigente do santo idoso contra os hereges e a corrupção dos costumes. No dia de sua elevação ao pontificado, perguntaram-lhe qual seria a linha de conduta de seu pontificado. São Pio V respondeu com entusiasmo: "Aquela de Paulo IV!" (segundo Carlo Bromato: "História de Paulo IV, Sumo Pontífice", Ravena 1748, segunda edição 1753, vol. II, p. 616).
O Papa São Pio V ordenou solenemente que as prescrições de Paulo IV fossem fielmente observadas. "Por nosso próprio movimento e conhecimento certo, e na plenitude de nosso poder apostólico [...] concernente à constituição de Paulo IV, [...] dada em 15 de fevereiro de 1559, renovamos agora seu teor, e ainda o confirmamos. E queremos e ordenamos que seja observada inviolavelmente e com o maior cuidado, conforme sua sequência e teor" (São Pio V: motu proprio "Inter multiplices curas", 21 de dezembro de 1566, § 1).
O termo "series", usado por São Pio V, significa "sequência, continuidade". Isso significa que a bula de Paulo IV deve ser considerada em seu encadeamento lógico e contínuo, do começo ao fim.
F. O Papa São Pio X faz inserir a bula de Paulo IV no código de direito canônico
Também São Pio X desejava que a bula de Paulo IV fosse observada, pois a tomou como referência para o novo código de direito canônico.
Esta mesma bula possui um valor jurídico inegável até os dias de hoje, pois foi incorporada no código de direito canônico de 1917. Este código foi elaborado por uma comissão pontifical presidida por São Pio X e promulgado pelo Papa Bento XV (constituição apostólica "Providentissima", 27 de maio de 1917).
Com o desejo de reunir todas as leis eclesiásticas em um único código, São Pio X decidiu: "1. Instituímos um conselho, ou, como se diz, uma comissão pontifical, à qual será confiada a direção e a responsabilidade por todo este assunto. Ela será composta por um certo número de Suas Eminências Reverendíssimas os cardeais, que serão nomeados especificamente para este fim pelo pontífice. 2. Este Conselho será presidido pelo pontífice, e na sua ausência, pelo cardeal decano dos cardeais assistentes. [...] " (São Pio X: motu proprio "Arduum sane", 19 de março de 1904).
Esta comissão, presidida por São Pio X, tinha um duplo objetivo, como explicou o secretário da comissão, o cardeal Gasparri:
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"distribuir metodicamente todo o direito canônico em cânones ou artigos, à maneira dos códigos modernos";
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"fazer uma coleção de todos os documentos [...] dos quais os mencionados cânones ou artigos foram emprestados" (cardeal Gasparri: carta de 5 de abril de 1904, in: F. Cimetier: "As fontes do direito eclesiástico", Paris 1930, p. 195).
A bula de Paulo IV foi explicitamente e especificamente incluída nesta coleção das "Fontes" do código de direito canônico ("Codicis Juris Canonici Fontes. cura emi. Petri card. Gasparri editi, Rome 1947, 1. J, p. 163 - 166). Isso é significativo: de acordo com a carta do cardeal Gasparri citada acima, isso significa que o código "emprestou" algo da bula de Paulo IV. Em outras palavras, o fato de a bula de Paulo IV estar nas "Fontes..." indica que suas disposições foram incorporadas ao direito canônico de 1917.
Além das "Fontes...", pode-se consultar o próprio "Codex iuris canonici". Existem duas edições: uma apenas com o texto das leis e outra com o texto das leis e suas fontes. Estas edições anotadas são pouco conhecidas, mas extremamente valiosas! A equipe de canonistas que trabalhou sob a direção de São Pio X cuidadosamente registrou o nome dos documentos legislativos anteriores que serviram de base para cada novo cânone. O secretário desta comissão pontifical, o cardeal Gasparri, publicou o código adicionando, para cada cânone, notas de rodapé com os documentos do magistério que serviram de fonte para elaborar o texto. A coleção com estas preciosas "fontium annotatione" (notas com as fontes) tem o título: "Codex iuris canonici, Pii X pontificis maximi iussu digestus, Benedicti papae XV auctoritate promulgatus, praefatione, fontium annotatione et indice analytico-alphabetico ab emo. Petro card. Gasparri auctus." Esta é uma edição oficial, feita pelo secretário da comissão pontifical que elaborou o código, publicada pela editora do Vaticano Typis Polyglottis Vaticanis (veja a reprodução em fac-símile no Apêndice B).
Ao consultar as "fontium annotatione" do "Codex..." (e também ao consultar o índice geral das "Codicis Juris Canonici Fontes...", 1. IX), percebe-se que a constituição apostólica em forma de bula de Paulo IV foi inserida no direito eclesiástico não menos que QUINZE VEZES! Quinze cânones se referem explicitamente a ela. No topo está o próprio texto do cânone; abaixo, na nota de rodapé, estão todas as referências que foram usadas para elaborar esse cânone (veja a reprodução em fac-símile no Apêndice B).
Todos e cada um dos parágrafos da bula (1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7) são mencionados no código. A bula foi incorporada na íntegra.
G. O Papa Pio XII confirma a inelegibilidade dos não-católicos para o pontificado supremo
Uma bula pontifical não precisa absolutamente ser confirmada pelo sucessor do papa falecido para permanecer em vigor. Por exemplo: "Espalhou-se o boato de que, após a morte de Clemente XII, a pena de excomunhão estipulada em sua bula [In eminenti, 4 de maio de 1738, contra os maçons] seria sem efeito, já que essa bula não havia sido expressamente confirmada por seu sucessor. Certamente era ABSURDO pretender que as bulas dos antigos pontífices caíssem em desuso se não fossem expressamente aprovadas por seus sucessores" (Leão XII: Carta apostólica Quo graviora, 13 de março de 1826).
A bula de Paulo IV, "válida perpetuamente", não precisa ser confirmada por ninguém. Se, no entanto, foi confirmada por São Pio V e São Pio X, foi simplesmente para que não caísse no esquecimento e fosse observada escrupulosamente.
A bula de Paulo IV às vezes é dita ter sido revogada. Mas revogada por quem? E quando? Que nos seja citado então o papa que explicitamente revogou esta bula! Até hoje, ninguém conseguiu fornecer tal documento. Esta bula está oficialmente incluída no código das leis da Igreja Católica (ver apêndice B). Portanto, ela não foi revogada, muito pelo contrário!
Para que uma lei eclesiástica perca sua validade jurídica, é necessário que seja explicitamente revogada por um papa. "Para que uma lei na Igreja seja suprimida, é necessário que um documento a declare expressamente. Isso é claro nos 30 primeiros capítulos do código publicado por Bento XV. No entanto, nenhum documento oficial suprimiu a bula de Paulo IV, que está, ao contrário, oficialmente incluída no corpo das leis canônicas" (Padre Mouraux, in: Bonum certamen, nº 80).
Vamos considerar um caso concreto de revogação. O Papa Júlio II (constituição Cum tam divino, 19 de fevereiro de 1505) declarou nulas as eleições simoníacas. Mais tarde, São Pio X aboliu explicitamente este impedimento à elegibilidade: "O crime de simonia é abominável, tanto do direito divino quanto do direito humano. Como é amplamente estabelecido que é absolutamente reprovável na eleição do pontífice romano, assim também nós o reprovamos e o condenamos, e aplicamos aos culpados a pena de excomunhão latae sententiae, embora tenhamos suprimido a nulidade da eleição simoníaca (que Deus afaste tal eleição!) decretada por Júlio II (ou qualquer outro decreto pontifício), para remover um pretexto para questionar a validade da eleição do pontífice romano" (São Pio X: constituição Vacante Sede Apostolica, 25 de dezembro de 1904, § 79).
A cláusula de simonia, explicitamente abolida por São Pio X, não está mais em vigor; por outro lado, a cláusula de catolicidade, nunca revogada por ninguém, permanece em vigor. Aliás, ninguém no mundo poderia revogar a cláusula de catolicidade, pois esta cláusula é uma lei de direito divino e, além disso, um dogma definido ex cathedra!
Em 1945, o Papa Pio XII publicou um novo regulamento que rege o conclave (constituição Vacantis Apostolicae Sedis, 8 de dezembro de 1945, in: Documentation catholique de 26 de outubro de 1958). Nele, ele confirma que as leis estabelecidas no direito canônico devem ser observadas, pois pressupõe que o pretendente tenha sido eleito conforme o direito eclesiástico antes de ser coroado com a tiara. Isso é evidenciado pela expressão "após a eleição canonicamente feita" (Pio XII: constituição Vacantis Apostolicae Sedis, § 100). Os termos "canonicamente feita" significam conforme os "cânones" (= regras, leis) estabelecidos pelo código de direito canônico.
No § 101 da constituição de Pio XII, é feita uma referência precisa ao cânone 219, que trata do pontífice romano recém-eleito. "O pontífice romano legitimamente eleito...". A palavra "legitimamente" é sinônimo de "canonicamente", ou seja, de acordo com as leis eclesiásticas ("legitime electus" tem como etimologia "lex, legis" = a lei).
Aquele que não foi eleito legitimamente não se torna papa de forma alguma! No cânone 109, de fato, é explicitamente especificado que, "por direito divino, alcança-se o pontificado supremo, DESDE QUE A ELEIÇÃO TENHA SIDO LEGÍTIMA!"
Então, quais são as leis a serem observadas durante um conclave para que a eleição do pontífice supremo seja legítima, canônica, válida, juridicamente inatacável?
O cânone 167, § l, que trata da eleição dos clérigos, estipula o seguinte: "Não podem dar votos [...] 4° aqueles que deram seu nome a uma seita herética ou cismática ou que aderem publicamente a ela". Se os não-católicos já são excluídos do direito de "eleger", presume-se que a intenção do legislador era, a fortiori, privá-los do direito de "ser eleitos". Pode-se objetar que isso não está explicitamente no texto da lei, e concordamos com isso. Na época em que o código foi elaborado, era óbvio que um candidato a um cargo eclesiástico deveria ser católico. O fato de que hoje em dia seja necessário provar essa evidência apenas mostra a distorção mental de nossa época. Mas é bastante fácil demonstrá-lo!
Um leigo poderia ser eleito validamente papa, mas é mais conveniente que o eleito seja escolhido entre os cardeais. No entanto, os cardeais, conforme especificado no código, devem ser "eminentes em doutrina" (cânone 232, § 1). Uma vez que lhes é exigido superar outros clérigos pela excelência de sua doutrina, é justo esperar deles, no mínimo, retidão doutrinal simples. Isso é o mínimo necessário.
Se um cardeal aderisse, por exemplo, a uma seita protestante, tornar-se-ia, por isso mesmo, inelegível. Pois, de acordo com o direito, clérigos que aderem a uma seita não-católica "são ipso facto infames" (cânone 2314, § 1, no 3). E "aquele que é atingido por infâmia de direito é [...] incapaz de obter benefícios, pensões, cargos e dignidades eclesiásticas" (cânone 2294, § 1, com uma referência, em nota, ao § 5 da bula de Paulo IV).
Que se deva professar a fé católica para ser papável é evidente em muitos outros textos legislativos. Segundo o cânone 343, o bispo deve zelar pela salvaguarda da ortodoxia em sua diocese. Como o bispo de Roma poderia zelar pela manutenção da fé em sua diocese e também no mundo inteiro, se fosse firmemente contrário à fé católica? Além disso, antes de poder se tornar bispo, é necessário ter feito previamente uma profissão de fé católica (cânone 332, § 2). Da mesma forma, o cânone 1406 prescreve a recitação de uma profissão de fé aprovada pelo Santo Sé para aqueles que acabaram de ser promovidos a bispos, cardeais, etc. Se um bispo já deve professar a verdadeira fé, não é natural e evidente que o papa, que também é bispo, deva ter a fé?
Que todo candidato ao supremo pontificado deva ter a fé é confirmado pelo princípio jurídico da "irregularidade" dos não-católicos. Cânone 985, nº 1: "São irregulares ex defectu: os hereges, os apóstatas da fé e os cismáticos". Seu crime de heresia, que resulta em uma irregularidade de natureza perpétua (cânone 983), torna os antigos hereges irregulares mesmo após sua conversão ao catolicismo (Comissão pontifícia para a interpretação autêntica do Codex iuris canonici, 30 de julho de 1934, in: Acta Apostolicae Sedis, Roma 1934, p. 494).
Os hereges convertidos (!) podem, mediante uma dispensa especial reservada à Santa Sé, acessar o sacerdócio, mas não estão habilitados a acessar o episcopado. Segundo o cânone 991, § 3, "a irregularidade que foi objeto de dispensa (!) permite o acesso às ordens menores, até mesmo ao sacerdócio, mas torna inelegível para o cardinalato, o episcopado, o abaciato, a prelazia nullius, o cargo de superior em uma religião clerical isenta". Ora, todo papa é bispo de Roma! Sua "irregularidade" impede os hereges convertidos (sem mencionar os não-católicos) de acessar o episcopado e, consequentemente, o supremo pontificado. A eleição de um "irregular" para o supremo pontificado é juridicamente NULA E SEM EFEITO!
Cânon 2335: "Aqueles que se associam à seita maçônica ou a outras associações desse tipo, que conspiram contra a Igreja ou contra as legítimas autoridades civis, incorrem por esse fato na excomunhão reservada à Sé Apostólica".
Cânon 2336: "§ 1. Clérigos que cometeram uma infração conforme aos cânones 2334 ou 2335, além das penas estabelecidas por esses cânones, devem ser suspensos ou privados de seu cargo, benefício, dignidade, pensão ou renda, se tiverem. Os religiosos devem ser punidos com a privação do cargo e a perda do direito de eleição ativa ou passiva, e por outras penas de acordo com as regras de sua ordem monástica. § 2. Além disso, clérigos ou religiosos que aderem à maçonaria ou a outras associações semelhantes devem ser denunciados à Sagrada Congregação do Santo Ofício". O Santo Ofício (antigamente chamado de "Inquisição") tem a tarefa de descobrir e punir os hereges.
Portanto, o cânon 2336 estipula que um maçom não pode ser papa.
O cânon 188 é crucial. "Por uma renúncia tácita admitida pelo próprio direito, qualquer cargo fica vago por si mesmo e sem qualquer declaração, se o clérigo [...] 4° se afasta publicamente da fé católica". Assim, um não-católico não pode se tornar papa, pois, devido à sua não-catholicidade, há uma "renúncia tácita" ao supremo pontificado.
Este cânone pode ser invocado para contestar a validade da eleição de uma pessoa que não é mais católica, mesmo desde a constituição de Pio XII. Pois Pio XII não anula de forma alguma o direito canônico, pelo contrário, ele explicitamente reafirma essas regras do direito eclesiástico em sua constituição. No entanto, poder-se-á objetar ainda que Pio XII fala do "verdadeiro papa" após a aceitação da eleição. Segundo Pio XII (Vacantis Apostolicae Sedis, § 100 e § 101), é necessário que a pessoa eleita pelo conclave aceite sua eleição. "Você aceita a eleição que acaba de ser feita canonicamente de sua pessoa como sumo pontífice? Este consentimento dado [...] faz imediatamente do eleito um VERDADEIRO papa e ele adquire por este fato e pode exercer uma plena e absoluta jurisdição sobre o universo inteiro". Certamente, mas analisemos mais profundamente! Pio XII diz claramente "a eleição que acabou de ser feita canonicamente".
Um homem não-católico é incapaz de receber o pontificado. De fato, a defeção na fé constitui automaticamente uma "renúncia tacitamente" a qualquer cargo eclesiástico (cânone 188, nº 4). Esta renúncia tácita impede a aceitação da eleição pelo eleito. Mesmo que ele aceite verbalmente sua eleição, essas palavras são invalidadas por sua não-catholicidade e ele não é papa de forma alguma. Este raciocínio é de lógica elementar: é impossível aceitar o pontificado enquanto ao mesmo tempo renuncia-se por ter abandonado a fé!
Que o cânone 188 possa e deva ser aplicado durante o conclave é claramente evidente nas "fontium annotatione" (veja a reprodução fotográfica na página seguinte, e também as reproduções maiores no Apêndice B). Essas "anotações" foram feitas pelo legislador para cada cânone, a fim de fornecer referências incontestáveis para uma interpretação correta da lei. Cada cânone inclui, ao pé da página, uma nota que serve como auxílio à interpretação. Ela indica várias "fontes" (ou "fontes", ou seja, textos doutrinários ou legislativos que devem ser usados como referência para entender o cânone em questão). No cânone 188 estão incluídas várias "fontes" doutrinais, incluindo os §§ 3 e 6 da bulle de Paulo IV, que tratam precisamente da eleição do sumo pontífice!
Aqui está a reprodução fotográfica de uma edição anotada do código de direito canônico, elaborado por São Pio X e promulgado por Bento XV em 27 de maio de 1917. Para uma melhor compreensão, adicionamos algumas explicações nas margens (consulte também o Apêndice B no final de nosso trabalho).
Fac-símile da página 47 do Codex Iuris Canonici. Promulgado pela autoridade de São Pio X, Pontífice Máximo, e elaborado sob a autoridade de Bento XV, com uma introdução, anotação de fontes e um índice analítico-alfabético aumentado pelo mesmo Cardeal Gasparri, Tipis Polyglottis Vaticanis, Roma 1918.
Tudo se relaciona: Pio XII faz referência ao direito canônico, e o direito canônico, por sua vez, faz referência à bulle de Paulo IV. Assim, o conclave DEVE observar as disposições dos §§ 3 e 6 da constituição Cum ex apostolatus de Paulo IV, sob pena de NULIDADE DA ELEIÇÃO!
Uma questão ainda resta a ser resolvida. Pio XII especificou claramente que nem mesmo a excomunhão de um eleito poderia invalidar a eleição.
"Nenhum cardeal pode ser excluído de qualquer maneira da eleição ativa e passiva do sumo pontífice sob o pretexto ou motivo de qualquer excomunhão, suspensão, interdição ou outro impedimento eclesiástico. Nós suspendemos essas censuras apenas para esta eleição; elas manterão seus efeitos para todo o resto" (Pio XII: Vacantis Apostolicae Sedis, § 34).
Isso não significa que os hereges (excomungados segundo o cânone 2314) tenham se tornado elegíveis! Pois Pio XII de forma alguma escreveu:
"Nós autorizamos os hereges a se elegerem papa"!
Ele nunca escreveu algo semelhante. Ele simplesmente suspendeu toda excomunhão durante o tempo que dura o conclave.
Por que suspender toda excomunhão? É impossível que o papa tenha pensado nos hereges, pois os clérigos não-católicos são automaticamente destituídos de seu cargo (cânone 188) e não têm o direito de votar (cânone 167). Portanto, Pio XII estava apenas considerando os cardeais excomungados por algum delito que não seja heresia. De fato, pode-se ser não-herético, mas excomungado. Aqui estão alguns delitos punidos com excomunhão pelo direito canônico: tráfico de relíquias falsas (2326), violação do claustro monástico (2342), usurpação de bens da Igreja (2345), aborto (2350), etc. Suponhamos que um cardeal, por ganância, se envolveu no tráfico de relíquias falsas. Sua excomunhão é suspensa durante o conclave. Se ele for católico, esse cardeal é elegível.
Por outro lado, um homem não-católico permanece inelegível. Pois ele enfrenta um DUPLO obstáculo:
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sua excomunhão e
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sua não-catholicidade.
Certamente, Pio XII levanta (pelo tempo que durar o conclave) todas as excomunhões. Mas o homem herege, mesmo que não esteja temporariamente excomungado, não faz parte dos candidatos papáveis, pois outro obstáculo, a cláusula de catholicidade, ainda é aplicável a ele.
Que Pio XII fosse muito apegado à cláusula de catholicidade é evidente para quem conhece bem este papa de santa memória. Podemos mencionar quatro indícios:
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Pio XII considerava "um patrimônio da Igreja" precioso, "constituído principalmente pela fé, que recentemente defendemos contra novos perigos" (discurso no primeiro congresso internacional dos religiosos, 8 de dezembro de 1950). Como poderia este papa, que valorizava a defesa do patrimônio da fé como a menina dos seus olhos, desejar ignorar o princípio da catholicidade durante a eleição pontifical?
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Este papa tinha tanta preocupação em manter a integridade da fé que passava horas e horas todos os dias atrás de sua máquina de escrever (não se deitava antes da uma da manhã) para expor a doutrina sã e refutar erros. Para suas pesquisas, Pio XII "tinha uma enorme biblioteca de manuais especializados, enciclopédias e resumos de ciências, totalizando mais de cinquenta mil volumes. Ele era assistido em suas pesquisas pelo Padre Hentrich e pelo sempre fiel Padre Robert Leiber, além de uma equipe improvisada de jesuítas bem-intencionados. Intransigente quanto à precisão, não hesitava em criticar seus auxiliares, verificando e re-verificando cada referência e citação. Um dia ele disse a um monsenhor: 'O papa tem o dever de fazer tudo melhor em todos os aspectos; outros podem ser perdoados por suas imperfeições, mas para o papa, nunca. Não!'" (John Cornwell: O Papa e Hitler. A história secreta de Pio XII, Paris 1999, p. 437). Como este "maníaco" da verdade, este inimigo implacável de qualquer erro, mesmo involuntário, poderia tolerar a ideia de que, após sua morte, alguém usasse seu nome para afirmar que ele teria autorizado um herege a se tornar papa?
- Este papa enriqueceu o missal, criando um ofício que não existia antes dele: o "comum dos papas". Naturalmente, a seita conciliar se apressou em suprimir este ofício. Por quê? Porque este ofício contém duas orações extraordinárias que constituem uma poderosa proteção para os católicos desejosos de permanecer integralmente católicos.
Aqui está o texto da secreta: "Munera quae tibi, Domine, laetantes offerimus, suscipe benignus, et praesta ut, intercedente beato N, Ecclesia tua et fidei integritate laetetur, et temporum tranquillitate semper exsultet" ("Aceitai com bondade, Senhor, os dons que alegremente vos oferecemos, para que, pela intercessão do bem-aventurado N., vossa Igreja se alegre na INTEGRIDADE DA FÉ e se regozije sempre na tranquilidade dos tempos").
Aqui está o texto da pós-comunhão: "Refectione sancta ellutritam gubema, quaesumus, Domine, tuam placatus Ecclesiam: ut potenti moderatione directa, et incrementa libertatis accipiat et in religionis integritate persistat" ("Ó Senhor, que aplacado governais vossa Igreja com a santificação do alimento sagrado, concedei-lhe, vos pedimos, que dirigida por vossa poderosa providência, ela receba o crescimento da liberdade e persista na INTEGRIDADE DA RELIGIÃO").
Isso é o que o Papa Pio XII desejava para o "comum dos pontífices": que eles perseverassem na fé católica integral e que a Santa Igreja conservasse a integridade da religião! Como ele poderia desejar abolir a cláusula de catholicidade que governa o conclave, já que esta cláusula é parte integrante da fé?
- Um ano antes de sua morte, Pio XII declarou: "Se um leigo fosse eleito papa, ele só poderia aceitar a eleição sob a condição de estar apto para receber a ordenação e estar disposto a ser ordenado; o poder de ensinar e governar, assim como o carisma da infalibilidade, ser-lhe-iam concedidos desde o momento de sua aceitação, mesmo antes de sua ordenação" (Discurso no segundo Congresso Mundial do Apostolado dos Leigos, 5 de outubro de 1957). Or nous avons vu plus haut que pour être apte à recevoir l’ordination, il faut être catholique (canon 985). Un non-catholique est inapte. Si l’élu du conclave n’est pas apte à recevoir l’ordination, dit Pie XII (5 octobre 1957, cité ci-dessus), il ne peut pas accepter le pontificat. Ainsi donc, PIE XII A CONFIRMÉ EXPRESSÉMENT LA CLAUSE DE CATHOLICITÉ EN 1957.
E lembremos que o mesmo Pio XII já havia confirmado a cláusula de catolicidade em 1945, ao exigir que a eleição fosse "canonicamente feita", ou seja, em conformidade com o cânone 188, que remete à bula de Paulo IV.
E o que diz o Santo Papa Pio X? Ele diz: "Após a eleição feita canonicamente..." Não, não é um erro de impressão. Esta frase é realmente dele! "Post electionem canonice factam consensus electi per cardinalem decanum nomine totius S. Collegii requiratur" (Santo Pio X: constituição Vacante Sede Apostolica, 25 de dezembro de 1904, § 87, com uma nota de referência ao Ceremoniale Romanum, livro 1, título 1, De conclavi et electione papae, § 34).
Resumamos a situação jurídica. Segundo o cânon 241, "estando vacante a Sé Apostólica, o sagrado colégio dos cardeais e a Cúria Romana não possuem outro poder senão aquele definido na constituição Vacante Sede Apostolica de 25 de dezembro de 1904 de Pio X". Santo Pio X concedeu aos cardeais o poder de eleger de maneira canônica o novo papa. Os cardeais não têm o poder de eleger de maneira não canônica um não-católico. Uma tal eleição feita não canonicamente constitui um abuso de poder, que torna o conclave juridicamente nulo e inválido.
Nota bene: Os haereticis ("hereges" = aqueles que contestam conscientemente a doutrina católica), assim como os errantes ("errantes" = aqueles que erram na fé por ignorância), são excluídos do pontificado pelo Papa Paulo IV. De fato, estão excluídos das eleições aqueles que "se desviaram da fé católica OU TAMBÉM (aut) caíram em alguma heresia".
Portanto, para contestar a eleição de tal ou qual candidato, basta constatar que ele "se desviou da fé", independentemente de ter desviado conscientemente ou por ignorância, e independentemente de ter recebido ou não um aviso de seus superiores (monição canônica individual). Se os escritos ou discursos do candidato contiverem um erro na fé, isso é suficiente para invalidar a eleição, pois a constituição Cum ex apostolatus torna inelegíveis não apenas os hereges formais, mas também aqueles que se desviam da fé por ignorância do magistério. Um único erro na fé - involuntário ou voluntário - e a eleição é nula "por si mesma, sem que seja necessário qualquer outra declaração posterior" (Cum ex apostolatus, § 6).
Para aqueles que se interessam, realizamos um estudo que define o que é um homem "herege", explica o que constitui "pertinácia" e prova que Roncalli, Montini, Luciani, Wojtyla são "pertinazes" (consultar o anexo C).
Conclusão
Os não-católicos são inelegíveis por cinco razões:
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Existe uma "lei divina", ou seja, enraizada nas Escrituras. De acordo com as Escrituras, nenhum não-católico pode se tornar (Mateus XVI, 15) ou permanecer (Tito III, 10-11 e João 10-11) o líder dos católicos. Uma lei de direito divino obriga independentemente do direito eclesiástico (como especificado no cânone 6, nº 6).
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Os não-católicos são excluídos do clero e dos cargos eclesiásticos não apenas pelas Escrituras, mas também pela Tradição (Santos Cipriano, Agostinho, Tomás, etc.).
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A cláusula de catolicidade foi definida ex cathedra por um pontífice romano (Paulo IV, 1559). De acordo com o Vaticano I (Pastor aeternus, cap. 4), tal definição é "irreformável por si mesma, e não em virtude do consentimento da Igreja"; se alguém ousar afirmar o contrário, "seja anátema".
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O texto de Paulo IV não apenas está implicitamente contido, mas também é citado explicitamente no Codex iuris canonici, não apenas uma vez, mas em QUINZE lugares diferentes.
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O regulamento que rege os conclaves, redigido por Pio XII em 1945, estabelece que a eleição deve ser "canonicamente feita" (= de acordo com o direito canônico) para ser válida.
Aquele que se desvia da fé não é papável: esta é a lei católica. Agora, façamos a aplicação prática desta lei.
Resumo: aqueles que se desviaram da fé católica antes de sua eleição não são elegíveis para serem Papa.
ÚLTIMA OBJEÇÃO, POUCA SERIEDADE: Pio XII não menciona explicitamente os hereges como sendo inelegíveis. Portanto, eles seriam elegíveis.
@ Um pouco de humor... A título de piada, observemos que Pio XII também não menciona que o eleito deva obrigatoriamente ser um ser humano. Por que então excluir do conclave os animais? Deus não falou através da boca de um jumento (Números XXII, 28-30)? E um doutor da Igreja não retomou esta anedota em um tratado especializado sobre a questão do Papa (!) (São Roberto Belarmino: De romano pontifice, livro IV, capítulo 6)? E o primeiro Papa (!) não elogiou a pregação deste jumento (2. Pedro II, 15-16)? Além disso, uma mula não ensinou o dogma da presença real de Nosso Senhor na Eucaristia ao se ajoelhar diante da hóstia, seguindo a instrução de Santo Antônio de Pádua? Peixes não ergueram suas cabeças fora d'água para ouvir um sermão deste mesmo santo? E o historiador Suetônio não relata que o imperador romano Calígula nomeou seu cavalo como cônsul? Se os animais são capazes de falar, de defender o dogma contra os incrédulos, de apreciar a sã doutrina de um bom pregador e de governar um vasto império, por que seriam excluídos das eleições para o pontificado supremo? Já que a constituição Vacantis Apostolicae Sedis de Pio XII não exclui os animais do conclave, isso deve ser permitido. Q.E.D.
Uma brincadeira duvidosa, deslocada ao abordar um assunto tão grave? Digamos apenas que nossa piada tinha como objetivo levar até o absurdo a lógica daqueles que afirmam que os hereges são elegíveis, porque Pio XII não teria estipulado nada a respeito deles em Vacantis Apostolicae Sedis.
RONCALLI, MONTINI, LUCIANI E WOJTYLA DESVIARAM-SE DA FÉ ANTES DE SUA ELEIÇÃO?
A. O juramento de São Pio X traído
B. Aplicação prática da lei a Angelo Roncalli
C. Aplicação prática da lei a Giovanni Battista Montini
D. Aplicação prática da lei a Albino Luciani
E. Aplicação prática da lei a Karol Wojtyla
Conclusão do capítulo
A. O juramento antimodernista de São Pio X traído
Para combater os hereges modernos (chamados "modernistas"), o Papa São Pio X instituiu todo um programa de luta: vigilância nos seminários, censura de livros e periódicos, conselhos diocesanos de vigilância, e o juramento antimodernista (São Pio X: motu proprio Sacrorum antistitum, 1º de setembro de 1910).
A resposta dos modernistas não demorou: após a morte deste santo Papa, espalharam o boato de que suas prescrições contra o modernismo não teriam mais valor, pois não teriam sido incorporadas no novo código de direito canônico, promulgado em 1917 por seu sucessor, Bento XV. O novo Papa desfez a manobra desleal dos modernistas ao publicar um esclarecimento.
"As prescrições acima mencionadas [de Pascendi e de Sacrorum antistitum], dadas por causa das serpentes contidas nos erros modernistas, são, por sua natureza, temporárias e transitórias, e não puderam, por essa razão, ser integradas no código de direito canônico. Por outro lado, enquanto o vírus do modernismo não cessar completamente de existir, elas devem manter sua plena força [de lei], até que o Sé Apostólico decida de outra forma" (decreto do Santo Ofício sobre os conselhos de vigilância e o juramento antimodernista, aprovado e confirmado pelo Papa Bento XV "por sua autoridade suprema", dado em Roma em 22 de março de 1918, in: Acta Apostolicae Sedis, Roma 1918, p. 136).
De acordo com as prescrições de São Pio X (Sacrorum antistitum), todo homem deve prestar um "juramento antimodernista" antes de se tornar clérigo, ou antes de assumir uma cátedra de ensino ou um cargo eclesiástico. E o que diz esse juramento? "Eu, N..., abraço e recebo firmemente todas e cada uma das verdades que foram definidas, afirmadas e declaradas pelo magistério infalível da Igreja, principalmente os princípios de doutrina que são diretamente contrários aos erros deste tempo". Assim, todo padre é esperado estar familiarizado com os escritos pontifícios dirigidos contra o liberalismo: Mirari vos, o Syllabus, e muitos outros documentos hoje colocados de lado. Além disso, o futuro clérigo ainda deve jurar: "Também me submeto, com a devida reverência, e adiro de todo o coração a todas as condenações, declarações, prescrições encontradas na encíclica Pascendi e no decreto Lamentabili". Portanto, todo padre é esperado conhecer esses dois escritos antimodernistas do santo Papa Pio X.
São Pio X (motu proprio Sacrorum antistitum, 1º de setembro de 1910) obrigou todos os clérigos a recitar o juramento. E acrescentou esta frase: "No entanto, se alguém - o que, Deus não permita! - tiver a audácia de violar este juramento, que seja imediatamente encaminhado (illico) ao tribunal do Santo Ofício". E, como todos sabem, os inquisidores do Santo Ofício têm o dever de identificar e punir os hereges!
Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla não puderam se esquivar desta obrigação de prestar o juramento antimodernista. Isso PROVA INEQUIVOCAMENTE que eles conheciam, portanto, todos os textos pontifícios antiliberais e antimodernistas. Foi com pleno conhecimento de causa que eles desobedeceram voluntariamente e gravemente ao magistério da Igreja Católica, através de todas as reformas que empreenderam ao assumirem o poder, assim como por sua doutrina liberal e modernista, pregada do alto da cátedra de São Pedro, que se tornou uma cátedra de pestilência.
São Pio X, em sua encíclica Pascendi de 8 de setembro de 1907, denunciou veementemente os modernistas hereges e seu programa de reforma: "Que releguem a filosofia escolástica [...] entre os sistemas obsoletos, e que ensinem aos jovens seminaristas a filosofia moderna, a única verdadeira, a única adequada ao nosso tempo [...]. Que nos catecismos não se insira mais, em matéria de dogmas, senão aqueles que tenham sido reformados e que sejam compreensíveis pelo vulgo. No que diz respeito ao culto, que se diminua o número das devoções exteriores [...]. Que o governo eclesiástico seja reformado em todas as suas partes, especialmente na disciplinar e dogmática. Que seu espírito, seus métodos externos se harmonizem com a consciência, que se inclina para a democracia [...]. Reforma das congregações romanas, especialmente as do Santo Ofício e do Índice. Que o poder eclesiástico mude 'de linha de conduta no terreno social e político'. Todo este programa de demolição dos modernistas, denunciado por São Pio X, foi no entanto realizado meio século mais tarde, pelos hereges do Concílio. Montini teve até a audácia, em 1967, de suprimir o juramento!
Estas palavras de São Pio X são mais atuais do que nunca: "Não lutamos mais, como no início, com sofistas que se apresentam cobertos de peles de ovelha, mas com inimigos declarados e cruéis, inimigos de dentro, que, tendo feito um pacto com os piores inimigos da Igreja, se propõem à destruição da fé. Falamos desses homens que, todos os dias, se levantam audaciosamente contra a sabedoria que nos vem do céu: arrogam-se o direito de reformá-la, como se estivesse corrompida; pretendem renová-la, como se o tempo a tivesse tornado obsoleta; desejam aumentar seu desenvolvimento e adaptá-la aos caprichos, ao progresso e às conveniências do século, como se ela fosse contrária não apenas à leviandade de alguns, mas ao próprio bem da sociedade" (Sacrorum antistitum).
Segundo São Pio X (Pascendi), os modernistas são "os piores inimigos da Igreja". E segundo este mesmo santo Papa, o modernismo é "o esgoto coletor de todas as heresias" (motu proprio Praestantia, 18 de novembro de 1907).
Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla estão completamente imersos nesta cloaca maxima que é o modernismo. Eles são verdadeiramente hereges, uma vez que perjuraram seu juramento. Seu programa de demolição da Igreja Católica é herético do começo ao fim. Como eles prestaram o juramento antimodernista, é absolutamente certo que eles conhecem a doutrina católica. Sua pertinácia está assim comprovada. Portanto, eles são indiscutivelmente hereges formais. Como perjuros que violaram seu juramento antimodernista, deveriam ter sido levados perante o Santo Ofício da Inquisição da perversidade herética, conforme as diretrizes de São Pio X. Que nenhum clérigo tenha tido a ideia (ou a coragem) de denunciá-los ao Santo Ofício faz parte do "mistério da iniquidade".
De qualquer forma, devemos lembrar: Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla são modernistas, ou seja, hereges da pior espécie. No entanto, um papa (como amplamente demonstrado na primeira parte) nunca cairá em heresia. Portanto, desde o início, eles nunca foram papas. Sua eleição deve ter sido inválida, pois se tivessem sido eleitos validamente, o carisma da infalibilidade os teria preservado de cair nos esgotos da heresia modernista.
Este raciocínio é confirmado pelos fatos: basta examinar um pouco a biografia desses perjuros para descobrir que eles já haviam se desviado da fé antes de sua eleição para o (pseudo) pontificado supremo.
A lei de Paulo IV, retomada por São Pio V, São Pio X e Pio XII, certamente se aplica a eles.
[1] A noção de "pertinácia" é estudada detalhadamente no apêndice C.
B. Aplicação prática da lei a Angelo Roncalli
Roncalli foi iniciado em uma seita gnóstica na Turquia em 1935 (Pier Carpi: As Profecias do Papa João XXIII, Roma 1976; tradução francesa Paris 1976, depois 1978). Ele entrou para a maçonaria quando era núncio em Paris (informação fornecida pelo padre Mouraux em sua revista Bonum Certamen; o padre Mouraux tinha um paroquiano cujo irmão estava inscrito na mesma loja que Roncalli).
Antes de sua eleição, Roncalli recebeu do poder oculto a previsão de que se tornaria papa, bem como as instruções para governar a Igreja conforme os pontos de vista das lojas maçônicas, especialmente convocando um concílio. O boletim ocultista Os Ecos do Sobrenatural de fato publicou o testemunho de Gaston Bardet, autor de vários livros pseudo-místicos, para não dizer luciferianos. Seu nome de iniciação é "Jean de la Joie". Ele é martinista. Saint-Martin, maçom do século XVIII, financiou a Revolução Francesa e fundou sua própria seita luciferiana, a dos "martinistas". Aqui está o testemunho de Gaston Bardet: "Em relação ao concílio, escrevi ao cardeal Roncalli (ex-núncio em Paris, do qual eu era conselheiro) em 14 de agosto de 1954, para anunciar sua futura eleição [para o papado] e pedir um encontro durante as férias em seu país natal para estudar seu primeiro trabalho [...]: o Concílio. E eu esclareci: 'Você gostaria de refletir sobre tudo isso, pois não haverá tempo para hesitar. Assim que subir ao trono pontifício, o plano deve ser executado imediatamente e surpreender todos os políticos'" (Os Ecos do Sobrenatural, dezembro de 1961 / janeiro de 1962, in: Latour, Loubier e Alexandre: Quem ocupa o trono de Pedro?, Villegenon 1984, p. 17). Quatro anos antes da morte de Pio XII, a maçonaria já havia designado seu sucessor e lhe atribuído seu primeiro trabalho: convocar um concílio revolucionário, guiado pelas lojas maçônicas!
Desde o início do século XX, houve adeptos do (falso) ecumenismo. "Esse movimento começou na Igreja Católica com uma tentativa de reforma litúrgica às vésperas da Primeira Guerra Mundial por um monge belga, Dom Lambert Beauduin. No entanto, aos poucos suas iniciativas começaram a colidir com a ortodoxia romana, e o Papa Pio XI não demorou a reagir, condenando essa tentativa em sua encíclica Mortalium animos em 1928. Infelizmente, apesar dessa censura e de sucessivos exílios, Dom Lambert Beauduin continuou a trabalhar nas sombras. Desde 1924, ele havia desenvolvido uma amizade fiel com Monsenhor Roncalli, que havia ingressado na diplomacia após perder, devido ao seu modernismo, sua cátedra no Ateneu Lateranense. Ao saber da morte de Pio XII, o idoso Dom Lambert, então com 85 anos, confidenciou ao Padre Bouyer (L. Bouyer: Dom L. Beauduin, um homem da Igreja, Casterman, 1964, p. 180): 'Se eles elegerem Roncalli, tudo estará salvo; ele será capaz de convocar um concílio e consagrar o ecumenismo'. As ideias do reformador haviam conquistado o coração do futuro papa. João XXIII declararia um dia (Bouyer, p. 135): 'O método de Dom Lambert Beauduin é o correto'" (Padre Daniel Le Roux: Pedro, tu me amas? João Paulo II: Papa da Tradição ou Papa da Revolução?, Escurolles 1988, p. 36).
Depois de (invalidamente) eleito, Roncalli proclamou que a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) era um "passo e avanço para o estabelecimento de uma ordem jurídica e política para todos os povos existentes no mundo". Ele fez uma lista interminável de direitos (vestuário, alimentação, descanso etc.), e acrescentou o direito "à liberdade na busca da verdade e, com a salvaguarda das exigências da ordem moral e do bem comum, o direito de poder expressar e divulgar sua opinião". A religião foi mencionada por último, indicando que era o elemento menos importante aos seus olhos. Além disso, ele nem sequer reivindicou o direito dos católicos de viver em um Estado católico, mas sim o ímpio direito dos hereges de professar sua heresia. "Deve-se também contar entre os direitos do homem que cada um possa honrar a Deus de acordo com a justa regra da consciência e professar sua religião na vida privada e pública" (encíclica Pacem in terris, 11 de abril de 1963). Roncalli fez entregar um exemplar de sua encíclica à ONU, em sinal de solidariedade. Assim, ele contradisse a posição papal, varrendo com essas poucas linhas duzentos anos de advertências pontifícias contra os princípios da revolução. Quando a ONU adotou a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), o Vaticano protestou (Osservatore Romano, 15 de outubro de 1948). Mas Roncalli chegou, e A MAÇONARIA SENTOU NO TRONO DE PEDRO.
A culminância do "mistério da iniquidade": este maçom foi "beatificado" (?) em 3 de setembro de 2000!
C. Aplicação prática da lei a Giovanni Battista Montini
Nos anos 1970, o príncipe Scotersco, ao retornar de Roma a Paris, revelou que possuía provas formais de que Montini era maçom. Ele foi assassinado naquela semana e seus documentos desapareceram.
Winckler revelou que o sobrinho de Rampolla havia formado um grupo de cardeais que esperava "ter sucesso com Montini onde Rampolla havia falhado" e que Montini era um agente dos judeus (Winckler conseguiu se infiltrar nesse grupo de traidores porque erroneamente o consideravam um marrano; testemunho em Latour, Loubier e Alexandre: Quem Ocupa a Cátedra de Pedro?, Villegenon 1984, p. 61-62).
Montini adotou a teologia panteísta de Teilhard de Chardin, teologia que foi colocada no Índice sob o Papa Pio XII. Montini, antes de sua (inválida) elevação ao (pseudo) pontificado soberano, fez observações singulares em um discurso em Turim: "O homem moderno não chegará um dia, à medida que seus estudos científicos progredirem e descobrirem leis e realidades ocultas por trás do rosto silencioso da matéria, a ouvir a voz maravilhosa do espírito que pulsa nela [heresia panteísta, popularizada na década de 1950 por Teilhard de Chardin]? Não será essa a religião do futuro? Einstein ele mesmo vislumbrou a espontaneidade de uma religião do universo. Ou talvez não seja essa, hoje, a minha religião?" (Documentation catholique 1960, páginas 764-765). Montini assim deixou entrever que o panteísmo evolucionista já era sua religião pessoal. Não é desinteressante notar que essa "religião do universo" inspirará o missal montiniano: "Bendito sejas, Deus do universo". E quem é esse "Deus do universo"? A resposta a essa pergunta será fornecida no capítulo 13...
O amigo e mentor de Montini foi o filósofo herege Jacques Maritain, falecido em 1973. Maritain escreveu: "À cristandade medieval de tipo sacral e teocrático [...] deve suceder hoje uma nova cristandade caracterizada [...] pela emancipação recíproca do temporal e do espiritual, e pelo pluralismo religioso e cultural da cidade". Maritain é conhecido como o pai da liberdade religiosa do Concílio Vaticano II. Ele foi antecipadamente condenado, por exemplo, por Leão XIII (encíclica Longinqua oceani, 6 de janeiro de 1895).
D. Aplicação prática da lei a Albino Luciani
Luciani era um defensor da pílula contraceptiva (mesmo após a publicação da Humanae Vitae de Montini). Ele lutou contra a Missa de São Pio V em seu próprio diocese. Escreveu um artigo contra Monsenhor Lefebvre, onde defendia a liberdade religiosa, apoiava a nova missa e se tornava apóstolo do pluralismo, do ecumenismo e do diálogo; ele chamava essas três ideias de "as palavras mais sagradas". Em sua conclusão, comparou Monsenhor Lefebvre a um discípulo de Voltaire, que dizia: "O papa é uma pessoa sagrada; então beijemos seus pés, mas amarremos suas mãos". [1].
Logo após sua elevação ao (pseudo) pontificado, ele recomendou aos educadores as obras do maçom italiano Carducci, autor do infame Hino a Satanás. Em 1910, Monsenhor Delassus (La conjuration antichrétienne) lamentou que alguns educadores católicos tivessem sido seduzidos pelos escritos de Carducci; em 1978, os educadores católicos foram apresentados a esses mesmos escritos como modelo a ser seguido! O discurso de Luciani, publicado no Osservatore Romano, causou escândalo. Alguns chegaram a questionar se ele próprio não seria maçom.
[1] Albino Luciani: "Lefebvre como Voltaire", em: Il Gazzettino di Venezia, junho de 1977. A citação que Luciani faz é aproximada, pois Voltaire (Le sottisier, "soberania real dos papas") escreveu textualmente: "O papa é um ídolo a quem se amarram as mãos e se beijam os pés".
E. Aplicação prática da lei a Karol Wojtyla
Quando Wojtyla chegou a Nancy, o prefeito, que era maçom, o recebeu conferindo-lhe a qualidade de maçom (testemunho do padre Mouraux, residente em Nancy).
O jovem Wojtyla foi influenciado pela teosofia. Em Wadowice, ele encontrou Mieczyslav Kotlarczyk, diretor e teórico de teatro, e foi iniciado em uma dramaturgia esotérica. Kotlarczyk era adepto do ocultismo. "Sobre a relação entre palavras e coisas, Kotlarczyk leu e meditou textos da tradição teosófica (de Helena Petrovna Blavatsky), de fonética e linguística (Otto Jespersen), da tradição hebraica (Ismar Elbogen), fundindo tudo em uma síntese totalmente pessoal. Annie Besant e Rudolf Steiner foram sucessores de Madame Blavatsky na liderança da sociedade teosófica. O cristianismo de Steiner era um cristianismo 'cósmico', não dogmático e, claro, evolucionista. Incluía uma iniciação à magia ocultista que conectava seus adeptos com 'forças', permitindo o exercício do 'pensamento fora do corpo'. Os meios de difusão do steinerianismo eram e ainda são o teatro, a dança, etc." (Le Roux: Pierre m'aimes-tu?, p. 63). Wojtyla escreveu um prefácio para um livro de Kotlarczyk e pregou em seu funeral.
Wojtyla descrevia a atmosfera na qual trabalhava como ator da seguinte forma: "Era uma missão, uma vocação; era o sacerdócio da arte. Os atores, como 'sacerdotes da arte', dotados de uma força ilimitada para renovar o mundo, para refazer toda a humanidade, para curar a moral através da beleza pregada, transmitiam os mais altos valores metafísicos. Essas eram as ideias cantadas pelo 'arcipreste' Kotlarczyk" (em: ibidem, p. 64). O vocabulário utilizado - "força ilimitada, sacerdotes da arte, renovar o mundo, curar a moral" - não é muito católico...
§No momento do Vaticano II, Wojtyla tornou-se apóstolo da ideologia das lojas maçônicas, o que lhe valeu aplausos da maçonaria. "É preciso aceitar o perigo do erro. Não se abraça a verdade sem ter certa experiência do erro. Portanto, é necessário falar do direito de procurar e errar. Reivindico a liberdade para conquistar a verdade" (terceira sessão do conciliábulo Vaticano II, in: Bulletin du Grand Orient de France, nº 48; novembro/dezembro de 1964).
Quando estava à frente da arquidiocese de Cracóvia, Wojtyla visitou Taizé duas vezes. Ele convidou o irmão Roger para pregar diante de 200.000 trabalhadores da mina (Le Monde, 7 de outubro de 1986). Em Kroscienko, aos pés dos Cárpatos, ele demonstrou sua simpatia pelo movimento "Oasis", a "Taizé polonesa" (Témoignage chrétien, 28 de maio de 1979). Tornando-se pseudo-papa, ele visitou Taizé no início de outubro de 1986: "Passamos por Taizé como passamos perto de uma fonte".
Durante o retiro que Wojtyla pregou diante de Montini e seus colaboradores em 1976, intitulado O sinal da contradição, ele definiu assim a "função real" que Jesus reivindicou diante de Pilatos: "A função real - munus regale - não é principalmente o direito de exercer autoridade sobre os outros, mas de revelar a realeza do homem. Esta realeza está inscrita na natureza humana, na estrutura da pessoa" (Karol Wojtyla: O sinal da contradição, Paris 1979, p. 176). Em suma, todos os homens são reis - exceto Jesus!
Aqui está a tradução para o português:
Em 1969, Wojtyla publicou, em polonês, um livro herético que depois foi traduzido para o francês: Pessoa e Ato.
Para Wojtyla, "o homem se realiza como pessoa" e é "cada ato que representa um cumprimento da pessoa". A norma para realizar um ato é a "norma de sua subjetividade pessoal". Portanto, não importa o ato, as noções de bem e mal são iguais. Todo ato é bom, desde que seja realizado.
Wojtyla vai além: a transcendência, a liberdade e a verdade não estão mais fora do homem: agora são os próprios atos do homem que tornam possível a transcendência e a liberdade, e que estabelecem a norma da verdade. "A pessoa é transcendente por sua própria ação, porque é livre". A escolha do ato marca a liberdade. E a verdade consiste em se realizar, ou seja, em existir realizando atos de acordo com seus próprios valores. "O poder normativo da verdade encontra sua explicação no dever", que "consiste em se realizar a si mesmo".
Assim, para Wojtyla, o propósito na terra e a felicidade consistem em se realizar: "Realizar-se, se realizar e ser feliz é quase a mesma coisa".
Deus é praticamente ausente nesta obra, ou apenas marginalmente presente. O paraíso não interessa ao autor. O homem pode prescindir de Deus, seu criador, pois se compreende como criador, porque "o homem se cria através do ato".
Essa concepção wojtyliana do homem se encaixa perfeitamente em um movimento filosófico moderno chamado "existencialismo". O existencialismo foi explicitamente condenado por Pio XII (encíclica Humani generis, 12 de agosto de 1950).
Em 1972, Wojtyla publicou um vade-mécum do Vaticano II para os fiéis poloneses (traduzido para o francês em 1981: Nas Fontes da Renovação). O autor nega um artigo da fé católica.
Wojtyla é assim "pego em flagrante" (cf. a bula de Paulo IV) por ter desviado da fé antes de sua eleição.
Wojtyla negou um artigo do credo antes de sua eleição, o da unidade da Igreja. Primeiramente, a doutrina sólida: "A Igreja é constituída na unidade por sua própria natureza. Ela é UNA, embora as heresias tentem dividi-la em várias seitas" (São Clemente de Alexandria: Stromates VII, 17). A unidade existe na Igreja Católica. Os hereges e cismáticos devem se unir à unidade existente, convertendo-se ao catolicismo.
Segundo Wojtyla, porém, a unidade da Igreja foi perdida. Católicos, "irmãos separados" (= protestantes hereges) e "ortodoxos" (= gregos cismáticos e hereges) devem reconstruir juntos uma unidade que não mais existe. "A Igreja [está atualmente] dividida pelos homens", mas "os homens, com a ajuda da graça e apesar das divisões atuais e antigas, alcançarão um dia essa unidade que é a da Igreja no pensamento e na vontade de Cristo: 'Por uma humilde oração, devemos pedir perdão a Deus e aos irmãos separados, assim como perdoamos àqueles que nos ofenderam'" (Vaticano II: Unitatis redintegratio, § 7) (Karol Wojtyla: Nas Fontes da Renovação, Paris 1981, p. 261). Portanto, os católicos também seriam culpados de cisma, pois deveriam pedir perdão a Deus por terem pecado contra a unidade.
Mesma linha após sua eleição (inválida): "Estamos caminhando para a unidade que caracterizava a Igreja apostólica em seus primórdios, e que buscamos" (encíclica Ut unum sint, 25 de maio de 1995). "A divisão dos cristãos está em contradição com a verdade que eles têm a missão de defender" (ibidem). "Não há dúvida de que o Espírito Santo age nesta obra de 'recomposição da unidade dos cristãos'" (ibidem).
Em 12 de março de 2000, diante do mundo inteiro, Wojtyla pediu perdão por todos os pecados da Igreja Católica, incluindo o de ser responsável pela perda da unidade. Etchegaray, presidente do comitê do pseudo-jubileu do ano 2000, rezou assim: "Oremos para que o reconhecimento dos pecados que romperam a unidade do corpo de Cristo e feriram a caridade fraterna abra caminho para a reconciliação e a comunhão de todos os cristãos". Wojtyla continuou imediatamente: "Pai misericordioso, na véspera de sua paixão, teu Filho rezou pela unidade daqueles que creem nele, mas, contra sua vontade, eles se opuseram e se dividiram, se condenaram mutuamente e lutaram uns contra os outros. Invocamos com força o teu perdão e te pedimos para nos dar um coração arrependido, para que todos os cristãos, reconciliados contigo e entre si, formando um único corpo e um único espírito, possam reviver a alegre experiência da plena comunhão" (em: La Croix, 13 de março de 2000).
No dia de sua ordenação, Karol Wojtyla (assim como Roncalli, Montini e Luciani) pronunciou este juramento antimodernista (imposto por São Pio X a todos os padres): "A fé não é um sentimento religioso cego, surgindo das profundezas sombrias do subconsciente moralmente informado sob a pressão do coração e o impulso da vontade". Com seu juramento antimodernista, Wojtyla comprometeu-se a não substituir o depósito da fé "por uma criação da consciência humana, que se formou gradualmente pelo esforço dos homens".
No entanto, este juramento foi uma mentira, porque, na verdade, Wojtyla tinha uma concepção diametralmente oposta da fé, como ele confidenciou a seu amigo Frossard: "Nunca considerei minha fé como 'tradicional' [...] Ao considerar objetivamente minha própria fé, sempre constatei que ela não tinha nada a ver com qualquer conformismo, que nasceu nas profundezas do meu próprio 'eu', que também era fruto dos esforços de minha mente buscando uma resposta para os mistérios do homem e do mundo" (em: André Frossard: Não Tenhais Medo, Paris 1982, p. 40-41).
A fé é um dom de Deus, pelo qual aderimos firmemente às verdades do catecismo. No entanto, Wojtyla, como bom maçom, rejeita o que ele chama de "verdades prontas". Ele disse a seu amigo Frossard: "A fé não constrange a inteligência, não a submete a um sistema de verdades prontas" (em: Frossard, p. 63). Isso está em completo oposto ao juramento antimodernista, segundo o qual a fé "é um verdadeiro assentimento da inteligência à verdade recebida de fora pela audição".
"Diga-me quem você admira, e eu direi quem você é.
"Teólogos tão eminentes como Henri de Lubac, Y. Daniélou, Y. Congar, H. Küng, R. Lombardi, Karl Ralmer e outros desempenharam um papel extraordinário nesses trabalhos preparatórios" do conciliábulo do Vaticano II (Wojtyla: entrevista em 1963 com o Padre Malinski: Meu Amigo Kami Wojtyla, Paris 1980, p. 189). Todos os teólogos mais escandalosos não só são elogiados por Wojtyla, mas às vezes são elevados ao (pseudo) cardinalato por ele. Resumimos brevemente as teses de todos esses teólogos, que Wojtyla tanto aprecia.
BALTHASAR afirma que o inferno está vazio.
Hans Urs von Balthasar, que o Le Monde de 20 de outubro de 1981 qualificou como "mentor de João Paulo II", foi criado cardeal em 28 de junho de 1988.
CAMARA acredita que o marxismo é legítimo. O Evangelho é um fermento revolucionário. "Longe de rejeitar a socialização, devemos aderir a ela com alegria como uma forma de vida social mais adequada ao nosso tempo e mais conforme ao Evangelho". Marx está certo ao criticar a religião como sendo "o ópio do povo", porque "a Igreja apresenta aos párias um cristianismo passivo, alienado e alienante, verdadeiramente um ópio para as massas" (1968).
Em 15 de agosto de 1981, Wojtyla parabenizou Dom Helder Camara: "Tua alma de pastor contribui para nossa santificação. [...] Temos por ti um amor especial".
CONGAR, várias vezes exilado por Pio XII devido à sua heresia, jubila: "Fui agraciado. As grandes causas que tentei servir culminaram no concílio: renovação eclesiológica... reformismo, ecumenismo, leigos". "A Reforma nos supera em quatro séculos nas demandas do espírito moderno".
"Teólogo eminente" segundo Wojtyla (em: Malinski: Meu Amigo Karol Wojtyla, p. 189).
KÜNG nega todos os dogmas. Ele é tristemente famoso por seus ataques à divindade de Jesus e à infalibilidade pontifical.
"Teólogo eminente" segundo Wojtyla!
LUBAC faz uma confusão entre natural e sobrenatural. Cada homem é Deus: "Ao revelar o Pai e ser revelado por ele, Cristo completa a revelação do homem a si mesmo" (1938).
Lubac foi criado cardeal por Wojtyla em 2 de fevereiro de 1983. "Inclino minha cabeça diante do Padre Henri de Lubac, teólogo jesuíta que estava nos primeiros lugares, ao lado do Padre Congar, ambos tendo tido dificuldades com Roma antes do período conciliar" (Wojtyla na França, Le Monde, 3 de junho de 1980).
MARITAIN advoga pela separação entre Igreja e Estado: "À cidade medieval de tipo sacral e teocrático deve suceder hoje uma nova cristandade, caracterizada pela emancipação mútua do temporal e do espiritual, e pelo pluralismo religioso e cultural da cidade". Maritain acredita em uma anistia final obtida por Satanás.
Maritain foi amigo e mentor de Montini e Wojtyla. Maritain "sustentou que uma concepção justa da pessoa humana era a base necessária para qualquer estrutura social e política digna do homem" (Wojtyla para o centenário do nascimento de Maritain, 1983).
RAHNER acredita que cada homem é Deus: "Em minha essência, há Deus". Ele nega o privilégio da Imaculada Conceição, porque nega o pecado original. Esse dogma "não significa de maneira alguma que o nascimento de um ser seja acompanhado por algo contaminante, por uma mancha, e que para evitá-lo, Maria deveria ter tido um privilégio" (1968). Negação da transubstanciação e do inferno.
"Karl Rahner faleceu aos 80 anos. Entre as provas de estima, Rahner acabara de receber votos pessoais de João Paulo II" (Témoignage chrétien, 9 de abril de 1984).
KIERKEGAARD, HUSSERL E SCHELER batizaram sua filosofia de "existencialismo". Segundo esses filósofos, os Evangelhos não são históricos, mas um testemunho da Igreja. Os dogmas se tornam relativos e mutáveis. A Redenção não passa de uma vitória sobre a injustiça, o racismo, o fascismo. Cristo é apenas um homem exemplar. Os sacramentos são apenas símbolos, etc.
Wojtyla, embora sua tese de doutorado sobre "A possibilidade de fundamentar uma ética cristã com base filosófica em Max Scheler" tenha sido criticada por seus examinadores, faz constantes referências aos filósofos Kierkegaard, Husserl e Scheler.
QQuando Wojtyla foi eleito, um cardeal visitou Jean Guitton, amigo de Montini e... maçom. Jean Guitton estava preocupado: o sucessor de Montini iria questionar as conquistas maçônicas de seu antecessor? O cardeal o tranquilizou: "As pessoas são tão tolas que acreditam que basta ser polonês para ter fé!" (testemunho de Michèle Reboul, secretária de Jean Guitton que assistiu à conversa).
[1] A expressão usada por Le Roux é imprecisa, pois Steiner deixou a teosofia e fundou sua própria seita, que ele chamou de "antroposofia". O centro dos antropósofos está localizado em Dornach (Suíça), onde Steiner mandou construir um edifício de madeira chamado "Goetheanum", que foi destruído por um incêndio e substituído por um edifício de pedra. A "eurythmie" (uma forma de dança teatral esotérica) é um componente essencial da antroposofia.
Conclusão
Considerando que Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla desviaram da fé antes do conclave, sua eleição é inválida de acordo com o direito divino e o direito eclesiástico.
A Igreja já tomou uma decisão antecipada: "Por renúncia tácita admitida pelo próprio direito, qualquer ofício fica vago de fato e sem qualquer declaração, se o clérigo [...] 4° se afasta publicamente da fé católica" (cânone 188). Um renomado canonista comenta sobre a noção de "renúncia tácita" do cânone 188: "Sabe-se que ela é o efeito de uma presunção legal e nem precisa ser objeto de um julgamento declarativo" (Raoul Naz: Dictionnaire de droit canonique, Paris 1957, artigo "ofícios eclesiásticos").
A Igreja já tomou uma decisão ao promulgar uma lei chamada "irritante". O que significa "lei irritante"? A palavra vem do latim in-ratus, que significa não ratificado, nulo. Segundo o cânone 11, leis irritantes determinam que um ato é nulo. "Leis irritantes ou incapacitantes são aquelas que decidem explicitamente ou em termos equivalentes que um ato é nulo ou que uma pessoa é incapaz".
A Igreja já resolveu a "questão do papa", pois estabeleceu uma lei irritante, de acordo com a qual a eleição de um não-católico é automaticamente nula, já que o § 6 da lei eclesiástica Cum ex apostolatus torna inválidas "de fato, sem necessidade de qualquer outra declaração posterior", as eleições de Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla.
Este é o que os canonistas chamam de "nullitas latae sententiae plenissima", ou seja, um ato eleitoral nulo de pleno direito, sem qualquer intervenção posterior de um tribunal eclesiástico. Segundo o Dictionnaire de droit canonique (artigo "nullités"), "a nullitas latae sententiae plenissima anula o ato tanto no foro interno quanto no foro externo, na ausência de qualquer sentença judicial". Este dicionário especifica que qualquer pessoa simples (até mesmo um leigo) está autorizada a constatar essa nulidade e agir conforme necessário. As eleições de Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla SÃO nulas desde já; qualquer católico está autorizado a tornar este fato conhecido.
É até mesmo um dever proclamar a invalidez dessas eleições. Pois o Papa Paulo IV redigiu uma "constituição" à qual todo católico deve obedecer sob pena de pecado. Segundo Santo Tomás de Aquino, de fato, "a ignorância da lei não desculpa. Ora, a constituição do papa estabelece a lei. Portanto, aquele que faz algo contra a constituição do papa por ignorância é inescusável. [...] A ignorância é um pecado, quando se ignora algo que se pode e deve saber; todos são obrigados a conhecer a constituição do papa. Se alguém a ignora por negligência, não está isento de culpa se age contra a constituição" (Santo Tomás de Aquino: Quaestiones quodlibetales, n.º 1, q. 9, a. 3).
A constituição de Paulo IV é indubitavelmente um "ato do Santo Sé". Portanto, de acordo com o cânone 2333, a oposição direta para impedir a execução dos atos do Santo Sé é um crime punível com excomunhão.
Aqueles que se opõem à constituição de Paulo IV incorrem ipso facto em uma maldição divina (Cum ex apostolatus, § 10).
Resumo: Visto que Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla desviaram da fé antes do conclave, sua eleição é inválida de acordo com a lei divina e a legislação eclesiástica vigente.
O TRONO PAPAL PODE SUBSISTIR TEMPORARIAMENTE SEM PAPA?
- A ausência de papa
- Conclusão do capítulo
Ausência de Papa
Desde a morte de Pio XII, não há mais um papa. Este fato não é de modo algum incompatível com a noção de "visibilidade" da Igreja, pois o Trono Pontifício e a Igreja Católica podem subsistir temporariamente sem um papa. A Igreja visível às vezes possui um papa, às vezes está sem papa. A vacância do Trono Apostólico é um fenômeno completamente normal, que ocorreu mais de 250 vezes na história da Igreja. A cada morte de um papa, o Trono Apostólico permanece vago por alguns meses, às vezes anos. Se a vacância do Trono Apostólico fosse contrária à visibilidade da Igreja, a Igreja teria desaparecido e ressuscitado mais de 250 vezes desde sua fundação! Quem defenderia tal absurdo?
A Igreja Católica e o Trono Apostólico são pessoas jurídicas (cânone 100). Uma pessoa jurídica de direito eclesiástico é de natureza perpétua (cânone 102). Por ser de natureza perpétua, a Igreja Católica não pode desaparecer, mesmo que temporariamente privada de um papa.
"Mesmo que vários meses ou anos se passem sem eleger um novo papa, ou mesmo que antipapas surjam, como aconteceu algumas vezes, o intervalo não destruirá de forma alguma a sucessão, porque então o clero e o corpo dos bispos sempre subsistem na Igreja com a intenção de eleger um sucessor para o papa falecido assim que as circunstâncias o permitirem" (Padre Barbier: Les trésors de Cornelius a Lapide..., Paris 1856, l. J, p. 724 - 725).
São Pio X previu a possibilidade de vacância do Trono, e previu tão bem que promulgou um regulamento completo para essa situação (constituição Vacante Sede Apostolica, 25 de dezembro de 1904). Além disso, ele até criou um cânone específico para essa circunstância. "Com o Trono Apostólico vago, o sagrado colégio dos cardeais e a cúria romana não têm outro poder além do definido na constituição Vacante Sede Apostolica de 25 de dezembro de 1904 de Pio X" (cânone 241).
Certamente! Aqui está a tradução para o português:
"Este santo pontífice até previu que a Sé Apostólica possa ser ocupada por um usurpador! Eis o que ele decretou a esse respeito: 'Quando um cargo eclesiástico está vago de direito, mas ainda ocupado ilegitimamente, pode ser conferido a outro, desde que, segundo o costume dos santos cânones, sua ocupação seja declarada ilegítima; e essa declaração deve ser mencionada no ato da nomeação' (cânone 151).
Outro santo Papa que se preocupou com a vacância da Sé Apostólica foi São Pio V. Este Papa também considerou não ser de modo algum impossível que a Sé se torne um dia vaga. Ele também regulou essa eventualidade, não administrativamente, mas liturgicamente. No missal do altar, no início, estão as instruções sobre como celebrar a missa. É bem especificado que - devemos dizer? ORDENADO! - em caso de vacância da Sé Apostólica, o celebrante deve omitir a menção do Papa no cânone da missa ('Una cum famulo tuo papa nostro N.'). 'Onde se diz "em união com vosso servo nosso Papa N.", expressa-se o nome do Papa; por outro lado, quando a Sé Apostólica está vaga, as palavras acima mencionadas são omitidas' (São Pio V: Missale Romanum; "Ritus servandus in celebratione Missae", capítulo 7, § 2). O padre deve retomar o texto a partir de "e de todos os ortodoxos,,27".
O célebre liturgista Dom Prosper Guéranger (Explicação das orações e cerimônias da missa, reedição 27 São Pio V prescreve que se ore assim: "Te igitur, clementíssimo Pai, por Jesus Cristo, teu Filho, nosso Senhor, suplicantes rogamos e pedimos que aceites e abençoes estes + dons, estes + presentes, estes + santos sacrifícios imaculados. Em primeiro lugar, os que te oferecemos pela tua santa Igreja católica: que dignes pacificar, guardar, unir e governar em todo o mundo, e por todos os ortodoxos, cultores da fé católica e apostólica. Lembra-te, Senhor... etc Bruxelas 1986, p. 106) comenta: 'Se a Sé Apostólica estivesse vaga, essa menção seria omitida'."
"O mesmo autor tem palavras reconfortantes para os cristãos que vivem durante a vacância da Sé Apostólica: 'Que um Decius, com suas violências, provoque uma vacância de quatro anos no Trono de Roma; que se levantem antipapas apoiados uns pela popularidade, outros pela política dos príncipes; que um longo cisma torne duvidosa a legitimidade de vários pontífices; o Espírito Santo permitirá que o teste se desenrole, fortalecerá, durante sua duração, a fé de seus fiéis; finalmente, no momento marcado, ele produzirá seu eleito, e toda a Igreja o receberá com aclamação' (Dom Guéranger: L’année liturgique, quarta-feira de Pentecostes).
Lucius Lector (Le conclave, Paris s.d., publicado sob Leão XIII) escreveu nada menos que 784 páginas sobre as leis e cerimônias que regem os conclaves e a vacância da Sé Apostólica. V. Martin escreveu um livro sobre a vacância (Les cardinaux et la curie, Tribunaux et offices, la vacance du Siège apostolique, Paris 1930). Charles Pichon publicou Le pape, le conclave, l’élection et les cardinaux (Paris 1955). Se esses livros foram escritos, é uma prova de que a existência de uma vacância da Sé Apostólica é teologicamente possível!
A vida da Igreja visível continua, mesmo quando privada de um papa. Houve até consagrações de bispos durante a vacância da Sé Apostólica.
E o Papa Paulo IV especifica que essa vacância pode durar muito tempo. Se um usurpador fosse eleito ilegitimamente, a Sé estaria vacante, 'e isso, independentemente da duração dessa situação' (Cum ex apostolatus, § 6).
Que a privação de um papa dure anos, até décadas, é certamente lamentável, mas de modo algum impossível. Vacância (25 de outubro de 304 - 27 de maio de 308) entre São Marcelino e São Marcelo I: três anos e sete meses. Vacância (29 de novembro de 1268 - 1º de setembro de 1271) entre Clemente IV e São Gregório X: dois anos e nove meses. Vacância (1º de abril de 1292 - 5 de julho de 1294) entre Nicolau IV e São Celestino V: dois anos e três meses. Papas duvidosos (portanto, inválidos) durante o Grande Cisma do Ocidente (1378 - 1417): trinta e nove anos (se adicionarmos a linha cismática dos antipapas do Concílio de Basileia, chegaríamos a setenta anos!).
CONCLUSÃO DO DÉCIMO SEGUNDO CAPÍTULO: Segundo os cânones 100 e 102, a Igreja subsiste perpetuamente. Em caso de vacância da Sé Apostólica, ela é governada pelo cânone 241. A vacância da Sé Apostólica é um fenômeno doloroso, porém não incompatível com a noção de 'visibilidade' da Igreja.
A visibilidade da Igreja compreende quatro características distintas, que serão delineadas no próximo capítulo."
Conclusão
A vacância da cátedra de Pedro é prevista pela legislação eclesiástica. Ela não interrompe a vida da Igreja. Portanto, não é de modo algum incompatível com a noção de "visibilidade" da Igreja Católica.
AS QUATRO MARCAS DA IGREJA VISÍVEL
A. A marca da unidade
B. A marca da santidade
C. A marca da catolicidade
D. A marca da apostolicidade
E. A Igreja conciliar não possui as quatro marcas da Igreja visível!
Conclusão
A. A marca da unidade
"Não há senão um só Senhor, uma só fé, um só batismo" (Efésios IV, 4). "Só há uma fé que TODOS devem guardar e professar publicamente" (Catecismo Romano).
Os 2.221 bispos que votaram, em 28 de outubro de 1965, na declaração Nostra aetate do Concílio Vaticano II, caíram diretamente sob um anátema do Concílio Vaticano I:
Concílio Vaticano II: Declaração Nostra aetate (1965): "O budismo ensina [...] um caminho pelo qual os homens [...] podem 'adquirir o estado de libertação perfeita, alcançar a iluminação suprema por seus próprios esforços'."
Concílio Vaticano I (1870): De revelat., cânon 3 (citado em Pascendi): "Se alguém disser que o homem não pode ser elevado a um conhecimento e a uma perfeição que excedam a natureza, mas que ele pode e deve, por um progresso contínuo, 'finalmente alcançar por si mesmo a posse de todo o verdadeiro e todo o bem', que seja anátema."
Poderíamos multiplicar os exemplos de divergência entre a fé católica e a crença conciliar. A esse respeito, Romano Amerio forneceu um livro com mais de 600 páginas (Iota unum), deixando de lado pelo menos cinquenta temas!
A Igreja conciliar não professa a mesma fé que a Igreja Católica. Portanto, LHE FALTA A MARCA DE UNIDADE.
B. A marca da santidade
"A Igreja é santa porque ela sozinha possui o culto do sacrifício legítimo e o salutar uso dos sacramentos, estes instrumentos eficazes da graça divina pelos quais Deus nos comunica a santidade" (Catecismo Romano).
Montini fez elaborar uma nova missa pelo maçom Bugnini e seis pastores protestantes. O resultado é apropriado. Como simples exemplo, observe que a invocação do Espírito Santo ("Vinde, Espírito Santo...") foi suprimida e substituída por: "Bendito sejais, Senhor Deus do universo". Mas quem é esse "Deus do universo"? Um livro escrito por um maçom luciferiano convertido fornece a resposta: "O que é então o Senhor dos Céus, senão o Deus dos preguiçosos, ociosos e vagabundos, que imaginam o espírito e se satisfazem com matéria; que vivem de ideias e consomem a realidade? Não há espírito sem matéria, e eles são identificados um ao outro, ou então o Senhor dos Céus é o Deus do Nada; enquanto Satanás, pelo contrário, é o Deus do Universo! O Deus do Universo, pois ele compreende em um único ser espírito e matéria, sendo que uma não pode subsistir sem a outra. Apenas esse deve ser para nós o Deus que governa ambos, e esse é Satanás" (Domenico Margiotta: Le palladisme. Culte de Satan-Lucifer dans les triangles maçonniques, Grenoble 1895, p. 44).
A luta católica está focada na "missa de sempre". Este foco faz esquecer que todos os rituais e todos os sacramentos foram mudados. O rito foi mudado em todos os lugares, a matéria e a forma às vezes.
À luz dessas informações sucintas, pode-se afirmar que a Igreja conciliar não possui um "sacrifício legítimo" e que os outros sacramentos, em sua maioria duvidosos ou inválidos, contribuem pouco para a santificação. Por isso, LHE FALTA A MARCA DA SANTIDADE.
C. A marca da catolicidade
"Todos os fiéis que existiram desde Adão até hoje, todos aqueles que existirão enquanto o mundo existir, ao professar a verdadeira fé, pertencem a esta mesma Igreja estabelecida sobre os apóstolos e os profetas" (Catecismo Romano). "Católico" significa "universal". A fé "católica" é "universal" no tempo e no espaço: é o que foi crido por todos, em toda parte e em todos os tempos, como disse São Vicente de Lérins (Commonitorium, 434).
Uma rápida análise (nossa investigação) ou numerosos e volumosos estudos (publicados por católicos desde os anos 1960) provam abundantemente que a crença professada pela Igreja conciliar não tem nada de "católica", pois está em contradição com o que foi crido e ensinado nos dois mil anos de catolicismo, ou até mesmo nos seis mil anos, pois a Igreja começou com Adão, como diz o Catecismo Romano e como explica magistralmente o padre Barbier (Les trésors de Cornelius a Lapide..., Paris 1856).
Além dos estudos católicos, pode-se citar até mesmo confissões dos próprios conciliares, que se orgulham publicamente de não serem mais católicos!
Segundo o (pseudo) prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, o texto conciliar Gaudium et Spes "desempenha o papel de um contra-syllabus na medida em que representa uma tentativa de uma reconciliação oficial da Igreja com o mundo como ele se tornou desde 1789" (Ratzinger: Les Principes de la théologie catholique, tradução francesa 1985, p. 426). Os conciliares, portanto, renegam o ensinamento ex cathedra do Syllabus de Pio IX! Isso é uma apostasia.
Congar, um dos teólogos mais importantes do Vaticano II, afirmou: "A Igreja fez, pacificamente, sua revolução de outubro" (in: Monsenhor Lefebvre: Lettre ouverte aux catholiques perplexes, Paris 1985, p. 133).
Enfrentando a ideologia dos direitos humanos, a Igreja "passou de um comportamento de condenação a um comportamento positivo e encorajador" (Comissão Pontifícia "Justiça e Paz": L'Église et les droits de l'homme, Cidade do Vaticano 1975, p. 21). Triunfo póstumo dos maçons de 1789!
Como a Igreja conciliar não é católica, LHE FALTA A MARCA DA CATOLICIDADE.
D. A marca da apostolicidade
"Eis um último caráter próprio que nos faz distinguir a verdadeira Igreja: ela remonta aos apóstolos, que publicaram o Evangelho. A doutrina da Igreja não é uma doutrina nova que apenas começou a aparecer, mas é aquela mesma que foi ensinada pelos apóstolos e espalhada por eles por toda a terra. Por isso, os Padres do Concílio de Niceia, inspirados por Deus, para nos fazer compreender o que era a Igreja Católica, acrescentaram no Credo a palavra 'apostólica'" (Catecismo Romano).
Os apóstolos queimaram livros ímpios (Atos dos Apóstolos XIX, 19); Montini suprimiu o Índice e elogiou a liberdade de imprensa.
O apóstolo São Paulo proibiu sacrificar aos ídolos (1 Coríntios X, 14-22); Wojtyla o fez na África e na Índia.
O apóstolo São Pedro acusou os judeus de deicídio (Atos dos Apóstolos II, 23); o Vaticano II (Nostra aetate, § 4) nega esse fato.
Os apóstolos e os discípulos de Nosso Senhor expulsavam demônios; a seita conciliar suprimiu os exorcismos do batismo, o exorcismo das santas óleos na Quinta-feira Santa, o sal exorcizado, o pequeno exorcismo de Leão XIII recitado no final da missa, a ordem dos exorcistas (Montini suprimiu a ordem dos exorcistas em 15 de agosto de 1972, concedendo, no entanto, aos bispos a faculdade de manter um exorcista se achassem bom). Em 29 de setembro de 1985 (Documentação Católica, 1986, p. 197), a Congregação para a Doutrina da Fé formalmente proibiu que qualquer um recitasse o pequeno ou grande exorcismo de Leão XIII. As orações para os agonizantes foram expurgadas: toda menção ao demônio, adversário temível na última hora, foi suprimida. As completas dos beneditinos foram amputadas da bela lição do apóstolo São Pedro: "Irmãos, sede sóbrios e vigilantes, porque o vosso adversário, o diabo, anda ao redor como um leão, rugindo, procurando a quem devorar; resisti-lhe firmes na fé" (1 Pedro V, 8).
Os líderes conciliares assim derrubaram todas as defesas sobrenaturais contra as forças infernais. Isso é diametralmente oposto ao ensinamento dos apóstolos São Pedro (citado acima) e São Paulo, segundo o qual devemos lutar contra os poderes infernais espalhados pelos ares (Efésios VI, 10-17).
A Igreja conciliar é diferente daquela estabelecida pelos apóstolos. Isso significa que LHE FALTA A MARCA DA APOSTOLICIDADE.
A Igreja conciliar não possui as quatro notas da Igreja visível!
A Igreja conciliar não possui as notas de unidade, santidade, catolicidade e apostolicidade, que são os sinais da Igreja visível. Portanto, a Igreja conciliar não é a Igreja visível!
Em setembro de 1988, Dom Lefebvre proferiu uma palestra sobre a visibilidade da Igreja, demonstrando que a Igreja conciliar não possuía essas quatro notas, enquanto os católicos que rejeitaram a Igreja conciliar as possuíam (bons sacramentos, doutrina católica, poder episcopal remontando aos apóstolos). Ele resumiu mais tarde essa palestra em duas frases: "Somos nós que somos a Igreja visível". "São os outros que não fazem mais parte dela" (entrevista em Le Choc, nº 6, Paris 1989).
Aqui estão os principais trechos de sua conferência crucial, intitulada A visibilidade da Igreja e a situação atual, proferida diante dos antigos seminaristas em Ecône, em 9 de setembro de 1988 (in: Bulletin officiel du district de France de la Fraternité Sacerdotale Saint Pie X, nº 29, setembro de 1988):
"[...] Onde está a Igreja visível? A Igreja visível é reconhecida pelos sinais que sempre deu para sua visibilidade: ela é UNA, SANTA, CATÓLICA E APOSTÓLICA.
Eu pergunto a vocês: onde estão os verdadeiros sinais da Igreja? Estão mais na Igreja oficial (não se trata da Igreja visível, mas da Igreja oficial) ou em nós, no que representamos, no que somos? É claro que somos nós que guardamos a UNIDADE da fé, que desapareceu na Igreja oficial. Um bispo acredita nisso, outro não, a fé é diversa, seus catecismos abomináveis contêm heresias. Onde está a unidade da fé em Roma?
Onde está a unidade da fé no mundo? Somos nós que a mantivemos. A unidade da fé realizada em todo o mundo é a CATOLICIDADE. No entanto, essa unidade da fé no mundo já não existe mais, portanto, praticamente não há mais catolicidade. Em breve, haverá tantas igrejas católicas quantos bispos e dioceses. Cada um tem sua maneira de ver, de pensar, de pregar, de ensinar seu catecismo. Não há mais catolicidade.
A APOSTOLICIDADE? Eles romperam com o passado. Se fizeram alguma coisa, foi isso mesmo. Eles não querem mais o que aconteceu antes do Concílio Vaticano II.
A apostolicidade: nós estamos ligados aos apóstolos pela autoridade. Meu sacerdócio vem dos apóstolos; o seu sacerdócio vem dos apóstolos. Somos filhos daqueles que nos deram o episcopado. Nosso episcopado desce do santo Papa Pio V e através dele remontamos aos apóstolos. Quanto à apostolicidade da fé, cremos na mesma fé dos apóstolos. Não mudamos nada e não queremos mudar nada.
E então, a SANTIDADE. Não vamos nos fazer elogios ou louvores.
Tudo isso mostra que somos nós que temos os sinais da Igreja visível. Se ainda há uma visibilidade da Igreja hoje, é graças a vocês. ESSES SINAIS NÃO SE ENCONTRAM MAIS NOS OUTROS. Eles não têm mais a unidade da fé, e é a fé que é a base de toda visibilidade da Igreja.
A catolicidade é a fé una no espaço. A apostolicidade é a fé una no tempo, e a santidade é o fruto da fé, que se concretiza nas almas pela graça de Deus, pela graça dos sacramentos. É completamente falso nos considerar como se não fizéssemos parte da Igreja visível.
Não somos nós, mas os modernistas que estão saindo da Igreja. Quanto a dizer "sair da Igreja visível", É UM ERRO ASSIMILAR A IGREJA OFICIAL E A IGREJA VISÍVEL.
Todos os domingos na missa, os católicos cantam o Credo de Nicéia-Constantinopla. « ...Et unam, sanctam, catholicam et apostolicam Ecclesiam ». Desprovida das notas de unidade, santidade, catolicidade e apostolicidade, a Igreja conciliar não representa de forma alguma a verdadeira Igreja visível, como fica claro no credo, definido pelos Padres de Nicéia, retomado pelos Padres de Constantinopla e devidamente explicado pelos Padres de Trento (Catecismo Romano**). Reconhecer Roncalli, Montini, Luciani e depois Wojtyla como chefes da verdadeira Igreja é contradizer um artigo do Credo de Nicéia-Constantinopla!!!
O Catecismo Romano foi escrito justamente para ajudar os fiéis a discernir a verdadeira Igreja e a não confundí-la com seitas que são sua contrafação. Estudamos cuidadosamente os critérios fornecidos por este catecismo e, com a ajuda desses pontos de referência, descobrimos que a Igreja conciliar não é mais do que uma seita qualquer, fundada por impostores. Então, como homens que não fazem parte da Igreja visível poderiam ser sua cabeça? Desde quando se pode ser o Vigário de Cristo sem fazer parte do corpo místico de Cristo?!
Dom Antonio de Castro-Mayer, bispo emérito de Campos (Brasil), compreendeu muito bem que a Igreja visível não tem nada a ver com a Igreja conciliar. Na véspera das ordenações episcopais em Ecône (1988), de fato, Dom de Castro-Mayer defendia a validade da causa católica:
« Deixe o mundo dizer que essas consagrações são feitas em desacordo com a cabeça visível da Igreja. Mas deixe-me fazer uma pergunta. Onde está a cabeça visível da Igreja? Podemos aceitar como cabeça visível da Igreja um bispo que coloca divindades pagãs no altar ao lado de Nosso Senhor Jesus Cristo? Se todos os homens de Igreja vierem a aceitar os ensinamentos de Assis, este erro de colocar as divindades pagãs no mesmo nível de Nosso Senhor, qual será a consequência? Será a apostasia geral » (in: Bonum certamen, no 132, ou ainda in: Simple lettre, Serre-Nerpol julho/agosto de 1993).
Aqui está o texto integral (traduzido do latim) de uma declaração corajosa de um arcebispo da Igreja Romana:
DECLARAÇÃO
Nos dias de hoje, sob que aspecto a Igreja Católica nos aparece? Em Roma reina o "papa" João Paulo II, cercado pelo colégio cardinalício, bem como um grande número de bispos e prelados. Fora de Roma, a Igreja Católica parece florescente com seus bispos e padres. Os católicos estão em número imenso. Todos os dias, a missa é celebrada em tantas igrejas e, no dia do Senhor, as igrejas acolhem muitos fiéis para ouvir a missa e receber a sagrada comunhão.
Mas, aos olhos de Deus, qual é o aspecto da Igreja de hoje? Essas missas - diárias e dominicais, às quais os fiéis assistem - agradam a Deus? De modo algum! Pois essa missa é idêntica para católicos e protestantes. Por essa razão, ela não é agradável a Deus e é inválida. A única missa agradável a Deus é a missa de São Pio V, que um pequeno número de padres e bispos, dos quais eu faço parte, celebram.
É por isso que, na medida do possível, abrirei um seminário para candidatos a um sacerdócio agradável a Deus.
Além dessa "missa" que desagrada a Deus, há muitos elementos que Deus rejeita, como por exemplo na ordenação dos padres, na consagração dos bispos, no sacramento da confirmação e no da unção dos enfermos.
Além disso, esses "padres" professam:
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o modernismo,
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um falso ecumenismo,
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a adoração do homem,
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a liberdade de abraçar qualquer religião;
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eles não querem condenar as heresias nem expulsar os hereges.
É por isso que, como bispo da Igreja Católica Romana, julgo que a Sé da Igreja Católica em Roma está vaga e que é meu dever, como bispo, fazer tudo o que estiver ao meu alcance para que a Igreja Católica Romana perdure, em vista da salvação eterna das almas.
Junto a esta declaração alguns documentos muito elucidativos:
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São Pio V: bula Quo primum;
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Concílio de Trento, 22ª sessão;
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Pio VII: brefo Adorabile eucharistiae, e Concílio de Florença: Decreto para os armênios; Decreto para os jacobitas;
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São Pio V: Missal Romano: "Dos defeitos na celebração da missa": "Defeitos de forma";
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Pio VI: Constituição Auctorem fidei; São Pio X: decreto Lamentabili e encíclica Pascendi;
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Concílio de Florença: Decreto para os jacobitas; Pio IX: encíclica Quanta cura; Bonifácio VIII: bula Unam sanctam;
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Codex iuris canonici, cânone 1322;
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Paulo IV: bula Cum ex apostolatus; Codex iuris canonici, cânone 188, nº 4;
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Pontificale romanum: "Da consagração dos eleitos ao episcopado": "Forma do juramento" e "Exame".
Munique, 25 de fevereiro de 1982
Pierre Martin Ngô-dinh-Thuc, arcebispo.
Conclusão
Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla não fazem parte da Igreja visível, mas de uma seita não-católica. Aquele que não faz parte do corpo místico de Cristo não pode, de forma alguma, ser o Vigário de Cristo. "Não pode ser a cabeça da Igreja aquele que não é membro dela" (São Roberto Belarmino: De romano pontifice, livro II, cap. 30).
Demonstração em três partes de que esses homens não são papas:
§ 1. "Seria absurdo dizer que aquele que está fora da Igreja possa presidi-la" (Leão XIII: encíclica Satis cognitum, 29 de junho de 1896).
§ 2. "Somente são verdadeiramente contados como membros da Igreja aqueles que receberam o batismo de regeneração e professam a verdadeira fé" (Pio XII: encíclica Mystici corporis, 29 de junho de 1943).
§ 3. Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla não professam a verdadeira fé.
Conclusão: aquele que não professa a verdadeira fé não é um membro do corpo da Igreja e, portanto, não pode ser o chefe supremo dela.
Resumo: a Igreja dita "conciliar", não possuindo as quatro notas características da verdadeira Igreja, é uma seita, uma "imitação de Igreja". Roncalli, Montini, Luciani e Wojtyla lideram uma seita herética; eles não são papas da Igreja católica.
"Uma vez que se ataca a própria cidadela da fé, [...] devemos lembrar deste preceito frequentemente ensinado por São Carlos Borromeu (Concílio Provincial, cap. 1): 'O primeiro e maior cuidado dos pastores deve ser ocupar-se da conservação integral e inviolável da fé católica, desta fé que a Santa Igreja Romana professa e ensina, e sem a qual é impossível agradar a Deus'" (São Pio X: encíclica Editae saepe Dei, 26 de maio de 1910).
Um dos artigos da fé particularmente atacado nos dias de hoje é este: "Creio na Igreja una, santa, católica e apostólica" (ordinário da missa, recitação do Credo de Niceia-Constantinopla).
"Que se faça ressoar o Credo: por este canto a verdadeira fé se afirma de maneira brilhante e a alma das populações católicas, avivando sua crença, se prepara para receber a comunhão do corpo e do sangue de Cristo" (III Concílio de Toledo, 589, cânon 2).